Conte Sua História de São Paulo: o Pedro, o Lobo e os meus amiguinhos de corrida

Paulo Mayr Cerqueira

Ouvinte da CBN

Foto de Caique Araujo

Mil anos atrás, mesmo não sendo próximo a minha casa, costumava correr na Pista de Cooper do Parque do Ibirapuera. Estacionava o carro em uma travessa da 4º Centenário e caminhava um pouco.

Dois dias seguidos, um menino de uns três, quatro anos, que estava com a empregada no jardim de casa puxou conversa:

– Quem é você?

– Sou o corredor do Parque.

Parei e continuamos o bate-papo.

Na semana seguinte, ao me ver, chamou o irmão, um pouco maior, para me apresentar.

Meu já amigo, o Pefeli, e o novo, o Nirani.*

E assim foi indo. Com frequência, eles estavam por ali e conversávamos.

Então, no começo de dezembro, fiz uma fita K7 com a História do Pedro e o Lobo do músico russo ProKofiev, narrada por Roberto Carlos, no início do início da carreira do ídolo.

A ideia do autor era introduzir, de maneira lúdica, crianças no mundo da música erudita. Assim, cada personagem da história era representada por um instrumento de orquestra.

Em um envelope natalino, além da fita, o histórico, que xeroquei da contracapa, e um cartão meu de Feliz Natal. Eles não estavam em casa. Deixei com a empregada, já minha conhecida.

Dia 25 de dezembro, por volta de meio dia, antes de ir para o Almoço da família, passei por lá. Toquei a campainha. A avó, pelo interfone, perguntou quem era. Disse que havia deixado uma fita K7 para as crianças.

Ela:

– Não vai embora, não vai embora.

E veio correndo para o portão.

Novamente, os meninos não estavam. Ela contou que todos haviam se encantado comigo; e insistiu para eu tomar uma bebida com eles. Agradeci, mas não aceitei.

Hoje Pefeli e Nirani são homens feitos e talvez tenham um toca-fitas de museu só para, de vez em quando, ouvir com chiados a lembrança que o Corredor do Parque lhes deu.

Paulo Mayr Cerqueira e seus amigos, Pefeli e Nirani, são personagens do Conte Sua História de São Paulo. A sonorização é do Cláudio Antonio. Seja você também um personagem da nossa cidade: escreva seu texto e envie para contesuahistoria@cbn.com.br. Para ouvir outros capítulos da nossa cidade, visite o meu blog miltonjung.com.br ou o podcast do Conte Sua História de São Paulo.

Lembranças de Pedro Carneiro Pereira

 

Por Milton Ferretti Jung

 


Em minha carreira de narrador de futebol, que eu me lembre, não consegui narrar apenas dois jogos. Um deles – não me perguntem o ano, por favor – foi Atlético x Grêmio, no Estádio Independência. Já contei, em uma dessas quintas-feiras, o ocorrido com a transmissão da Rádio Guaíba, nesse jogo. Em resumo, a RADIONAL deixou-me na mão: narrei 85 minutos e só parei quando, nos meus fones, ouvi a voz do meu colega Marco Aurélio, que apresentava o rádio jornal noturno. O motivo que me impediu de relatar uma partida pela segunda vez foi, porém, bem mais sério. Fui escalado para narrar, pelo Campeonato Brasileiro, Desportiva x Grêmio em Vitória, capital do Espírito Santo. A equipe que eu comandava desembarcou no sábado, descansou e, no domingo, rumou para o Estádio Engenheiro Araripe. Em Porto Alegre, Armindo Antônio Ranzolin já começara a narrar Inter x São Paulo. O jogo, em Vitória, começa mais tarde. No Autódromo de Tarumã, localizado no município de Viamão, bem próximo da capital gaúcha, o repórter Clóvis Rezende, acompanhava a 4ª Etapa do Campeonato Gaúcho de Turismo. Antes que se estabelecesse o nosso contato com a central técnica da Guaíba, alguém comentou que um grave acidente havia ocorrido no Autódromo. Tão pronto fizemos contato, fomos informados pelo operador da central que deveríamos retornar para Porto Alegre. O nosso companheiro Pedro Carneiro Pereira envolvera-se num acidente com Ivã Iglesias ao tentar ultrapassá-lo. Os carros se chocaram e ambos bateram no muro de proteção dos boxes. Imediatamente se incendiaram. Os pilotos não puderam ser retirados em tempo de serem salvos. No Beira-Rio, o árbitro Arnaldo César Coelho, ao ser informado do ocorrido, interrompeu a partida por alguns minutos. A Rádio Guaíba encerrou a jornada esportiva e passou a rodar músicas. Saímos às pressas do Engenheiro Araripe, corremos até uma agência da Transbrasil e conseguimos voar, debaixo de mau tempo, para o Rio de Janeiro. Lá,embarcamos no “corujão” da Cruzeiro. Eu e meus companheiros largamos nossas bagagens em casa e rumamos para o velório do Pedrinho. Corria, então, o ano de 1973. Estávamos no dia 21 de outubro

 

