De eficácia e honestidade

 

Por Maria Lucia Solla

 

 

De mais eficaz farto-me, literalmente, na mídia falada, escrita e sussurrada. Só na arte não encontro a pérola, porque arte não precisa mentir.

 

Tudo começou quando eu estava fazendo arte. Olhos e mãos ocupados, ouvi a pérola: Está será a campanha mais eficaz que São Paulo já viu.

 

(Quando escrevi olhos e mãos ocupados, ali em cima, me dei conta de quanto são autoritários os governantes; têm certeza de tudo, mas miram mal quando tentam entender do que é que o povo precisa. Será que eu deveria ter dito: mãos e olhos ocupadas e ocupados, para andar na via do politicamente correto? Ótimo de qualquer maneira, porque não vou andar nessa via, e quero ver quem é que me arrasta. Continuo me comportando, em Roma como os romanos e na Língua Portuguesa de acordo com ela. Língua não se muda por decreto, que ela é livre. Só o povo pode com ela, usa e abusa dela, porque ela, como mulher de bandido, se deixa abusar.)

 

Então, voltando ao que dizia, meus olhos estavam focados no trabalho de mão, mas os ouvidos não. Se não é o silêncio, o escolhido da vez – que me faz sentir parte do mundo real lá de fora – é música ou tevê. Desta vez foi a tevê que me trouxe de bandeja a inspiração para este papo com você.

 

Comecei a prestar atenção, e foi uma avalanche. Fui atacada por dietas que se dizem mais eficazes, encontrei anúncios de Comunicação mais eficaz, li que a ONU quer ação mais eficaz, só não me lembro sobre o que falavam exatamente. O mais eficaz é que a toda hora sequestrava a minha atenção.

 

Até notícia esportiva dizendo que o Messi é o suplente mais eficaz da Liga, eu li. E a Língua Portuguesa sofrendo, gemendo, se contorcendo.

 

Agora, vamos combinar que eficiente é uma medida que faz a gente se aproximar da solução ideal, e que eficaz é a ação que nos leva ao clímax da projeção. Eficaz é o que nos leva ao ponto final. Não tem estação depois do ponto final, portanto meu amigo não existe mais eficaz assim como não existe mais honesto ou menos honesto. Ou o cidadão é honesto ou não é, e estamos conversados.

 

Ou melhor, não estamos, ainda não. Acredito que o povo precisa de arte, cinema, educação, livros, textos que lhe abram as asas da imaginação e que o impulsionem até onde não chega com as pernas do corpo. Acredito que o povo precisa de música, de poesia, de dança, natureza e alegria, para poder reconhecer seu valor e não se contentar com pouco, nem seguir modelo alheio, que povo mais criativo não há. Acredito que o povo precisa sempre querer saber mais, percebendo a cada tanto de aprendizado o quanto ainda tem para aprender. Acredito que nós, o povo, precisamos de mais tolerância e menos orgulho. Mais dúvida e menos certeza.

 

Agora sim, estamos conversados.

 

Obrigada por tua companhia e até a semana que vem.

 


Maria Lucia Solla é professora de idiomas, terapeuta, e realiza oficinas de Desenvolvimento do Pensamento Criativo e de Arte e Criação. Aos domingos escreve no Blog do Mílton Jung

Cidade bonita é cidade eficiente

 

Em entrevista ao Estadão, neste domingo, o prefeito Gilberto Kassab (DEM) anunciou que “a cidade vai ficar mais bonita de novo”. Falou em momento de virada, retomada de obras e investimentos com um discurso bastante otimista para quem sofreu forte desgaste em sua popularidade nos últimos meses e encerrou o período de verão com 18 mortes provocadas pelas enchentes, cinco vezes mais do que no ano anterior.

Kassab não levou em consideração esta tragédia que São Paulo encarou nos temporais, pois na entrevista ao jornalista Diego Zanchetta insistiu que, em 2009, fez a lição de casa e não endividou a capital.

Uma cidade não pode ser medida apenas pelo dinheiro que tem em caixa, mas pela maneira como as pessoas vivem e são respeitadas nela. O que aconteceu no verão paulistano não é coerente com o discurso do “fizemos o que tinha de ser feito”.

O prefeito me fez lembrar, também, do Projeto Belezura, criado na gestão da prefeita Marta Suplicy (2000-2004), que se resumiu a umas pinceladas no muro do Pacaembu e a palmeiras imperiais plantadas em avenidas. Desta vez, Kassab fala em asfalto nas ruas.

Mas São Paulo precisa mais do que isso. O trânsito tem de fluir, o transporte de passageiros tem de rodar em corredores exclusivos, as calçadas tem de ser decentes, a assistência social tem de existir, a infra-estrutura tem de ser ampliada e passar por manutenção, o serviço público tem de respeitar o cidadão e ser rápido no atendimento às suas demandas, as pessoas tem de ter acesso a ampla rede de saúde e educação, a fiscalização tem de estar atenta para impedir abusos a lei, entre outros aspectos que transformam de verdade o ambiente urbano.

A cidade de São Paulo não precisa ser mais bonita, tem de ser mais eficiente.