Uiraquitan, inovação nos anos 70

 

Por Adamo Bazani

Modelo desenvolvido em São Bernardo do Campo para Curitiba, que tinha motorista em “mirante” sobre os passageiros, assustou indústria na época, mas deu importantes lições para novos modelos e sistemas de ônibus

Uiraquitan. Você já ouviu falar deste modelo de ônibus? Pois, foi uma das oportunidades da cidade de São Bernardo do Campo, no ABC Paulista, ter tido influência direta na implementação do sistema de ônibus expresso Segregado, de Curitiba, inédito no País. Mas as inovações propostas na época pelo DEPV – Departamento de Pesquisa de Veículos, da FEI – Faculdade de Engenharia Industrial da Fundação Educacional Inaciana de São Bernardo do Campo assustaram e o modelo não passou de uma miniatura e vários desenhos. O projeto foi encomendado pelo IPPUC (Instituto de Pesquisa e Planejamento Urbano de Curitiba), no início dos anos 70, que na contramão dos investimentos ferroviários, decidiu, de maneira bem sucedida, investir em linhas de ônibus de grande demanda, troncais, em corredores exclusivos, e linhas alimentadoras, que serviram de modelo até para outros países, como a Colômbia que implantou o Transmilênio.

O Uiraquitan, desenvolvido pelos engenheiros da FEI, de São Bernardo do Campo, já revolucionava pela posição do motorista, que ficava numa alta cúpula de vidro, acima dos passageiros. Isso mesmo, se hoje, vemos alguns ônibus panorâmicos com o salão de passageiros sobre os motoristas, no projeto do ABC para Curitiba, o motorista que ficava em cima do passageiro. O objetivo do “mirante” era oferecer maior visibilidade tanto para motorista como para passageiros.

Não bastasse essa inovação, a acessibilidade para pessoas com mobilidade reduzida, que hoje é obrigatória em todas as carrocerias produzidas desde julho de 2009, já foi preocupação dos engenheiros da época, que planejaram o Uiraquitan para que o salão de passageiros ficasse a 20 centímetros de altura em relação ao solo.

O modelo, projetado em 1973, teria também painel eletrônico (algo adotado recentemente nos ônibus urbanos), que informava, além de itinerário e número de linha, quantos assentos estavam desocupados. Os engenheiros da FEI também tinham preocupação ambiental. Projetaram uma série de filtros no motor que já nos anos 70 reduziriam em até 50 por cento os níveis de poluentes.

A capacidade para transportar passageiros sentados, de acordo com o projeto, seria maior que um articulado de hoje: 80 sentados. Os articulados tem, aproximadamente, 60. Isso seria possível porque o posto do motorista ficaria acima do salão de passageiros e pelo fato de os bancos serem longitudinais. Os corredores também seriam mais largos.

No entanto, o ônibus não saiu da fase de miniatura, por vários motivos, entre eles, o desenho inovador para época, dificuldade de fabricação de alguns equipamentos e necessidade de uma barra de direção muito longa, por conta do “mirante do motorista”

Fracasso? Não, apesar de o Uiraquitan não ter sido fabricado. Assim como no mundo da moda, onde vemos roupas inimagináveis de serem encontradas nas ruas, mas que ditam tendências, o Uiraquitan apontou caminhos que depois de adaptados à realidade da indústria nacional de carrocerias viriam solucionar vários problemas, alguns ainda recorrentes, como a necessidade de ônibus acessíveis e menos poluentes.

De pronto, o Uiraquitan deixou a herança da maior visibilidade para motoristas e passageiros e de um salão de passageiros com melhor aproveitamento. Logo após a recusa do Uiraquitan, depois de analisar projetos de encarroçadoras como Nimbus, Marcopolo e Caio, o Instituto de Pesquisa e Planejamento de Curitiba, escolheu o modelo Marcopolo Veneza Expresso, com grande área envidraçada na carroceria. O IPPUC fez questão de exigir algumas características do Uiraquitan, como a visibilidade, o desenho diferenciado e o motor mais silencioso, traseiro, com no mínimo 200 cavalos de potência.

Com um pouco do Uiraquitan, em 22 de setembro de 1974, começam a circular os Marcopolo Veneza Expresso trazendo ao setor, o conceito de BRT – Bus Rapid Transit -, os ônibus rápidos de corredor segregado, termo usado em todo o mundo.

As propostas do Uiraquitan também foram usadas por outras encarroçadoras que aos poucos vinham assimilando os conceitos apresentados pela FEI. Alguns destes conceitos viraram obrigação por órgãos concedentes e fiscalizadores e opção de modelo de encarroçadoras, que o desenvolveram.

Por isso, dizer que o Uiraquitan foi um fracasso da engenharia do setor de transportes é um equívoco. Talvez, sem as idéias, consideradas loucuras na época, de seus projetistas, a indústria de ônibus nacional, uma das mais respeitadas do mundo, não teria chegado ao atual patamar.

O Uiraquitan pode ser visto apenas em miniatura, como na foto de nosso acervo publicada na abertura deste post. Já o Veneza Expresso, deixado de lado nos anos 80, por conta da maior demanda de passageiros e novas necessidades, teve um exemplar restaurado em 1999, com o uso de três carrocerias abandonadas, achadas em ferro velho de Curitiba e vários dias de trabalho.

Adamo Bazani é jornalista da CBN e busólogo. Toda terça-feira, escreve no Blog do Milton Jung

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