Fora da Área: #SomosTodosNeymar #SóQueNão

Máscaras de Neymar estão sendo distribuídas pela internet em campanha de apoio ao atacante que teve, como ele próprio disse, o sonho de disputar a final da Copa do Mundo abortado pela violência com que foi atingido pelas costas. A ideia, lançada pelo Grupo ABC de comunicação, é que a torcida brasileira vá mascarada ao estádio repetindo manifestação que havia sido realizada quando Neymar estava no Santos, em jogo contra o Colo-Colo, pela Libertadores, em 2011. Se naquela época a inspiração era o Carnaval, desta vez é o drama que está vivendo o jogador. Agregado a campanha está a hashtag #SomosTodosNeymar que, não por acaso, segue a linha do #SomosTodosMacacos criado pela mesma agência quando Daniel Alves foi alvo de atos de racismo na Espanha. Do ponto de vista promocional e motivacional tudo é válido, afinal o baque com a fratura da terceira vértebra da lombar foi enorme, pois tira no momento mais decisivo o jogador em que o Brasil depositava total confiança. Torcedores e equipe sofrem com o acontecido. Sem contar o sofrimento pessoal de um jovem que dedica a vida ao futebol, é expurgado da primeira Copa, na África do Sul, por não ter experiência suficiente e, na segunda, é abatido pela agressão traiçoeira.

 

Agora, caro e raro leitor deste blog, sabemos todos que não é preciso ser nenhum especialista no tema para entendermos que #SomosTodosNeymar #SóQueNão (usufruindo de outra hashtag de sucesso no Twitter). Ou seja, por mais que Luis Felipe Scolari procure no seu grupo de jogadores e mesmo se pudesse buscar em outros elencos não encontrará alguém à altura do craque. Neymar tem o dom, como tiveram Pelé, Garrincha, Maradona, Messi, Zidane, Beckembauer e poucos outros que fizeram a história desse esporte mais rica e bonita. Ele nasceu para exercitar a arte do futebol e por isso foi capaz de marcar gols após a sequência inimaginável de dribles naquela vitória contra o Inter (3×1) ou na derrota para o Flamengo (5×4), ambos na Vila Belmiro, quando jogava com a camisa do Santos. Se transformou em um dos maiores jogadores do mundo com pouco mais de 20 anos e alcançou marcas que impressionam vestindo a camisa do Brasil. Atualmente é o sexto goleador da seleção com 35 gols marcados, quatro nesta Copa.

 

Scolari sabe que não tem ninguém com o mesmo talento de Neymar nem procura alguém semelhante. Pode usar William, Bernard ou quem sabe três volantes. Talvez peça para Oscar ocupar o espaço do nosso camisa 10. Só saberemos pouco antes do início do jogo, pois vai anunciar em cima da hora para não dar mais munição a seleção da Alemanha. No vestiário (e deve estar fazendo isto desde que foi comunicado da eliminação do seu goleador), porém, mobilizará a equipe com o discurso de que Neymar estará incorporado em cada um dos que entrarem em campo na esperança de que consigam doar 110% das suas capacidades. De que Oscar desabroche, Hulk chute a bola fora do alcance do goleiro e Fred, em pé ou deitado, desencante de vez. E, assim, transforme em realidade o que só existe até agora na versão virtual: #SomosTodosNeymar.

Fora da Área: Neymar abatido pelas costas faz parte de um roteiro épico

 

 

Terminei a sexta-feira assistindo, na tv à cabo, à 42 – A História de uma Lenda, que tem como personagem principal Jackie Robinson (Chadwick Boseman), primeiro jogador de beisebol negro a entrar na Major League, na década de 1940, recrutado pelo dono da equipe dos Dodgers, do Brooklyn. O executivo Brach Rickey (Harrison Ford) desafiou o racismo que manchava os Estados Unidos enquanto Robinson suportou as mais absurdas ofensas e agressões de torcedores, colegas e jogadores, demonstrando abnegação e talento. A atitude deles escreveu capítulo importante do combate à segregação e transformou Robinson em lenda atualmente representada pela sua camisa 42, número que foi aposentado pelo beisebol americano, em 1997, e é vestido por todos os jogadores no dia 15 de abril, data que ele estreou na liga “dos brancos”. Evidentemente que os roteiristas precisam se esforçar e adaptar as histórias à tela e ao tempo e nos apresentam um resumo de fatos marcantes, alguns reescritos para glamourizar a cena. Mas é inevitável que percebamos como o esporte por sua própria beleza e dramaticidade é protagonista de momentos fantásticos que, apesar de surgidos de forma espontânea, parecem terem sido previamente escritos por alguém disposto a criar um filme inesquecível.

