Conte Sua História de SP: o meu milagre de Nossa Senhora Aparecida

 

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Por Rubens Salles dos Santos
Ouvinte da rádio CBN

 

Foram quatro dias debaixo de sol, três noites dormindo no mato, mais de 200 quilômetros de intensa caminhada e um chinelo de dedo que não teria sola para nem mais um passo. Estávamos nos primeiros dias de 1971. Enquanto as pessoas ainda tinham esperança em cumprir as promessas de reveillon, eu pensava em pagar uma que eu havia feito três anos antes. E não era uma promessa qualquer, era uma promessa a Nossa Senhora Aparecida. Se eu conseguia andar àquela altura, devia tudo à intercessão dela.

 

Imagine um encanador que tinha certeza de que nasceu para ser jogador de futebol. Era eu. Naquela época, eu morava com minha família no Bixiga, bem no Centrão de São Paulo. Já estava mais enturmado com a italianada que os próprios descendentes que moravam ali. Quem me conhecia nem fazia ideia que, na verdade, eu era filho de português.

 

Fim de semana era um evento a parte. A gente juntava a turma da Bela Vista pra jogar bola, naquele famoso “casado contra solteiro”, em que todo mundo se achava craque. Foi em uma dessas peladas que marquei o gol mais bonito da minha carreira de encanador metido a boleiro. Uma matada no peito na entrada da área, numa virada rápida, num “sem pulo”. O “sem pulo” fez a festa de quem assistia, mas foi o terror para o meu joelho. Caí naquele terrão já sentindo que boa coisa não era. O joelho inchou, a dor surgiu e o hospital era inevitável. Aquele lance, que de habilidoso não tinha nada, estourou meu menisco. Veio remédio e repouso, conseguia andar de novo, mas com dificuldade. A dor não passava.

 

O médico foi categórico: tinha que operar. Eu pensava na cirurgia e já imaginava o médico mexendo na minha perna como eu serrando cano, soldando calha e rosqueando registro. Não bateu medo nem temor, bateu paúra mesmo. Marcou o dia, fui pro hospital e, na hora de internar, resolvi recorrer àquela em quem eu sempre tive fé – desde menino. Juntei as mãos, olhei pro céu e pedi pra Nossa Senhora Aparecida me ajudar a melhorar do joelho, me livrar daquela cirurgia, que se eu curasse iria a pé até (a então) Aparecida do Norte.

 

 

Eu era devoto desde menino. Mas também, desde menino, era teimoso e levado. Saí fugido do hospital, sem o médico me ver, contrariando todas as ordens. Não mais que de repente, a dor passou. Voltei a minha vida normal, subindo em forro, me pendurando em prédios e entrando em esgoto. Nada de dor no joelho. Foi milagre da Mãe.

 

Levei três anos para tomar coragem e cumprir a promessa. Mas, como bom filho de português, pra mim promessa sempre foi dívida. Devo, não nego. Pago quando puder. E eu não tinha desculpas pra não cumprir. Era janeiro de 1971 quando virei pra Josefina, minha mulher, e disse que iria pra Aparecida do Norte. Na ocasião, meu filho Roberto tinha 6 anos e minha filha Sueli só 3 anos. Minha mulher ficou ressabiada, mas sabia que eu ia de qualquer jeito pra lá.

 

Logo a Bela Vista inteira ficou sabendo. Foi quando meu pai, que tinha uma venda no bairro, me falou que o José, que vendia batata na feira do Bixiga  todo fim de semana, também tinha feito promessa. Eu só conhecia ele de vista, nunca tinha conversado. Bati na porta dele, contei minha história e falei: parto no dia 23 de janeiro, do marco zero de São Paulo, da Praça da Sé. Voltei pra casa com a palavra dele de que iria, mas só saberia mesmo no dia. Se ele aparecesse, teria companhia. Se não, eu iria sozinho enfrentar os mais de 200 km.

 

Chegou o dia. Ainda era madrugada e eu já estava de pé. Cheguei cedinho na Praça da Sé, só tinha eu e os pombos. Começou a espera angustiante. Será que o José vai aparecer? Será que vou ter de ir sozinho? Vai que me acontece alguma coisa no caminho. Vai que eu me perco. Vai que… Não, Nossa Senhora está comigo. A fé tinha que ser mais importante que tudo. E foi. Não só pra mim como pro José, que pra minha completa surpresa apareceu. Não perdemos tempo, começamos a caminhada.

