Sua Marca Vai Ser Um Sucesso: além das telas?

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“A lição vale para marcas e para nós, pais e avós, que tenhamos equilíbrio para combinar o on e o offline, as brincadeiras de roda e as atividades na tela”. 

Cecília Russo

As marcas podem ajudar a afastar as crianças das telas? Considerando o que já conversamos, em comentários anteriores, sobre o papel social e pedagógico que as empresas exercem, assumir essa responsabilidade e promover um equilíbrio saudável entre o digital e o físico faz todo sentido. Esse foi o tema do Sua Marca Vai Ser Um Sucesso que foi ao ar no Dia das Crianças. No comentário, Jaime Troiano e Cecília Russo exploram como algumas marcas têm se destacado ao incentivar brincadeiras que fogem ao domínio das telas.

Cecília Russo destaca o exemplo de Omo, que, por meio da campanha “Se sujar faz bem”, promove o brincar ao ar livre e longe dos dispositivos. “Podem dizer que isso é pregar em causa própria”, comenta Cecília, “mas é uma pregação que faz um bom serviço à sociedade”. A marca, segundo ela, oferece sugestões de atividades fora das telas, incentivando pais e filhos a valorizarem o tempo juntos em atividades físicas e criativas.

Jaime Troiano, por sua vez, expressa preocupação com o uso excessivo das telas pelas crianças, mas pondera que o digital, quando usado com equilíbrio, pode coexistir com experiências tradicionais. Ele cita a Lego como um exemplo de marca que soube equilibrar o mundo físico e o digital. “Até a marca Lego, diga-se de passagem, admirável, se reinventou com base no digital, transportando seus bloquinhos também para outra esfera. Por sorte, ela manteve os pés nos dois lugares”, afirma Jaime.

A marca do Sua Marca

O comentário de Jaime Troiano e Cecília Russo destaca o compromisso social que as marcas devem ter com suas audiências, principalmente com as crianças. A mensagem principal do quadro é que o equilíbrio entre as telas e as brincadeiras ao ar livre é essencial, tanto para os pais quanto para as empresas que dialogam com esse público. Manter essa dualidade — entre o digital e o físico — pode ser a chave para conquistar e, ao mesmo tempo, proteger as futuras gerações.

Ouça o Sua Marca Vai Ser Um Sucesso

O Sua Marca Vai Ser Um Sucesso vai ao ar aos sábados, logo após às 7h50 da manhã, no Jornal da CBN. A apresentação é de Jaime Troiano e Cecília Russo.

Licença-paternidade é mecanismo de igualdade de gênero

Por Caroline Burle, Mariana Chaimovich e Thaís Zappelini

Ilustração criada pelo Dall-E

Apesar dos crescentes esforços em favor da igualdade de gênero, a disparidade salarial entre homens e mulheres ainda é uma incômoda realidade. Na classificação do Fórum Econômico Mundial, no relatório “Desigualdade de gênero de 2023”, o Brasil ocupa a 57ª posição dentre os países pesquisados, com um score de 0,726 — atrás de vizinhos como Bolívia, Suriname, Colômbia, Argentina e Peru. O ranking vai de 0 a 1: quanto mais perto de 1, mais próximo o país está da igualdade de gênero.

Esse contexto muitas vezes é agravado pelo nascimento dos filhos. Depois de se tornarem mães, as mulheres têm seus salários e participação no mercado de trabalho reduzidos. Os impactos da maternidade continuam a reverberar depois do nascimento da criança, de maneira que, mesmo após 10 anos, os salários das mães não retornam ao patamar pré-nascimento (GONÇALVEZ; PETTERINI. 2023).

A problemática do trabalho de cuidado feminino ainda é um grande desafio para a permanência das mulheres no mercado de trabalho, e tem consequências em suas escolhas de carreira, pessoais e financeiras. Segundo o IBGE (2023), a diferença de remuneração entre homens e mulheres voltou a subir no país e atingiu 22% no fim de 2022. As mulheres brasileiras recebem, em média, 78% do que ganham os homens.

Além disso, há o fenômeno teto de vidro nas organizações brasileiras: as mulheres até conseguem se colocar no mercado de trabalho, mas não ascendem para cargos de comando das empresas. Exemplo disso são os dados apresentados pelo levantamento “Panorama Mulheres 2023”, realizado pelo Talenses Group em parceria com o Insper, mostrando que as mulheres representam somente 17% dos CEOs do país.

