Conte Sua História de São Paulo: Em transformação

 

Márcio Chicca nasceu em 1947 em São Paulo e é um apaixonado pela cidade. Nas décadas de 1950 e 1960, entre a infância e a juventude, participou de momentos marcantes da história da cidade, como a inauguração do parque do Ibirapuera e de alguns dos tradicionais cinemas da cidade. Histórias que ele narrou ao Museu da Pessoa:

Ouça o texto de Márcio Chicca sonorizado por Cláudio Antônio

Tenho muitas recordações desta cidade, que eu aprendi a gostar desde pequeno, pois meu pai me propiciava informações, assuntos e passeios que se tornaram inesquecíveis, alguns dos quais ainda recordo com muita emoção.

Aos domingos, meu pai me levava passear no centro da cidade, na rua Boa Vista, onde ficava o Restaurante Guanabara e onde eu me deliciava com os enormes e variados sanduíches. Enquanto eu comia e tomava uma “Caçulinha” da Antártica, um sucesso na época, ele saboreava um chopp escuro.

Em outros domingos, invertia o roteiro e íamos para a rua Vieira de Carvalho, onde o restaurante Fasano funcionava em um prédio bonito que hoje é o hotel Bourbon São Paulo. Lá, meu pedido era uma ou duas coxinhas especiais, que eram deliciosas. Logo depois, meu pai comprava alguns doces em uma doceria ao lado, que eu acho que já era a Dulca, para a sobremesa do domingo.

Um passeio que marcou minha memória foi um dia inteiro de domingo de 1954, quando da inauguração do Parque do Ibirapuera. Tudo novinho, gramado lindo, lagos, pavilhões de alguns países, exposições diversas, alguns teco-tecos sobrevoando o parque e jogando flâmulas de papel prateado com textos em comemoração à inauguração do parque e ao IV Centenário da cidade.

Cada casa de São Paulo colocava em lugar de destaque uma placa comemorativa dos 400 anos da cidade: o brasão de São Paulo em alumínio polido ou colorido, salientando a idade da cidade. Quase todas as casas tinham um ou dois.

A maior diversão da cidade, e mais barata, era o cinema! Havia cinemas belíssimos como o Cine Metro da MGM dos EUA; o Bandeirantes (depois Ouro); o Marrocos, único em que as cadeiras deslizavam ao se sentar, o maior da cidade; o República, primeiro a exibir filmes em terceira dimensão; o Ipiranga e o Marabá, de grandes exibições como “Os Dez Mandamentos”, de Cecil B. de Mille, grande diretor de filmes épicos maravilhosos da época.

Nestes cinemas só se entrava com terno e gravata e foi para ir a um deles que usei a minha primeira. Nos intervalos, uma orquestra surgia no palco para tocar algumas músicas. Deste tempo eu peguei o final, onde se mantinha o hábito de usar terno e gravata, mas somente um cinema mantinha um excelente pianista, o Cine Ouro do Largo do Paissandu. Os outros já não suportavam este custo.
Depois de alguns anos, e com novas tecnologias, surgiu o Cinerama. Um espetáculo: tela imensa, som estéreo, só apresentando filmes especiais para aquele equipamento.

Na minha juventude ainda mantive alguns hábitos que meu pai me deixou, tais como ir comer um bauru no Ponto Chic do Largo Paissandu, ou tomar um chopp no Bar do Léo, na rua Aurora esquina com a rua dos Andradas, ou ainda uma boa canja de galinha no frio da madrugada no restaurante Papai, na esquina da Duque de Caxias com a São João.
Já não existia mais o Fasano da Vieira de Carvalho e o Guanabara mudou para rua São Bento, já não tinha nada mais a ver com aquele dos anos 50.

Hoje, às vezes, quando saio com meu filho, vamos comer um bauru ainda no Ponto Chic do Largo Paissandu e ele me lembra destas histórias dos passeios de meu pai, seu avô.

O Conte Sua História de São Paulo vai ao ar aos sábados, às 10 e 30, dentro do programa CBN SP. Você pode participar enviando seu texto ou agendando uma entrevista no site do Museu da Pessoa.

Conte Sua História de São Paulo: O bar automático

 

No Conte Sua História de São Paulo, Oliver Gomes da Cunha, natural de Botucatu, interior paulista. Veio morar na capital, em 1940, para fazer a faculdade. A história que você vai ouvir agora faz parte do acerto do Museu da Pessoa:

Ouça o texto de Oliver Gomes da Cunha que foi ao ar no CBN SP, sonorizado por Cláudio Antonio


Quando chegamos aqui em São Paulo – meu pai me trouxe -, nos hospedamos no Hotel do Este, que era ali na Rua Boa Vista. Era um dos melhores hotéis de São Paulo. Dali fomos à faculdade tirar informações. Era a Faculdade de Ciências Econômicas de São Paulo. São Paulo era uma coisa estranha para mim, por causa do movimento que havia na época. Eu fiz o vestibular, acabei me classificando e fui morar com uma tia que morava no Brás, na Rua Oiapoque.

Comecei a viver São Paulo. Tomava bonde para vir à cidade, era um deslumbramento. Para conhecer a cidade tinha um bonde chamado 17 que saía do Brás, ia para o Largo do Arouche, dava uma volta enorme, passava pela Avenida São João, entrava na Consolação, dava uma volta enorme, e era um grande passeio. Eu me lembro de umas coisas interessantes na época.

Havia em São Paulo um bar chamado Bar Automático, não sei se ouviram falar nisso. O Bar Automático era um bar que tinha na Avenida São João, ali no primeiro quarteirão entre a Libero Badaró e o Anhangabaú. A gente colocava um níquel e caía um sanduíche, não tinha garçom, não tinha ninguém. Você botava uma moeda, o sanduíche descia o degrau, você pegava o sanduíche, punha a moeda noutro lugar, jorrava um copo de refrigerante. Quantas e quantas vezes esse foi o meu jantar, porque eu tinha que ir pra aula e não dava tempo. Então eu ia no Bar Automático, que custava barato, e gastava pouco. Eu vivia de mesada.

Outra boa recordação que eu tenho nessa época, já na fase de estudante, era o Bar Pingüim. O Bar Pinguim era situado em frente ao Correio, mas do lado da descida da São João, perto de onde tem a Praça Antônio Prado. Na esquina tinha um bar chamado Bar Pingüim, que era da Antarctica, e a gente ia beber chope, sentava lá e ficava bebendo até esborrachar. Foram coisas que ficaram na época. Em frente ao Bar Pingüim era o Correio, tinha evidentemente uma urbanização. A gente fazia uma brincadeira: os estudantes todos saíam da faculdade e iam tomar chope no Bar Pinguim. A gente fazia apostava para ver quem bebia mais chope sem precisar ir ao banheiro. Nosso companheiro ganhou a aposta, só que quando levantou ele estava todo molhado!

Este texto está publicado no site do Museu da Pessoa. Vá até lá e registre mais um capítulo da nossa cidade. Ou então, agende uma entrevista com o Pessoal do Museu, pelo telefone 2144-7150.