Conheci Pedro Carneiro Pereira quando a Rádio Canoas, cujos estúdios situavam-se em Porto Alegre, chamou interessados em fazer carreira no rádio. Entre os inúmeros candidatos a uma vaga de locutor, estava um jovem pouco mais moço que eu. Não me esqueço, sei lá a razão, que vestia uma camisa esporte quadriculada. O teste não era dos mais fáceis. Não bastava, para quem buscava lugar na Canoas, ler, sem errar, textos comerciais e noticiários. Exigia-se, também, que falassem de improviso sobre assunto que desse na cabeça do testado. Somente um dos candidatos passou no teste: Pedro Carneiro Pereira. Em 1958, deixei a Rádio Canoas e sentei praça na Guaíba, onde estou até hoje. Pedrinho e eu narramos várias provas automobilísticas quando ambos ainda estávamos na Emissora da Caldas Jr. Pedro saiu da Canoas, fez teste na Rádio Difusora e,claro,foi aprovado. Indiquei-o para Mendes Ribeiro, diretor de broadcasting da Guaíba. Ele foi contratado e voltamos a trabalhar lado a lado, fazendo dupla, às vezes, na locução comercial. Naquela época éramos dez locutores. A Rádio não aceitava jingles nem spots. Era tudo ao vivo. Acabamos os dois trabalhando na equipe esportiva. A história do Pedrinho, porém, não termina aqui. Na próxima quinta-feira, contarei como foi a estreia dele no automobilismo de competição.

 


Milton Ferretti Jung é jornalista, radialista e meu pai. Às quintas-feiras, escreve no Blog do Mílton Jung (o filho dele)

Torci pelo time do Pedro

 

Direto de Roma/Itália

Comecei a partida torcendo pela Alemanha. Sei lá se você é daqueles que consegue sentar diante da TV e assistir a um jogo de futebol sem tender por um ou outro lado. Eu, decididamente, não. Escolhi os alemães por questões familiares, e após a vitória contra a Argentina em que vi jogadores germânicos driblando pra cá e pra lá, desconfiei que ali havia resquícios do futebol-arte que um dia esteve no Brasil.

Poucos minutos haviam se passado até que minha fidelidade fosse colocada à prova. A Espanha, que diziam ter um jogo festivo, marcava a saída de bola, seus atacantes – gente de talento – não deixavam os alemães trocarem passe. E como erraram passes os alemães.

Uma assistência para Villa que fez o goleiro Neuer sair a seus pés mexeu comigo. Um cruzamento forte da direita que encontrou Puyol me chamou atenção. Chutes do ataque espanhol de fora da área mostravam quem tinha mais chances de marcar primeiro.

Foi, porém, no início do segundo tempo que virei casaca, definitivamente. E o responsável foi um cara que não tem nome composto, charmoso nem famoso como Xabi Alonso, David Villa ou Andrés Iniesta. Ele se chama apenas Pedro, veste o número 18, não chega a 1,70 de altura e, apesar de estar às vésperas de fazer 23 anos, já tem muita história pra contar.

É o único jogador do Barcelona a marcar um gol em seis competições diferentes em uma mesma temporada. Da Copa del Rey ao Mundial de Clubes, deixou sua marca em 2009. Foi aposta espanhola para esta semifinal substituindo Fernando Torres. E deu muito certo.

Habilidoso nos dois pés, Pedro fez uma jogada especial pelo lado direito. Driblou um, dois, três, se não me engano, havia também um quarto alemão no caminho. E todos ficaram para trás com cara de desesperados. Ciente de seu papel de coadjuvante, entregou um presente para o companheiro Alonso que desperdiçou o ataque chutando para fora. A televisão, teimosamente, repetia o chute errado e se esquecia de registrar o lance mais interessante do jogo.

Daquele momento em diante, os italianos que assistiam à partida comigo não tinham dúvida de que minha torcida era espanhola. E, aos poucos, eles também se entregaram. A seleção comandada por Vicente Del Bosque – que tem cara daquele avô simpático e satisfeito com o que a vida lhe ofereceu -, contaminada pelo estilo Barcelona de ser, tomava conta do jogo, apesar da insistência da Alemanha em estragar a festa.

O futebol bacana dos alemães, responsável por três goleadas e os melhores desempenhos na Copa da África, não apareceu diante da intensidade dos espanhóis. Mas a seleção treinada por Joachim Loew é jovem – a mais jovem que a Alemanha já reuniu – e, portanto, é de se esperar que seu estilo de jogo ainda possa oferecer bons espetáculos até a Copa do Brasil, em 2014.

A Espanha começou a Copa decepcionando muitos dos que esperavam um show a cada partida, e quando tinha boa performance parecia se satisfazer mais em tratar bem a bola do que colocá-la dentro do gol – fez sete em seis jogos.

Nesta semifinal, mostrou que mesmo quem pretende jogar bonito precisa marcar bem – e até aqui levou apenas dois gols em seis jogos. Houve excessos em alguns momentos e isso é comum quando sobra talento, mas ver que o gol surgiu de jogada pragmática – cobrança de escanteio e cabeceio de um defensor – revela, também, que a Espanha sabe que o caminho da vitória nem sempre está no toque de calcanhar, no drible legal ou em uma jogada fantástica.

Vê-la na final é motivo de satisfação. Mostra que mesmo com os esquemas táticos rígidos e fechados que imperam na maioria das seleções, o futebol moderno ainda tem espaço para o drible, para um toque sutil e para o talento.

A Espanha está na final. O futebol agradece.

E pra mim será muito simples escolher alguém pra torcer no domingo: o time do Pedro.