Por Milton Ferretti Jung
Em 1947, eu estava internado no Colégio São Tiago, na então pequena cidade de Farroupilha, no Rio Grande do Sul. Muitos educandários ofereciam internatos para filhos com mau comportamento, guris de cidades interioranas nas quais não existiam escolas do nível exigido por seus pais e também porque a prática era moda na época.
Confesso lisamente – sei que meus netos jamais me imitarão – que o motivo de ter sido afastado da casa paterna durante o ano letivo, inclusive sem licença para visitá-la no relativamente longo feriado de Páscoa, era o pouco empenho nos estudos.
Cheguei ao internato depois das férias de meio de ano. Achei mais interessante trocar o Roque Gonzales, em Porto Alegre, em que as tais férias duravam apenas quinze dias, pensando haver feito um bom negócio, engano do qual iria me arrepender já no momento em que meus pais e eu desembarcamos do trem que nos levara da capital do estado para Farroupilha.
Mal os “velhos” se despediram de mim, deixando-me aos cuidados dos maristas do São Tiago, driblei meus “carcereiros” e fugi, tentando achar a linha férrea, sei lá com que esperança ou pretensão. Os irmãos não tardaram a me encontrar e me levaram de volta.
No primeiro dia de aula do segundo semestre me fingi de doente e fiquei no dormitório. O Irmão Inácio, o mais velho dos maristas do colégio, apareceu com uma garrafa de vinho e um copo. “Bebe – disse – que te fará bem”. Foi a primeira vez que me receitaram o “néctar dos deuses”.
Em casa, minha irmã e eu tomávamos um pingo de vinho misturado com água, ao invés de refrigerante. Alguns médicos também garantem que um copo de vinho nas refeições faz bem para a saúde. Há controvérsias. Seja lá como for, beber moderadamente é o que se recomenda.
Todo este preâmbulo, o maior nariz de cera que cometi até hoje, foi para encaminhar um assunto que me provoca grandes dúvidas. E o vinho surge novamente no texto. Aqueles que se consideram “experts” na matéria, o bebem com enorme prazer e são capazes de detectar num único gole – o que me espanta – os mais diversos sabores.
Leiam, por exemplo, a opinião de um especialista sobre determinado vinho, cuja marca não revelo para não fazer “merchandising”:
no sabor,é compacto,firme,nervoso,com grande persistência,com seu gosto achocolatado e sua eterna juventude,o 89 é curiosamente bordalês,muito complexo com frutas secas,tabaco,madeira “fina”,madeira velha,uma pitada de estábulo.
E eu, na minha santa ignorância, pensava que o bom vinho somente necessitasse de uvas de boa safra. Vivendo e aprendendo.
Milton Ferretti Jung é radialista, jornalista e meu pai. Às quintas-feiras, escreve no Blog do Mílton Jung (o filho dele)