Conte Sua História de São Paulo: o filho da Dona Ernesta foi a guerra

 

Por Olívio Segatto
Ouvinte da CBN

 

 

Em 1944, morava no bairro do Piqueri, próximo a Freguesia do Ó. Tinha oito anos de idade. Em frente a nossa casa morava uma família cuja mãe, dona Ernesta, tinha vários filhos.

 

A Segunda Guerra Mundial estaca ocorrendo na Europa.

 

Um dia, soubemos que um dos filhos da dona Ernesta, Bruno Serra, havia sido convocado para o exército e participaria da tropa brasileira que em breve embarcaria para a Itália, onde ficaria instalada sob o comando aliado, no combate ao nazismo e ao facismo.

 

A partir desse momento, medo, preocupação e ansiedade envolveram os familiares e a vizinhança.

 

Na ocasião, por motivos de segurança, a capital à noite ficava às escuras, sendo que nas casas eram usadas pequenas velas.

 

Nós, as crianças da época, ficávamos agrupados nas calçadas, curioso e com medo, acompanhando os movimentos dos holofotes que refletiam no céu, que eram manobrados no Campo de Marte como treinamento.

 

Passados 15 dias daquela convocação, eis que chega um caminhão do exército lotado pelos Pracinhas que fariam a mesma viagem do filho da Dona Ernesta.

 

Nesse instante todos os moradores da rua Coronel Bento Bicudo se colocaram ao redor do caminhão para a despedida ao jovem Bruno, com desejos de retorno.

 

Da casa, sairam mãe e filho abraçados. Ela, em um choro convulsivo, éera acompanhada por muitas pessoas em lágrimas.

 

Só em 1945, fomos conhecer o fim daquela história.
Ao fim da guerra, o Brasil registrou 443 mortes e cerca de 3 mil feridos.

 

A maioria dos pracinhas retornou para suas casas e entre eles estava Bruno Serra, recebido de joelhos pela mãe.

 

As cenas por mim descritas nunca se apagaram de minha memória.

 

Olivio Segatto é personagem do Conte Sua História de São Paulo. A sonorização é da Débora Gonçalves. Conte você também mais um capítulo da nossa cidade: envie seu texto para milton@ cbn.com.br. Para ouvir outras histórias visite agora o meu blog miltonjung.com.br

A pracinha em frente de casa e o Citroën de cano reto

 

Milton Ferretti Jung

 

Recém havia sentado e preparado o meu computador a fim de escrever o texto para o blog do Mílton, que não é uma obrigação,mas,isso sim, uma satisfação para um pai aposentado cujo único compromisso,nos últimos tempos,é visitar médicos das mais variadas especialidades. Aliás, são tantos que deixo parte da organização dessa tarefa à Maria Helena,minha mulher,filha de farmacêutico, que trabalhou alguns anos na farmácia paterna e é bem mais afeita,por isso, a lidar com os que cuidam da minha saúde. Este escriba de Facebook que,talvez,alguém leia,seja por curiosidade ou amizade,sempre acha assim tempo para redigir esta coluna,nem sempre nas quintas-feiras,conforme minha combinação com o filho,este sim um escritor de verdade. Por falar nisso,recentemente,ele lançou um livro em parceria com a fonoaudióloga Lenny Kyrillos,com este título:”Comunicar para liderar”.Recomendo a sua leitura e não é por corujice paterna,mas porque já o estou lendo e é muito bom.

 

Não era bem este o meu assunto,mas os caminhões que durante um dia inteiro subiram e desceram a rua onde moro. Acontece que os tais caminhões passaram fazendo isso por pelo menos dez dias. Retiravam terra e restos de árvores de um terreno baldio,o último existente, por sinal,na Dr.Possidônio da Cunha, em Porto Alegre. Um pensamento,às vezes,corre atrás do outro ou mesmo dos outros. Este me veio à cabeça ao assistir à azáfama dos caminhões,que chegavam vazios ao terreno que limpavam e saíam carregadíssimos,fazendo um barulho ensurdecedor. Não são eles,porém,os protagonistas da historiazinha que vou contar e da qual me lembrei quando escrevi que os monstrengos ruidosos levavam o que chegou a ser um espaço arborizado e não um simples barral. Ainda,no entanto,tergiverso e,com isso,deixo entrar no que interessa ou pode interessar.

