Qual é o Brasil que podemos ser, juntos?

Por Matheus Nucci Mascarenhas

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O BRASILEIRO PRECISA VOLTAR A ACREDITAR: a descrença generalizada em nosso país explica por que ainda passamos por um interminável ‘terceiro turno’, o qual nos provoca a refletir sobre o futuro da nação.

As eleições dividiram ainda mais um povo que jamais foi unido de fato. Já afirmava o sociólogo carioca, Sérgio Buarque de Holanda, que o brasileiro persiste em ser “um desterrado em sua própria terra”. Mas quem é o Brasil? O colonizador português, o escravizado africano, o imigrante europeu e asiático: o único verdadeiro brasileiro, o indígena, todavia hoje é um pária, vive às margens da sociedade e sob a constante lembrança do extermínio da colonização. Esse Brasil, que nunca teve um povo que se pensasse brasileiro, que se pensasse genuinamente patriota, sofre, novamente, um dos sintomas dessa sociedade estilhaçada: uma eleição de descrença.

Em termos gerais, o brasileiro atual divide-se em três categorias de descrentes.

O primeiro deles, é o descrente cético. Este, que perdeu sua esperança no fracasso das “Diretas Já”, no fracasso dos fiscais do Sarney, no fracasso do governo Collor, na corrupção do governo Lula, no fracasso do governo Dilma e no fracasso do governo Bolsonaro, agora rejeita qualquer chamado “patriótico”, tanto a se opor ou a apoiar projetos políticos.

Esse brasileiro cético é aquele que, no passado, era interessado na política nacional, acompanhava-a no noticiário e até mesmo detinha certa esperança por um Brasil melhor. Porém, quando a maré baixou e a sujeira deplorável da política desnudou-se perante seus olhos, o descrente cético escolheu se blindar. Agora, prefere aproveitar um churrasco em casa, papear com os amigos e assistir a FRIENDS, a participar da decepcionante ciranda da política brasileira. Dentre esses indivíduos, incluem-se os quase cinco milhões que votaram nulo, ou aqueles que, muito indecisos, escolheram entre uma das duas gárgulas, geralmente por terem maior raiva em uma do que na outra.

A segunda categoria, esta já mais fisiológica, barulhenta e caricata, trata-se dos descrentes fanáticos. Parece ilógico juntar a palavra “descrente”, alguém que não acredita, com “fanático”, aquele que cegamente crê.

No entanto, o descrente fanático engloba, paradoxalmente, essas duas características. Por um lado, essa porção de brasileiros é fanática por aceitar levianamente o que recebe em suas bolhas ideológicas (tanto de esquerda, direita, ou qualquer outra denominação política que seja pertinente). Por tão intensamente se colocarem passivos ao que recebem e a como se devem comportar, “Sim, meu líder, farei o que for preciso”, tornam-se servos de um “mestre”, que tem como última das suas prioridades importar-se com essa casta devota de seu eleitorado. Por outro lado, são, sim, descrentes, porque não têm mais a capacidade de, pelo menos por um momento, acreditar em si mesmo e em seu julgamento próprio. Não, não o fazem, pois, perante quaisquer evento político, tomam seus juízos não de si mesmos, mas de formadores de opinião. Tornam-se “presas intelectuais” de um sistema que os faz, pouco a pouco, mais distantes de sua própria capacidade de pensar. Nesse contexto, a esses brasileiros falta reflexão, abrir os olhos de forma tal a se apartar de vieses que confirmam diariamente, intensamente e, sobretudo, maliciosamente, sua “suposta” visão política. E digo “suposta”, porque, para que seja uma visão política, demandar-se-ia do indivíduo raciocínio e análise crítica (alguma lasca de crédito a si mesmo), não uma simples fagocitação faminta de discursos pré-fabricados, muitas vezes, divulgados na internet. Em síntese, a estes minions, stormtroopers, habitantes da Oceania de George Orwell, ou londrinos de Aldous Huxley falta a capacidade de escapar desse invólucro alienante que os condiciona a dizer “sim”, a dizer “não”, a gritar, a protestar, a quebrar, ou a matar segundo a vontade de outrem, daquele líder “virtuoso” (popular, sonhador, da esperança, ou mesmo imbrochável).

