Cristaldo aparece no ataque em foto de Lucas Uebel/GrêmioFBPA
O Grêmio reforçou o grupo no meio da temporada. Trouxe jogadores de talento ascendente ao perceber suas carências. Apostou em um centroavante gringo experiente, diante da falta de gols. Encheu seu elenco de estrangeiros, considerando o risco de rebaixamento que se desenhava na primeira parte da competição. Mais recentemente, até para a Arena retornou, o que parece não ter sido suficiente para conquistar o torcedor, incapaz de lotar os poucos lugares disponíveis.
Mesmo que tenha enfrentado todos os elementos para percorrer aquilo que os mais românticos — e confesso que assim fui até há algum tempo — exaltariam como sendo parte da jornada do herói, em que viajamos do mundo dos comuns, aceitamos o chamado e encaramos a provação suprema, o Grêmio segue sendo um time propenso a oferecer sofrimento ao seu torcedor, uma partida após a outra.
Às vezes, esboça boas jogadas no ataque, sem, porém, transformá-las em risco de gol. Ao mesmo tempo, não resiste à mínima pressão do adversário na defesa. Nos últimos quatro jogos, levou nove gols. Nas 26 partidas disputadas no campeonato, foram 34 gols sofridos. Essa equação é insustentável.
Rodada após rodada a batalha que nos aflige é a proximidade com aquela-zona-que-você-sabe-qual-é. Não há um dia de sossego. Quando pensamos que o olhar se voltará para o alto, que poderemos sonhar com alguma conquista, por mais medíocre que seja, a realidade se impõe. Pode ser com os melhores do elenco em campo, pode ser na sua casa ou pode ser contra adversários de menor expressão. O Grêmio só tem a oferecer sofrimento. E assim será para todo e sempre, nesta temporada.
Criciúma 0x1 Grêmio Brasileiro – Heriberto Hülse, Criciúma/SC
Na braçadeira de capitão, uma das homenagens a Cacalo. Foto: Lucas Uebel/GrêmioFBPA
“Cacalo vivia o Grêmio como poucos viveram. O defendia com a gana de um Dinho, a disposição de um Kannemann e o sarcasmo de um Danrlei. Cacalo nunca foi Valdo, tampouco Gessy. Porque esses jogavam com diplomacia vestidos de Grêmio. Quando se tratava de Grêmio, Cacalo dispensava as diplomacias. A paixão era maior.”
Leonardo Oliveira, GZH
Aproveito-me do talento no texto e da proximidade que o jornalista Leonardo Oliveira, da GZH, tinha com Luiz Carlos Silveira Martins para homenagear um dos maiores dirigentes destes quase 121 anos de história do Grêmio. Cacalo morreu no sábado, aos 73 anos. Era o patrono do clube, título concedido a alguém que se satisfaria em ser apenas torcedor, porque era o maior deles.
Quando ascendeu na hierarquia gremista, eu já estava distante dos bastidores do time. Lembro dele de algumas conversas apaixonadas no pátio do Olímpico Monumental, exercendo a função que mais sabia fazer: torcer pelo Grêmio. Dos presidentes gremistas, conheci mais de perto Hélio Dourado e Fábio Koff, muito mais pelas mãos de meu pai do que por minhas competências. Admirava aquelas figuras pelo poder que tinham de construir o time do coração.
Assim como Dourado e Koff, Cacalo fez do Grêmio um campeão. Com presença ativa entre o fim da década de 1980 e ao longo dos anos de 1990, ele participou de grandes conquistas do clube, com destaque para a Libertadores de 1995, o Brasileiro de 1996 e as Copas do Brasil em 1994 e 1997. Foram 13 títulos no total. ‘Aposentado’ do papel de cartola, foi defender o Grêmio na imprensa, como colunista do jornal Diário Gaúcho e, depois, comentarista da rádio Gaúcha de Porto Alegre.
Era ‘sanguinário’, como bem disse o texto publicado pelo Grêmio ao anunciar a morte do ex-presidente. Era feliz em ser gremista, sentimento expresso na frase que ele imortalizou e estava estampada na braçadeira de capitão e na camisa do técnico e dos jogadores que entraram em campo, em Criciúma, nesta tarde: “Como é bom ser gremista.”
