Palmada neles !

 

Por Milton Ferretti Jung

A bancada evangélica, oportunamente, pressionou e a Câmara dos Deputados comunicou, nessa terça-feira, o adiamento da votação do projeto de lei que proíbe aplicação de palmadas ou castigos físicos em crianças e adolescentes. Trata-se da Lei da Palmada, que seria votada em comissão especial da Casa. Tal lei pode transformar professores, médicos, funcionários públicos e sei lá quem mais em alcaguetes. Basta que, se souberem ou suspeitarem de agressões ou tratamento degradante, inclusive xingamentos, deixem de denunciar esses crimes às autoridades. Quem infringir a Lei da Palmada será multado em 20 salários mínimos.Vejo-a como mais um dos tantos exageros cometidos pelos nossos “criativos” legisladores. Teresa Surita (PMDB-RR), relatora do projeto, declarou textualmente que “na educação de crianças e adolescentes, nem suaves ‘palmadinhas’, nem beliscões, nem xingamentos, nem qualquer forma de agressão, tenha ela a natureza e a intensidade que tiver, pode ser admitida.

Como a maioria dos da minha geração (nasci em 1935) e das que me sucederam, fui criado com admoestações dos meus pais, levei palmadinhas de minha mãe, etc., mas nem por isso me senti vítima de tratamento cruel ou degradante. Vai ver que eu desconhecia possuir “direitos humanos”. A Lei, com os seus exageros, não leva em conta que a maioria das famílias sabe o que é necessário fazer para educar seus filhos, sem precisar que isso seja determinado por parlamentares que, em alguns ou, quem sabe, muitos casos, não dão bons exemplos à sociedade. Seria por culpa dos seus pais? Duvido. É evidente que existem pais despreparados, cruéis, pedófilos, viciados. Nenhuma lei fará, porém, que essa gente vire pessoa de bem.

Estou concluindo este texto às primeiras horas de quarta-feira. Constava na notícia que li sobre a pressão dos evangélicos para o adiamento da votação que, hoje ainda, o projeto da Lei da Palmada voltará a ser debatido. Que Deus ilumine deputados de todas as religiões a votarem com muito cuidado esta lei que, ao invés de beneficiar, poderá prejudicar as famílias.

N.B: O Projeto de Lei (PL) 7.672/10, do Executivo, foi aprovado quarta-feira (14) pela comissão especial criada para sua análise na Câmara dos Deputados. O texto daquela que já é conhecida como Lei da Palmada segue agora para o Senado, exceto se houver recurso no plenário.

Milton Ferretti Jung é jornalista, radialista e meu pai. Às quintas, escreve no Blog do Mílton Jung (o filho dele, que, apesar de ter feito por merecer, jamais levou palmadas do pai)

A necessária redução da Câmara dos Deputados (Réplica)

 

Por Antonio Augusto Mayer dos Santos

De início, não obstante o reconhecimento ao site Transparência e seus dedicados colaboradores, em especial ao jornalista contestante, algumas considerações lançadas ao texto “A necessária redistribuição de vagas na Câmara dos Deputados” revelam-se no mínimo divorciadas, senão distorcidas acerca da efetiva realidade da Câmara dos Deputados, eis que por exemplo, é sabido que grande parte dos assessores dos Deputados Federais não residem e tampouco são oriundos dos Estados dos mesmos. Depois, alegações respeitáveis mas periféricas tais como “deputado mais conhecidos” ou “usina de corrupção” estão desviadas do contexto proposto, qual seja: a causa. Assim, embora óbvio, necessário ressaltar que a abordagem proposta incidiu sobre a redução da Câmara dos Deputados e não na análise de problemas relacionados a outras origens, tais como o sistema eleitoral e atos interna corporis.

Vamos ao mérito.

A Câmara dos Deputados não precisa ser menor; o que a instituição precisa é ser mais forte e mais representativa. E um dos meios de se alcançar esse fortalecimento tem relação sim com o número de vagas, mas não com o numero total. Explico: o que está disfuncional na Câmara é o número de deputado por estado.

A partir da honrosa contestação, é de ser reiterada, com entusiasmo, a assertiva de que a Câmara dos Deputados precisa ser menor para poder sobreviver, redimensionar o seu papel institucional e justificar sua utilidade. Matéria do site http://www.congressoemfoco.ig. com.br desta semana passada dá conta de parlamentares desiludidos com a Casa Legislativa e não concorrendo à reeleição invocando, dentre outras razões, o seu gigantismo e ineficiência. Até porque, força e representação são fenômenos que decorrem da altivez dos titulares e da eleição disputada, respectivamente. Portanto, são situações distintas com efeitos autônomos.

