Uma chave para o amor

Por Simone Domingues

@simonedominguespsicologa

Foto de George Becker

“Quando uma porta se fecha, outra se abre;

mas frequentemente olhamos por tanto tempo

 e com tanto pesar para a porta fechada

que não vemos aquelas que foram abertas para nós.”

(frase atribuída a Alexandre Graham Bell)

Ela desceu as escadas apressada, com uma das chaves em mãos, acreditando que era a certa. Um sábado à noite frio em Paris. O lixo para fora, uma tarefa simples. Mas, ao voltar, o susto: a chave que tinha levado era do trabalho. A porta de casa continuava trancada. O celular? Lá dentro.

Por alguns minutos, Olívia ficou paralisada no corredor. Pensou nas opções. Ela recentemente havia trocado sua fechadura para mais segurança, e um chaveiro, a essa altura, seria financeiramente inviável. Tentou lembrar o número de alguém. Só vinha à cabeça o contato da mãe, o mais óbvio, o mais seguro. Ligou de um telefone emprestado pelos vizinhos. A mãe, do Brasil, tentou contato com o ex-marido de Olívia, que ainda tinha uma cópia da chave. Nenhuma resposta.

Enquanto isso, os vizinhos, um casal de idosos, ofereciam café, cobertores e preparavam uma cama para ela passar a noite.

A mãe, de longe, mobilizou pessoas nas redes sociais, amigos de Olívia que poderiam ajudar para que a mensagem chegasse à sua faxineira, que também tinha uma cópia da chave. Apesar de ser tarde, a faxineira, com muita boa vontade, cruzou a cidade de metrô para ajudá-la. Sim, de metrô, porque julgou que chamar um transporte particular, além de mais demorado, sairia muito custoso para Olívia.

Já era quase meia-noite, depois de horas de espera, a chegada da chave permitiu que a porta fosse, finalmente, aberta.

E ali, sentada no sofá da sala, com o casaco que permanecia nos ombros e os olhos ainda levemente marejados, Olívia percebeu, ao contrário do que mais ruminara em sua mente nas últimas semanas: ela não estava sozinha.

Essa história poderia retratar uma cena de filme, daquelas em que, no final, a personagem aprende algo importante sobre a vida. Mas não. Essa história aconteceu na vida real.

Olívia vinha há meses se questionando sobre uma reconciliação com o ex-marido. Mesmo com o silêncio dele. Mesmo com a falta de cuidado. Mesmo com os sinais claros de que ele não estaria interessado nessa volta.

Uma cena que, no fundo, é familiar a muita gente.

“Por que “aceitar o pouco”? Por que insistir em quem não demonstra querer estar?

Pelo medo. O medo de ficar só, de não ser suficiente para ser amado.

Muitas histórias de vida guardam aprendizagens de um amor condicionado, onde se aprende, muito precocemente, que é necessário fazer muito para receber pouco. Que é necessário provar valor para não ser deixado. Que o amor é escassez e precisa de muito esforço para ser retribuído.

A Teoria do Apego, proposta por John Bowlby, destaca o quanto os vínculos afetivos, especialmente na infância, são fundamentais para o desenvolvimento emocional e social de uma pessoa. Quando crescemos com figuras de cuidado imprevisíveis, distantes ou negligentes, podemos desenvolver um padrão de apego ansioso — aquele que teme o abandono a qualquer custo. Um padrão que se antecipa à rejeição e se adapta demais, mesmo que isso custe o próprio bem-estar.

Embora muitas crenças sobre desamor se desenvolvam ainda na infância, a partir da forma como a criança vivencia os vínculos com seus cuidadores, elas também podem surgir ou se fortalecer em fases posteriores da vida, como na adolescência ou na idade adulta. Situações como rejeições amorosas, exclusões em grupos de amizade, relações abusivas, vivências de abandono ou mesmo relações familiares difíceis podem fazer com que a pessoa passe a acreditar que não é digna de amor ou que, cedo ou tarde, será deixada de lado. Quanto mais repetitivas ou emocionalmente intensas essas situações forem, maior a chance de a pessoa internalizar a ideia de que não merece ser amada, o que pode influenciar seus comportamentos futuros: seja evitando se envolver com medo de sofrer, seja buscando de forma ansiosa a aprovação e o afeto dos outros.