Por essas coincidências que a vida nos apronta, Cacalo morreu às vésperas de uma partida do Grêmio. Considerando que noutra vez em que esteve em coma por cinco dias, ao acordar, a primeira coisa que perguntou foi se o Grêmio havia vencido, desconfio que tenha sido dele o cuidado para que o velório se encerrasse uma hora antes de o jogo de hoje se iniciar. Cacalo tinha pressa, queria assistir ao Grêmio lá do alto e transmitir a energia necessária para o time se recuperar das duas eliminações recentes, na Libertadores e Copa do Brasil.
Na preleção que antecedeu a partida, o atual presidente do Grêmio, Alberto Guerra, falou aos jogadores sobre a importância de Cacalo na história do clube. Pediu a vitória em homenagem ao dirigente falecido. Em campo, o que se viu foi um Grêmio buscando o resultado desde o início, mesmo diante da pressão adversária e de desacertos na movimentação e troca de bola em algumas jogadas.
Com Cristaldo e Monsalve no meio de campo, o Grêmio se arriscou mais. No gol, Marchesín fez defesas importantes. No ataque, Soteldo aparecia com destaque. A vitória foi alcançada no segundo tempo, após as entradas de Arezo e Aravena. Foi o chileno quem fez a jogada pela esquerda e cruzou para Monsalve brigar com os zagueiros e o goleiro antes de desviar a bola às redes.
Foi só um a zero, mas não precisava mais do que isso para somarmos três pontos na tabela de classificação, nos afastarmos mais um pouco daquela-zona-que-você-sabe-qual-é, e começarmos a olhar para cima. Ao fim do primeiro tempo e no encerramento da partida, tanto Villasanti quanto Monsalve, aos serem entrevistados, fizeram questão de lembrar o nome de Cacalo. Dois jogadores que não tiveram proximidade com o dirigente, mas que entenderam o simbolismo dele para o clube.
Que Cacalo, lá em cima, siga nos iluminando para que nós, cá embaixo, sejamos fortes e capazes de manter o legado que ele nos deixou.
Roger observa o time em foto de Lucas Uebel/Grêmio FBPA
O caro e cada vez mais raro leitor desta Avalanche me conhece bem. Sabe o quanto torço, sofro e acredito, mesmo diante da descrença do futebol jogado. Sou daqueles que conservo a esperança de que em algum momento alguma coisa haverá de acontecer e mudará nosso destino. A bola que resvala no poste, vai voltar para o pé do goleador; a que desvia no zagueiro, seguirá a caminho do gol; a que chega na cabeça do atacante terá o destino das redes.
Verdade que diante dos acontecimentos do ano passado, temos motivos para desconfiar da nossa confiança. Mas aí vem um outro jogo e a crença se expressa mais uma vez. A bola começa a rolar e a gente tem a impressão de que o futebol vai desencantar. Até percebe que o passe não é mais o mesmo, a velocidade é menor e a intensidade prometida no discurso do vestiário desaparece no decurso do jogo. A despeito disso, nos entregamos à ilusão, do primeiro minuto ao apito final.
Apesar dos pesares, prefiro não depositar toda essa crença no desvario que sempre me moveu quando trato das coisas do tricolor. Se tenho a expectativa de que o dia da grande revelação está por vir é porque reconheço em Roger capacidade para tal. O treinador que tem comandado o time com a estratégia da tentativa e erro, levando a campo formação e posicionamento diferentes na busca de desempenhos melhores, terá de contar com a paciência do torcedor — quem ainda a tem?
Roger precisará de tempo para fazer com que os jogadores entendam o papel de cada um dentro do time. Mais tempo ainda porque tem o desafio de encaixar na sua forma de pensar os jogadores que herdou dos comandos técnicos anteriores. Que a paciência do treinador seja maior do que a do torcedor e os resultados – aqueles nos quais deposito minha esperança e desvario – comecem a aparecer o mais breve possível, antes que entremos em mais um caminho sem volta.