De profetas do passado

 

Por Maria Lucia Solla

 

Solla

 

Sou a favor da extinção dos profetas do passado. Nada violento, de extinção radical do tipo prisão perpétua ou cadeira-elétrica. Sou a favor da extinção deles, da minha vida; e se eu fosse você faria o mesmo.

 

O profeta do passado tem sempre razão. Não larga o osso nem por decreto. Ao menos tem sido assim desde que eu me reconheço como ser pensante. Aplausos para ele, que já está careca de velho, mas não larga o bastão. Encabeça a minha lista dos alijados.

 

Fala sério, você sabe do que eu estou falando, e aposto que tem ao menos dois na sua agenda de amigos.

 

Você cai na própria armadilha quando está triste, desanimado, derrotado e precisa desabafar. Parece que eles têm radar; estão sempre por perto e interessados pela novidade nefasta. Você se abre e está perdido, meu amigo! Se estava triste, depressivo, inconsolável por um evento qualquer, o profeta saboreia o que você disser, com senho franzido, olhar de desaprovação e um virar para a esquerda e direita da cabeça.

 

Você para de falar, enxuga as lágrimas, e ele cai em cima:

 

– Eu sabia que isso ia acontecer!

 

Isso quando não diz:

 

Eu tinha certeza de que isso ia acontecer!

 

E o hiperbólico:

 

– Eu tinha absoluta certeza de que isso ia acontecer!

 

Cai a cortina, porque você tem vontade de cortar os pulsos, de se atirar da Torre Eiffel, ou mergulhar num dos lixões da cidade. Ele acaba de estraçalhar a pessoa onde você mora, desde que aterrizou no planeta Terra, e de onde vem aprendendo tudo o que pode, na escalada da vida.

 

Na minha lista de extinção também estão os estraga-prazeres. Para qualquer ideia tua, vêm logo com:

 

– Imagina! Sem chance! Perda de tempo! A vida tá difícil. A crise tá pegando. O mercado tá recessivo, a bandidagem tá solta…

 

Eu mandaria os dois times, o dos profetas do passado e o dos estraga-prazeres, – não precisa tirar as crianças da sala porque você sabe que eu sou educada – para uma linda ilha deserta do Pacífico.

 

Teríamos que, eventualmente, mudar o nome do Oceano, mas isso seria bem mais fácil do que ter que lidar com eles.

 

Imagina o cruzamento das duas raças!?

 

Maria Lucia Solla é professora de idiomas, terapeuta, e realiza oficinas de Desenvolvimento do Pensamento Criativo e de Arte e Criação. Escreve no Blog do Mílton Jung

A extinção do Senado Federal

 

Por Antônio Augusto Mayer dos Santos

O Senado Federal deve ser extinto, em caráter definitivo e de forma irrevogável. Não imediatamente, porque seria um ato demasiado radical e até impossível (há necessidade de aprovação de uma emenda constitucional para esta situação), mas no encerramento dos mandatos dos parlamentares que serão eleitos em 2010 estaria mais do que razoável. Não porque no ano retrasado absolveu seu presidente numa sessão bizarra, hermética e sobre a qual, além de não existir registro documental, pairam suspeitas de todas as naturezas. Seria casuísmo confinar tema desta envergadura a episódios lembrados ou referidos apenas porque são recentes. Outras e diversas são as razões.

Em 2010 haverá eleição para o preenchimento de 54 vagas de Senador por Estado, cada uma destas vagas acompanhada por dois Suplentes. O ideal seria que um anticandidato se elegesse pregando justamente a extinção da Casa.

A Câmara Alta (denominação pomposa e fantasiosa utilizada pelos autores de Direito Público em suas obras) do Congresso Nacional brasileiro perdeu a sua essência legislativa.

O Senado é retórico, oneroso e simbólico, verdadeiramente anacrônico numa República de analfabetismo elevado, serviços públicos precários, estruturas ineficientes e remunerações públicas aviltantes, das mínimas às máximas. São milhares de funcionários (muitos dos quais competentes e eficientes) distribuídos numa estrutura gigantesca organizada sob um regimento interno parcialmente inconstitucional para atender apenas 81 pessoas.

Trata-se, portanto, de uma estrutura imperial num país republicano.

Sua burocratização é de tal forma eloqüente que diversos são os projetos deliberados pela Câmara dos Deputados ou formulados pelos próprios Senadores que estão emperrados ou claudicantes em Comissões e relatores.

A justificativa de que representa a Federação é uma concepção jurídica superada e tecnicamente inconvincente. Afinal, por conta de disposições constitucionais, os Estados são reféns da União em matéria de economia, política, direitos sociais, orçamento, poder de legislar, tarifas, etc. Em contrapartida, todos elegem bancadas de Deputados Federais. Portanto, a representação política de cada um estará preservada, inclusive porque a legislação eleitoral não distingue o ato de votar num deputado ou num senador.

Como no sistema bicameral vigente no país qualquer congressista legisla sobre qualquer matéria, freqüentemente diversas propostas similares, senão idênticas, tramitam simultaneamente na Câmara dos Deputados e no Senado Federal.

Esta duplicidade ocasiona a morosidade do processo legislativo, o que obviamente impede o aperfeiçoamento da legislação, seja ele qual for. Além disso, conforme pondera o jurista Paulo Queiróz, malgrado sejam eleitos pelo povo, o tratamento constitucional dispensado a Deputados e Senadores é duplamente desigual: primeiro, porque os membros do Senado têm mandato de oito anos, o dobro dos membros da Câmara; segundo, porque o voto de 81 Senadores vale tanto quanto o de 513 Deputados, estando o poder de decisão desigualmente distribuído.

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