O Cerimonial da Gentileza

Por Christian Müller Jung

Foto: Mauricio Tonetto / SecomRS

Não planejei a profissão que tenho hoje. Cheguei a ela pelos caminhos que a insatisfação abre quando percebemos que algo já não nos serve. Aproveitei o patrimônio biológico que carregava desde sempre: a voz. Fiz o curso de Locução, Apresentação e Animação, acrescentando uma nova formação ao diploma de Publicidade e Propaganda pela PUC-RS.

Enquanto procurava um espaço para exercitar essa nova habilidade,  surgiu a oportunidade de atuar como Mestre de Cerimônias do Governo do Rio Grande do Sul. Ali, entendi que a voz e o cerimonial tinham mais conexão com gentileza do que eu imaginava.

Chego, assim, ao tema central deste texto.

Fui instigado a falar sobre ele em um programa de televisão, no Dia Mundial da Gentileza. Recordei imediatamente a rotina do cerimonial, esse conjunto de formalidades que orienta os atos solenes e exige, antes de qualquer protocolo, lidar com seres humanos: autoridades, convidados, pessoas que entram no Palácio Piratini por razões muito distintas.

Lembro do meu amigo e ex-chefe do Cerimonail, Aristides Germani Filho, apresentando as primeiras instruções aos estagiários: “Aqui todo mundo é Senhor e Senhora.”

Era um resumo elegante do ofício de receber: tratar com atenção, preservar a delicadeza, reconhecer o espaço do outro. Em poucas palavras, ser gentil.

Com o tempo, percebi que gentileza funciona como um distintivo social. Ela aproxima da comunicação não violenta, afasta a arrogância e abre espaço para relações mais transparentes. Falar sobre o tema me fez revisitar atitudes que venho praticando nesses anos de trabalho no Palácio do Piratini: acolher quem chega, perceber angústias escondidas nos gestos, manter a relação institucional do Governo firme e respeitosa.

Falar em público também tem sua dose de gentileza. A forma como colocamos a voz revela estados de espírito. Uma articulação clara acolhe; um tom cansado distancia; a irritação fere. A voz, quando bem usada, é uma ponte — e pode ser uma ponte suave.

Gentileza com quem está acima de nós é bom senso. Com quem trabalha ao nosso lado, é cuidado para evitar ressentimentos que se acumulam em silêncio e viram sabotagens involuntárias. Na vida profissional, ela funciona como instrumento discreto e decisivo.

E há um ponto essencial: escutar. Em uma época em que todos falam com absoluta convicção, a escuta virou raridade. Quem escuta exerce gentileza, mesmo quando discorda. A escuta é o gesto mais simples e, ao mesmo tempo, o mais exigente.

Antes de tudo, precisamos ser gentis conosco. Conhecer limites, saber dizer não, recusar a ideia de que ser gentil é agradar a qualquer custo. Gentileza não é submissão. Também não é manipulação. É autoconhecimento e respeito ao espaço do outro.

Ao longo da vida, encontramos pessoas que já nos conhecem e reconhecem nossas intenções. Mas grande parte dos encontros acontece com quem nada sabe sobre nós. E é nesses encontros que a gentileza se torna cartão de visita.

Alguns estudos mostram que pessoas que cultivam a gentileza relatam níveis menores de estresse e até pressão arterial mais baixa. Há pesquisas que relacionam essa prática à ocitocina: o hormônio produzido no hipotálamo, associado ao vínculo e à empatia. É a lógica da velha metáfora:

“Quando acendo a minha vela apagada na tua vela acesa, ninguém perde; todos ganham luz.”

Gentileza é exercício diário, daqueles que amadurecem com o tempo. E, justamente por ser prática contínua, encontra pela frente muita dureza, quase sempre fruto de ignorância, que não escolhe classe social, nível de escolaridade ou aparência.

Platão escreveu que precisamos de graça e gentileza por toda a vida. Concordo.

E se você chegou até aqui, agradeço pela gentileza da leitura!

Christian Müller Jung é publicitário de formação e mestre de cerimônia por profissão. Colabora com o blog do Mílton Jung (de quem é irmão).