 

Fomos totalmente sem preparo, afinal, decidimos de uma hora pra outra. Levamos só uma mochila com dinheiro, água pro dia, um chinelo e toalha. Assim que chegamos na Dutra, percebi que minha sandália não ia aguentar. Não ia demorar pra aparecer bolha no meu pé. E a viagem mal tinha começado. Peguei o chinelo de dedo na mochila e calcei. Não tirei mais. O verão de 1971 castigou a gente. O asfalto parecia um mar de fogo. O sol pelo interior de São Paulo era coisa de louco.

 

Bom, não demorou pra gente achar que aquilo tudo era coisa de louco mesmo. Naquela época, mal tinha acostamento e pra achar posto de gasolina tinha que rodar muitos quilômetros.A água logo acabou e o dinheiro não servia, porque nem tinha onde comprar nada. O jeito foi começar a parar nos casebres que encontrávamos na beira da estrada pra pedir de beber. E foi assim que a gente seguiu. Fazendo as moitas de banheiro, a sombra das árvores de cama, os postos de gasolina de refeitório e as fazendas no caminho de ponto de água.

 

Mal passou o primeiro dia e percebemos que tínhamos de adotar uma estratégia. Do contrário, não chegaríamos nem à metade. Passamos a caminhar de noite e cochilar ao meio-dia, na sombra. E não dava pra parar muito tempo. Era reduzir o passo e as dores vinham. Doía canela, coxa, costas, pescoço, tudo. E o cansado se mesclava com o medo dos carros e dos caminhões. De noite, qualquer sombra que se aproximava era motivo de susto. O temor foi tomando conta da gente, a promessa parecia um fardo pesado demais, muito maior do que podíamos carregar.

 

Quando alcançamos a placa que indicava a metade do caminho, bateu um desespero. José era mais novo que eu, mas já estava esgotado. Dava pra ver nos olhos dele. Ele virou pra mim e disse: “segue com Deus, meu amigo, vai você porque eu não aguento mais”. Naquele momento, confesso que quase sucumbi à tentação de desistir. Foi quando novamente juntei as mãos, olhei para os céus e pensei firme em Nossa Senhora Aparecida. Era isso que nos faltava, a confiança de que a Mãe estava conosco. Não deixei ele parar, peguei pelo braço, puxei e assim seguimos. Na manhã do quarto dia, já avistávamos aquela cidadezinha pequena, mas tão abençoada.

 

Essa basílica que vemos hoje, gigante, ainda não existia. O que havia era a Igreja antiga, que guardava a imagem de barro encontrada no Rio Paraíba do Sul. Quando nos deparamos com a imagem da Mãe… Bom, nem consigo descrever. Foi, sem duvida, o momento mais emocionante em toda a minha vida. Agradecemos, rezamos, assistimos a uma missa e era hora de pegar o ônibus pra voltar.

 

Não tinha celular, não tinha internet, no máximo um orelhão que se achava de vez em nunca. Foram quatro dias sem dar qualquer notícia pra família. Quando cheguei de volta no Bixiga, nem ‘bom dia’ recebi. Afinal, ninguém me reconhecia. Justo eu, que andava pela Treze de Maio e encontrava um conhecido a cada passo. Parecia que tínhamos ficado anos longe. Imagine um cara barbudo, com as roupas sujas e rasgadas, uma sandália destruída, os pés em carne viva, com cara de esgotado. Minha mulher, a Josefina, não sabia se festejava ou se chorava quando me viu. Nem sei quantas horas dormi depois. Nem do José, que depois perdi contato e nunca mais tive notícia.

 

Os anos passaram, os filhos cresceram, saí da Bela Vista, os netos vieram, reduzi o futebol – não na arquibancada, mas no campo – e até parei de beber. Em cada vitória minha, da minha mulher, dos meus filhos e dos meus netos, uma certeza: Nossa Senhora Aparecida está conosco. Hoje, está até tatuada no meu peito.

 

Rubens Salles dos Santos é personagem do Conte Sua História de São Paulo. A sonorização é de Cláudio Antonio e a narração de Mílton Jung.

Basílica de Aparecida, maior estacionamento do mundo

 

Destacado internacionalmente, o estacionamento do templo religioso no interior de São Paulo recebe quantidade de ônibus que supera a frota da maioria das cidades brasileiras e pode ser considerado um dos maiores terminais de ônibus do mundo.

Por Adamo Bazani

Quatro mil ônibus colocados lado a lado, dos quais 2,5 mil fretados, junto com mais de 6 mil carros, em uma área de cerca de 272 mil metros quadrados, formam o maior estacionamento do mundo que pode ser encontrado na Basílica de Aparecida, conforme registra o Guiness Book, o livro dos recordes.

