Por Maria Lucia Solla

A gente nunca sabe onde termina a ficção e começa a realidade, ou vice-versa. É a tal da zona cinzenta; mas onde tem rumor tem qualquer coisa que rime com ele, de horror e humor a amor. Então entra comigo na zona, e vamos deixar que a ficção nos ajude a ver melhor a realidade que nos cerca. Refletir faz bem.
Xiquinha, finalmente recolhida por uma ambulância, vítima de colisão entre a esperança e a lambança, sofre, sofre, geme, pede a Deus que lhe dê alento e que resgate o seu talento para se manter viva e respirando. Passam-se horas até que a providência divina, ocupadíssima que anda nestes tempos conturbados, dá um jeito na Logística e desvia uns dois ou três anjos para dar conta do recado. Nada de místico no babado.
Xiquinha vive na Sociedade do Eu Primeiro, onde a Lei Divina que se oferece para orquestrar a sociedade perdeu o lugar para a Planilha do Excel, o Grande Irmão de rabo escondido pelo camisolão, que foi criado para servir o homem, – como diria o Tufão da novela das nove, para servir a Humanidade: homem, mulher, criança, cachorro… e acabou sugando, porém, a sua seiva, gota a gota.
Faz um teste, pega o fio de qualquer situação difícil na tua vida, que envolva outros da tua espécie, e vê aonde vai dar. Na Planilha do Excel. Mas volto ao caso da Xiquinha, que é resgatada. Está pobre de Saúde. Seu caso é grave, talvez gravíssimo. Prende o pescoço, faz alavanca nas costas. Agora, levanta com cuidado. Tem plano de saúde, perguntam vozes desconhecidas. Sim, balbucia entre um e outro ai. Para onde você quer ir, perguntou amorosamente uma voz conhecida e que a acalmava. O caso dela não é para ir aonde ela quer, é para ir ao hospital mais próximo. Decisão tomada, lá foi ela, acompanhada por dores e temores. No hospital, foi encaixada num espaço no corredor, onde havia outros seres que também precisavam de socorro e que gemiam e choravam. Onde está o médico? Cadê o pobre coitado que tem como objetivo cuidar dos seus semelhantes na hora da precisão? Correndo feito louco entre uma cabine e outra, diagnosticando a granel, ouvindo lamentos e, Xica me disse, parecia bem intencionado. Era gentil, tinha a compaixào sadia e malhada. Você teve sorte senhorita Xica, poderia ter ficado para sempre numa cadeira de rodas. Tome estes remédios para sentir menos dor. São remédios hospitalares. Procure se mexer o mínimo possível, mantenha este colar cevical por ao menos um mês. E sabe o quê? Deu alta imediata a Xica, depois de analisar as radiografias.
Por que teria ele dispensado Xica assim, com tanta pressa? O que o teria impedido de abrigá-la no hospital onde houvesse quem a ajudasse e lhe aplicasse a medicação? Como é que ela iria se alimentar, se vestir, tomar banho, ir ao banheiro? Afinal paga regiamente pelo socorro de um plano de saúde e já estivera internada no mesmo hospital, por quase uma semana e fora muito bem atendida. Certamente o plano de saúde tinha ressarcido o hospital pelos gastos comigo. Isso já acontecera outras vezes, em outros hospital. O hospital mudara de nome. Teria também mudado os seus objetivos?
Dias depois, Xica descobriu que o plano de saúde dela tinha comprado o hospital; e chorou.
Maria Lucia Solla é professora, realiza oficinas de Desenvolvimento do Pensamento Criativo e de Arte e Criação. Aos domingos escreve no Blog do Mílton Jung
Pobre da Xica! E pobre Brasil! Onde até medicamentos temos que buscar na Justiça! Bjs Maryur
Maryur,
Justiça? Lembro de algo assim, mas faz tempo!
Triste. Muito triste.
Obrigada pela companhia,
AMIGA MARIA LUCIA,
BOA NOITE.
PLANO DE SAÚDE DEVERIA SER EXPLICADO A QUALQUER CIDADÃO QUE JUNTO COM SEU SALÁRIO,DEVERIAMOS POUPAR UM POUCO PARA QUANDO FOSSEMOS USÁ-LO,NÃO SERIA PROBLEMA.
INFELIZMENTE PAÍS SEM EDUCAÇÃO,É PAÍS SEM AÚDE
ABRAÇO
FARININHA.
Farina, é verdade!
Educação que deve ser tão flexível e mutante quanto é a nossa vida.
Nossa educação, em grande parte, está engessada e por isso vai quebrando aqui e ali e fica craquelada. É aí que a gente cai. Mas a gente é jovem, a gente aprende, como diz o pai da Suiang.
Beijo,