 

Na minha infância e até casar,morei com os meus pais em uma rua que,bem na frente da casa paterna,se unia a outra. A minha era a 16 de Julho,a vizinha dela,Zamenhoff. As duas,por muito tempo,possuíam,entre as suas casas,terrenos baldios. Os terrenos baldios eram os locais onde brincávamos de esconde-esconde e,principalmente,jogávamos as nossas peladas.Para desespero dos nossos pais, chegávamos em casa com os sapatos em pandarecos. Naquela época não haviam ainda inventado sequer as alpargatas e os sapatos não eram baratos. Os espaço livres foram terminando.Recebiam casas modernas e acabavam, principalmente,com o futebol que a gente jogava. A única bola que usávamos – bola de tento – como eram conhecidas,tinha um dono,o Airton Stein. No bom do jogo,a mãe do dono da bola o chamava para tomar café ou dar um pulo no armazém para comprar isso ou aquilo.

 

Escrevi que os espaço livres para se brincar foram,aos poucos,virando casas.Sobrou a “pracinha” que ficava na junção das duas ruas a que já me referi. Em roda da “pracinha”,ficavam as casas mais próximas dela.Volta e meia,a bola do Airton ia parar dentro de uma dessas casas. E a bronca do residente era imediata. Alguns faziam de conta que nos deixariam sem bola.

 

Encontrávamos,entretanto,novos “esportes”. Bola de gude,bolinhas de tênis muito usadas,etc. A “pracinha”,que a prefeitura tentava transformar em praça de verdade, nunca passou do diminutivo. As flores da prefeitura nunca chegaram a crescer e inventávamos,a casa dia ou durante algum tempo,toda a espécie de “esportes”. Jogou-se nela desde futebol,vôlei e até tênis,com rede e tudo.

 

A “pracinha” teve,inclusive,os seus personagens. Um deles,de repetente,sofria um ataque e o remédio era lhe pôr na mão a bola do Airton. O outro menino problemático não jogava. Apenas nos olhava e segurava entre dois dedos folhas de trepadeiras e as sacudia incansavelmente. Era na minha casa que a turma pedia licença para beber água da pena. No Dia de São João,os esportes davam lugar a uma imensa fogueira. Lembro-me que o meu pai enchia de água a banheira,o tanque,enfim,todos os baldes da residência,temendo que a fogueira soltasse fagulhas capazes de incendiar a nossa casa.

 

Crescemos quase todos e continuamos morando nas casas que nossos pais haviam construído. Um vizinho,que morava no fundo da minha casa,numa rua paralela chamada São Pedro,bem mais velho do que eu,tinha comprado um Citroën e colocado nele um cano de descarga reto. Esse fazia um ruído tão encorpado que parecia uma Ferrari.Fiquei doidinho por ter um carro com tal tipo de descarga e consegui convencer meu pai a me deixar imitar o cano do Citroën que ele comprara direto da fábrica, na França e era igualzinho ao do Valnei Law. O cano reto foi um presente por eu ter passado de ano,no colégio. Eu retirava uma tampa da boca do cano reto (o original era mantido e ficava depois de uma curva que deixava a descarga fluir pelo lado esquerdo do carro). O meu pai me emprestava o Citroën para ir às missas dominicais. Nunca fui. Em um desses domingos um carro de praça (assim chamavam os carros de aluguel na época), em um cruzamento perto da minha casa, bateu no paralama traseiro do Citröen. Como não tinha carteira dispensei o taxista e fiquei sem poder dirigir por um bom tempo.

 

Contei todas essas histórias,a partir do dia de hoje e daí para trás por uma razão:não suporto mais ler ou ouvir notícias de crimes,estupros e de mortos por balas perdidas,afora o inesgotável Lava-Jatos e safadeza de políticos.

Lembro do tempo em que jogávamos bola na pracinha

 

Por Milton Ferretti Jung

 

Tenho por hábito ler,quando tomo o meu café da manhã, as páginas da Zero Hora que tratam de esportes. As que mais me interessam são as que versam sobre futebol,automobilismo de competição e basquete e tênis,nessa ordem. Não deixo também de dar uma olhada na que ZH batizou como “De Fora da Área”. Confesso que nem sempre,dependendo do assunto,sigo lendo o texto do dia até o fim. O dessa segunda-feira,17 de novembro,foi um dos que chamaram a minha atenção.Li-o de cabo a rabo.