Diversos fatores interconectados dificultam uma mudança. Muitas organizações têm estruturas culturais e sistemas de liderança historicamente dominados por homens, o que pode resultar em preconceitos inconscientes ou explícitos contra mulheres. Esses vieses influenciam promoções e seleções para cargos de alto escalão. As mulheres frequentemente enfrentam desigualdades de oportunidades ao longo de suas carreiras, incluindo menor acesso a mentorias, networking, assim como a treinamento de liderança.

Para abordar o fenômeno do teto de vidro de forma eficaz é necessário um esforço conjunto de organizações, governos e sociedade. Isso inclui a implementação de políticas de igualdade de gênero, programas de desenvolvimento de liderança para mulheres, mudanças culturais nas empresas, bem como o reconhecimento e combate às desigualdades econômicas e raciais que podem agravar essa questão. Diversidade e inclusão devem ser prioridades para impulsionar o sucesso das organizações em um mundo cada vez mais global e diversificado.

Pesquisa da Fundação Getulio Vargas (FGV, 2016) verificou que, após 24 meses do retorno da licença-maternidade, 50% das mulheres simplesmente saem do mercado de trabalho. A maior parte das demissões ocorre sem justa causa e por iniciativa do empregador. Estudos mais recentes seguem apontando índices alarmantes: levantamento mostra que 56% das profissionais entrevistadas já foram desligadas ou conhecem outra mulher que foi demitida após a licença-maternidade (Empregos.com, 2023).

As gestantes e as mães, sobretudo com filhos pequenos, invariavelmente sofrem com recusa de promoções, perda de oportunidades de carreira e até mesmo demissões injustas. Isso é, muitas vezes, resultado de equivocados estereótipos de que mães não são comprometidas com suas funções. Para promover uma percepção mais inclusiva da maternidade no mercado de trabalho, é crucial que haja ações e iniciativas por parte do poder público e do terceiro setor, além de mudanças nas empresas.

Algumas ações já estão sendo feitas, como a transformação paulatina da cultura corporativa. Isso envolve educação e sensibilização sobre a discriminação de gênero e maternidade no local de trabalho. Campanhas de conscientização podem ajudar a combater estereótipos. A flexibilidade no trabalho, também. Outra ação importante são os programas de desenvolvimento profissional de liderança e mentorias específicos para mulheres que são mães.

Além disso, é necessário tratar da “economia do cuidado” de forma mais ampla, com maior compartilhamento de direitos e deveres entre homens e mulheres. Regulamentar a licença-paternidade de forma obrigatória e remunerada, e equipará-la à licença-maternidade, é essencial para garantir o direito das crianças de terem pais presentes e participativos desde o início das suas vidas, assim como trazer inúmeros benefícios à sociedade.

A Constituição prevê a licença-paternidade em seu art. 7º, XIX, mas reservou sua regulamentação à lei ordinária. O que tem permanecido em nosso contexto é o prazo de somente cinco dias para o gozo da licença, estipulado pela CLT e Art. 10, § 1º, do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias. Sem uma licença parental para que homens e mulheres possam cuidar dos filhos, será muito difícil mudar o cenário atual.

O mesmo texto constitucional que estabeleceu provisoriamente cinco dias para a licença-paternidade determinou, de maneira definitiva, o prazo de 120 dias para a licença a ser usufruída pelas mães. Este prazo é 24 vezes superior ao estabelecido para a licença-paternidade. Não há dúvidas das necessidades fisiológicas e psicológicas de mães, que precisam estar ao lado de seus filhos recém-nascidos durante esse período. No entanto, a criação de vínculos afetivos com os pais nos primeiros meses de vida da criança impacta seu desenvolvimento cognitivo e emocional, além de estar relacionada ao bem-estar da família como um todo.

A transformação cultural de compartilhamento da responsabilidade do cuidado entre homens e mulheres, assim como a redução da descriminação feminina no trabalho, será proporcional à redução da diferença entre a duração das licenças parentais. Um modelo progressivo de aumento da duração da licença pode ser importante para promover, com sucesso, a adaptação necessária dos impactos no orçamento assim como a transformação cultural.