O autor do texto cita Espanha e Portugal, mas se esquece da França, que tem um terço da população brasileira mas conta com 64 deputados a mais

Não foi esquecimento. Ao contrário: foi algo rigorosamente proposital e motivado por uma razão bastante elementar no contexto proposto: é que o mandato dos integrantes da Assemblée Nationale é de 5 (CINCO) anos, enquanto que o texto contestado pelo Sr. Fabiano Angélico objetivou confrontar a Câmara dos Deputados do Brasil com seus similares internacionais cujos mandatos também sejam de 4 (QUATRO) anos. Bem simples. Logo, não se trata de nenhum esquecimento, ao menos por parte deste modesto analista.

Infelizmente, não obteve êxito a iniciativa do Tribunal Superior Eleitoral em redistribuir o número de cadeiras na Câmara dos Deputados considerando-se a população de cada estado.

Primeiro, que felizmente não obteve êxito. Segundo, que é conveniente esclarecer que a iniciativa não partiu do TSE, mas da Assembléia Legislativa do Amazonas. O TSE apenas polemizou fatos. Menos mal que em audiência pública prevaleceu a razão. Terceiro, que em vista da composição numérica vigente, face à sua insuperável limitação imposta pelo art. 45 da Constituição Federal, em nada, absolutamente nada, haveria de alteração quanto ao NÚMERO de deputados. O TSE, sob duvidosa constitucionalidade, apenas executaria uma pálida REDISTRIBUIÇÃO de cadeiras – aliás, tão equivocada quanto à vigente. O que haveria ante o decantado senso do IBGE seria uma mera oscilação a cada pleito geral, uma alteração ou verdadeiro rodízio de cadeiras a cada eleição, em nítido e deplorável fomento da INSEGURANÇA JURÍDICA. Quarto, que com a pretensa providência, o TSE não resolveria problema algum, antes pelo contrário, desencadearia lamúrias e inconformidades pelos quatro anos da legislatura.

Ante tais considerações e face à miopia da digna contestação neste ponto, reafirmo convicto: não é o número de integrantes de um parlamento que lhe confere respeitabilidade ou prestígio. A rigor, cogita-se o contrário. Tanto que o parlamento mais numeroso das democracias ocidentais aprovou a “Convocação de uma Comissão de Reforma sobre o Tamanho da Câmara Federal Alemã”.

Contudo, na contramão da autocrítica alemã, que reduziu a sua Câmara, o Brasil, a contar do período pós-redemocratização, tem registrado um aumento anacrônico na composição da sua Câmara dos Deputados. Esta é a explicação que pende. Na eleição de 1982, a primeira após a revogação do Ato Institucional Nº 2 e do ressurgimento do multipartidarismo, foram eleitos 479 Deputados Federais. Para o pleito de 1986, eleição da Constituinte, o número passou para 487, atingiu 495 em 1990, 503 em 1994 e 513 a partir de 1998. Injustificável.

Indaga-se: Qual a explicação para isto? Onde está a razoabilidade para esta evolução ao longo das legislaturas? A sua manutenção, consoante se depreende a partir da resposta “A necessária redistribuição de vagas na Câmara dos Deputados”, é então, digna e merece ser encarada com absoluta naturalidade?

Redistribuir as cadeiras como pretendia o TSE significa contornar o problema, senão agravá-lo, eis que o crescimento numérico da Câmara a partir da redemocratização pós-1946 é expressivo, conforme o quadro a seguir:

quadro deputados

São para estes números concretos e insofismáveis que a sociedade exige resposta. A Câmara dos Deputados precisa ser menor e ter menos integrantes seja para facilitar a sua fiscalização, seja para o acompanhamento de sua parca produtividade, salvo se no seu formato vigente existe alguma fiscalização eficiente a qual desconhecemos. Precisa ser menor porque sob o seu formato atual, ela é reconhecidamente inoperante, onerosa, improdutiva, desacreditada, subserviente a Governos e mal freqüentada.

Chega de fetiches e eufemismos.
Menor será melhor.