 

Cristiel Gasparetto,editor de esportes do Diário Gaúcho,um dos jornais que fazem parte do Grupo RBS,informo aos que não são de Porto Alegre,assinou um texto com o seguinte título:”Menos Videogame e mais campinhos”. Lembra adiante que,na sua infância,na década de 80 em Santa Maria,os espaços para a prática do futebol eram fartos”. “Passávamos horas jogando bola em campinhos ou mesmo no meio da rua de paralelepípedos que quase não tinha movimento”,escreveu Gasparetto. No texto,propriamente dito,queixa-se que vê crianças hipnotizadas diante de monitores. Essas,hoje em dia,passam o seu tempo livre,desde que sejam controladas por seus pais para que não exagerem,jogando videogame.

 

Ocorre que, se os jovens da década de 80,foram talvez os primeiros a ver minguarem os espaços livres,onde jogavam futebol,o que dizer dos que vieram ao mundo bem depois. Gasparetto lembra como era fácil montar projetos de goleiras e improvisar outros apetrechos parecidos com os do futebol de verdade,o dos estádios, e jogar mil peladas,de pés descalços,os mais ricos com chuteiras,aquelas com uma proteção na frente,que facilitava dar bicos na bola quando isso se fazia necessário.

 

Eu,que nasci na década de 30,ainda aproveitei muito os espaços vazios. Morei grande parte tanto da minha infância quanto da adolescência,até me casar,na Rua 16 de Julho,157,que era separada da Zamenhof por uma pracinha. Foi o único espaço livre, depois que todos os terrenos baldios foram ocupados,no qual jogamos vários arremedos de esporte:futebol,vôlei,basquete e até tênis.A prefeitura de Porto Alegre tentou plantar flores no local,mas quando os trabalhadores terminam o serviço e iam embora,recuperávamos o “nosso” espaço.

 

Trabalhei 60 anos na Rádio Guaíba e várias vezes fui a São Paulo para transmitir futebol. Em um hotel no qual nossa equipe se hospedou,havia um computador e nele era possível jogar o tataravô dos videogames. Os jogos,pouco depois,foram se sofisticando e ficaram cada vez mais atraentes,que o digam os meus netos homens: Gregório e Lorenzo,paulistanos; Fernando,gaúcho de Porto Alegre.

 

Dos meus filhos,apenas o Mílton se dedicou a jogar futebol,primeiro na escolinha do Grêmio e após,basquete,também pelo Imortal Tricolor,começando no infantil e chegando ao time adulto. Fernando,filho do Christian,joga basquete no Colégio Nossa Senhora do Rosário. Ah,Malena e eu,diariamente,jogamos Tetris,um game que nos acompanha faz muitos anos. Seja lá como for,gostei do texto do Gasparetto. Ele me fez lembrar do tempo da pracinha,que nunca foi ocupada. Não sei se os meninos que moram nas duas ruas ainda a usam para praticar esportes. Acho,porém,que preferem videogame.

 


Milton Ferretti Jung é jornalista, radialista e meu pai. Às quintas-feiras, publica seu texto no Blog do Mílton Jung (o filho dele)

Minha Copa do Mundo era disputada na pracinha da Zamenhoff

 

Por Milton Ferretti Jung

 

Zero Hora,nesse domingo,23 de março,dedicou cinco páginas,com textos e fotos em preto e branco,à Copa do Mundo, disputada em 1950,aqui em um Brasil do qual lembro com saudade. Se isso me transforma em saudosista de carteirinha,não me importa. Eu gostava de futebol,desde que fosse o disputado pela gurizada da minha rua nos terrenos baldios que somente aos poucos foram sendo preenchidos por casas de alvenaria,a maioria de dois pisos. A casa paterna ficava bem na frente de um arremedo de pracinha,situada na confluência da Ruas 16 de Julho e Zamenhoff. Essa – a pracinha – jamais foi ocupada por um jardim,como queria a prefeitura,porque nela,embora fosse triangular e em ligeiro declive, jogávamos futebol,vôlei,basquete e até partidas de tênis,por incrível que pareça. É verdade que nossas atividades lúdicas começaram muito antes do ano da Copa do Mundo.