O problema é que na tentativa de evitar a solidão, muitas pessoas entram num ciclo de supercompensação: fazem demais, aceitam demais e, com o tempo, se sentem cada vez menos amadas. Isso reforça um padrão de pressupostos disfuncionais pautado na crença de desamor: “Eu só serei amada se eu for útil. Se eu não der trabalho. Se eu for perfeita e me sacrificar para fazer tudo para o outro.”

Mas naquela noite, Olívia viveu uma experiência diferente.

Ela não precisou fazer nada. Não precisou agradar, se explicar ou se esforçar além da conta. Apenas existiu. E, mesmo assim, pessoas se moveram, ajudaram, cuidaram. Gente que não tinha obrigação nenhuma, mas escolheu se fazer presente.

Exatamente quando tudo parecia sair do controle, a vida veio e trouxe pequenos sinais, mostrando que há caminhos mais leves, vínculos mais honestos, encontros que aquecem sem ferir.

E assim, enquanto finalmente se acomodava no sofá, ainda de casaco e com os olhos marejados, Olivia entendeu: estar sozinha não é o oposto de ser amada. Há portas que se fecham — algumas com estrondo, outras em silêncio — mas há também aquelas que se abrem quando menos esperamos. Entre cobertores emprestados, telefonemas solidários e o cuidado espontâneo de quem escolheu estar ali, a vida mostrou que o afeto verdadeiro não é fruto de um esforço solitário, mas de uma disposição mútua, de pessoas que escolhem se encontrar e permanecer. Já não se tratava mais da porta que havia se fechado, mas das outras que, sutilmente, estavam se abrindo bem diante dela.

Simone Domingues é psicóloga especialista em neuropsicologia, tem pós-doutorado em neurociências pela Universidade de Lille/França, é uma das fundadoras do canal @dezporcentomais, no YouTube. Escreveu este artigo a convite do Blog do Mílton Jung. 

Conte Sua História de São Paulo: em memória de Gabi, ajudamos crianças e jovens

Por Iracema Barreto Sogari

Ouvinte da CBN

No Conte Sua História de São Paulo, a ouvinte da CBN Iracema Barreto Sogari destaca a cidade que se transforma a partir da coragem de sua gente:

Meus pais vieram da Bahia, em busca de trabalho e sobrevivência. Nasci em São Miguel Paulista, no extremo leste. Frequentei escola pública, ajudei minha mãe nas tarefas de casa e trabalhei enquanto cursava pedagogia à noite. Fiz especialização em educação especial e, nos fins de semana, participava das comunidades eclesiais de base.

Na década de 1990, criamos o Centro de Comunicação Popular do Itaim Paulista, que incluía uma rádio popular, essencial para os bairros periféricos. Foi lá que conheci Francisco Sogari, pesquisador e jornalista, com quem me casei e tive dois filhos, Gabriele e João Filipe. Trabalhei como professora, em três turnos, e o salário ajudava minha mãe. Nossa família se divertia no Parque Ibirapuera, na Avenida Paulista e até em estádios, torcendo pelo Inter, time do meu marido gaúcho.

Aos seis anos, Gabriele foi arrancada do nosso convívio, vítima de um motorista irresponsável. Ainda hoje, 24 anos depois, vivo a maior violência que uma mãe e um pai podem passar, dor que vai contra a natureza humana: enterrar os filhos.

Mas a vida tinha que continuar.  Encontramos forças em João Filipe e no amor ao próximo. Em memória de Gabi, criamos o Instituto Gabi, atendendo crianças e jovens com deficiência e autismo. Hoje, o Gabi é referência em inclusão, oferece acolhimento e assistência a 50 pessoas diariamente. Em breve, o projeto completa 25 anos, transformando vidas e construindo políticas públicas para famílias que vivem duplamente excluídas.

“Quem ajuda as pessoas é feliz.” Gabi dizia esta frase toda vez em que eu e o Francisco participávamos das atividades nas comunidades.

((os textos originais, enviados pelos ouvintes, são adaptados para leitura no rádio sem que se perca a essência da história))

Ouça o Conte Sua História de São Paulo

Iracema Barreto Sogari é personagem do Conte Sua História de São Paulo. A sonorização é do Cláudio Antonio. Envie seu texto agora para contesuahistoria@cbn.com.br. Para ouvir outros capítulos da nossa cidade, visite meu blog miltonjung.com.br ou o podcast do Conte Sua História de São Paulo.

