Por Julio Tannus
Desde criança ficava intrigado com os fenômenos da eletricidade – as descargas elétricas, o acender e apagar das luzes… Não deu outra, me formei em engenharia elétrica, dei aula na universidade por dez anos, nas cadeiras de Teoria da Eletricidade, Eletromagnetismo, Máquinas Elétricas. Até que, após as primeiras aulas particulares com a filósofa Marilena Chauí, me dei conta que a fonte primeira de conhecimento dos fenômenos contidos na física estava na filosofia. Passei, então, por um bom tempo, a me dedicar de corpo e mente às ciências humanas. E depois, juntando as exatas com as humanas, ingressei no marketing, nos estudos de mercado e na pesquisa de mercado.
E a Filosofia? Deixou nossos bancos escolares. É uma grande perda. Retomo então a indagação que Marilena Chauí faz: Para que a filosofia? Inútil? Útil? E ela mesma responde: O primeiro ensinamento filosófico é perguntar: O que é o útil? Para que e para quem algo é útil? O que é o inútil? Por que e para quem algo é inútil?
O senso comum de nossa sociedade considera útil o que dá prestígio, poder, fama e riqueza. Julga o útil pelos resultados visíveis das coisas e das ações, identificando utilidade e a famosa expressão “levar vantagem em tudo”. Desse ponto de vista, a Filosofia é inteiramente inútil e defende o direito de ser inútil.
Não poderíamos, porém, definir o útil de outra maneira?
Platão definia a Filosofia como um saber verdadeiro que deve ser usado em benefício dos seres humanos.
Descartes dizia que a Filosofia é o estudo da sabedoria, conhecimento perfeito de todas as coisas que os humanos podem alcançar para o uso da vida, a conservação da saúde e a invenção das técnicas e das artes.
Kant afirmou que a Filosofia é o conhecimento que a razão adquire de si mesma para saber o que pode conhecer e o que pode fazer, tendo como finalidade a felicidade humana.
Marx declarou que a Filosofia havia passado muito tempo apenas contemplando o mundo e que se tratava, agora, de conhecê-lo para transformá-lo, transformação que traria justiça, abundância e felicidade para todos.
Merleau-Ponty escreveu que a Filosofia é um despertar para ver e mudar nosso mundo.
Espinosa afirmou que a Filosofia é um caminho árduo e difícil, mas que pode ser percorrido por todos, se desejarem a liberdade e a felicidade.
Qual seria, então, a utilidade da Filosofia?
Se abandonar a ingenuidade e os preconceitos do senso comum for útil; se não se deixar guiar pela submissão às idéias dominantes e aos poderes estabelecidos for útil; se buscar compreender a significação do mundo, da cultura, da história for útil; se conhecer o sentido das criações humanas nas artes, nas ciências e na política for útil; se dar a cada um de nós e à nossa sociedade os meios para serem conscientes de si e de suas ações numa prática que deseja a liberdade e a felicidade para todos for útil, então podemos dizer que a Filosofia é o mais útil de todos os saberes de que os seres humanos são capazes.
Julio Tannus é consultor em Estudos e Pesquisa Aplicada, co-autor do livro “Teoria e Prática da Pesquisa Aplicada” (Editora Elsevier) e às terças-feiras escreve no Blog do Mílton Jung
Você tem razão, mas infelizmente, o problema atual é muuuuuuito maior que a simples inexistência da Filosofia nos bancos escolares.
Os jovens escrevem cada vez menos e pior. É assustador ver no trabalho como escrevem os que acabaram de sair da Faculdade. Fico imaginando como estão os que não conseguiram entrar em uma (se houver alguém capaz disso).
Abs
Uma linda reflexão, Julio. E fica a pergunta: a quem serve o fim do ensino da Filosofia?
Julio,
Muito bem lembrado e uma delícia de ler.
André, penso que a falta de reflexão sobre as carências na educação, e a filosofia nos remete a reflexão, nos leva a esse quadro que você aponta.
Miriam, esta é uma boa pergunta: a quem serve o fim do ensino da Filosofia?
Julio, na minha opinião o motivo da retirada da Filosofia foi o mesmo do Latim. Pura ignorância, isto é, não entendimento nem da Filosofia como matriz do conhecimento e nem do papel que o Latim representa para as línguas.
Maria Lucia, agradeço suas palavras.
Carlos, muito bem lembrado. O latim nos ajudou muitíssimo no aprendizado de nossa lingua portuguesa e outras mais.