 

Eu não costumava assistir aos jogos dos times de Porto Alegre:Grêmio,Inter,São José,Cruzeiro,Renner e Nacional. Em compensação,já trabalhando em rádio,na Clube Metrópole,tive de narrar uma partida entre Cruzeiro e Renner. No ano do Mundial,porém,minhas incursões radiofônicas restringiam-se aos alto-falantes do Colégio Nossa Senhora do Rosário e,em festas da paróquia do Sagrada Coração de Jesus,naquela que apelidamos de Voz Alegre da Colina,porque ficava no alto de um morro. Na parte baixa desse, havia o campo de futebol do amadoríssimo, União do Buraco. Os jogos eram sempre aos domingos e,volta e meia, dava uma pauleira danada (já naquele tempo)e os torcedores corriam Zamenhoff abaixo para fugir da bronca.

 

A turma da zona continuou,eu inclusive,a bater bola na pracinha mesmo quando já estávamos bem mais velhos. Assistir aos jogos dos profissionais,porém,no meu caso,ainda no ano do Mundial,era coisa raríssima. Eu sequer ouvia as transmissões das partidas pela Farroupilha,Gaúcha e Difusora (hoje Bandeirantes).Talvez,se a televisão já cobrisse futebol,eu teria me interessado bem mais por este esporte. Não passou pela minha cabeça assistir aos jogos de Porto Alegre,no Estádio dos Eucaliptos.Mexicanos,iugoslavos e Suíço não chamavam um mínimo de atenção da minha parte. E a esperada final chegou. Nem essa me prendeu em casa. Fui ver um filme no Cine Eldorado,um dos que costumava frequentar,além do Rosário,Orfeu e Colombo. Não recordo a que filme assistia quando a película foi interrompida:a notícia dada pelos alto-falantes do El Dorado não poderia ser pior: a Seleção Brasileira havia perdido para Uruguai. Saí do cinema e vi muita gente com lágrimas nos olhos, mas confesso lisamente,os meus permaneceram secos.

 

Agora,diante de nova Copa do Mundo em nosso país,não consigo a aceitar sem inúmeras restrições. Temo que,caso o Brasil conquiste o título mundial,o fato seja aproveitado politicamente na próxima campanha eleitoral,como ocorreu no tempo do governo militar que se aproveitou das vitórias da Seleção para se promover. Não posso dizer que Copa no Brasil me agrada. Bem pelo contrário,tenho certeza de que o seu custo para o nosso país será altíssimo. Seria muito melhor se o dinheiro que está sendo gasto fosse utilizado para amenizar ou mesmo corrigir problemas de todas espécies que afetam o nosso povo. São tantos que não me atrevo a os enumerar.

 


Milton Ferretti Jung é jornalista, radialista e meu pai. Às quintas-feiras, escreve no Blog do Mílton Jung (o filho dele)

Saudade da pracinha de futebol

 

Por Milton Ferretti Jung

Quem, porventura, leu algum ou alguns dos textos por mim postados neste blog talvez imagine que sou saudosista. Houaiss, porém, informa, no seu dicionário, que essa palavra descreve quem cultiva o saudosismo. Este, por sua vez, significa “tendência, gosto fundado na valorização demasiada do passado”. Eu valorizo, sem demasias, tanto o passado quanto o presente. Já o futuro, embora me preocupe, deixo para lá, porque a Deus pertence, diz o ditado popular.

Seja lá como for, sinto saudade de meus falecidos avós, pais, de minha irmã e de muitos amigos que se foram e de outros que ainda aí estão, mas com os quais perdi contato. Tenho saudade também de coisas: meus times de botões. Guardo-os até hoje, mas nem meus netos se dispõem a jogar comigo. Todos preferem os sofisticados jogos de computador. E lhes dou razão. Afinal, também pratico alguns desses, os menos complicados, claro. Por falar nessas maravilhosas máquinas modernas, apresento mais uma prova de como dou importância ao presente. Gosto de novidades: GPS, IPod, IPad, carros modernos, repletos de air-bags, com câmbio automático e avanços incontáveis em todos os sentidos.