Para se ter ideia, esse número de ônibus é 10 vezes superior a toda frota municipal de uma cidade como Santo André, no ABC Paulista, que tem cerca de 400. O terceiro maior templo católico do mundo comporta em torno de ¼, mais precisamente 26,6%, da frota que atende a capital paulista onde rodam 14 mil 995 mil ônibus cadastrados.

Sem exageros, a Basílica de Aparecida, na região do Vale do Paraíba, interior de São Paulo, pode ser considerado um dos maiores terminais rodoviários do mundo. Isso sem contar que o templo recebe também fiéis vindos de ônibus urbanos e rodoviários de linhas regulares, não fretadas.

A foto, conservada por Jorge A. Ferreira, mostra que o local é testemunha da evolução da indústria de ônibus e do transporte coletivo em geral. A imagem é de 1961, quando a torre da basílica ainda estava sendo erguida. Nela podem ser vistas preciosidades da história dos transportes, como Monoblocos O321, da Mercedes Benz, os primeiros ônibus integrais, que unem num bloco só motor, chassi e carroceria, de alcance nacional e internacional fabricados no Brasil, além de velhos Carbrasas e Nicolas, entre outros.

E quem quer dar um passeio pelo passado e até mesmo pelo futuro da história dos ônibus, uma volta no enorme estacionamento é uma boa pedida. Isso porque, o local, principalmente no dia 12 de outubro, recebe ônibus do Brasil inteiro, de empresas de diferentes portes e passageiros com situações financeiras distintas. Assim, é possível ver os modelos mais modernos do mercado, com computadores de bordo, ambientes para jogos e entretenimentos eletrônicos, até os veículos mais simples do início dos anos de 1980, às vezes até mais antigos.

A Basílica chega a receber em feriados prolongados como este até 400 mil fiéis. E foi essa demanda e a necessidade de receber de forma mais organizada possível que motivou a construção do atual templo. As movimentações para que a Basílica atual fosse construída começaram em 1926 por romeiros e funcionários do templo da época. A estrutura era pequena para o número de religiosos. Mas os pedidos foram negados pelo então arcebispo de São Paulo, Dom Duarte Leopoldo, que preferiu concentrar esforços para ampliação de igrejas na capital e do Seminário do Ipiranga, também na cidade de São Paulo.

A iniciativa só foi abraçada em 1939 pelo sucessor Dom José Gaspar. Mas a trágica morte do religioso num acidente de avião, em 1943, interrompeu os planos. As obras tiveram um início tímido em 10 de setembro de 1946, quando foi lançada a pedra fundamental que pouco tempo depois foi roubada. As obras só se intensificaram em 1955 e além de dízimos e doações dos fiéis, recursos públicos foram usados.

O Governo Federal ofereceu o transporte de cimento. Com recurso público foi feita toda a estrutura de ferro da torre principal. As obras de canalização da Ponte Alta e do nivelamento do Morro dos Pitas saíram dos cofres estaduais, além do asfaltamento da praça principal. A Basílica só foi concluída quase 40 anos depois do início das obras, em 4 de julho de 1980.

As empresas de fretamento devem muito a fé, pois Aparecida é um dos maiores mercados para o setor. Em contrapartida, a Igreja Católica tem de agradecer ao serviço de ônibus, sem este não haveria como tantos fieis seguirem a caminho da Basílica.

Adamo Bazani é jornalista da CBN, busólogo e escreve no Blog do Mílton Jung

Foto-ouvinte: Desrespeito oficial

Desrespeito oficial

Na Estância Turística de Aparecida as leis de trânsito devem ser diferentes daqueles em vigor no restante do Brasil. O carro oficial da prefeitura de lá foi flagrado parado em cima da faixa de segurança semana passada (17/02), logo após o meio dia, na esquina da Bela Cintra com a Paulista.

De acordo com o ouvinte-internauta Cleber Jacob, os ocupantes do carro oficial não se importaram com o fato dele estar fotografando o veículo em flagrante desrespeito a lei assim como também não se incomodaram com a cara feia dos pedestres obrigados a desviar o caminho

Nota de ouvinte-internauta (27/02 – 19h51)

“Eu visitei o site da prefeitura daquela cidade e, no endereço podemos ver que a infração causada pelo motorista daquele carro é do tipo Gravíssima, com multa de R$ 574,61 (vide pag. 12), além de uma falta grave (pag. 13), estacionar sobre calçadas ou sobre faixa de pedestres. Segundo o PARE – Programa de Redução de Acidentes de Trânsito – deles, a educação no trânsito deve começar na escola. Acho que a autoridade de lá deve conduzir o motorista daquele carro de volta à 1ª série.  –   Edson Rocha”