Coisa rara quando estou no Brasil é assistir ao futebol em estádio. Houve época em que não saía de dentro de um, hoje tento ficar o mais distante possível. Aqui na Copa, porém, é inevitável o desejo de conhecer ao menos um desses gigantes construídos para os jogos.
Em Cidade do Cabo, a atração é o Green Point, construído no lado mais rico, próximo do mar, com vista para a Table Montain e a 15 minutos a pé de Victoria & Alfred Waterfront, onde se encontram turistas e compras.
Com ingresso em mãos e a oportunidade de ver a campeã do mundo na estreia, o frio e a chuva não seriam barreira para a caminhada do hotel até o estádio. Pelo movimento nas calçadas, muita gente aderiu ao “até a pé nos iremos”, talvez convencidos de que o carro não é a melhor alternativa.
A quantidade de policiais era enorme, reflexo do protesto dos trabalhadores revoltados com os baixos salários que estão sendo pagos. Os agentes privados de segurança fizeram greve no dia da partida, mas pouca coisa mudou no atendimento ao torcedor – há muitos voluntários atuando, também. Foi um deles que me indicou o caminho para a primeira linha de controle, um portão estreito no qual a sacola e você são rapidamente revistados.
Para chegar ao assento número 49, fila 5, no quarto andar, contei com a ajuda de outro voluntário. E não é que meu lugar estava lá, reservado, apesar de ter chegado 20 minutos antes do jogo se iniciar? E que belo lugar. A concepção de Arena multiuso, sonho recente de todos os clubes brasileiros, fica evidente quando você olha o gramado. Tudo parece muito próximo, apesar da distância, beneficiado que somos pela iluminação.
O Green Point é visivelmente italiano dada a êxtase que toma conta do estádio durante a execução do hino. Os paraguaios, apesar de estarem em minoria, tentavam ganhar espaço no grito, mas, infelizmente, o efeito vuvuzela acabou com a cantoria nos estádios. As músicas que embalaram os jogos de copas anteriores desaparecem com o irritante som das cornetas que só silenciaram quando o locutor oficial pediu respeito durante o hino.
O sistema de som anima a torcida quando anuncia a escalação dos times, e tudo é acompanhado em dois telões com a imagem do jogador. Estes telões reproduzem as imagens que você vê na televisão, mas com censura. Os lances polêmicos são tirados do ar e o cronômetro desaparece assim que se aproxima o fim do jogo. Tudo para evitar pressão sobre o árbitro.
O gol do Paraguai foi reproduzido várias vezes, uma baita vantagem pra quem acostumado a ficar em frente a TV sempre sentiu falta do replay no estádio. E um comentário bem-humorado de um neófito em Copa do Mundo como eu: “Meu primeiro gol de Copa é paraguaio!”
No intervalo, a prova dos nove. E o desafio da fila. Escolha a pior: no bar, enorme como em qualquer estádio brasileiro; no banheiro, impossível de entrar. Incrível como uma arena para 66 mil pessoas tenha banheiros tão mal situados e de difícil acesso. Foi preciso descer dois andares para ainda assim não conseguir chegar até lá. Deixa pro fim do jogo, porque a bola já estava rolando, novamente.
A chuva me acompanhou boa parte da partida com a vantagem de todos os lugares serem cobertos – ou quase todos. O problema foi o vento forte que fez respingar mesmo nos torcedores mais bem protegidos. Nada que estragasse o clima de Copa.
A Itália empatou e o estádio veio abaixo, confirmando minha primeira impressão. A casa era italiana. Aliás, como é saudável ver que os torcedores podem dividir espaço apesar de serem rivais. Enquanto um festeja, o outro respeita. Como deve ser no mundo civilizado.
Com o fim da partida, a primeira constatação: os jogos apresentados até aqui não estão a altura da beleza do estádio. E aproveito para anotar mais um item na coluna dos problemas, ao lado do atendimento no bar e no banheiro: rota de fuga. Para deixar o quarto andar, havia necessidade de passar por uma pequena porta e descer alguns lances de escada. Simples em uma situação normal como a de ontem, apesar do grande número de torcedores. Perigoso em um momento de crise e confusão.
Passada esta barreira, o estádio esvazia rapidamente e o deslocamento externo também é fácil, se você não estiver de carro. Os motoristas tiveram de esperar pacientemente a passagem de boa parte da torcida.
Um brasileiro, acostumado a assistir aos jogos do São Paulo, com quem conversei ao fim da partida me disse com um certo ar de tristeza: “hoje entendi porque os jogos da Copa não podem ser realizados no Morumbi, pra fazer como este aqui só colocando tudo abaixo”.
Como o Morumbi já é passado, na volta para o hotel fico a imaginar como seria o nosso Green Point em Pirituba.