Tudo é muito coisa

Por Simone Domingues

@simonedominguespsicologa

Reprodução do filme

“Eu sou aquela mulher
a quem o tempo muito ensinou.
Ensinou a amar a vida
e não desistir da luta,
recomeçar na derrota,
renunciar a palavras
e pensamentos negativos.
Acreditar nos valores humanos
e ser otimista”

Cora Coralina

O filme francês O fabuloso destino de Amélie Poulain (2001) conta a história de uma jovem sonhadora que dedica a vida a consertar pequenas dores de outras pessoas: devolve um brinquedo esquecido, junta casais ou espalha bilhetes anônimos para fazer alguém sorrir. Ela faz tanto pelos outros que, por um bom tempo, esquece de si mesma, deixando sua vida cheia de histórias alheias, mas vazia do próprio cuidado.

Assim como Amélie, muita gente acredita que precisa ser útil, boa e generosa ao extremo para garantir que será aceita, valorizada ou pertencente.

Evidentemente, esse não é um padrão que alguém escolhe ter de maneira consciente.

Em geral, a ideia de que ser amado está associado a ser útil nasce de experiências antigas, de situações nas quais a criança, cedo demais, entendeu que precisava fazer além do que podia para receber amor, atenção ou segurança.

Às vezes é o filho mais velho que, ainda pequeno, assume o cuidado de irmãos menores enquanto os pais trabalham, e aprende, sem se dar conta, que precisa ser “responsável” para ser elogiado ou notado; ou a criança que nota que os pais estão sobrecarregados, doentes ou emocionalmente ausentes, e então tenta não dar trabalho, engole a própria dor, faz tudo para ajudar em casa, acreditando que isso evita brigas e mantém a família unida. Em outros casos, é a criança que recebe afeto apenas quando tira boas notas, faz tudo “certinho”, ajuda em tudo e percebe que não há espaço para ser apenas criança, com erros e limites.

Assim, muito cedo, a mensagem se instala: “Eu só sou amado quando faço algo por alguém”.

E o que era apenas uma forma de sobreviver emocionalmente vira, na vida adulta, um padrão invisível, difícil de perceber, mas que faz a pessoa se doar além da conta, enquanto carrega, lá no fundo, a sensação de nunca ser suficiente.

Ser generoso, amoroso ou disponível não é um defeito. É algo valioso! O risco está em oferecer tudo sem critério. E quem já me conhece sabe que sempre digo: tudo é muita coisa!

Porque quando se faz demais, corre-se o risco de atrair quem só fica enquanto se beneficia. O resultado?  O que era afeto disponível vira recurso de utilidade.

Talvez dentro de você exista uma Amélie: doce, cuidadosa, disposta a juntar pedaços do mundo dos outros. Que bom! Mas, hoje, faça o compromisso de cuidar também do seu próprio mundo, de cuidar de você.

Quero lhe propor um desafio: Pense em alguém importante na sua vida e se pergunte: “Essa pessoa me procuraria se ela não precisasse de nada?”


Se a resposta for não, talvez seja hora de rever esse laço, não com amargura, mas com a leveza de quem entende que vínculos verdadeiros não funcionam como caixas eletrônicos, onde alguém passa, retira o que quer e vai embora. Relações autênticas são presenças vivas em vias de mão dupla.

Penso que o tempo nos ensina… Nos ensina a amar, a não desistir, a recomeçar, a acreditar nos valores humanos e ser otimista!

Há sempre um jeito de seguir sendo generoso, sem se sacrificar, mas com respeito, equilíbrio e limites.

Afinal, afeto saudável não se mede pelo quanto você faz pelos outros, mas pelo quanto você consegue permanecer inteiro depois de se doar.

Simone Domingues é psicóloga especialista em neuropsicologia, tem pós-doutorado em neurociências pela Universidade de Lille/França, é uma das fundadoras do canal @dezporcentomais, no YouTube. Escreveu este artigo a convite do Blog do Mílton Jung. 

Podcast: de sutilezas

 

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A conversa foi pré-Pandemia. E foi generosa. Recebi Paula Caubianco sem ter ideia até onde iria o nosso papo. Que assunto a interessava. E o que dizer sobre esses assuntos. O resultado está no MOMENTOCAST, que foi assim apresentado pela Paula a quem tive o prazer de conhecer:

