Conte Sua História de São Paulo: a volta ao passado, no Beco do Batman

Maria de Lourdes M. Ferreira Martins 

Ouvinte da CBN

Foto Arquivo Pessoal

Fiquei muito tempo isolada e após tomar a segunda dose da Coronavac, do Instituto Butantã, meus filhos me levaram até a Vila Madalena para conhecer o Beco do Batman, na intenção de me distrair um pouco. Descobri que ficava bem próximo do cemitério São Paulo, onde meus pais estão sepultados. Após um breve pensamento em reverência a eles, adentrei pelo famoso beco. Fiquei admirada com as belezas dos grafites, sendo surpreendida por um que apresentava um grande jacaré com uma vacina na mão. Acima dele, o registro do autor da obra, que coincidentemente também era ligado ao bairro do Butantã. 

Naquele momento, os caminhos que percorri em meus 86 anos de vida confluíram para aquela pintura de tema bem humorado. Eu estava num beco que não é um beco, de um homem-morcego que nada tem de sinistro. Achei divertido: o local tem um colorido que retrata bem o espírito animado da Vila Madalena. E eu estava ali, no bairro em que nasci, imunizada com uma vacina feita no bairro em que cresci e onde frequentei a escola, na década de 1930. 

Na minha infância, caminhava mais de seis quilômetros para ir do bairro Ferreira, na zona oeste, até a escola que ficava no instituto Butantã —- era a única que existia na região. E nos ensinavam além de ler, escrever e calcular, a cultivar a terra para fazer hortas. Para chegar lá, subia e descia morros no Bonfiglioli. Passava pela igreja do Mercadinho, no Rio Pequeno, perto do terreno em que meu pai, João Martins, e minha mãe, Victória, criavam vacas. Mais tarde o local se tornou parte da Cidade Universitária. 

Em 11 de setembro de 1954, casei-me com Helio Ferreira, filho de Desidério Ferreira, que teve uma mercearia, conhecida como “Venda do Ferreira”, a qual deu origem ao nome do bairro em que vivi.

Nos conhecemos no Mercado Municipal, do Largo da Batata, já que trabalhávamos no comércio do bairro. Como filha mais velha de dez irmãos, mesmo adolescente, ajudava meu pai a plantar, transportar e vender verduras. Era eu, também, quem fazia muita força para girar o motor do caminhão velho dele, virando uma manivela. 

Depois trabalhei como enfermeira na Cruzada Pró-Infância e operadora de caixa na Casa Pequena, perto da igreja de Pinheiros, onde o bonde fazia o retorno a caminho do centro. Vivenciei a transformação do bairro, com o aumento do comércio em suas ruas. Surgiram pastelarias, mercados, lojas de móveis … Eu sempre levava meus irmãos e meus filhos até as ruas Cardeal Arcoverde e Teodoro Sampaio para comerem pastel e tomarem garapa. Com a chegada das grandes lojas, mesmo sem dinheiro, gostava de passear no Bazar 13, Mesbla, Eletroradiobraz, no Shopping Iguatemi, o primeiro da cidade …

Quase ninguém mais sabe o que se passou no Largo da Batata ou como era de fato Pinheiros. Pouco se preservou da memória. Ficaram apenas a igreja e algumas ruas e árvores como testemunhas de muitas vidas. Hoje, carrego dores e limitações —- consequência do trabalho duro e dos anos vividos. E sou feliz com tudo que fiz e com a família que Deus me deu.

Nasci na Mourato Coelho, na Vila Madalena, criei-me no Butantã, trabalhei e me casei em Pinheiros e moro no Ferreira. Faço parte de um pequeno pedaço de São Paulo que ajudei a construir e hoje me ajuda a viver, seja com uma vacina, seja com lembranças positivas e saudosas, seja com uma alegria por admirar as cores vivas na vila em que nasci.

Maria de Lourdes M. Ferreira Martins é personagem do Conte Sua História de São Paulo. A sonorização é do Cláudio Antonio. Envie você também seu texto para contesuahistoria@cbn.com.br Para ouvir outros capítulos da nossa cidade, visite o meu blog miltonjung.com.br e assine o podcast do Conte Sua História de São Paulo.

Conte Sua História de São Paulo: a “Cinderela” da Vila Madalena

 

Por Samuel de Leonardo

 

 

Um dos primeiros empregos da minha vida foi numa loja de calçados na Rua Teodoro Sampaio dentro da Galeria Cidade de Pinheiros. Era apenas um menino, adolescente ainda. Além de eventualmente bancar o vendedor, fazia de tudo um pouco, serviços de banco, cobranças, entregas. Lembro-me de ter atendido um casal de cliente o qual deduzira ser namorado ou noivo, tal era a forma de carinhos trocados durante todo o tempo que permaneceram na loja:

 

“Querido daqui, benzinho e amor dali”.

