Coisas de Estocolmo*
Eram cinco e meia da tarde quando deixamos a comunidade de Danderyd, no subúrbio de Estocolmo, e a noite já começara naquela região da Suécia. De agora em diante isto ocorrerá cada vez mais cedo até o fim do inverno. Perguntei ao jornalista russo Pavel Prokhorov, de São Petesburgo, o que achara da conversa que havíamos mantido durante uma hora e meia com um dos moradores do vilarejo de 50 casas que integram programa experimental de aquecimento solar e geração de energia: “Um pouco exótico de mais”, respondeu em inglês.
Exótico pode ser traduzido por estranho, termo que caberia à experiência que tivéramos oportunidade de conhecer. Mais ainda ao homem que nos deu as boas vindas e apresentou o trabalho desenvolvido desde 2002 naquela vila de Enebuberg. Um senhor de quase 70 anos, alto e forte, capaz de caminhar com rapidez apesar de ter de arrastar uma das pernas que quebrou há pouco tempo.

Em lugar da apresentação projetada do computador, Stig Rahm usou folhas tamanho A4 coladas na parede da casa para nos explicar o sistema de aquecimento Anneberg ou como coletar e estocar energia solar para aquecimento durante os dias frios, na Suécia – que são maioria em uma escala anual.
Mesmo com os quatro graus centígrados daquele fim de tarde, ele fez questão de passear com o grupo de jornalistas que o ouvia do escritório, onde administra a comunidade, até a casa dele.
À esquerda de quem entra na porta principal há uma grande sala dividida em dois ambientes, com um laptop sobre a mesa, um televisor, móveis, muitos livros e brinquedos espalhados. À direita, uma cozinha de tamanho médio e confortável, onde um rádio está ligado. No lado oposto da porta, o banheiro. O pé direito da casa é alto, e nos permite ver que na parte de cima há espaço para dois quartos, pelo menos.
Stig abriu uma pequena porta na parede do banheiro e afastou casacos que estavam na dispensa para nos mostrar os equipamentos que têm dentro de casa, capazes de aquecer a água que consome, a partir de um sistema de coleta de energia solar com 52 placas que cobrem todo o telhado. O emaranhado de canos que passa pelas paredes e piso não é visível e só se pode entender melhor seu funcionamento após conferir a tela de um computador que registra 26 graus centígrados. Esta é a temperatura da água que passa pelos canos, naquele momento. No mesmo programa é possível ver que, ao deixar a casa, houve perda de apenas 2 graus na temperatura da água, em uma demonstraçõo de eficiência.
E para alcançar este resultado houve mudanças na forma de consumo de cada um dos moradores da vila, e equipamentos foram escolhidos cuidadosamente para manter o calor, seja com a colocação de vidros duplos nas portas e janelas, seja no tipo do piso escolhido para as moradias. Os eletrônicos só entram nas casas se atenderem normas rígidas que privilegiam o baixo consumo de energia.
O sistema de aquecimento não funciona de maneira isolada. Há, também, preocupação em conter a água da chuva para reaproveitamento, separação do material reciclado, entre outras ações que visam a redução do consumo de água e energia. Mais de 60% do aquecimento anual é suportado pelo sistema, não sendo suficiente, portanto, para sobreviver todo o inverno, o que exige a manutenção de força elétrica usada com moderação, ressalta o simpático sueco.
O visual de Stig Rahm, a maneira como ele se esforça para que possamos entender a lógica da coisa e, principalmente, a sinceridade que usa em suas avaliações confirmam um dos lemas dos moradores que acreditaram nesta experiência: “Simplicidade no desenho é preferível em lugar do perfeccionismo”, era o que estava escrito em uma das “telas” do “powerpoint” improvisado.
A valorização dos imóveis nos últimos anos demonstra que os moradores estão trilhando um caminho que extrapola a imagem exótica que nosso preconceito registrou. Casas compradas a 1,9 milhão de coroas suecas – que trocados por reais significam 570 mil – hoje estão à venda por 4 milhões de coroas suecas – R$ 1,2 milhão.
O mais surpreendente, contudo, é que mesmo moradores dispostos a algumas “privações” em defesa do meio ambiente são tentados a manter não apenas um, mas dois carros na garagem e belos carros, por sinal. Provavelmente comprados com o dinheiro que economizaram ao reduzir o consumo de energia elétrica e água.
Nesta semana, apresento neste blog algumas histórias registradas na viagem a Estocolmo com um grupo de jornalistas estrangeiros convidados pelo governo da Suécia a conhecerem tecnologia ambiental.
Casa de R$ 1,2 milhão! Pelo jeito defender o meio ambiente é só para ricos.
No meu cafofo nem tem como.
Qual seria o custo de uma casa dessas com os preços do Brasil? Se é que já se produz equipamentos necessários para se construir uma casa assim.
Caro Jornalista Mílton Jung,
Não importa o lugar. É importante instalar coletores solares para economizar a eletricidade que usamos no aquecimento de água.
Se lá na Suécia, que é um lugar sabidamente frio, o sistema funciona mesmo com sol fraco, que há de acontecer aqui no Brasil?
E não temos sistemas feitos com garrafas PET? Que custam baratinho?
Acho que somos um país de trouxas em gastar energia com o chuveiro elétrico e aquecimento a gás boliviano…
Um Abraço!
Venessa,
A renda “per capta” do sueco está próximo dos US$ 40mil, ou seja, talvez 10 vêzes à mais que a do brasileiro.
Valendo a proporcionalidade, talvez no máximo, R$ 150 mil.
Paulo T Watanabe
Como gostaria de acordar e ver você Milton, colocar no blog um fato igual a esse, não de outro País e sim do Brasil… Quando isto vai acontecer… Ai meu Deus…. Por que será que aqui é diferente…