Não esqueço, entretanto, das coisas passadas que fizeram o encanto da minha infância: os terrenos baldios, por exemplo, quase todos, na minha zona, usados para que jogássemos peladas. Esses foram aos poucos se rarefazendo à medida que eram ocupados por residências. Sobrou a “pracinha” – como a chamávamos carinhosamente – um triângulo formado pela junção de duas ruas, situada bem na frente da casa paterna. Nela, praticamos vários esportes, embora o terreno tivesse um declive e quem jogasse na parte mais alta – a ponta aguda do triângulo – sempre ficasse em desvantagem. Havia, na “pracinha”, todo o tipo de jogo, desde bolinha de gude, vôlei e basquete, até um gol a gol disputado com bola de tênis, impulsionada a cabeçadas e, claro, as peladas, nossas preferidas. Às vezes, entretanto, nos transformávamos em espectadores.

Um pouco distante da minha rua havia um campo de futebol amador no qual jogava o União. Para nós, meninos e adultos, era o União do Buraco, porque o gramado ficava ao lado de um morro. Neste, se aboletava a maioria dos espectadores. Da janela do quarto dos meus avós, ouvia-se o barulho da bola chutada pelos “craques” que, não raramente, se desentendiam e partiam para a pauleira. Era um salve-se quem puder. Lembro que muitos dos que fugiam passavam correndo por minha rua. O futebol, no campo do União, fazia a alegria das tardes de domingo, tanto da criançada quanto dos adultos. Bem mais longe, situava-se o campo do Pombal. Este era outro dos times amadores que não deixavam de ter seus torcedores. A vantagem dessas equipes é que não precisavam ceder seus jogadores para seleções de todas as espécies ou para o futebol europeu, árabe, japonês, russo, ucraniano, etc. Não sei se algum dos nossos “craques” chegou a se profissionalizar. Isso, todavia, nunca impediu que a gente torcesse para eles.


Milton Ferretti Jung é jornalista, radialista e meu pai. Às quintas, escreve no Blog do Mílton Jung (o filho dele).

Éramos felizes e não sabíamos ?

 

Por Milton Ferretti Jung

“Éramos felizes e não sabíamos”. Ouve-se seguidamente essa frase. Quem ainda não a escutou? Ela serve para lembrar, com prazer, o passado, nem sempre se referindo ao que as pessoas viveram. Outro dia, por exemplo – socorre-me o Google – um diretor da Rede Globo disse que os radiodifusores sentem saudade do tempo em que não havia a ameaça das novas mídias em seu modelo de negócios.

Normalmente, porém, quem pronuncia a frase é gente que vivenciou na sua infância momentos inesqucíveis, comparando-os com a realidade dos dias de hoje.

Permitam-me que regresse aos meus oito anos ou pouco mais que isso. Minha família morava diante de uma pracinha. Essa não passava de um triângulo situado no encontro de duas ruas. A prefeitura tentou em vão transformá-la numa praça de  verdade, mas nós, seus usuários, nunca permitimos porque acabaria com nossos improvisados jogos de futebol, basquete, vôlei e outras brincadeiras. Na minha rua havia também muitos terrenos baldios, os quais, às vezes ,serviam para que uma turma maior participasse de “peladas”, eis que o chão da pracinha era não só inclinado como sem um mínimo de grama.

O tempo foi passando, a pracinha permaneceu incólume. Os terrenos baldios acabaram. Em seu lugar surgiram casas. Os guris cresceram, casaram, tiveram filhos, alguns edifícios substituíram as casas mais velhas. Ainda sobraram os que, na juventude,fundaram um clubezinho – o Tijuca – que congrega parte da turma antiga em jantares de confraternização.

Meus filhos, quando visitavam seus avós, que nunca se mudaram, chegaram a conhecer a pracinha. Meus netos, porém, nunca passaram sequer perto da residência avoenga. Eles estão noutra. Brincam,hoje,como muitas crianças da idade dele, com computadores,iPod,iPad,Nintendo,Play Station, etc.

O Fernando, mais moço da turminha, filho do Christian e da Lúcia,irmão da Vitória, possui até um blog e está tentando ensinar a tia Jacque a criar o dela. Gregório e Lorenzo, filhos do Mílton e da Abigail, desde menininhos lidam melhor com computadores  que muita gente grande. Eu jogo somente Tetris no PC. E olhe lá.

Quando paro para pensar, volta e meia me ocorre a frase com a qual iniciei este texto e me pergunto quem teria mais razão para usá-la: eu, meus filhos ou meus netos? Responda quem se achar capaz.

Milton Ferretti Jung é jornalista, radialista, trabalha na Rádio Guaíba de Porto Alegre e é meu pai. Às quintas, escreve no Blog do Mílton Jung (o filho dele)