 

Uma melação que só vendo. O apaixonado presenteou a moça com três pares de calçados, cada um mais caro que o outro. Como de praxe, solicitei os dados para cadastro de cliente que prontamente foi preenchido. O homem pagou a despesa à vista, sem pechinchar. Venda normal e corriqueira, sem maiores detalhes, não fosse o fato de que no dia seguinte a bela mulher voltou sozinha para devolver um dos pares para a troca, pois apresentava um pequeno defeito.

 

Como não tinha nem a numeração nem o modelo em estoque combinamos que ela retornasse em dois dias que a troca seria efetuada. Passaram-se semanas e não apareceu ninguém para retirar o calçado. Como manda o bom senso, busquei os dados na ficha cadastral do cliente para comunicar a substituição. Na ficha constava somente o nome e o endereço, não tinha o número do telefone. No mesmo dia segui em direção ao local mencionado para entregar a encomenda, lá pelos lados da Vila Madalena.

 

Com os calçados em mãos, sentia-me como o príncipe consorte em busca da Cinderela. Após longa caminhada encontrei a rua e o número da residência, um local agradável, casa padrão classe média, muros com pintura nova, portões automáticos.

 

Acionei o interfone:

 

– Bom dia, é aqui que mora o Senhor Paulo? Trouxe os sapatos que a mulher dele pediu para trocar.

 

Fui atendido por uma jovem senhora que abriu o portão, uma aparência meio que escangalhada que pensara ser a empregada, tava mais para Gata Borralheira do que para uma princesa.

 

– Ele é o seu patrão?

 

De forma ríspida ela responde:

 

-Patrão coisa nenhuma, sou a esposa dele.

 

Sem saber mais o que falar permaneci em silêncio por alguns instantes. Percebi o constrangimento que causara àquela mulher. Respirei fundo e tentando consertar a situação soltei:

 

– Acho que errei o endereço, peço-lhe desculpas.

 

Antes que pudesse desvencilhar-me daquela situação, ela bruscamente tomou o pacote das minhas mãos:

 

– Deixe-me ver esses calçados – abriu o embrulho, arrancou suas sandálias e tentou calçá-los, mas não lhes serviram, ficaram pequenos.

 

Ironicamente ela me diz:

 

– Olhe aqui garoto, vou ficar com eles para mostrar ao meu marido.

 

Sem ao menos pedir licença e sem cerimônias, ela fecha o portão na minha cara. Poucos dias depois ela apareceu na loja muito bem vestida e com os sapatos na sacola. Sem muita conversa pediu para trocá-los por uma numeração maior. Experimentou-os, pegou o pacote e foi embora sem nada dizer. Ainda hoje pergunto a mim mesmo, teria sido um conto de fadas ou do vigário. Seria mesmo ela a esposa do cliente ou a empregada aplicando um golpe. Seria a esposa do cliente que foi a loja pela primeira vez ou …

 

Samuel de Leonardo é personagem do Conte Sua História de São Paulo. A sonorização é do Cláudio Antonio. Conte você também mais um capítulo da nossa cidade. Envie seu texto para milton@cbn.com.br.

Falta de educação: o tênis no Ibirapuera e o Carnaval na Vila Madalena

 

Por Carlos Magno Gibrail

 

 

Sábado no ginásio do Ibirapuera, o tenista italiano Luca Vanni, que disputou uma emocionante semifinal com o brasileiro João Souza (Feijão), foi visivelmente prejudicado em determinados momentos pela má educação de alguns torcedores. Menos mal que venceu a partida.

 

Domingo e segunda, os brasileiros moradores da Vila Madalena foram enormemente perturbados por conterrâneos.

 

Em comum, a falta de educação!

 

No jogo de tênis, menos pela exigência de alto custo para a sua prática e mais pelo necessário silêncio para sua boa execução, a pretensão de massificação fica necessariamente descartada. Embora em grandes partidas sempre há a possibilidade da importação de público não habilitado ao esporte.

 

No bairro da Vila Madalena, tradicional pela vocação artística e pela mistura de residências, lojas, restaurantes e bares, tão defendida por alguns urbanistas que buscam a redução da mobilidade, o tumulto prova, ao menos, que tal modelo urbano não exporta mas importa mobilidade.

 

Para o tênis a sugestão é melhorar o sistema de controle do espectador com câmeras e pessoal treinado.

 

Para a Vila Madalena, as câmeras e a polícia deveriam resolver o problema. O que devemos temer é que a Prefeitura faça o que sempre tem feito. Quando a degradação começa, ao invés de coibir, regulariza.

 

Assim tem sido quando se trata de zoneamento. A nova lei pretendida não só vai regularizar o que foi degradado como criará potenciais zonas em locais que hoje são ilhas de conforto e qualidade de vida. Se duvida, visite a Avenida Morumbi em trechos ainda totalmente residenciais e, principalmente, a Alameda das Begônias. Ambas com proposta de corredor comercial.

 

Talvez tenha sido uma boa esta arruaça carnavalesca da Vila, se servir de alerta à Proposta de Zoneamento que será votada em breve.

