Por Olga Pereira
Meu pai era vendedor de bilhetes de loteria federal. Toda manhã ele pulava da cama cedo, Fazia café para os filhos. Engraxava os sapatos. Escovava o terno e o chapéu. Jamais esquecia da gravata. E saía para vender os bilhetes. Antes, ainda passava em uma igreja e assistia à missa. Sua freguesia era nos jardins América, Europa e Paulistano.
Meu pai era português – veio muito menino -, e minha mãe brasileira. casaram, tiveram quinze filhos e criaram treze; viveram 57 anos juntos em São Paulo e em algumas cidades do interior. Nos educaram muito bem. Nos deixaram como herança a honestidade, a responsabilidade e o trabalho. Foi assim que ele conseguiu ter uma vida digna na cidade.
Em janeiro de 1969 – não lembro bem o dia, sei que era um sábado – ele saiu como de costume para vender seus bilhetes. Já tinha bastante idade e seu ponto era na Augusta. Ali tinha vários clientes, um deles o radialista Miguel Vaccaro Neto.
No fim do sábado, a pedido do próprio Miguel, meu pai sempre passava na Galeria Ouro Fino e vendia a ele os bilhetes que haviam sobrado. Foi que naquele dia meu pai não encontrou o Miguel. Tentou deixar o bilhete com o barbeiro da galeria, mas ele não aceitou para não ter de assumir a responsabilidade de pagá-los, afinal o Miguel não havia dito nada ao barbeiro.
Meu pai voltou para casa e com ele ficaram um bilhete inteiro e mais alguns redações que não conseguido vender.
Às seis da tarde, ao conferir pelo rádio os números sorteados, ele descobriu que um dos números que estavam encalhados em sua mão havia saído no primeiro prêmio: 25 mil cruzeiros. Um bom dinheiro naquela época, que lhe garantiu uma velhice mais tranquila ao lado de minha mãe.
Este texto foi publicado no livro Conte Sua História de São Paulo (Editora Globo)