Quando se fala de paternidade ativa, se discute que uma licença-paternidade é imprescindível para dar essa oportunidade aos homens, pois a maioria deles quer participar de forma mais efetiva da rotina familiar, não só sendo provedor. Além disso, a licença-paternidade é necessária para atingir-se a equidade de gênero. Trata-se, portanto, de um conjunto de iniciativas que precisam ser conectadas para expandir, de forma positiva, essas políticas públicas e mudanças legislativas que precisam avançar no Brasil.

Caroline Burle é executiva com mais de 15 anos de experiência, especialista em governança multissetorial e advocacy. Ela mantém um compromisso com iniciativas de Diversidade, Equidade e Inclusão. Possui mestrado em Governo Aberto pela UNESP.É co-fundadora da ONG LiBertha.org.

Mariana Chaimovich é advogada, legal advisor no ITCN (Instituto de Estudos Estratégicos de Tecnologia e Ciclo de Numerário), Doutora pelo Instituto de Relações Internacionais da USP e Mestra em Direito Internacional pela mesma instituição.

Thaís Duarte Zappelini é advogada, consultora de Relações Governamentais no ITCN (Instituto de Estudos Estratégicos de Tecnologia e Ciclo de Numerário), pós-doutoranda no Lemann Center for Brazilian Studies (University of Illinois, Urbana-Champaign), Doutora e Mestra em Direito Político e Econômico pela Universidade Presbiteriana Mackenzie (UPM).

Mundo Corporativo: Fabíola Meira, advogada, fala da transição de carreira para profissionais liberais

Foto divulgação

“Não dá para ter medo, porque o medo tem dois lados: dá aquela aquela sensação gostosa, ao mesmo tempo que te trava. Não dá para ter medo, mas você precisa saber onde você tá pisando. Não dá para ir de olhos fechados”. 

Fabiola Meira, advogada

A secretária falta, o funcionário se atrasa, os boletos do escritório não param de chegar, o aluguel aumenta e os clientes sempre querem mais e mais. É o que você ganha quando decide ser protagonista do seu próprio negócio em lugar de seguir prestando serviço a outras empresas e empregadores. 

Foi esse o desafio que a advogada Fabíola Meira decidiu encarar em um dos momentos mais sensíveis para uma mulher: o nascimento do primeiro filho. Desconfia que o puerpério — esse estágio na vida de todas as mães, no qual enfrentam transformações hormonais, físicas e emocionais  — tenha influenciado na decisão de deixar um emprego seguro para tocar o próprio escritório de advocacia. Uma desconfiança que se expressa em tom de brincadeira porque Fabíola sabe que tinha outros ótimos argumentos para deixar o escritório em que trabalhava há 15 anos:

“Eu queria alguma coisa bem especializada para os clientes. Que eles sentissem que estavam sendo acolhidos, cuidados, com alguma coisa muito específica”.

Diante disso, vem a primeira lição para profissionais liberais que pretendam seguir carreira própria. Fabíola conversou com muita gente do mercado em que atua, fez várias reuniões com escritórios de advocacia e elencou argumentos antes de tomar sua decisão. O segundo passo foi entender se seria seguida por sua equipe no escritório em que já atuava e por seus clientes —- já que tinha uma carteira bastante robusta na área de direito do consumidor, que foi na qual se especializou. Não dá para começar do zero.

A terceira lição que se tira da experiência da Fabíola é que, mesmo não sendo a “dona” desenvolveu uma visão empreendedora — especialmente, quando sugeriu que a área dela fosse administrada de forma independente no escritório que atuava no modelo “full service”, ou seja, prestava serviços jurídicos com a oferta de especializações nas diversas áreas do direito. 

Nossa entrevistada no programa Mundo Corporativo também contou com uma ajuda extra e importante em momentos decisivos de nossas carreiras: o da família. Seja pela experiência que o pai tinha em escritório próprio seja no impulso que o marido dela ofereceu, incentivando-a a abrir o seu. Fabíola que, na frase que abre este texto, pede para não se ter medo, confessa que teve. E para superá-lo, pesou dores e prazeres:

“Apesar das preocupações, tem um lado gostoso de você ver que as coisas estão acontecendo da sua forma, que você está crescendo, que você está desenvolvendo outras pessoas na carreira, que tem um toque seu nas coisas. Tem as dores, mas também tem um lado muito positivo”.

Acho que você, caro e raro leitor deste blog, já percebeu que a Fabíola tomou a decisão de ser “dona do seu próprio nariz” ao mesmo tempo em que teve o primeiro filho. O que não contei ainda para você é que este filho nasce depois dela ter completado 40 anos —- uma decisão que muitas mulheres têm adotado ou pensam em adotar atualmente, com a intenção de, antes de ser mãe, garantir estabilidade profissional e financeira. 

