Conte Sua História de São Paulo: Namorar no trânsito

 

Por Júlio Salles
Ouvinte-internauta

Ouça este texto que teve sonorização de Cláudio Antonio

Era linda aquela moça no carro ao lado. O trânsito da 23 me deixou parado e me permitiu prestar atenção naquele rosto. Havia cabelos loiros escorrendo até o pescoço. E um sorriso que interrompia o meu olhar.

Pelo balançar da cabeça, ela acompanhava a música em uma rádio qualquer. Ou seria um CD. O balanço era suave como o olhar dela que não se alterava mesmo com o buzinaço dos motoboys que cruzavam em alta velocidade entre os carros.

Pobres rapazes. Andam tão rápido, tem tanto a fazer. Que jamais saberão o prazer de estar preso no congestionamento ao lado daquela moça.

Apesar de próxima, e da minha insistência em olhar por entre os vidros do carro, ela não parecia perceber minha presença. Nada parecia perturbar a atenção que tinha em seus próprios pensamentos. O que estaria pensando ? No encontro que teria assim que chegasse ao seu destino. No namorado que acabara de ligar falando-lhe coisas de amor. No trabalho da escola. No trabalho do trabalho. Nas coisas da vida. que podem ser muitas coisas.

A fila em que ela estava as vezes andava mais do que a minha, e eu a mirava pelo espelho lateral do carro dela. Quando chegava minha vez, passava a frente e continuava a acompanhar seu rosto agora intermediado pelo meu espelho. Aquele jogo de espelhos a tornava ainda mais atraente.

Qual será o nome dela ? Janete, Valéria, Norma, Regina … Todos os nomes cabiam na minha imaginação. Todos combinavam com ela e aquelas bochechas levemente avermelhadas, cor que acentuava a maciez da pele.

Dava o azar de o trânsito melhorar mais adiante e eu quase a perdia de vista. Mas logo o engarrafamento conspirava a meu favor. E nós nos encontrávamos. Ou eu a encontrava, pois ela permanecia impassível dentro de seu carro, conduzindo sua própria vida, distante de todos a sua volta, apesar de parecer tão pertinho de mim.

Já havia uns 20 minutos em que meu namoro se iniciara ali na 23. Até que de repente, a luz da seta se ascende e começa a piscar, um carro sai pela direta, o outro pela esquerda e um tunel nos separa. Ela não olha pelo espelho retrovisor como eu gostaria. Eu sou obrigado a olhar para frente.

De onde vem e para onde vão estas moças bonitas do trânsito de São Paulo ?

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2 comentários sobre “Conte Sua História de São Paulo: Namorar no trânsito

  1. Sem querer ser chato, mas… o deslocamento baseado no automóvel traz esse tipo de frustração. Isola as pessoas, desumaniza o convívio. Se ambos estivessem de bicicleta, você teria a chance de pelo menos dizer oi. Se ambos estivessem num ônibus ou metrô, mesmo com outras pessoas entre vocês, talvez ela notasse seu sorriso.

    Isolados em suas bolhas, os motoristas perdem a oportunidade conhecer pessoas interessantes, de fazer amigos, talvez até de mudar sua história de vida encontrando alguém especial.

    Boa sorte nas divagações em meio ao congestionamento…

  2. Você deveria era prestar atenção no trânsito!

    Por causa de motoristas que deixam de prestar atenção no tráfego, ciclistas e outros veículos mais rápidos que automóveis sofrem seríssimas consequências.

    Moral da história: “Ficou sem a mina, só foi prestar atenção no tráfego depois que a mina se mandou. Aposto que se vc tivesse o número do celular dela, ligaria de dentro do caro mesmo (que é proibido), e provavelmente aumentaria sua chance de causar um acidente devido sua falta de atenção!”

    Carro MATA! Trânsito também! Peço por gentileza que preste atenção quando estiver conduzindo um veículo que pode matar um inocente! Reveja seus conceitos.

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