((os textos originais, enviados pelos ouvintes, são adaptados para leitura no rádio sem que se perca a essência da história))

Use o seu Imposto de Renda para ajudar crianças e idosos, no Rio Grande do Sul

No Brasil, os contribuintes têm a possibilidade de destinar parte do Imposto de Renda (IR) para fundos de assistência a crianças e idosos, com um potencial de arrecadação de R$ 11 bilhões. No entanto, até o dia 8 de maio de 2024, apenas 0,7% desse montante foi efetivamente destinado, alcançando R$ 89 milhões. Desse total, 59% foram direcionados a instituições que atendem crianças e adolescentes, e 40,5% para entidades voltadas a idosos.

O Conselho Nacional de Justiça (CNJ) lidera a campanha “Se Renda à Infância” para incentivar essas destinações, com a colaboração de diversas entidades, incluindo a Receita Federal e a Associação dos Tribunais de Contas do Brasil (Atricon). O prazo para a declaração do IR encerra-se em 31 de maio, mas foi estendido até 31 de agosto para os residentes do Rio Grande do Sul devido à calamidade pública causada pelas recentes tragédias climáticas.

Importância da Destinação

O juiz auxiliar da Presidência do CNJ, Edinaldo César Santos Junior, reforça a importância dessa destinação para os Fundos dos Direitos da Criança e do Adolescente (FDCA) no Rio Grande do Sul. Isso é válido tanto para contribuintes com imposto a pagar quanto para aqueles com direito à restituição. Quem já entregou a declaração pode acessar novamente o site da Receita Federal e destinar parte dos impostos para esses fundos.

Cezar Miola, vice-presidente de Relações Político-Institucionais da Atricon, ressalta que essa colaboração não implica nenhum custo adicional para o contribuinte. “Parte dos tributos que iriam para os cofres da União é revertida em benefício direto às populações atingidas pelas inundações, agilizando e ampliando o acesso a serviços essenciais, sobretudo aos vulneráveis”, afirma Miola.

Desempenho dos Estados

O levantamento revela que o Rio Grande do Sul é o estado com maior percentual de destinação, com 1,94%, seguido por Paraná (1,71%) e Goiás (1,65%). No outro extremo, Amapá (0,09%), Pará (0,13%) e Distrito Federal (0,10%) apresentam os menores percentuais. Estados como São Paulo (0,57%) e Rio de Janeiro (0,17%), apesar de terem alta renda per capita, apresentam percentuais baixos de destinação.

Como Destinar

Destinar parte do IR para fundos de crianças e idosos é um gesto de solidariedade que não implica em custos adicionais para o contribuinte. Através dessa ação, é possível contribuir diretamente para melhorar a vida de muitas crianças e idosos, especialmente em um momento de grande necessidade no Rio Grande do Sul.

Para outras informações sobre a campanha “Se Renda à Infância” e como realizar a destinação, visite o site do CNJ: Campanha Se Renda à Infância.

Assim, ao destinar parte do seu IR, você pode transformar tributos em esperança e dignidade para os mais vulneráveis.

A mágica da validação

Dra. Nina Ferreira

@psiquiatrialeve

Criado pelo Dall-E

Precisar ser visto, considerado, acolhido – sim, a palavra é ‘precisar’, porque isso é uma biológica necessidade humana.

Especialmente quando não estamos nos sentindo bem – tristes, ansiosos, com raiva, perceber que a outra pessoa está notando nosso sofrimento e se sensibilizando com nossa situação nos dá uma sensação de segurança e respeito. E essa é a base para que possamos voltar ao nosso equilíbrio emocional e mental e encontrar forças para levantar e seguir em frente.

O cenário contrário faz um estrago – perceber que o outro não nota nossa dor, não leva em consideração “nosso lado na história”, gera revolta, preocupação, um incômodo intenso. Fugir dali, se esconder, partir pra cima e brigar, falar poucas e boas… tudo isso passa pela cabeça quando uma pessoa se sente invalidada. Em resumo, a invalidação é uma arma que causa profundos machucados e gera reações muito ruins nas pessoas.

Com esta dualidade exposta, te convido a refletir: você já foi invalidado? Se sim, como se sentiu? Uma outra reflexão, essa mais desafiadora: você já invalidou alguém? Já reparou se é uma pessoa que faz isso com outras… se é raro ou frequente…?