Assim como nos ensina sobre como se transformar em uma profissional liberal e abrir negócio próprio, Fabíola também usa nossa conversa para orientar outras mulheres que queiram aproveitar a maternidade com maturidade: congelem seus óvulos. Um alerta que só foi ouvir — e de amigas — quando estava com 38 ou 39 anos, motivo que lhe causou angústia. Entende que é preciso falar desse tema, porque muitas mães têm filhos aos 44 ou 45 anos e não contam que o tiveram a partir da fertilização in vitro e não em uma fecundação natural:

“Eu não tenho vergonha nenhuma de dizer isso, até porque eu acho que isso a gente precisa falar para outras mulheres. É um assunto que muitas mulheres escondem e isso acaba atrapalhando. Tenho amigas que engravidaram naturalmente depois dos 40 anos. Mas não é a regra”.

Assista à entrevista completa com a advogada Fabíola Meira na qual conta, também, sobre as mudanças que as empresas tiveram de fazer para atender as demandas do consumidor diante da pandemia do coronavírus.

O Mundo Corporativo tem as colaborações de Renato Barcellos, Bruno Teixeira, Rafael Furugen e Priscila Gubiotti.

Carta aberta para minhas filhas

Simone Domingues

@simonedominguespsicologa

Foto de Anthony no Pexels

Queridas filhas,

Onde foi que eu errei?

Antes que vocês respondam a essa pergunta, permitam-me expor o meu ponto de vista.

Ainda durante a gestação, tive que decidir sobre o tipo de parto que eu teria, com base numa enxurrada de informações que indicavam o que seria melhor para o bebê. Li artigos, conversei com médicos e com outras mulheres e, quando decidi que faria o parto natural, fui parabenizada por muitos. Seguia firme no meu propósito, afinal, de algum jeito, vocês teriam que sair da minha barriga.

Fui surpreendida pela ausência de dilatação e, após 14 horas de parto e com 42 semanas de gestação, evoluí para uma cesárea. Pelo menos eu havia tentado…

No fundo, não estava triste ou frustrada, mas suspirava aliviada após uma cesariana sem intercorrências, por não ter passado pela dor do parto sem anestesia. Não tive partos normais pela ausência de dilatação. Confrontada pela ausência de coragem, essa explicação me trazia conforto.

Nas primeiras semanas de amamentação, uma dificuldade tornou quase inviável o aleitamento materno. Eu não conseguia sequer imaginar a introdução da mamadeira… Exceto quando a dor parecia insuportável e eu pensava como a mamadeira poderia resolver o meu problema.

Bom mesmo era quando me elogiavam pela refeição saudável que eu oferecia para vocês. Mal sabiam que eu tinha saído voando de uma reunião no trabalho, passado na feira orgânica e, quase sem fôlego, chegado atrasada para buscá-las na saída da escola. Afinal, crianças precisam de pratos coloridos e saudáveis e eu não seria uma mãe preguiçosa, como aquelas que dão comidas prontas para os filhos!

Diante desses elogios eu engolia a seco, sabendo das vezes que tinha feito macarrão instantâneo. Falta de tempo ou preguiça mesmo.

Melhor ainda era chegar na escola e receber um feedback positivo das professoras e coordenadoras, dizendo que se todas as mães fossem como eu, as crianças seriam obedientes e responsáveis. Isso me validava para não permitir faltas, enrolação para fazer o dever de casa ou broncas quando vocês atrasavam – porque eu me atrasaria para minhas obrigações profissionais e sabia que responsabilidade é coisa para adultos.

E tinha muito mais.

Quando vocês se sentavam na bancada da cozinha, pequenininhas, a gente se divertia fazendo bolo, contando os ovos ou dizendo as cores dos ingredientes. Tinha o domingo na praia, os inúmeros (e minúsculos sapatinhos) das bonecas, os abraços apertados, os brigadeiros enrolados para as festas de aniversário, numa construção de memórias afetivas que nos enchem de saudade.

Mas se eu não fosse dura, não cuidasse da alimentação, do sono, dos riscos, dos desafios… O que seria de vocês?

Pois é, minhas filhas, aí talvez esteja o maior erro: eu acreditava que dependia excessivamente das minhas ações para que a vida de vocês fosse isso ou aquilo.

