Tem uma brincadeira antiga na qual uma mesma notícia é apresentada em diferentes versões, adaptada ao estilo editorial de cada jornal, revista ou programa de televisão. Um exercício para entender melhor a mídia e mostrar como a forma de pensar do veículo e o próprio público-alvo podem influenciar a abordagem do assunto. A primeira vez em que me deparei com este texto a notícia em questão era o fim do mundo e havia coisas curiosas como acusação contra partidos políticos, destaque para as perdas econômicas e até uma, nunca esqueço, que destacava em letras garrafais: “O Rio Grande do Sul vai acabar“. Claro, se referia a um jornal gaúcho.
Nessa segunda-feira, recebi e-mail do ouvinte-internauta Joaquim S. Falcão Neto mostrando como a história de Chapeuzinho Vermelho seria contada na imprensa brasileira. Já conhecia este texto, também. Mas havia uma provocação interessante na mensagem copiada por ele: “E na CBN, como vocês noticiariam?”
A pergunta me permite falar um pouco sobre algo que me incomoda há bastante tempo no rádio brasileiro: o texto. Com as exceções de praxe, deixamos de lado o desenvolvimento de uma escrita apropriada para o veículo, o que significa dizer, apropriada para o ouvinte. E o que vem a ser isto? Escrevi no livro Jornalismo de Rádio, editado pela Contexto, sobre o assunto:
O jornalista catalão Iván Tubau, professor do Departamento de Jornalismo e Ciências da Comunicação da Universidade Autônoma de Barcelona, em seu livro Periodismo oral (Paidós, 1983), ensina que ao escrever para quem ouve, deve-se escrever como quem fala. O redator de rádio tem de levar em consideração que a notícia será falada; não pode se prender ao texto escrito do jornal, da agência de notícias ou internet, fontes de sua redação. Precisa recriá-lo. No rádio, assim como na televisão, a compreensão tem de ser imediata. Não se dá ao ouvinte o mesmo direito que o leitor tem de voltar atrás sempre que alguma ideia for percebida.
Mais adiante, reproduzo outro ensinamento de Tubau:
Quem escreve para rádio e televisão deve ouvir a algaravia da rua, ordená-la e limpá-la um pouco e devolvê-la levemente melhorada a seus emissores primigênios, procurando que estes a sigam conhecendo como sua.
Digo tudo isso para, finalmente, responder ao interesse do Falcão Neto. A notícia do Chapeuzinho Vermelho no rádio, muito provavelmente, seria “copiada e colada” de algum outro veículo de comunicação, infelizmente, como ocorre na maioria das vezes, sem nem mesmo se atentar para o interesse editorial que moveu o veículo-fonte.
Haverá aqueles colegas de rádio que lerão este post – é pretensão minha acreditar que algum deles lê este blog? – e logo pensarão consigo mesmo: “eu não faço assim” ou “na minha rádio, não”. Se for verdadeira a reação, parabéns. Você é um dos poucos que ainda se lembram do ouvinte ao redigir para o rádio.