A mágica da validação é a essência do entendimento entre as pessoas, da solução de problemas, da sensação de segurança e bem-estar. A mágica da validação sustenta a ajuda mútua entre os seres humanos e, vamos combinar… ajuda mútua facilita tudo!

Vamos começar a treinar essa mágica? Pessoas validantes servem de porto-seguro e de exemplo para outras – é um clássico “ganha-ganha”!

Vamos validar e, assim, fluir e viver mais leve!


A Dra. Nina Ferreira (@psiquiatrialeve) é médica psiquiatra, especialista em terapia do esquema, neurociências e neuropsicologia. Escreve a convite do Blog do Mílton Jung.

Conheça três projetos que ajudam profissionais de saúde, empreendedores e pequenos negócios

 

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Imaginar o que haverá pós-pandemia é difícil. Há quem veja um mundo mais solidário. E os que enxergam as fronteiras mais fechadas. Há os que pensam em uma vida mais simples. E os que creem no aumento das desigualdades. Talvez saíamos todos iguais ao que éramos assim que a crise amenizar, a vacina aparecer e o novo coronavírus se transformar em velho conhecido. O que enfrentamos vira memória — história para ser contada. E bola frente. Quem jogava bonito, segue fazendo belezuras. Quem jogava feio, feiúras. Os adeptos do jogo sujo, sujeiras.

 

Melhor, então, olhar para o que acontece agora e identificar quem sabe se comportar diante da regra do jogo e usa de sua criatividade para melhorar o mínimo que seja a vida do outro. Nestes dias, encontrei algumas iniciativas que me chamaram atenção; gente disposta a ajudar gente, a apoiar empresas, manter empregos, acolher quem precisa.

 

 

Começo pelo Projeto Isolar que olha para os profissionais de saúde, muitos dos quais com dificuldade para encontrar um lugar onde possam ficar isolados. É o pessoal que atende nos postos e hospitais, recebe pacientes, trata, cuida, dá carinho, salva. E tem medo de voltar para a própria casa pelo risco de contaminar seus familiares. O Isolar é uma plataforma na qual o médico, o enfermeiro, a recepcionista do hospital, o motorista da ambulância, ou seja, qualquer um desses profissionais que estão no “campo de batalha” se candidatam a um imóvel, próximo ao local do trabalho, que será financiado pelo próprio projeto que se sustenta a partir de doações.

 

A Camila Putignani, uma das idealizadoras do Isolar, conta que ao menos 250 pessoas estão cadastradas e foi possível, até este momento, acomodar 17 profissionais que podem ficar em um apartamento ou em um quarto de hotel, de hostel ou de pousada. O prazo inicial é de 14 dias podendo ser renovado conforme a necessidade do profissional. Além da moradia, as doações servem para comprar produtos de higiene pessoal, limpeza e alimentação.

 

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O outro projeto que também depende da doação é o “Adote um Pequeno Negócio”, criado pelo Claudio Tieghi e o Fabio Fiorini. Na plataforma, o doador escolhe a quem se destina o dinheiro. Os empreendedores escolhidos receberão consultoria para organizar a empresa e terão acesso a uma plataforma que permite controlar as tarefas diárias do seu negócio.

“Para adotar uma empresa, sendo pessoa física, é necessário inicialmente investir R$9,90 ou mais. Em seguida, o investidor recebe um livro (“Manual do micro e pequeno negócio em tempos de pandemia”) para presentear um outro empreendedor, além de ter acesso à plataforma para acompanhar o dia a dia da empresa que adotou. O nome da cada pessoa que fizer a adoção irá aparecer na página dos doadores, além de receber um certificado” Fabio Fiorini.

O terceiro projeto que destaco reúne gente graúda e está sob o comando do César Souza, do Grupo Empreenda, e do Alexandro Barsi, da Verity Group. Com o Movimento #VamosVirarOJogo, eles estão reunindo empresários e gestores dispostos a compartilhar práticas e ideias capazes de ajudar as empresas a superarem os obstáculos impostos pela crise atual. Mais de 300 empresas já assumiram o compromisso de atuar no movimento:

“A frase “Há vida após o Covid-19” nos inspirou a estruturar o movimento. As lideranças empresariais devem compreender que virar o jogo passa, necessariamente, por assumir um verdadeiro compromisso, com muita inovação e criatividade para a reinvenção dos negócios, considerando oportunidades ainda não percebidas. Levando em conta o ecossistema de toda a cadeia de valor das empresas, é necessário que todos deem o melhor de si, com foco em soluções para o futuro e superando medos e angústias naturais em meio às turbulências que vivenciamos. Reinventar á a palavra de ordem”. César Souza.

