O Conte Sua História de São Paulo, neste mês de Julho, em que o frio chega à cidade, e aqueles que vivem em situação de rua sofrem com as baixas temperaturas, abre espaço para acolher o texto de pessoas que estão ou passaram pelo Arsenal da Esperança, onde antigamente funcionava a Hospedaria dos Imigrantes. A partir de um concurso literário, promovido durante a pandemia, quando o local manteve alojados e protegidos quase 1.200 pessoas, 66 textos foram selecionados para compor o livro “Os desafios de uma pandemia”. Destes escolhemos cinco que serão publicados aqui no blog. Nem todos os autores são identificados por nome e sobrenome, mas em todos os textos nós vamos identificar a resiliência do povo de rua.
Para dar início a essa série, o Conte Sua História de São Paulo traz o texto de Luís Carlos:
Tons de esperança
Parecia uma crise, mas era só o fim de uma ilusão… Já fazia algum tempo que eu notava no tom de voz dos que me amavam a nítida intenção de não me proteger da verdade que, mesmo machucando, dói menos do que a ilusão. E a trajetória ao encontro do destino iria revelar que lutar para permanecer no mesmo lugar por fim me tornaria um peregrino.
O céu colorido ao amanhecer, numa aquarela de tons marcantes, emocionava tanto que até um cego veria que algo belo acontecia. Na despedida, o passo do meu caminhar se fazia determinado quando, de soslaio, percebi que minha mãe ainda permanecia à porta do recanto que me confortava e protegia o universo ao meu redor, e que, agora longe, se transmutava em cenários inacreditáveis, notícias estarrecedoras e perspectivas desafiadoras, desenhando em minha mente uma realidade global desoladora e pandêmica.
Conforme rumava à metrópole, surgia a impressão de que silenciosas e vazias ruas haviam sido evacuadas e a população, abandonado o planeta, fugindo de um surpreendente inimigo invisível.
Frente ao olho do furacão percebi que todo este movimento oferece uma mensagem; repensar a vida é o que nos resta e isolar pode se traduzir em reaproximar-se da essência de uma existência mais plena, ou seja, reconectar-se, religar. Ressignificar faz toda a diferença diante das situações que nos põem à prova. Dar um tom de compaixão e fraternidade na abordagem do que nos é exigido pavimenta nosso caminho para a superação. Mais vale um susto no final do que um susto sem fim.
E como a sensação de que algo maior transcende um panorama, nos pintado como avassalador, que nos conduz ao crescimento, surge no horizonte raios de confiança e obstinação, perfazendo verdadeiros tons de esperança, a compor a paisagem de calmaria que nosso mais íntimo sentimento anseia e contempla, sem desamparo.
E que nos imunizemos sobretudo contra a ignorância e falta de humanidade, e surja diante de nós a imagem soberana da paz, num quadro onde todos alcançam saúde e prosperidade.
Luíz Carlos, do Arsenal da Esperança, é personagem do Conte Sua História de São Paulo. A sonorização é do Cláudio Antonio. Escreva você também o seu texto e envie agora para contesuahistoria@cbn.com.br. Para ouvir outros capítulos da nossa cidade, visite agora o meu blog miltonjung.com.br ou o podcast do Conte Sua História de São Paulo.