Eu acreditava que se fosse perfeita, não por um capricho, mas por uma preocupação enorme, vocês teriam vidas plenas e felizes.

Nessa busca pela perfeição, aceitei, assim como a maioria de nós mulheres, cobranças excessivas, sugestões indevidas, de uma sociedade que ainda dita regras de como nós devemos agir, numa atribuição de culpa pela falibilidade das mães.

Na ausência de perfeição em mim, em alguns momentos, talvez eu a tenha delegado para vocês, desejando que correspondessem às minhas expectativas e assim me ajudassem a diminuir o sentimento de ter falhado ao prestar contas à sociedade.

Para a minha sorte, vocês não atenderam ao meu desejo e questionaram esse sistema perverso e opressor.

Com a ajuda de vocês, descobri que não depende de mim. Podemos nos apoiar mutuamente, nos encorajar, viver plenamente, ainda que a vida seja isso, aquilo ou além.

Para encerrar, não precisam responder à pergunta inicial, ela ficou sem sentido… 

Mas não esqueçam de pegar o guarda-chuva e um casaco porque a frente fria está chegando… Eu sei, eu sei… Mãe é assim mesmo!

Vale então, queridas filhas, um último conselho?

Sejam vocês! É isso o que eu mais posso desejar.

Assista ao programa Dez Por Cento Mais, todas às quartas-feiras, 20h, no YouTube

Simone Domingues é psicóloga especialista em neuropsicologia, tem pós-doutorado em neurociências pela Universidade de Lille/França, é uma das autoras do canal @dezporcentomais, no YouTube. Escreveu este artigo a convite, no Blog do Mílton Jung. 

Mundo Corporativo: filhos são uma potência na vida profissional, defende Michelle Terni, da Filhos no Currículo

 

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Família é família, trabalho é trabalho. 

Não dá pra misturar. 

Cada coisa no seu devido lugar. 

Se tem “verdades corporativas” que foram desconstruídas nesta pandemia, com certeza essas que estão no topo deste texto entram com destaque na lista. Por anos, empresas, seus chefes e, também, funcionários acreditaram na ideia de que da catraca pra dentro, casamentos, filhos e famílias deveriam ser esquecidos – no máximo deveriam ser motivo de conversa na sala do cafezinho. Com os escritórios fechados, o trabalho invadiu o espaço da família e a convivência se fez necessária. Percebeu-se que apesar das diversas dimensões e realidades que vivemos, em todas essas circunstâncias somos apenas um, e a jornada diária precisa se organizar dentro dessa perspectiva.

“Não é ou filhos ou carreira. É filhos e carreira”. 

É o que defende Michelle Levy Terni, publicitária, formada em comunicação e com especialidade em equidade de gênero, que fundou, ao lado de Camila Antunes, pedagoga e advogada, a consultoria Filhos no Currículo. As duas se conheceram pelo Instagram, e se identificaram por serem mães de dois filhos. Após sentirem as dores que a maternidade gera no ambiente de trabalho, se encontraram em um projeto que acredita na possibilidade da construção de uma relação de vínculo e presença com os filhos sem a desconstrução da carreira. Além de investirem no desenvolvimento pessoal de pais e mães, provocam as empresas a repensarem as suas relações de trabalho e a eliminarem os vieses que limitam o crescimento de seus profissionais:

“Foi muito por nossa experiência pessoal que nasceu esse insight de compartilhar toda a nossa dor com o mercado de trabalho e ressignificar filhos como potência na vida profissional de pais e mães”.

Em entrevista ao Mundo Corporativo, que está completando 20 anos, Michelle explicou como o tema da parentalidade tem avançado nesses últimos tempos. Especialmente no caso das mulheres, ter filhos era visto como um custo a ser pago no crescimento na carreira – lamentavelmente ainda existem pessoas que enxergam dessa maneira. No entanto, hoje, já está bem mais clara a ideia de que ter filhos agrega no currículo profissional. Pesquisa realizada com o Movimento Mulher 360 mostrou que 98% dos pais entrevistados entendem que ter filhos os fez criar alguma habilidade, tais coo empatia, resiliência e liderança. 

“A gente muitas vezes é admitido por hard skills (habilidades técnicas) e demitido por soft skills (habilidades emocionais). E esses soft skills transbordam em quem tem filho”.