 

Nestas três últimas semanas, temos sido espectadores da Copa do Mundo de futebol com suas histórias incríveis contadas ao vivo, sem roteiro prévio, e captadas por centenas de câmeras ultramodernas que registram lances, gestos, expressões e palavras por diferentes ângulos e reproduzidas à exaustão e lentidão suficientes para estender nosso sorriso e sofrimento até o próximo capítulo. O corpo de Neymar estendido no gramado quase ao fim da partida contra a Colômbia, vítima de agressão sofrida pelas costas, é uma dessas imagens que serão eternizadas e nos ajudarão a entender o fim do filme, feliz ou não. Fico imaginando que roteirista, se não a nossa própria vida, seria capaz de escrever aquele instante. O maior craque da seleção local, aquele em que o país que sedia a competição deposita sua esperança, abatido pelo adversário com um tiro certeiro, traiçoeiro, sem direito à defesa. Com o rosto esfregando de dor na grama, ele agoniza à frente de seu público e seu choro é compartilhado pela enorme arquibancada que a Nação se transformou desde que se iniciaram os jogos. A alegria que se desenhava com a classificação à semifinal ganha tons de cinza e a incerteza se torna unânime mesmo entre os mais otimistas. O que será de nós a partir de agora? O escritor conduz a plateia a imaginar o pior.

 

Desculpe-me se você, caro e raro leitor deste blog, está cético com nosso futuro nesta Copa. Eu tendo a enxergar em cada drama o ponto de virada da história, como se fizesse parte da estrutura mítica que os contadores usam para criar narrativas poderosas que impactam todos nós e nos levam a grudar os olhos nas páginas seguintes, ansiosos por descobrir o final, certo de que o autor está pronto para nos impressionar. Não acredito nos que pregam a derrota antecipada pela ausência de Neymar nas duas partidas finais deste Mundial. Os vejo como incapazes de compreender o enredo planejado pelo destino que nos quer campeão. Temos, porém, de provar que somos merecedores desta conquista e fortes para suportar o gol contra no início da história, o futebol mal jogado nas primeiras partidas e a bola que explodiu na trave no minuto final. Vamos forjando nossos ídolos: o goleiro que chora antes de se transformar em herói ou os zagueiros que desbravam o ataque para nos fazer vencer. Até o título precisaremos ainda encontrar aquele que vai substituir o insubstituível – talvez vestir a todos com o nome do craque ferido na camisa. E esperar pela redenção de muitos dos que ainda não estiveram a altura de seu nome. Dentre eles, o escritor haverá de escolher um para marcar o gol definitivo, que nos permitirá chorar diante da imagem do capitão levando a taça às mãos de Neymar, sentado em uma cadeira de rodas.

 

Insisto em acreditar que Luis Felipe Scolari saberá, como nenhum outro, escrever esta história para nós.

Fora da Área: classificado, sem ilusão e com Neymar

 

 

No Tribunal Militar, o funcionário negociou compensar no restante da semana as horas não trabalhadas nesta segunda-feira porque o carro dele estava impedido de circular durante todo o dia, em São Paulo. A enfermeira informou por e-mail que havia combinado com um paciente e assistiria ao jogo no quarto em que ele está hospitalizado. Alguns escritórios replanejaram as atividades, diminuíram o expediente ou liberaram os funcionários em horário escalonado. Houve quem arriscasse o transporte público, de ônibus ao trem, mesmo sem saber se conseguiria ser bem atendido no retorno para casa. Os torcedores brasileiros driblaram as dificuldades de mobilidade, bloqueios de ruas e avenidas e a insensibilidade de administradores para chegar a tempo de assistir ao jogo do Brasil. Cada um fez o que pode do lado de fora do campo, enquanto lá dentro nossos jogadores tentavam retribuir com um futebol mais bem jogado do que nas duas partidas iniciais desta Copa. Tanto quanto as medidas adotadas nas cidades diminuíram os congestionamentos, em relação ao jogo anterior, as estratégias de Luis Felipe Scolari levaram a seleção à vitória contra Camarões. Nos dois casos, nada foi definitivo. Muitos problemas seguem nas cidades, da mesma forma que na nossa equipe, mas nesta, ao menos, temos Neymar, que faz toda a diferença. O camisa 10 brasileiro driblou, provocou, brilhou e marcou dois gols.

 

Como as soluções para nosso cotidiano são mais complexas, passo a escrever apenas do futebol. Felipão esbravejou ao lado do gramado, gesticulou para reposicionar seu time, percebeu erro na movimentação dentro da área que nos levou a tomar o gol de empate e a dificuldade para a bola passar de pé em pé e migrar da defesa para o ataque. Mesmo terminando o primeiro tempo com vantagem – pois se nada dava muito certo, tínhamos Neymar -, o treinador entendeu que estava na hora de mudar a equipe e trocou Paulinho por Fernandinho. Se aquele fez um jogo no diminutivo, esse foi grande, defendeu, chegou à frente, trocou passe e, de bico, marcou o seu gol, resultado de uma triangulação muito legal de ver entre ele, Oscar e Fred. Aliás, Fred foi mais uma boa notícia no segundo tempo. Fez, de bigode, o primeiro gol na Copa e ainda participou de lances importantes. No fim das contas, saímos do Mané Garrincha líderes do grupo, com uma goleada e com o goleador do Mundial. (Neymar, claro).

 

O Brasil se classificou às oitavas de final para enfrentar o Chile, no próximo sábado, no Mineirão, em Belo Horizonte. Precisará melhorar ainda mais para superar o adversário sul-americano, mesmo que as estatísticas estejam a nosso favor. Sabe que tem dificuldades nas alas, na marcação dos volantes e na articulação no meio de campo. Conhece seus limites e está buscando soluções, como a entrada de Fernandinho que deve ter conquistado a vaga de titular. Avança no Mundial, sem nenhuma ilusão e com Neymar. E isso faz uma baita diferença.