Por fim, temos a terceira categoria: os descrentes despretensiosos. Esses congregam a maioria dos brasileiros: o trabalhador informal, o profissional liberal, o vendedor ambulante, o favelado, o aposentado, o doente, o morador de rua, o trabalhador que bate ponto às 18h, o pequeno empresário, o agricultor familiar, e assim por diante.

Os descrentes despretensiosos (e me desculpem pelos sufixos repetitivos), são o mais verdadeiro retrato do Brasil. Esse povo é aquele que votou no palhaço ou no farsante, mas não por convicção, e, sim, por obrigação (para não ter que se dar ao trabalho de justificar a abstenção) ou por terem se convencido de forma rasa a escolher entre os dois “cândidos” candidatos. Os descrentes despretensiosos, diferentemente dos outros dois grupos, ainda não sabem que possuem um papel na democracia, na transformação social. Os céticos o reconheciam, mas agora desiludiram-se por completo, enquanto os fanáticos o vêem com clareza, mas somente para o lado que lhes convêm (o resto é antidemocrático, facista, comunista, censitário). Nessas eleições, o terceiro Brasil não entende que seu voto faz, e muita, diferença, muito menos entendem que o poderiam ter usado em outra alternativa, na primeira rodada do jogo eleitoral. Esse terceiro grupo não reconhece e, muitas vezes, tampouco tem acesso à sua cidadania. A exemplo, um morador de rua, um favelado, um andarilho: tais indivíduos não se enxergam como cidadãos (e, resgatando o início do texto, como verdadeiros brasileiros). Como então podem enxergar-se como transformadores da política nacional? E o padeiro, motorista, porteiro, lavrador, pedreiro? Qual é o seu papel, senão trabalhar e cuidar de sua família. Para este terceiro Brasil, esse papel é não menos do que a despretensão de atuar politicamente, pensando em seu círculo pessoal acima do cidadão. A este grupo, digo que não estão errados: há, sim, a necessidade de pensar em si e em seus próximos. Mas, quando estamos diante de problemas que afetam a vida de todos os brasileiros, é vital que o terceiro Brasil creia em sua função social de provocar mudança.

Após definir e elucidar os três Brasis que se manifestaram nesta eleição, gostaria de finalizar o texto com um convite a todos. Enquanto passarmos por momentos como esse, de descrença generalizada (seja ela no outro, em si ou no nosso papel cidadão), não devemos perder de vista nossa missão maior: formar o Brasil dos brasileiros, para os brasileiros. Nosso sonho deve ser, nas décadas que se seguirem, termos um novo intelectual brasileiro, um Sérgio Buarque de Hollanda XVIII, que escreva: “finalmente, os brasileiros dispõem de sua terra, e à sua terra dispõem-se os brasileiros”.

Bem, esse passar do “terceiro turno” eleitoral, que muito mais tem a ver conosco do que com as duas bestas, deve tornar-se um momento de autocrítica e progresso. Aos descrentes céticos, há, sim (e nunca cessará de ter), poder de transformar, protestar, cobrar, se posicionar, lutar democraticamente. Essas ações surtem efeito, mesmo que gradual e lentamente. Aos descrentes fanáticos, tenham mais respeito e admiração a si próprios! É possível pensar por si mesmo e impedir que uma lavagem cerebral irrompa doutrinas perigosas em suas mentes. E essa tarefa depende exclusivamente de vocês. Aos descrentes despretensiosos, vocês não são somente habitantes do Brasil, mas cidadãos brasileiros. Lutar pela democracia que vocês almejam, lutar por um país mais justo, igualitário, fraterno e livre está ao seu alcance. É possível mudar, basta acreditarmos no poder de ser brasileiros de verdade.