Michelle Terni, Filhos no Currículo

Ao longo da própria pandemia houve mudanças de olhar em relação a algumas questões. Se no início. o debate era como se adaptar ao trabalho em casa, ao lado dos filhos e da família, hoje, quando o retorno ao escritório ocorre de forma total ou parcial, a preocupação é como trabalhar distante dos filhos: 

“Essa é uma situação que trouxe para pais e mães uma herança de vínculo, de presença com os filhos. O que ouço de relatos nas consultorias com os clientes é essa alegria que surgiu pela possibilidade de conviver tão de perto (com os filhos). Voltar agora é quase uma impossibilidade. Eu percebo muito essa vontade de um equilíbrio”

Em consulta feita com mulheres, a Fihos no Currículo descobriu que 95% daquelas que são mães acreditam que o ‘home office’ veio para ficar, e 75% se identificam com o trabalho híbrido. Quanto às empresas, boa parte ainda avalia como serão os próximos anos, depois da experiência que a pandemia proporcionou. Michelle diz que, independentemente do que pensem em fazer, todas as organizações têm de ter consciência de que alguma coisa mudou e para trazerem os colaboradores para o presencial precisarão dar ao ambiente de trabalho uma missão, uma importância muito clara: 

“Esse lugar físico vai ser muito mais um lugar de colaboração, um lugar de experiência, de troca, do que necessariamente de sentar e trabalhar”.

Os líderes precisarão estar sintonizados com esse momento e desejo de seus colaboradores sob o risco de perderem talentos. A discussão sobre o retorno aos escritórios, o trabalho híbrido ou o ‘home office’ tem de ser colaborativa, ouvindo as prioridades e necessidades dos profissionais. A esses caberá também uma readaptação, abrindo diálogo com as crianças, porque pais e mães talvez não estejam mais 100% do tempo ao lado dos filhos. 

Outra realidade que ficou escancarada dentro do núcleo familiar – e a oportunidade de mudarmos isso é agora – é a percepção de como a economia do cuidado gera um sobrepeso nas mães. O cuidar da criança, preparar a lancheira e levar na escola são tarefas mais evidentes. Para realizar essas atividades, porém, existem várias outras que costumavam não entrar nesse cálculo: por exemplo, a compra de material, produtos e alimentos, que tomam tempo e geram desgaste de energia. Conversas difíceis tiveram de ser travadas dentro de casa que, se espera, tenham colaborado para reequilibrar as tarefas entre homens e mulheres. 

Michelle lembra que oferecer oportunidades a pais e mães vai além de programas de licença de parentalidade ou de família. A empresa precisa criar uma cultura que permita que esses e outros benefícios sejam usufruídos na prática. E cabe aos líderes esse papel. Para que o ambiente de trabalho seja contaminado por essas ideias, a Filhos no Currículo sugere um metodologia aos gestores que se resume na palavra SETA:

S – SEGURANÇA: o líder é treinado para que crie um ambiente que transmita segurança; as pessoas só vão compartilhar seus desafios ao se sentirem seguras;

E – EMPATIA: é preciso entender e aprender como desenvolver esse olhar empático

T – Troca:  comunicação é via de mão dupla. É você falar e você ouvir. A escuta empática é habilidade socioemocional extremamente importante.

A – Autoresponsabilidade: o líder precisa fazer aquilo que ele fala; tem de ser a referência; se acredita que existe vida além da profissão, tem de saber se desconectar e, por exemplo, não marcar reuniões de trabalho na hora do almoço.

Por mais que ter filhos seja visto como uma potência na vida profissional, Michelle – que também tem de dividir o trabalho da consultoria, com família, filhos e afazeres domésticos – sabe que essa relação é difícil e instável. Haverá momentos em que o lado profissional se expressará mais e outros em que o pessoal pede passagem. O importante é que a escolha seja consciente.

Pra fechar a conversa, deixo o convite da Michelle Terni aos pais: coloque seus filhos no currículo e conte essa experiência nas suas redes sociais corporativas (#meufilhonocurriculo): 

“Desafiem outras pessoas a fazerem o mesmo”.

Assista agora à entrevista completa com Michelle Levy Terni, da Filhos Currículo:

O Mundo Corporativo teve a colaboração de Bruno Teixeira, Débora Gonçalves, Rafael Furugen e Renato Barcellos.

