Sobre frases e livros de auto-ajuda

Por José Cascão

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Um amigo comenta com outro: “Faz mais de três meses que estou pagando a academia de ginástica e ainda não emagreci um quilo sequer. Vou ligar lá para saber o que está acontecendo.”

Sempre lembro dessa piada quando vejo a quantidade de livros de auto-ajuda que se publicam e vendem, enquanto boa parte dos leitores, entusiastas do estilo e compradores compulsivos, seguem sendo o que sempre foram, fazendo o que sempre fizeram, mas esperançosas de que um dia acordem e as suas vidas mudem para sempre.

Alguns, quando se cansam de ler (ou de comprar livros), adquirem cursos pela internet e enchem as redes sociais com frases de efeito sobre como a vida deve ser. E, para muitos, a isso se resume o autoconhecimento e a evolução pessoal.

Nada de errado com frases inspiradoras ou livros de auto-ajuda. Também os leio de vez em quando e compartilho pensamentos. Mas, como acontece com o álcool, penso que essas coisas devem ser consumidas e compartilhadas com moderação.

Duas frases que li recentemente e que me deixaram pensando por vários dias, têm relação direta com o que estou falando aqui: “Nada sairá da sua vida enquanto você não aprender o que precisa saber”. Para mim explica muito do por quê entra dia e sai dia e nada diferente acontece na vida da pessoa, parece que está sempre andando em circulo. A outra é: “Ninguém vira borboleta de uma hora para a outra. A evolução é um processo.” Esta é justamente sobre a ilusão de que apenas e simplesmente comprando livros ou reproduzindo posts de frases feitas vamos melhorar as nossas relações e viver de forma mais consciente e significativa.

Se não evoluímos, não é porque não saibamos o que temos de fazer. É porque não o fazemos!

José Cascão é publicitário, diretor de criação, copywriter on-off e ajuda a construir e valorizar o ativo mais importante da sua empresa: a sua marca.

De auto-ajuda

 

Por Maria Lucia Solla

Ouça “De auto-ajuda” na voz e sonorizado pela autora

Olá,

esta semana me fizeram uma pergunta que me levou a faxina em mim.

‘É só ser natural, não é?’ foi a pergunta.

Quando voltei para casa, à noite, continuava estacionada no conceito. Olhei bem para mim procurando o meu natural e, depois de algum tempo de senho franzido, ri aliviada. Não encontrei; vai ver não tenho um. Vai ver se foi com a placenta, na minha chegada. Vai ver ninguém tem.

O fato é que a pergunta desencadeou em mim mais um processo de limpeza de emoções – esta fica, esta vai, o que é que esta ainda está fazendo aqui? – e dei de cara com um evento, guardado na caixa de emoções, que era hora de transferir para a de lembranças. É bom fazer isso de tempo em tempo. Dá uma limpada boa. Melhora o desempenho da gente.

Encontrei ali um fato de anos atrás, quando fui ‘informada’ de que gente do meu grupo, da minha tribo, tinha dito que não entendia como alguém tão desequilibrado quanto eu tinha escrito um livro ‘de auto-ajuda’. Fiquei sentida porque, na época, andava ainda mais mergulhada do que hoje na ilusão de que somos o que o outro pensa que somos, e que se não somos amados incondicionalmente por aqueles que a gente ama, somos infelizes.

Foquei, então, na limpeza das emoções guardadas e transferi esse evento para a caixa de lembranças. No processo, revendo a fala deles, percebi que, fora o fato de não terem dito aquilo para mim, eu só questionava o codinome ‘de auto-ajuda’, atrelado ao meu livro, porque sempre vivi, mesmo, muito mais em desequilíbrio do que no prumo. Questiono o subtítulo ‘de auto-ajuda’ aplicado a livros que falam de vida, emoção, questionamento, de por quês e porquês, e dos que dão dicas porque, afinal, de médico e louco cada um tem um pouco.

Por que não chamam de livros ‘de auto-ajuda’, os romances de Tolstoy? Por que as peças de Nelson Rodrigues não recebem o carimbo de teatro ‘de auto-ajuda’? Uma noite de música na Sala São Paulo, a disputa pelo campeonato, no estádio do time do teu coração? Por que o pãozinho com manteiga, na padaria, e um capuccino, tudo fresquinho, feito no capricho, não são chamados de café da manhã ‘de auto-ajuda’? O primeiro beijo de cada novo amor, o milésimo beijo do amor de sempre. Por que não é chamado de auto-ajuda, o fato dolorido, a situação embaraçosa?

Mas o que é auto-ajuda?

Veja, o prefixo auto- quer dizer que você pratica uma ação, e é ao mesmo tempo o alvo dela. Você é o sujeito e o objeto da ação. Você faz a coisa para você mesmo. Portanto, nenhum livro, nenhuma peça, nenhuma criação musical, nenhuma partida de futebol, nada, nadica de nada pode ser chamado de ‘de auto-ajuda’.

Se algo externo a você te provoca o desejo de se perceber, de usar a consciência pra ela não enferrujar, se te ajuda a chegar aonde quiser ou puder, como der, esse algo simplesmente para a ser uma ajuda, se você quiser se ajudar. Simples assim. Auto-ajuda é o esporte que a gente pratica quando não se boicota. E olha que já está de bom tamanho! Você não acha? Vale dar uma chegada no porão ou no sótão onde estão armazenadas emoções antigas, emboloradas, e meter a mão na massa.

Pense nisso, ou não, e até a semana que vem.

Maria Lucia Solla é terapueta, professora de línguas estrangeiras e realiza curso de comunicação e expressão. Aos domingos, escreve no Blog do Mílton Jung

Só não vale sofrer além da conta

Por Abigail Costa

Diferenças. Elas revelam  nosso comportamento. E  sempre dão uma forcinha a mais pra que a gente pense: Campo ou cidade? Estresse ou relax? Ficar ou seguir em frente? Interessante com as pessoas discorrem sobre o assunto com métodos variados de ação e reação.

Sereno e tranquilo como alguém que medita todos os dias, esse meu amigo sempre tem uma visão mais espiritual:

– Nada foge aos olhos do nosso criador.

A voz pausada mas forte mostra segurança:

– Tudo o que acontecer tem um por quê.

– Dos nossos atos dependerá nosso futuro .

E mais  outras tantas palavras tiradas da escritura.

Claro que ele tem uma religião. Uma crença  tão forte que chega a pertencer a uma casta. Sempre aceitar com conforto o que acontece pela frente.

Já para um outro conhecido,  professor, doutor e curioso nas histórias de vida de seus pacientes. Para ele é:

– É você quem faz acontecer. Errando daqui, derrubando um obstáculo ali.

Sem a crença  divina. A auto-confiança aqui ganha um tom racional.

Quem está certo? O que busca consolo na crença? Ou o doutor,  que busca respostas nos livros?

Arrisco a dizer os dois.  Cada um com  suas diferenças, numa busca parecida. Transformar o difícil em algo novo. Que pode ser resolvido, não sofrido. E pra isso vale a leitura do livro, da bíblia. Só não vale sofrer além da conta.

Abigail Costa é jornalista e toda quinta-feira, aqui no Blog do Milton Jung fala da vida (dela e dos outros)
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