SPFW: Preconceito na passarela

Por Carlos Magno Gibrail

Recorte de O Estadão mostra Paulo Borges, criador da SPFW, e o filho

A questão racial foi bater na porta de Paulo Borges, personagem ilustre do setor de Moda, tão caro e importante para a Economia brasileira.

Criador e dirigente do SPFW, maior evento da Moda no país, adotou uma criança negra. Era a prova definitiva que não havia preconceito da direção do espetáculo.

A Folha, provavelmente quando publicou em janeiro do ano passado reportagem que originou inquérito do Ministério Público, desconhecia a adoção ou a desconsiderou. Como também não levou em conta que a Direção do SPFW não interfere na escolha das modelos.

O ponto de partida era que em 2008, apenas 8 modelos negros desfilaram contra 344 brancos, 2,3% .

Deborah Kelly Affonso, promotora do grupo de atuação especial de inclusão do Ministério Público e autora da proposição, talvez empolgada com o TAC (Termo de ajustamento de conduta) sobre anorexia e idade mínima de 2007, diz: “O percentual de modelos negros no evento [em torno de 3%] é bem menor que o de brancos. O objetivo da Promotoria é fazer um acordo de inclusão social. Estabelecer um número mínimo de modelos negros a desfilar”. Foi procurar Paulo Borges e resumiu: “Ele disse que não tem controle sobre quem vai desfilar”.

“Em 2007, por causa de problemas de modelos com anorexia, assinou um Termo de Ajustamento de Conduta (TAC) com a Promotoria da Saúde Pública e da Juventude se comprometendo a cumprir uma série de exigências, inclusive em relação à idade mínima das modelos [16]. Isso passou a figurar em uma espécie de “manual das grifes” da SPFW. Agora, ele [Borges] diz que não é possível consignar no manual a exigência da cota. No que é diferente das outras?” E, continua citando Paulo Borges : “Há algum tempo ouvi uma entrevista onde ele dizia: Moda não é arte. Moda é serviço, é dinheiro. É um negócio.’ Nesse ponto”, conclui ela, “a gente está de acordo”.

Da Saúde Pública e Juventude ao Preconceito sem discernimento não há equivalência. A não ser a quem negue a Moda como arte. Ou se confunda com questão de ordem de Borges. Arte, serviço, dinheiro, negócio não podem ser vítimas de preconceito. Nem que seja para atacar preconceito.

A estilista Glória Coelho é da opinião que “a cota pode interferir na obra do estilista”. “Nosso trabalho é arte, algo que tem de dar emoção para o nosso grupo, para as pessoas que se identificam com a gente”.

Alexandre Herchcovitch não se opõe. “Pra mim, isso (cota) não é problema. Nunca excluí modelo por causa de cor”. Ele não acha que a cota pode interferir na obra do estilista

O baiano Helder Dias Araújo, proprietário da HDA Models, agência paulista que trabalha exclusivamente com modelos negros. “Claro que existe [preconceito]. É mais social do que racial. Se fosse um Pelé, um Barack Obama, ninguém iria ignorar.”

Ainda assim, Hélder é contra a cota. “O Brasil tem é de tomar vergonha e ver que não é um lugar de raça pura”.

Anderson Santos modelo da HDA :“Nem nas provas de roupas os estilistas querem modelos negros. Eles são claros – não mandem negros. As modelos negras encontram uma abertura maior fora do país. No Brasil, o mercado publicitário é mais flexível que o da moda”. Segundo o último censo do IBGE (de 2007), 49,7 % da população brasileira é composta por negros e pardos. “Nosso país é miscigenado, uma mistura de diversas etnias e todas devem estar representadas. Por que os modelos negros não são convocados?”.

Pelo TAC assinado agora a direção do SPFW orientou as empresas participantes a procurar desfilar com 10% de modelos negras no prazo de 2 anos.

O resultado reflete que o sugerido foi atendido, pois 148 modelos negros desfilaram num total de 1149 modelos, dando um percentual de 12,8%.

A Educafro – Educação e Cidadania de Afro descendentes e Carentes – que realizou manifestação na SPFW deu os parabéns e o frei David falou : “A organização demonstrou sensibilidade com o povo afro-brasileiro”.

Resta posicionar e enfatizar que a Moda, quer arte ou negócio, não pode receber interferência de maiorias ou minorias. É uma atividade de mercado.

À Folha, à Promotoria e ao Frei: Por que não a isonomia? Se a preocupação é levar a proporcionalidade da amostra populacional brasileira para todas as atividades, mãos a obra. Começando pela Folha, pelo Ministério Público e pela Educafro, ou pela Igreja?

Carlos Magno Gibrail é doutor em marketing de moda, escreve às quartas no Blog do Mílton Jung e sempre defendeu a ideia de que o preconceito deve estar sempre fora de moda.