Antônio Augusto Mayer dos Santos é advogado especialista em direito eleitoral e autor do livro “Reforma Política – inércia e controvérsias” (Editora Age). Às segundas, escreve no Blog do Mílton Jung.

Leia, também, “A necessária redução da Câmara dos Deputados”, de Antonio Augusto Mayer dos Santos, publicado em 22.03.10

E, ainda, “A necessária redistribuição de vagas na Câmara”, de Fabiano Angélico, publicado em 23.03.10


A necessária redistribuição de vagas na Câmara

 

Por Fabiano Angélico

Em artigo publicado no blog do Milton nesta segunda-feira, o advogado Antonio Augusto Mayer dos Santos defende a redução da Câmara dos Deputados. O argumento é de que a ineficiência “impõe” a diminuição do número de vagas. Para defender sua tese, o autor do artigo cita outros países, que teriam menos parlamentares do que o Brasil.

Permita-me discordar, doutor.

O autor do texto cita Espanha e Portugal, mas se esquece da França, que tem um terço da população brasileira mas conta com 64 deputados a mais.

Os problemas relativos a ineficiência e corrupção na Câmara dos Deputados brasileira não estão na quantidade de parlamentares, mas sim processos internos, que são arbitrários e pouco transparentes. Se houver a redução do número de vagas sem as necessárias alterações nos processos, tudo ficará como está.

Exemplo de arbitrariedade que leva à ineficiência e à corrupção: o excesso do número de cargos de confiança à disposição de cada deputado federal.
Num estudo comparativo (leia aqui) coordenado por este que vos escreve e publicado pela Transparência Brasil, observa-se que são 25 os “assessores” que cada deputado federal brasileiro pode contratar.

Nesse quesito, não há qualquer similaridade no mundo. No Chile, o número de assessores não pode ultrapassar 12. Na França, cada deputado pode ter no máximo 5 assessores.
Com tal quantidade de cargos para distribuir, os parlamentares brasileiros em geral contratam apaniguados, que na verdade são cabos eleitorais. Eles têm a única função de falar bem do chefe junto às bases eleitorais.

Além de ser uma usina de corrupção (esses “assessores” são usualmente os “fazedores” das malfeitorias; quando descobertas, essas malfeitorias são sempre atribuídas ao “assessor” — os chefes nunca sabem de nada), o trabalho desses “assessores” detona a idéia de eleições livres e justas.

É que na corrida eleitoral, o deputado que está no exercício do cargo nos últimos quatro anos obviamente é muito mais conhecido do que os seus adversários que não estão em um cargo de visibilidade. Assim, o eventual cidadão que quer entrar na política precisará de muito, mas muito dinheiro para divulgar sua candidatura e se equiparar ao nível de conhecimento desfrutado pelo deputado em exercício.

Limitar o número de cargos de confiança é o tipo da coisa que deve ser implementada se buscamos um Parlamento mais eficiente e menos corrupto. Diminuir o número de deputados sem alterar esse tipo de processo não afetará o funcionamento da Casa.

“Um homem, um voto”

A Câmara dos Deputados não precisa ser menor; o que a instituição precisa é ser mais forte e mais representativa. E um dos meios de se alcançar esse fortalecimento tem relação sim com o número de vagas, mas não com o numero total. Explico: o que está disfuncional na Câmara é o número de deputado por estado.

Se o Senado existe para representar igualmente todos os estados (são 3 parlamentares por Unidade da Federação, não importando o tamanho da população de cada ente federativo), a Câmara dos Deputados existe para representar a diversidade da sociedade brasileira.Tabela Um Homem, um voto

Mas isso, na prática, não acontece: há uma representação exagerada de alguns estados e uma subrepresentação de outros. Exemplos: cada deputado federal de Roraima representa 52 mil pessoas de seu estado; e o deputado amapaense, 78 mil. Por outro lado, o parlamentar paulista representa 591 mil pessoas; e o cearense, 388 mil.

Levando-se em conta a contagem populacional do IBGE para 2009, somos 191 milhões de brasileiros. Assim, cada um dos 513 deputados federais representa 373 mil brasileiros.
Aplicando-se essa relação a cada unidade da federação, conclui-se que 5 estados — Amazonas, Ceará, Minas Gerais, Pará e São Paulo — deveriam ter mais deputados do que têm hoje. Por outro lado, 18 estados deveriam ter menos deputados do que têm atualmente. Assim, são apenas 4 os estados que têm uma representação adequada na Câmara dos Deputados.

