Conte Sua História de SP: conduzido pela bengala branca do cego

 

Por Suely A. Schraner
Ouvinte-internauta da rádio CBN

 

 

Era um dia nublado quando chegamos para a primeira reunião na Fundação Dorina Nowill para Cegos. O sonho da mobilidade e maior autonomia, na ponta da bengala.

 

Bengala branca. Esta bengala é um recurso fundamental para garantir a mobilidade do deficiente visual. Mantém a postura ereta. É como uma extensão do braço. Adepta da geometria. Com sua ponta ela toca linhas retas, linhas curvas e suas subdivisões. E toca também o lixo, pernas distraídas, entulho na calçada. Encaixa copos descartáveis jogados no chão. ..

 

A bengala, muitas vezes, é rejeitada e dá medo. Remete ao preconceito. Sinônimo de velhice. Haja vista o logotipo no bilhete do idoso, aquele, simbolizado pelo bonequinho curvado, segurando uma bengala e simulando dor nos quadris. Ai, ai…

 

Sensibilizar os espaços. Desafiar inseguranças, vencer o medo. Compartilhar vias públicas e multiplicar respeito, um desafio permanente.

 

Na sala de reuniões, um grupo ávido por mais autonomia para finalmente poder circular por aí.

 

Um disse que a mobilidade está dentro da gente. Outro sonha ter três bengalas: uma para direcionar, outra para apoiar, e uma terceira para buzinar. Ideal de outro com as vistas avariadas: nunca fazer sinal para o caminhão do lixo parar pensando que era o ônibus.

 

Aprendi que, na Atividade Vida Diária (AVD), a terapeuta ocupacional, dá condições ao deficiente visual para fazer o que quer, com mais segurança. Por exemplo, fritar um ovo sem se queimar.

 

Na Fisioterapia, o objetivo é fortalecer os músculos e desenvolver um bom padrão de marcha, ou seja, pisar primeiro o calcanhar e em seguida a planta do pé. Além disso, trabalhar a lateralidade: esquerda e direita.

 

No Programa de Orientação e Mobilidade, a importância da auto-segurança. Enfim, todas as áreas estão interligadas.

 

Neste compartilhar, um olhar mais apurado pela região da Vila Clementino. Uma legião aflui para aquele quadrilátero hospitalar: ruas Borges Lagoa, Pedro de Toledo, Marselhesa, Napoleão de Barros, Botucatu e Diogo de Faria.

 

Brigando com postes, saídas de garagem, reformas e calçadas esburacadas. Superando preconceitos. Construindo dias melhores.

 

Na condição de Guia Vidente. Aprendo a verbalizar a lateralidade: ao invés de dizer de dizer “tem um lugar aqui”, falar: “tem um lugar à sua frente, à direita”.

 

Que a pessoa com deficiência visual, deve segurar na altura do cotovelo do guia vidente, no pulso ou ombro, dependendo da diferença de altura entre ambos. Facilitar a acessibilidade.

 

Eu e ela atravessamos as mesmas ruas, percorremos estes caminhos. A geografia do cego é um mundo visto pelos ouvidos, vozes, cheiros e toques.

 

Não é um cajado de Moisés ou um cetro de Reis. É a sua bengala branca que a conduz. Segue compartilhando a via pública, os pisos táteis. Tateando vida afora, multiplicando respeito. Driblando preconceito e a falta de respeito de alguns. Ser incluída é poder circular pelo mundo com desenvoltura.

 

Outro dia, pedi a uma jovem no ônibus para dar o lugar para ela. A moça recusou dizendo que o banco para cegos era o outro, mais atrás. No fim, uma senhora que estava lá, levantou-se espontaneamente e cedeu o lugar. Percebi depois, que além de idosa ela estava indo para uma quimioterapia, no Hospital São Paulo.

 

Dias destes, ouvi de uma deficiente visual:  “tenho a preferencial, mas, se não me cuidar, me derrubam no chão”. Há néscios dos direitos e da solidariedade .Há também os que multiplicam respeito. Menos mal.

 

No quadro da recepção da Fundação há uma inscrição que diz mais ou menos isso: a melhor maneira de agradecermos por enxergar é ajudar quem não vê. Uma maneira inefável de levar a vida. Na guerra contra o preconceito, compartilhando a via pública e multiplicando respeito.

 

Nota: “Uma em cada cinco vítimas de quedas atendidas no Hospital das Clínicas, (em agosto de 2012), se acidentou nas calçadas de São Paulo.”FSP 05.11.2012

 

O Conte Sua História de São Paulo tem sonorização do Claudio Antonio e narração de Mílton Jung. O programa vai ao ar, aos sábados, logo após às 10h30, no CBN SP.

Cegos devem cuidar de sua imagem nas entrevistas de emprego

 

Por Dora Estevam

 

Emprego, moda e deficiência visual. O que uma coisa tem a ver com a outra? Se para uma pessoa com a saúde e o corpo perfeitos já é difícil encontrar emprego, imagine para quem tem uma deficiência.

 

Não sei se você conhece, mas existe uma associação que cuida de pessoas cegas, é a Adeva – Associação de Deficientes Visuais e Amigos, que presta serviços a deficientes visuais com objetivo de preparar este cidadão para o mercado de trabalho.

 

Para oferecer soluções aos cegos, a Adeva reunirá, neste sábado, uma série de parceiros, em um curso sobre imagem pessoal. Um deles é Maria Helena Daniel, proprietária da Sintonia Consutoria de Imagem e Estilo, que fará palestra para chamar atenção para a importância de se estar vestido adequadamente em uma entrevista de emprego. A ideia é conhecer o rosto de cada um dos participantes do encontro, saber de suas necessidades e tirar dúvidas que costumam incomodar qualquer ser humano na hora de se vestir. Como usar uma camisa? Por dentro ou por fora da calça? Quais os padrões das roupas? Quais as melhores cores? E, até mesmo, como combinar uma bengala com a bolsa, por exemplo? Neste trabalho, Maria Helena se propõe, também, a fazer uma varredura nos armários e implantar códigos de forma que os clientes cegos possam identificar as roupas e combiná-las sem precisar da ajuda de outras pessoas.

 

Aproveito para mostrar a você duas fotos incríveis da consultora Maria Helena com o presidente da Adeva, Markiniano Charan Filho. Notem a diferença:

 

 

 

Outro parceiro no programa é empresa de cosméticos Embelleze, afinal todos precisam estar com os cabelos bem cortados, as unhas feitas e, por exemplo, para quem pretende usar esmalte, saber qual a cor apropriada para uma entrevista. Como o visual tem de ser impecável, a fabricante de óculos Ventura, marca muito conhecida no mercado fashion, vai doar óculos de sol. A cadeia de restaurante Ráscal também se unirá ao grupo (que delícia né?) oferecendo almoço aos participantes do encontro. O Ráscal já vem trabalhando com esta parceria há muito tempo. Os cardápios dos restaurantes da rede, por exemplo, têm informação em braille – uma das muitas atividades da Adeva.

 

O circuito de palestras, com entrada franca, ocorrerá em duas etapas, a primeira neste sábado, e a segunda sábado que vem, dia quatro de agosto. O evento será na sede da própria entidade, na rua São Manuel, 174, Vila Mariana, SP. Para saber mais sobre a associação e o curso sobre Imagem Pessoal para cegos visite o site da Adeva

 


Dora Estevam é jornalista e escreve sobre moda e estilo de vida, no Blog do Mílton Jung, aos sábados.