Cláusula do “veja bem” afasta candidato do Ficha Limpa

 

ficha-limpa-limpaUma carta foi enviada a todos os candidatos a presidência da República para eles não esquecerem de se cadastrar no site Ficha Limpa. A lembrança foi necessárias porque apesar de toda a publicidade em relação ao serviço que está no ar há duas semanas, nenhum deles se inscreveu até agora.

O problema talvez não seja de memória. E, sim, da cláusula do “veja bem”.

Para se inscrever no Ficha Limpa é preciso apresentar um documento, o de registro da candidatura no TRE, e três declarações: de que não tem condenação em outros Estados, não renunciou a mandato para evitar cassação e – aqui mora o perigo – o que assume o compromisso de publicar na internet a prestação de conta da campanha, semanalmente, com o nome dos doadores, valores recebidos e gastos realizados.

O registro no Tribunal, é simples, pois somente com ele pode disputar o cargo. Basta tirar uma cópia e enviar. A declaração de que nada deve para a Justiça, a maioria pode assinar. Mas a declaração de que vai tratar com transparência as doações na campanha, “veja bem” é preciso …. ou, não tenho como …. ou, as empresas não querem … ou, qualquer outra desculpa que surgir na hora afasta o candidato do site.

Por isso, levantamento apresentado, hoje, pelo Instituto Ethos, que integra o Movimento de Combate a Corrupção Eleitoral, mostra que apenas 35 candidatos estão cadastrados no site Ficha Limpa, dos quais apenas dois concorrem a governador: Fernando Gabeira (PV/RJ) e Soraya Tupinambá (PSOL/CE). Ao Senado, são seis, a Câmara dos Deputados, 27.(A lista completa aqui)

Há uma lista de 75 pedidos ainda não aceitos pelos organizadores, pois as informações enviadas estão sendo analisadas. Desde o início do projeto, houve seis denúncias de candidatos cadastrados que não estavam atualizando as contas na internet, mas assim que foram cobrados, os candidatos colocaram as informações em dia. Ninguém foi descadastrados, até agora.

Ainda não chegaram os documentos do candidato Netinho de Paula, que concorre ao Senado pelo PC do B, e se comprometeu publicamente, durante entrevista ao CBN São Paulo, de se cadastrar no Ficha Limpa. Veja bem …

A adesão não é pequena até agora ?

“Eu já esperava”, disse Oded Grajew do alto de seu cabelo e barba brancos, sentando na parte central de uma enorme mesa, ao lado de mais dois ou três integrantes do movimento de combate à corrupção eleitoral. Aos jornalistas que almoçavam a convite do Ethos e se pautavam nas informações servidas, Oded disse que o ideal será o dia em que haverá tantos candidatos dispostos a se inscrever no Ficha Limpa que o serviço não será mais necessário.

Melhor a gente ir para o cafezinho porque vai demorar.

Vereadores & construtoras

 

Por Carlos Magno Gibrail

Praticamente metade dos vereadores de São Paulo está em julgamento, e, teoricamente, correm risco de perder o mandato. O juiz Sérgio Rezende Silveira que os cassou, pode ter dado o passo inicial para a reformulação do processo eleitoral brasileiro.

A AIB – Associação Imobiliária Brasileira da qual o jornal Folha de São Paulo, desde abril deste ano chamou a atenção pelo fato de não ter escritório, funcionário, web site e receita fixa, é acusada de pertencer ao SECOVI – Sindicato das Empresas de Compra, Venda, Locação e Administração de Imóveis. Aliás, denúncia que havia sido feita bem antes pela Transparência Brasil, sem que ninguém tivesse se atentado para o risco.

A partir daí a discussão passou a girar em torno da comprovação do vínculo AIB e SECOVI, pois a lei não permite que Sindicatos façam doações. Embora ficasse evidenciado, que, independentemente, desta relação, há provavelmente irregularidade específica na AIB, pois a lei permite que se aplique somente 2% da receita bruta em doações de campanha. Segundo o Ministério Público a AIB não mostrou capacidade financeira para ter arrecadado R$ 325 milhões em 2007, necessários para cobrir as doações em 2008.

Neste momento, em que os cassados conseguiram aguardar julgamento em seus cargos, dever-se-ia aproveitar a exposição na mídia, embora desproporcionalmente pequena, para que se analise causa e não efeito. Na medida em que o processo eleitoral permite doações de empresas, que tem interesse direto na administração pública, através de venda de serviços e produtos, não há como impedir a corrupção, reação crescentemente inerente ao ser humano. E, neste caso a lei permite doações, que são feitas com incontestável interesse de obter vantagens junto ao poder público. Tanto é verdade que as contribuições acentuadas aos vereadores de São Paulo vieram do setor de construção civil, atividade que pode se beneficiar em muito dos atos da Câmara.

É o mesmo que vemos em Brasília, onde encontramos bancadas representativas dos principais setores da economia nacional. Se não houver total transparência e controle absoluto do dinheiro aplicado, não haverá chance de um sistema civilizado e honesto.

O que leva uma empresa privada, cujo objetivo é lucro e retorno sobre o capital investido, aplicar dinheiro em campanhas e candidatos políticos? Qual o CEO ou Presidente de empresa, tão pressionados por resultados, que arriscaria doar para campanhas eleitorais sem interesse em obter vantagens?
Que retorno uma incorporadora ou construtora espera de um capital aplicado em vereadores?