No quadro acima, está expresso o número de deputados que cada Unidade da Federação deveria ter, se respeitássemos a idéia de “um homem, um voto”, noção extremamente importante numa democracia.

Infelizmente, não obteve êxito a iniciativa do Tribunal Superior Eleitoral em redistribuir o número de cadeiras na Câmara dos Deputados considerando-se a população de cada estado. Mas o Censo do IBGE vem aí. No próximo ano, teremos uma idéia mais exata da população de cada estado brasileiro. Será uma boa oportunidade para resgatarmos a discussão sobre a noção de representatividade na Câmara dos Deputados, com o intuito de fortalecê-la — e não de reduzi-la.

Fabiano Angélico é coordenador de Projetos da Transparência Brasil, especialista em Transparência e Combate à Corrupção pela Universidade do Chile e mestrando em Administração Pública e Governo pela Fundação Getúlio Vargas


Leia aqui o texto de Antonio Augusto Mayer dos Santos, publicado segunda-feira sob o título “A necessária redução da Câmara dos Deputados”

A necessária redução da Câmara dos Deputados

 

Por Antonio Augusto Mayer dos Santos

Recentemente, o Tribunal Superior Eleitoral ensaiou redistribuir as cadeiras da Câmara dos Deputados em vista do pleito que se aproxima. Todavia, esbarrou no que seria uma vitória de Pirro: ante a rigidez legal no número de Deputados Federais, a subtração de alguns destes em relação a um Estado em 2010 significaria a necessidade de rever tal número em 2014 para, talvez, reconstituir o número original e assim sucessivamente.

O excesso vigente decorre da Constituição Federal. Aliás, no Brasil até a qualidade do papel higiênico passa pela Constituição. De fato, tramitam no Congresso Nacional propostas estabelecendo a redução da atual composição da Câmara dos Deputados. Para justificar o necessário enxugamento, os argumentos são diversos e convincentes: inoperância pelo excesso de parlamentares, elevado custo público de sua manutenção, sucessão de escândalos nas legislaturas, apresentação de projetos inúteis, bizarros ou impossíveis, produção legislativa escassa ou irrelevante. Por outras palavras: é a própria ineficiência da estrutura impondo a sua diminuição.

No aspecto prático, em termos numéricos, as PECs propõem 380, 450, 342 e uma última, mais drástica e sob convincente Justificação, reduz a atual composição de 513 para 250 parlamentares, ou seja, praticamente à metade (número ideal). Antes, em 1995, uma Comissão Especial do TSE sugeriu o funcionamento da Casa com 400 integrantes. No Senado Federal, o paranaense Álvaro Dias reapresentou Projeto restringindo em 405 o número de Deputados Federais.

Mais do que inadiável, a cogitada redução traduz, simultaneamente, um anseio nacional e uma ação racional na medida que elimina um expressivo custo público cujo retorno tem se revelado frustrante. Ademais, certamente não é o número de integrantes de uma casa parlamentar que lhe confere respeitabilidade ou prestígio; a rigor, cogita-se o contrário, especialmente se levarmos em conta o nível intelectual e produtivo das últimas legislaturas, descontadas as necessárias e reconhecidas exceções.

No entanto, na habitual contramão da autocrítica, o Brasil, a contar do período pós-redemocratização para cá, tem registrado um aumento anacrônico na composição da sua Câmara dos Deputados. Passou-se, de 1982 para cá, de 479 Deputados Federais para os atuais 513.

A propósito de outras Câmaras cujos mandatos também são de quatro anos, Portugal elege 230 Deputados Federais, Espanha 350 e Colômbia 199. Nem mesmo aspectos geográficos ou econômicos sustentam a absurda composição numérica vigente no Brasil. Para exemplificar, basta citar que os EUA, cuja população é 60% maior, apresenta uma Câmara dos Deputados com 435 Representantes e apenas uma reeleição subseqüente é permitida. Já a Índia, quatro vezes mais populosa que o Brasil, tem uma Câmara integrada por 545 Deputados.

Em síntese: não há argumento idôneo que justifique a atual composição, fruto de um corporativismo oneroso e tupiniquim.

Antônio Augusto Mayer dos Santos é advogado especialista em direito eleitoral e autor do livro “Reforma Política – inércia e controvérsias” (Editora Age). Às segundas, escreve no Blog do Mílton Jung.