Avalanche Tricolor: “o bicho é bom!”

Grêmio 1×0 Brasil de Pelotas

Gaúcho – Arena Grêmio, Porto Alegre/RS

Suárez cercado pelos marcadores em foto de Lucas Uebel/GrêmioFBPA

Um jogo inteiro jogado se fez necessário para que os quase 30 mil torcedores que foram à Arena, no fim da noite de quarta-feira, tivessem a oportunidade de explodir em festa com o gol de Luis Suárez. Até aquele instante de felicidade, assistíamos à uma partida truncada, catimbada e violenta. Enquanto o adversário tinha como única intenção impedir que o futebol se realizasse, o Grêmio tentava, com paciência e pouco repertório, impor a sua superioridade. 

Ao longo dos 90 minutos —- usar o tempo de jogo é apenas força do hábito, porque com tantas paralisações, sequer os 12 minutos de acréscimo no segundo tempo devem ter sido suficientes para completar a hora e meia regulamentar —-, o Grêmio era mais esforço do que entrosamento, o que se justifica diante da necessidade de o técnico reconstruir a equipe. Nem todo o esforço, porém, tornava o gol mais próximo.

Aos torcedores restava-nos, mais uma vez, esperar pela bola fatal, aquela que seria entregue a Suárez para que ele resolvesse, como já havia feito no fim de semana, em Caxias do Sul. Mas como fazer a bola chegar até ele, se o atacante uruguaio estava cercado por marcadores? Tentou-se de diversas formas e sem muito sucesso. 

Às vezes, Suárez deixava a área em busca dos companheiros, mas por enquanto, ele dança milonga e os colegas vanerão. Os passos não estão suficientemente coordenados. A tabela não sai com a precisão que a retranca adversária exige. Restava ao atacante lamentar a falta de entrosamento. Para ter ideia da dificuldade gremista de chegar ao gol, até o gol propriamente feito, Kannemann era quem mais havia finalizado, graças a cabeceios sem muita direção, em lances de escanteio.

O primeiro tempo já havia ido embora —- em meio a um entrevero envolvendo Suárez e Piton, o goleiro adversário —, e o segundo recém estava de volta, quando uma falta dura ainda na nossa defesa, resultou em cartão vermelho e expulsão, deixando o Grêmio com vantagem numérica em campo. Nem isso foi suficiente para mudar a cara da partida.

Das muitas tentativas de trocas na equipe — as cinco substituições foram feitas —, a presença do estreante argentino Franco Cristaldo foi a que mais fez diferença, dando um outro ritmo para o nosso ataque. O meio de campo ganhou talento, o passe melhorou e a velocidade aumentou. Mas nada de o gol sair.

Nas arquibancadas, o incômodo se expressava em reclamações e vaias ensaiadas contra um ou outro jogador. A maioria de nós, porém, ainda estávamos a espera do lance genial. O problema é que o cronômetro seguia correndo contra nossas pretensões e o jogo parando diante da nossa indignação. Temíamos que o prazo de validade de Suárez fosse expirar antes do fim. 

Com as dificuldades impostas, o atacante que demonstra um comprometimento contagiante com o time, desta vez, seria mantido até o apito final. E com isso nossa esperança se estendia mesmo com a partida quase se encerrando. 

Os acréscimos começariam a ser contados no relógio do árbitro quando Bruno Alves, nosso zagueiro, fazendo às vezes de meio-campo, lançou para Ferreirinha que entrava pelo lado esquerdo da área. O ponteiro foi um dos jogadores mais acionados na partida e quase havia marcado um gol um pouco antes. Desta vez, em lugar de chutar direto, depois de vencer com velocidade o marcador, passou para Suárez.

O tempo, então, parou!

E fomos recompensados àquela hora da noite. Tivemos o privilégio de  apreciar o que estaria por vir. O que aconteceu naquele pequeno espaço de grama, dentro da pequena área adversária, com marcadores por todos os lados e o goleiro quase aos pés de Suárez, foi esplêndido. Ele dominou a bola e tabelou com ele próprio, trocando a bola de pés, duas vezes, e impedindo com o corpo o assédio dos adversários. Com uma barreira de homens à sua frente, ele recorreu ao bico da chuteira para elevar a bola o mínimo possível para escapar das mãos do goleiro, o máximo necessário para não se chocar contra o travessão. 

O estufar da rede acionou o botão euforia na Arena — aqui onde eu estava, também — e ofereceu aos torcedores o prazer que somente os craques são capazes de saciar. Uma alegria muito além da importância do jogo, do resultado e da competição. Que se expressava como êxtase pela presença de um dos gigantes do futebol mundial que agora é o dono da camisa 9 do Grêmio.

Adjetivos não faltariam para definir o que representa Suárez para os gremistas. Poderíamos explorar as hipérboles da língua portuguesa para descrever o sentimento de assistir à Suárez em campo. Quis, porém, a ironia que o destino oferecesse a uma das vítimas do atacante e protagonista do antijogo que imperava na Arena a oportunidade de melhor descrever, naquele instante, o fenômeno Suárez: : “o bicho é bom mesmo!”, disse o goleiro Marcelo Pitol, do Brasil de Pelotas.

É muito bom! E é do Grêmio!!!

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