Só de lembrar o dia que gravei esse episódio eu já fico emocionada… agitada. Eu fui muito ousada! Era manhã do dia foi 20 de fevereiro de 2020, quando eu saí da Mooca ( bairro na zona leste – onde eu moro) seguindo em direção à Marginal Pinheiros: eu tinha um grande encontro!… já era costume ouvir a rádio CBN no carro … mas aquele dia guardava um motivo especial. Eu fui ouvindo o Milton Jung, a Cássia Godoy e até o Dan Stubach noticiarem, com grande pesar, a morte ocorrida no dia anterior, do genial José Mojica Marins, conhecido como Zé do Caixão… o pai do terror brasileiro. Ele partiu aos 83 anos de idade… que perda irreparável…

 

Eu estava super ansiosa, mas ouvir as homenagens contando a trajetória e o estilo próprio do Zé do Caixão… foi me trazendo um alento… a sua irreverência me deu um ânimo extra: de certa forma, ele me dizia… Paula é preciso ter coragem para se conquistar o que se quer… vá e faça. Depois de 50 minutos lá estava eu… no saguão daquele edifício moderno… pegando minha credencial para subir até o andar da CBN… eu tinha uma hora marcada com o Milton Jung – e ele já me aguardava.

 

A maior satisfação que tenho em conceber e produzir o MOMENTOCAST é poder conversar sobre sutilezas com pessoas que admiro, respeito, e que sinto, que de alguma forma estão dispostas a compartilhar algum conteúdo de valor.

 

Convidei o Milton com minha cara e coragem, e recebi um saudoso sim! Nesse dia, minha palavra era ousadia. E a do Milton, sem dúvida alguma, generosidade! Espero que você goste desse episódio, nele eu compartilho com você o que ouvi e aprendi com esse grande ser humano que é o Milton Jung… e você, qual é a tua palavra?

 

Me conta sua experiência com o momentocast enviando um audio pelo link disponível no descritivo desse episódio. Assine o momentocast gratuitamente pelo seu spotify, deezer, apple podcasts, google podcasts e nos principais agregadores de áudio. Ou se preferir acesse anchor.fm/momentocast. Depois compartilhe esse episódio com seus amigos e familiAres, quanto mais gente escutar… melhor.

 

Interaja com o MOMENTOCAST nas redes sociais utilizando a hashtag #momentocasters e vamos acompanhar que palavras andam te definindo nesses tempos. Quando eu agradeci o MIlton por toda a generosidade em aceitar meu convite e me receber mesmo sem me conhecer… ele me disse: eu sei exatamente o que é estar no seu lugar… não se preocupe, só faça sempre um bom trabalho. E assim… eu venho seguindo… Obrigada por seu tempo, e até.


Ouça outros episódios e coloque o MOMENTOCAST entre os seus favoritos

Como é a sua mesa de trabalho?

Notícias importantes, cadernos de jornal, anotações feitas durante o programa, recados do produtor, Ipad e celular se confundem sobre a mesa do estúdio onde apresento o Jornal da CBN. Além de ser uma contradição à organização que mantenho no meu espaço de trabalho no escritório de casa, também se transforma em uma incógnita diante da pesquisa apresentada pelo Gilberto Dimenstein, no quadro Capital Humano. Conforme estudo publicados na revista Psychological Science deescobriu-se que estar cercado por desordem pode promover o pensamento e estimular novas ideias. Em contraste, trabalhar em uma mesa limpa pode promover a alimentação saudável e a generosidade. O estudo foi conduzido pelo psicólogo Katleen Vohs e os colegas dele da Universidade de Minnesota, Minneapolis, nos Estados Unidos. De uma maneira geral, os participantes expostos a uma quarto bagunçado geraram o mesmo número de ideias para novos usos como os que estiveram em uma sala limpa, mas as ideias deles foram classificadas como mais interessante e criativas. Em compensação, a turma da sala organizada doou mais do seu próprio dinheiro para a caridade. Os cientistas querem transferir o estudo para a internet, pois os resultados preliminares sugerem que a arrumação de uma página web prevê o mesmo tipo de comportamento.

Certa ou não, falar da pesquisa no jornal e publicar a foto da minha mesa na CBN no Twitter provocou uma série de participação de ouvintes-internautas que compartilharam as imagens de seus locais de trabalho – inclusive no helicóptero. Os bagunceiros, comemoraram, pois agora têm uma boa desculpa. Os arrumadinhos se defenderam dizendo que foram criativos ao cuidar de suas mesas ou que ao limpar a área, abrem espaço para a criatividade. Como fiquei no meio do caminho, vou considerar que sou criativo na rádio e generoso em casa. Cada um na sua. E curta as fotos.