Todas essas iniciativas nos revelam que existe gente interessada em espalhar o bem. Talvez sejam as mesmas pessoas que sempre atuaram assim, antes da pandemia se apresentar. E sejam as mesmas que continuarão acreditando nestas práticas após a crise passar.

 

A esperança que sempre deposito é que essas ações ao estenderem a ajuda a outras tantas pessoas façam dessas outras pessoas e de todos os que foram impactados, direta ou indiretamente, embaixadores do bem, criando um ciclo virtuoso. É a minha esperança; se esta vai se tornar realidade somente saberemos ao longo do tempo. Prefiro acreditar que sim. Fica mais fácil atravessar o drama que estamos assistindo neste momento.

Mundo Corporativo: como o coronavírus mudou o cotidiano de uma fábrica de carros e vai impactar o comportamento do consumidor

 

“Na volta ao trabalho, funcionários devem encontrar um ambiente que os proteja”, Antonio Filosa

Engenheiros de automóveis estudam manuais de respiradores e ventiladores respiratórios; projetistas e desenhistas de carros adaptam impressoras 3D para produzirem plástico shield usados em máscaras faciais. Essas são algumas mudanças que ocorreram na rotina de funcionários da Fiat Chrysler, aqui no Brasil, desde a paralisação das fábricas devido a pandemia do coronavírus.

 

De acordo com Antonio Filosa, presidente da FCA na América Latina, graças a disposição desses profissionais já foi possível entregar mais de 1.000 plásticos shield —- mais 1.000 estão para serem entregues nas próximas semanas. E foram recuperados cerca de 100 ventiladores e respiradores de um total de 256 que apresentavam defeitos e não podiam ser usados pelas equipes médicas. Duas salas especialmente preparadas para esses trabalhos foram montadas logo que os novos projetos foram apresentados pelos funcionários.

 

Em entrevista ao Mundo Corporativo da CBN, o executivo disse que a crise sanitária e econômica provocada pela pandemia levou a FCA a definir seu planejamento estratégico a partir de três pilares:

  • Solidariedade —- com a empresa expressando sua razão social através de projetos e ações, especialmente com as comunidades no entorno dos locais onde mantém suas fábricas;

 

  • Proteção das pessoas —- com investimento para implementar os dispositivos e processos de segurança sanitária nas fábricas, escritórios e ambientes da FCA;

 

  • Retomada inteligente — com estudo social e antropológico para entender o comportamento das pessoas, dos funcionários, dos parceiros de negócios e do consumidor nos pós-pandemia.

 

A paralisação das fábricas e a queda acentuada das vendas de automóveis fizeram a Fiat Chrysler rever os resultados previstos para suas operações no Brasil, em 2020. Se a expectativa nos dois primeiros meses do ano era de um crescimento de 8% até dezembro, agora o presidente da FCA calcula perdas de até 40%. Segundo ele, em março, a demanda foi 90% menor, e em abril, 80%, índice que deve se repetir quando as contas de maio fecharem. Soma-se a esse prejuízo, o impacto financeiro das mudanças que o fabricante está promovendo para retomar a produção em condições de segurança sanitária.

 

No calendário da FCA as fábricas começam a operar parcialmente no fim da segunda quinzena de maio, mas a estratégia de retomada ainda depende do ambiente externo nas áreas em que atua — ou seja, de identificar como está o controle da pandemia em cidades como Betim (MG) e Goiana (PE), onde têm duas de suas fábricas na América Latina. Internamente, todas as medidas teriam sido implementadas, segundo o executivo informou a partir de uma simulação de retorno realizada na semana passada.

“O retorno vai depender da conjunção desses fatores (internos e externos)”

Para aumentar a segurança, a FCA terá termômetros que medem e escaneiam a temperatura de todos os funcionários. Desenvolveu um aplicativo, instalado nos celulares dos colaboradores, para informação rápida e autoavaliação do estado de saúde. E duplicou a frota do transporte coletivo para permitir distanciamento entre os passageiros nos ônibus que levam os trabalhadores às fábricas.