Evitando clichês finais, como “o Brasil que queremos depende de nós”, ou “a nossa nação se faz com as nossas mãos”, termino com a seguinte pergunta:

“Qual é o Brasil que podemos ser, juntos?”

Matheus Nucci Mascarenhas é estudante, ouvinte de rádio e tem 17 anos.

Minha devoção pelo Padre Reus

 

Por Milton Ferretti Jung

 

Tenho muita pena de quem se confessa ateu. A recíproca é verdadeira: aceito, sem reclamar, que um ateu, que porventura esteja lendo esta coluna, me espinafre por ser um crente. Os meus raros e caros leitores, como costuma salientar o meu filho nos seus textos, neste blog, talvez estejam estranhando o meu assunto nesta quinta-feira. Explico:o Mílton, em uma de nossas conversas telefônicas nas quais o futebol sempre faz parte da pauta, sabedor que sou devoto do Servo de Deus João Batista Reus, sugeriu-me que escrevesse sobre o alvo da minha devoção. Afinal, o santinho, com a imagem do Padre, me acompanha quando sento à frente do televisor para assistir a um jogo do Grêmio, que é o time da nossa família, com uma honrosa exceção, o meu cunhado Luiz Carlos, colorado de quatro costados. O Servo de Deus apenas não fica comigo quando me disponho a “secar” alguma equipe. Seria exigir demasiado dele que me prestasse ajuda em algo, reconheço, não muito ou nada cristão.

 

Padre Reus esteve presente, agarrado com força por minhas mãos e beijado com insistência, na Batalha dos Aflitos, quase de minuto a minuto. Na hora do pênalti, chorei ao ver a defesa maravilhosa do goleiro Rodrigo José Gallato, e por pouco não estraguei o santinho ao o agradecer pela sua preciosa ajuda. Essa foi a tarefa mais difícil, imagino, cumprida pelo meu caríssimo Padroeiro. Houve outras, muitas outras, em que rezei convicto de que Padre Reus não nos abandonaria na pior. Nem mesmo naqueles jogos em que não me brindou com o seu socorro, deixo de lhe agradecer. Ora essa, não se pode ganhar sempre. Às vezes, os disparates cometidos pelos jogadores e técnicos são tão grandes que eu olho para o santinho e sou obrigado a concordar com ele.

 

Padre Reus nasceu na Alemanha, na cidade de Pottenstein, na região da Baviera, no dia 10 de julho de 1868. Lá, entrou na Companhia de Jesus e foi enviado para o Brasil, radicando-se no Rio Grande do Sul. Por muitos anos foi professor de teologia no Colégio Cristo Rei, de São Leopoldo. Como ex-estudante do Colégio Anchieta, em Porto Alegre, ouvia frequentemente histórias sobre o Padre Reus, contadas pelos meus professores, padres jesuítas. Reus foi um homem místico, que recebia visões quando celebrava missas. Escreveu inúmeros livros em português, espanhol, alemão e italiano. Hoje, o Santuário Sagrado Coração de Jesus, no cemitério do qual descansa o seu corpo, é um dos principais pontos turísticos de São Leopoldo. Em Porto Alegre, seu nome foi dado a uma das principais vias da Zona Sul, que atravessa três bairros: Tristeza, Camaquã e Cavalhada.

 

Se querem saber a razão de eu ter escolhido o Padre Reus para proteger o Grêmio, digo que se deveu a um técnico de futebol, o Capitão Carlos Benevenuto Froner. O primeiro time a ser treinado por ele foi o Grêmio Esportivo Leopoldense, coincidentemente ou não, na cidade em que o Padre Reus se estabeleceu e viveu até falecer. Froner era devoto do Servo de Deus João Batista Reus. Tanto falava nele que me levou a acompanhá-lo na devoção pelo Padre Reus.
Enfim,acho que este tipo de crença, que me perdoem os incréus, nos ampara nos momentos difíceis que todos precisamos enfrentar. Acreditar é preciso e só faz bem.

 


Milton Ferretti Jung é jornalista, radialista e meu pai. Às quintas-feiras, escreve no Blog do Mílton Jung (o filho dele)