Conte Sua História de SP: minha vida na cidade começou de fato no Fórum João Mendes

 

Por Paula Calloni
Ouvinte da rádio CBN

 

 

O Hospital e Maternidade Central Nossa Senhora da Abadia, em Santo Amaro, que era administrado por freiras, já não existe mais. Lá conheci meus pais pela primeira vez, quando tinha 15 dias de vida, em 1968.

 

Eles já tinham 3 filhos, mas queriam mais uma menina. A freira levou minha mãe ao berçário e mostrou vários recém-nascidos, abandonados pelas mães biológicas… a maioria solteiras e recém-chegadas à cidade. Ao me pegar no colo, minha mãe disse: “quero esta”. E não adiantou a irmã apresentar outros bebês: “quero esta!” – disse mamãe, firme.

 

Dias depois, lá fui eu para o fórum João Mendes, região da Sé, nos braços da enfermeira Venina de Oliveira Costa, já falecida, que me entregaria para meus pais adotivos.

 

Quantas vidas se encontrando na São Paulo que se agigantava, vivaz, onde viver já era uma correria.

 

Naquela manhã, o juiz da Vara de Menores do Fórum propôs que eu ficasse num abrigo para menores até sair a papelada oficial da adoção.

 

Nesse momento, meu pai, imigrante italiano, me segurou firme e desafiou o juiz: “ela é minha filha e se eu não sair com ela no colo hoje, vou deixá-la aqui!”.

 

O que fazer? O juiz se viu encurralado. E cedeu. Ufa…

 

Ganhei uma família. Ganhei um lar.

 

Hoje, quando passo ao lado do Fórum João Mendes, olho para ele, imponente, sem jamais esquecer que ali, de fato, começava a minha história com São Paulo.

 

O Conte Sua História de São Paulo tem sonorização do Cláudio Antonio e narração de Mílton Jung. Vai ao ar aos sábados, após às 10h30, no CBN SP. Para participar, envie seu texto para milton@cbn.com.br

Desprendendo-me

 

Por Abigail Costa

A maternidade chegou, digamos, na fase madura. Depois dos 30. Estava tão acostumada em ser eu – e quando tinha que dividir era só com meu marido – que quando aquele pequeno homem chegou em casa desorganizou minha vida.

As noites não seriam mais as mesmas. De fato não foram. E quantas delas passei em claro com ele berrando no colo. O pensamento era só esse:”acabou meu sossego”.

Era uma sensação de perda de liberdade, de tranquilidade, de sono gostoso depois de namorar muuuuuuuuuuito.

Agora, eu tinha uma responsabilidade que pesava. Não só porque tinha sono e não podia ir pra cama. Vestir aquela blusa cheias de botões, durante meses (não por opção) para ter praticidade na hora de amamentar, confesso nem sempre me dava prazer.

Mas o tempo, sempre ele, se encarregou de colocar os pingos dos is.

Daquelas noites sobraram as olheiras na fotografia; das mamadas do meu bebê, saudade.

Ele se desprendendo, a vida voltando ao jeito que era.

Meu pequeno grande homem já tem suas responsabilidades e as desempenha muito bem. A mim cabem pequenas complementações como mãe.

Você já não é tão requisitada como antes. Definitivamente, ele não morrerá de sede sem você.

De vez em sempre um carinho, que mal tem ?

Numa dessas voltas, eu, cortando as unhas naqueles dedinhos já crescidos, comecei a fazer perguntas com aquela voz quase idiota que usamos para conversar com animais e crianças:

– Já não precisa mais da mamãe pra trocar as fraldas, não é? Nem pra mamar?

Consegui perguntar mais meia dúzia de besteiras até cair em prantos.

Ele “pensando” ser mais uma das minhas brincadeiras disse inocentemente:

– Você é uma atriz e tanto, não é mamãe?

– Pois é – respondi, passando as mãos no rosto e disfarçando as lágrimas.

Fui pro banheiro pra me olhar sozinha no espelho. “Tá louca mulher?” Perguntei pra mim mesma.

Passei uns dias pensando nesse episódio.

Louca não. Lúcida.

Estamos nos desprendendo.

Assim como foi preciso me acostumar com a chegada do meu bebê, estou me acostumando com as outras etapas. Sofrer como lá atrás sofri quando ele chegou mudando a minha vida, sei que não vai dar pra escapar. Sofrerei.

De novo me lembro da frase preferida da minha mãe.

“Com o tempo tudo passa”.

Abigail Costa é jornalista e escreve às quintas-feiras no Blog do Mílton Jung