 

Carlos Magno Gibrail é mestre em Administração, Organização e Recursos Humanos. Escreve no Blog do Mílton Jung, às quartas-feiras.

 

O vídeo que ilustra este post foi gravado pelo SOSego Vila Madalena. O grupo que incita à violência é o bloco Anti-Acadêmicos do Baixo Pinheiros.

Muros de São Paulo pintados em defesa da natureza

 

Greenpincel de Eduardo Kobra

“Denunciar e combater artisticamente as várias formas de agressão do Homem à natureza”. Assim Eduardo Kobra, artista e grafiteiro, explica o primeiro de uma série de trabalhos que realizará nos muros e paredes da cidade de São Paulo. Na Domingos de Morais, em frente a estação do metrô, no bairro de Vila Mariana, zona sul da capital, o artista de renome internacional inicia a série “Greenpincel” alertando para a matança de baleias.

Na imagem acima, Kobra se distancia para enxergar melhor parte do trabalho que será entregue nessa quinta-feira, dia 17: “É uma obra crua e forte, baseada em uma cena da caça de uma baleia pelo navio Yushin Maru. Todas as tragédias naturais que têm acontecido em nosso planeta mostram que proteger os animais e a natureza como um todo é também uma forma de protegermos o ser humano. Particularmente, sou um apaixonado por plantas e animais. São temas que namoro há muito tempo e, por isso, decidi que já era hora de colocá-los também dentro do meu trabalho como artista”

Foto-ouvinte: Carro ecológico é isso aí

 

Carro Árvore

O proprietário deste carro, sabe-se lá o motivo, tomou uma iniciativa inusitada. Transformou a velha máquina em uma espécie de jardim suspenso, provando que mesmo um automóvel pode ser amigo da natureza – nem que para isso tenha de se jogar a chave fora e dar às plantas o lugar dos passageiros. O veículo está na rua padre João Gonçalves, no bairro da Vila Madalena, zona oeste de São Paulo e o flagrante foi feito pelo ouvinte-internauta Wagner Homem.

Canto da Cátia: Pequeno conto na sala abandonada

 

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O conjunto foi comprado em 36 vezes na loja popular do bairro e combinava com a decoração simples da casa pequena da Vila Madalena. Antes de as prestações acabarem, acabou o estofado. Pegou sol, perdeu a cor, desbotou. Para receber as visitas não servia mais. Que fim vou dar ? – perguntou conçando a cabeça. Tinha pena de se desfazer dele, lembrava o namoro novo consumado no menorzinho. Na salinha dos cacarecos nem lugar mais havia. Ouviu no rádio que jogar na calçada atrapalha os pedestres e se a prefeitura pegar, vai multa. Viu a caçamba na Aspicuelta e a confundiu com coração de mãe, onde além do entulho, do resto da obra, da terra revirada, sempre cabe mais alguma coisa. E lá deixou com dó no peito e sem-vergonha na cara, as duas peças decorando a caixa de ferro.

Pequena história prá ilustrar flagrante feito pela repórter Cátia Toffoletto na manhã de quinta-feira. Se gostou – do estofado – corre lá que talvez ainda dê para salvar

Conte Sua História: A bicicleta que fez amigos

 

Entrevista_04

Com um bicicleta, o menino Floriano Pesaro deixava as casas elegantes do bairro dos Jardins para pedalar entre os amigos que viviam na Vila Madalena. E foi assim que construiu amizades em sua infância, conforme depoimento que gravou com a equipe do Museu da Pessoa durante programa especial do CBN SP em homenagem aos 456 anos de São Paulo. Pesaro é vereador na capital paulista pelo PSDB e foi secretário municipal da Assistência Social durante a gestão de José Serra/Gilberto Kassab:

Ouça o texto gravado por Floriano Pesaro e sonorizado por Cláudio Antônio

Você pode participar do Conte Sua História de São Paulo gravando seu depoimento na sede do Museu da Pessoa. Agende uma entrevista pelo telefone 011 2144-7150 ou acesse o site do Museu. O programa Conte Sua História de São Paulo vai ao ar, sábados, logo após às 10 e meia da manhã, no CBN SP.

Foto-ouvinte: Buraco da Girassol

 

Buraco na Girassol

Um buraco não é apenas mais um buraco quando fotografado e analisado pelo ouvinte-internauta Tavinho Costa. Este que você vê aí em cima é na rua Girassol, na Vila Madalena, zona oeste, aberto pela segunda vez em um mês, resultado de vazamento mal resolvido. Antes de reclamar do pobre coitado, Tavinho ajusta sua câmera e o registra com uma plasticidade singular, talvez como agradecimento ao benefício que o rombo no asfalto trouxe para pedestres e crianças: “os carros passam por esta ladeira como se fosse pista de corrida; com o buraco e os cones, os motoristas diminuem a velocidade, e nós nos sentimentos mais seguros”.