Há um incômodo evidente com o que se lê nas redes sociais e demais espaços digitais, públicos e disponíveis para a expressão de ideias, pois a profusão desses ambientes deu dimensão demasiada àquelas conversas que se limitavam ao círculo de amigos e ao almoço de domingo com seus parentes — incluindo o tio com soluções para o mundo, o primo capaz de dizer uma asneira a cada afirmativa e o cunhado estraga-prazer que traz nos comentários suas frustrações.
A facilidade com que se propaga uma opinião e o “esconderijo” que o cenário virtual se transformou, nem tanto pela dificuldade para se encontrar o autor do ataque, muito mais pela covardia em dizer diante do outro o que se pensa, empoderou essa gente esquisita.
Sou otimista ao acreditar que estamos apenas vivendo uma evolução natural do ser digital e dentro de alguns anos, talvez décadas, saibamos nos comportar melhor — e isso inclui pensar com equilíbrio, bom senso e, especialmente, respeito.
Toda boa sugestão, portanto, é bem-vinda, e, por isso, recupero aqui alguns princípios que foram publicados pelo filósofo Paul Grice, no artigo “Logic and Conversation”, lá por meados dos anos de 1970, ou seja, muito antes de assistirmos a este diálogo sem propósito e sem noção, que tanto nos incomoda (ao menos a mim incomoda) nas redes sociais.
Naquela época, Grice já nos apresentava a necessidade de incentivarmos uma linguagem sem confronto, a partir de quatro máximas conversacionais que podem tornar esta “luta livre” travada no ambiente virtual em um embate saudável e colaborativo:
Quantidade: faça sua contribuição tão informativa quanto necessária; o autor, em seu texto original, é redundante ao incluir a ideia de que não se deve fazer contribuição mais informativa do que o pedido, pois se não vê aqui uma transgressão aos princípios cooperativos, identifica como sendo uma perda de tempo.
Qualidade: tente fazer uma contribuição verdadeira; esta supermáxima, como define o próprio autor, vem seguido de duas outras mais específicas: não diga o que você acredita ser falso e não diga nada sobre o que você não tenha provas suficientes.
Relação: seja relevante, sugere de forma concisa; faz questão, porém, em nome da clareza, de revelar a intenção que pode ficar escondida nesta máxima, pois sua proposta é que a contribuição seja pertinente ao tema em discussão.
Modo: seja claro, uma supermáxima que está relacionada não ao que é dito mas na forma como é dito, e aparece reforçada por evite expressões obscuras e a ambiguidade, seja breve (evite a prolixidade) e ordeiro.
Perceba que em nenhum momento há a intenção de cercear a opinião contrária, mas, sim, de torná-la produtiva para o diálogo.
Nas redes sociais, aplique as máximas de Grice e ganharemos todos; nos almoços de domingo, já que a visita é inevitável, peça para trazer um bom vinho na próxima vez.
A imagem que ilustra este post é do álbum de Alison Kurke no Flickr