“Enquanto houver financiamento privado, haverá a imposição do poder econômico. É assim nos municípios, nas assembléias legislativas, na Câmara e no Senado. É preciso acabar com o financiamento privado de campanha. É preciso que os partidos políticos recebam vultosos – vultosos, sim – recursos públicos para que façam campanha integralmente com valores vindos dos cofres públicos. O que houve em São Paulo, agora – o comprometimento de 1/4 da câmara de vereadores – é apenas uma amostra. Foi apenas UMA entidade financiadora. As demais simplesmente não apareceram. Lá, em São Paulo, onde já houve escândalo da merenda escolar terceirizada, onde há disputa brutal pela distribuição de livros didáticos, onde há empresas de transporte interessadíssimas na permanência da prioridade do transporte rodoviário, lá, enfim, foi identificado o financiamento APENAS do setor imobiliário. E só esse setor comprometeu 25% da câmara de vereadores”. Castanha Maia Advogados Associados, Brasília.

Talvez por isso, o líder do DEM na Câmara de São Paulo, Carlos Apolinário, disse “estar estarrecido” com a sentença de Sérgio Rezende Silveira: “Por que a AIB doou em 2002, 2004, 2006 para candidatos a prefeito, governador e presidente e somente os vereadores foram punidos?”.

Para que Carlos Apolinário não mais se estarreça, estamos de acordo com os advogados da Castanha Maia de Brasília, o financiamento público certamente sairá bem mais barato do que o financiamento privado no processo eleitoral.

Carlos Magno Gibrail é doutor em marketing de moda e às quartas-feiras escreve no Blog do Mílton Jung. Está disposto a tirar do bolso para financiar campanha em lugar de ver nosso dinheiro ser arrancado pela corrupção

 

Financiar campanha é legal, o problema é o preço cobrado

Recorte de jornais de São Paulo com notícias da Câmara Municipal

O noticiário de três dos principais jornais de São Paulo sobre a Câmara Municipal, nesta quarta-feira, foi bastante rico. Na primeira página do Diário de São Paulo, com direito a foto de plenário vazio, “Câmara de SP: Cem dias sem aprovar  projetos de vereadores”; no alto e em letras garrafais da primeira página da Folha “Imobiliária banca vereador que atua pelo setor em SP”; e nas internas do Estadão “Entidade quer cassar mandato de relator do Plano Diretor”.

Para quem se preocupa com o trabalho no legislativo, sinal de terra arrasada. “Não sabia que até ele estava metido nessa”, disse-me o primeiro que encontrei na redação. “Só tem bandido”, tascou outro mais à frente.

Pé no chão. É preciso pensar antes de mais nada que a ideia de que todos são bandidos, ladrões e corruptos só serve mesmo para os bandidos, ladrões e corruptos – e estes existem, apesar de muitas vezes não sermos capazes de identificar seus nomes ou qualificar seus crimes.

A começar pelos cem dias de trabalho no legislativo municipal, o jornal se antecipou, pois os vereadores apesar de terem tomado posse em primeiro de janeiro, só entraram na Câmara em primeiro de fevereiro. Mesmo que tivessem completado este período simbólico sem aprovar nenhuma proposta de vereadores, é preciso avaliar que os projetos de lei tem trâmite a ser seguido até estarem prontos para serem votados em plenário, em duas votações como prevê o regimento interno.

Mais importante é avaliar outras informações que estão na reportagem do Diário, na qual é possível ver que tipo de projeto de lei cada um deles apresentou. Sinaliza a que vieram. Há quem não tenha apresentado nada até agora, assim como aqueles que deram entrada a projetos sem nenhuma importância. É significativo ver, ainda, o comparecimento deles nas comissões para as quais foram escolhidos.

Do financiamento de campanha, destaque na Folha e Estadão, é preciso estar atento para o fato de que não há irregularidade nenhuma em candidatos receberem doação, desde que registrada no Tribunal Regional Eleitoral. Mesmo que o recebam da Associação Imobiliária Brasileira que a Folha acusa ser testa-de-ferro do Secovi, que se apresenta como Sindicato da Habitação, e repassou R$ 6,5 mi aos vereadores. É claro que quem dá, cobra. Ou pede de volta.

É isto que reforça a desconfiança em relação a atuação desses vereadores, como demonstra a Associação dos Comerciantes da Santa Efigênia que teme pelas decisões do líder do Governo na Câmara e relator do projeto de concessões urbanísticas, José Police Neto (PSDB), na lista dos financiados pela AIB, conforme afirma o Estadão.

Sobre este assunto, aliás, a informação desta tarde é que os comerciantes não entrarão com pedido de cassação contra Police Neto como anunciado no jornal. Querem é pressionar a prefeitura a mudar o projeto que, de acordo com eles, foi levado à Câmara sem discussão prévia. No caso ainda há o “fogo amigo” de parlamentares de olho na relatoria da revisão do Plano Diretor.

O deputado federal Ivan Valente (PSOL), que foi candidato à prefeitura de São Paulo, e um dos dois únicos a declararem a lista de financiadores antes da eleição, entrou com representação no Ministério Público Eleitoral para que o caso das doações da AIB seja investigado. E faz bem.

Ao cidadão cabe, a partir desta enxurrada de informações, ainda maior rigidez na fiscalização dos parlamentares, monitorando o comportamento deles nos projetos que interessam ao setor que os financia. Um desafio, principalmente, àqueles que se comprometeram com a campanha Adote um Vereador.