Conte Sua História de São Paulo: o cavalo do sorveteiro da Pompeia

 

Por Marcello Pizo
Ouvinte da CBN

 

 

Falta meia dúzia de anos para meio século. Isso não me faz tão velho assim, porém sou chamado diariamente de tio e, às vezes, me lembro de umas coisas que me fazem sentir o peso de ser de outro milênio. O sorvete é uma dessas lembranças da minha antiguidade.

 

Quando garoto, costumava tomar um sorvete que era vendido nas feiras livres e também de porta em porta, nas ruas da Pompéia. O vendedor era um senhor que andava numa carroça pintada de vermelho e branco, puxada por um cavalo marrom. Ele vendia sorvete de dois sabores somente: limão e morango. Geralmente ficava numa das extremidades da feira durante todo tempo que as barracas estavam montadas. Nos outros dias e horários, ele saía com a charretinha e tocava uma buzina prateada, que brilhava muito e anunciava a aproximação daquela guloseima tão especial.

 

— “Mãe, é o sorveteiro do cavalo, corre.”

 

Minha mãe sempre cedia aos meus pedidos, exceto quando as amígdalas me impediam de tomar gelado – aliás, até hoje não entendo o por que daquele lenço velho empapado de álcool no meu pescoço, quando a garganta atacava. Ela também era fascinada por aquele som de buzina e contava sempre que quando garota, o meu avô comprava para ela o sorvete vendido pelo pai do mesmo sorveteiro nas ruas de Higienópolis.

 

Será que o cavalo também era filho do cavalo antecessor?

 

A cada comprador ele descia da charrete, se dirigia para a parte posterior onde ficavam os apetrechos e perguntava se era morango, limão ou misto. Pegava a casquinha e com uma habilidade inimaginável para aquelas mãos tão rústicas, manuseava uma faca de mesa que preenchia a casquinha de biscoito com o sabor escolhido. Só vi algo parecido com o seu método de servir muitos anos depois, quando a Parmalat se instalou na esquina da Sumaré com a Aimberê, nos tempos que os palmeirenses eram felizes. As atendentes usavam umas pás para servir o sorvete, igualzinho ele fazia com aquela faquinha herdada do pai.

 

Quando ele parava próximo às feiras, ficava de plantão atrás da boléia esperando os fregueses. Nessas situações, o cavalo ficava sempre em três patas – não que ele fosse portador de necessidades especiais, mas preste atenção: todo cavalo quando “estacionado” alterna uma das patas para ficar suspensa. O mais incrível é que esses eqüinos têm um temporizador melhor que qualquer cronômetro de Fórmula 1, trocando a pata suspensa por outra mais cansada, com uma precisão cavalar. Andei ruminando uma explicação e acho que a contagem deles é feita pela mastigação…

 

Ainda falando do cavalo ( ou seria uma égua?) era comum ver o carroceiro dando as casquinhas de sorvete defeituosas para o equino como guloseimas carinhosas. Hoje em dia choveriam denúncias nas redes sociais contra a alimentação inadequada para o bicho, dos perigos da poluição para os pulmões do quadrúpede, além de algum vereador desocupado fazer uma lei para a coleta do estrume em sacos recicláveis. O mundo politicamente incorreto era menos estressante.

 

Marcello Pizo é personagem do Conte Sua História de São Paulo. A sonorização é do Cláudio Antonio. Conte mais um capítulo da nossa cidade: escreva para contesuahistoria@cbn.com.br.

Operação Casca de Ovo

 

Buraco na República

Por Devani Amâncio
ONG EducaSP

O polêmico buraco da Praça da República, tapado na terça-feira passada, 9 de fevereiro, está de volta. Veja o que disse o sorveteiro Arodi Garcia, mais conhecido na praça como Véio do Sorvete.

“Bem que o Pai de Santo que trabalha aqui, previu : ‘Véio, alguma coisa me diz que esse trabalho não ficou bem feito, depois de 6 meses encrencado. Você viu? Já está desmanchando. Isso não vai durar três dias. É bom você não ficar passando por cima disso não. No desespero, vão jogar a culpa no seu carrinho ’. Olha, conheço todos os buracos do centro, de todos os tamanhos… No Vale do Anhangabaú tem um na entrada da garagem do shopping Light, parece um poço. Aquele buraco vai engolir um caminhão logo logo… Num dia desses, por pouco um gari anãozinho não foi engolido. Debaixo do asfalto está tudo oco… Ando olhando para o chão… vejo um buraco aqui, desvio de um outro ali … vou manobrando. Esse buraco da República deu um bafafá! Saiu no rádio, no jornal, veio até uma televisão aqui. No outro dia apareceu cedo, um caminhão da Prefeitura cheio de gente. ‘Vai… Vai rápido’… Foi tapado só com cimento e areia, na grossura de uma casca de ovo. Está o maior bochicho na praça, o engraxate sabe de tudo… Estão falando que o serviço do buraco ficou em 2 mil”.

O Véio do Sorvete tem 63 anos e se orgulha em ter o Estatuto do Idoso, assinado pelo presidente da República em 2003.

N.B (Nota do Blogueiro): No dia 4 de fevereiro, postamos texto “Os Buracos da República” de Devanir Amâncio chamando atenção para o buraco que estava aberto na praça da República, um dia depois recebemos informação da prefeitura que o serviço seria providenciado. O conserto foi feito, mas o problema está de volta.