Por Maria Lucia Solla

Férias terminadas, missão cumprida, e agora a longa volta para o Brasil.
São cinco horas da manhã, e estou sentada na sala de embarque do aeroporto de Fort Lauderdale, na Flórida. Esta ala está passando por uma reforma e já tem homens trabalhando e martelando. Nada que incomode, mas fica tudo feio e desarrumado.
Não sei se você tem viajado pelos Estados Unidos e se já enfrentou a situação de ter que tirar os sapatos para que eles, assim como você e toda a tua bagagem, possam passar por dedos nervosos e Raio X. Esta é minha segunda experiência, e ainda terei mais uma quando chegar em NY para tomar o voo de volta para o Brasil.
Minha estreia ‘descalça no aeroporto’ foi quando embarquei, no dia 20 deste mês, de NY para a Flórida. Fui pega de surpresa, de sandália alta, daquelas de uma tirinha fina segurando os dedos e fivela no tornozelo arrematando o pacote. Quando vi que as pessoas tiravam os sapatos, entendi. Não!
Pos é, sim! Para tirar a sandália do pé direito foi menos complicado, uma vez que o pé esquerdo, apoiado num belo salto, me dava altura suficiente para esticar a perna direita, pôr o pé na esteira e, só um jeitinho aqui, outro ali, e lá se foi um pé. Mais difícil um pouco foi realizar a mesma proeza com o pé esquerdo, pois o direito, já descalço, me privava de uns sete centímetros. Já se vai tempo do meu tempo de balé, mas fiz um alongamento surpreendente e consegui tirar o segundo pé da sandália e colocá-la numa bandeja. plástica que foi rolando pela esteira, com meus outros pertences, para o exame minucioso de dedos nervosos e máquinas curiosas.
Adianta a fita e os dois pés já estão calçados novamente. Ufa! Esquisito, seu.
Além da desarrumação da sala de embarque, tenho reparado que a gritante maioria das pessoas não se arruma mais, para nada. Nem para viajar. Ou melhor, principalmente para viajar. Chinelo de borracha, bermudão e camiseta. Um ar desleixado invade o aeroporto que, há não muito tempo, era pura festa. Mas deixa para lá.
Meu voo só sai às seis, e preciso que as voltas da vida e do relógio não virem as costas uma para outra, porque o avião que me leva de volta a São Paulo decola às onze e quinze, do aeroporto JFK. Me espera ainda um desembarque, e a tortura da espera por minha mala que será desovada (a gente nunca tem certeza disso) da aeronave e levada para um passeio de carrossel e que venha se oferecer na minha direção. Depois disso, andança apressada pelo aeroporto, até a ala da American Airlines, e descalça de novo.
Quando meu pai começou seu primeiro trabalho remunerado, tinha só catorze anos e nenhum par de sapatos. Começou descalço. Isso me dá a certeza de que posso sempre recomeçar.
E a vida continua.
Maria Lucia Solla é professora de idiomas, terapeuta, e realiza oficinas de Desenvolvimento do Pensamento Criativo e de Arte e Criação. Aos domingos escreve no Blog do Mílton Jung