 

Quanto ao estudo que analisa o comportamento pós-pandemia, Filosa diz que algumas mensagens são bem claras. Uma delas que parece óbvia é o fato de que a digitalização e a experiência digital serão cada vez mais presentes na vida das pessoas:

“Não apenas nos hábitos de pesquisa ou de consumo futuro, mas também dos nossos hábitos diários: os escritórios parecem agora uma entidade longe do nosso hábito, quando até 45 dias atrás fazia parte do nosso cotidiano”

Outra mensagem aparente é que o período forçado de isolamento mudou a forma de as pessoas se relacionarem com a própria casa que antes era o local de descanso, agora também é o de trabalho e de maior comunhão com a família. Percebe-se também a tendência de algumas pessoas trocarem o transporte público pelo individual, como forma de segurança. E de outras quererem se reconectar com alguns prazeres próprios — no que o automóvel pode ser um agente importante, segundo o executivo.

 

Com base na experiência de fábricas da FCA que retomaram a produção, como as da China, Antonio Filosa diz que a expectativa é que, depois desse prendo dramático, a volta ao trabalho deve ocorrer associada a sentimentos mais positivos, com valores mais puros, de solidariedade e união entre os colaboradores:

“Claramente não gostaríamos de ter passado por tudo isso; mas quando voltarmos, vamos voltar melhor e mais forte: com esses valores faremos a diferença”

O Mundo Corporativo vai ao ar aos sábados, às 8h10 da manhã, no Jornal da CBN e aos domingos, às 10 da noite, em horário alternativo. Colaboraram com o programa Juliana Prado, Natasha Mazaro, Patrícia Gubioti e Adriano Bernardino.

A lição do Seu Paulo a oportunistas de plantão

 

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A imagem do apoio do pai de uma refém à mãe do sequestrador é de  Pedro Teixeira/Agência O Globo

 

Foram cerca de quatro horas de transmissão, ao vivo, descrevendo as cenas de um homem que mantinha reféns o motorista de um ônibus e 38 passageiros. No seu entorno, forte aparato policial, agentes especializados em negociação de risco, atiradores de elite e uma quantidade enorme de gente que teve seu caminho para o trabalho bloqueado. A história que monopolizou os programas matutinos —- incluindo o Jornal da CBN —, nessa terça-feira, e tinha a ponte Rio-Niterói como cenário nos trouxe de volta à memória o sequestro do ônibus 147, que resultou na morte do sequestrador e de uma refém, no Jardim Botânico, no Rio de Janeiro, em 2000.

 

 

Cada momento da negociação, a liberação dos primeiros reféns, o atendimento médico, a movimentação estratégica dos policias, a angústia do trabalhador que estava preso no congestionamento ou do motoboy que teve entrega interrompida foi contada minuto a minuto. A participação de repórteres que levantavam as informações possíveis no local ou à distância, assim como a palavra de porta-vozes oficiais e especialistas em segurança pública e gerenciamento de crise colaboravam na construção daquela crônica de uma cidade tensionada pelo medo e a violência.

 

Os tiros que deram fim a atuação do sequestrador —- que se soube depois ser um rapaz de apenas 20 anos —- não puderam ser registrados pelas câmeras, mas foram ouvidos e relatados pelos jornalistas que estavam próximos. Tiros seguidos de gestos de comemoração expressados por pessoas transformadas em plateia viva daquele drama, em uma reação expontânea de um público acuado e já incomodado com a demora para o desfecho do caso. Nada que estivesse a altura do espetáculo grotesco proporcionado na sequência pelo governador do Rio, Wilson Witzel, que desceu saltitante do helicóptero, com um sorriso no rosto, braços erguidos e punhos cerrados como se comemorasse a vitória da barbárie. Tudo devidamente registrado pelo celular de um aspone que buscava o melhor ângulo para as redes sociais —- não se tem notícia onde foram parar aquelas imagens, após a repercussão negativa do comportamento do governador. 

 

Nas declarações que se seguiram, Witzel tentou recuar e disse que estava comemorando a vida salva dos 39 reféns, jamais festejando a morte do sequestrador. Agora já fala em ajudar a família do rapaz, oferecendo apoio psicológico. Difícil acreditar nessa retratação, especialmente se levarmos em consideração o histórico do governador —— “a polícia vai mirar na cabecinha”, declarou logo após eleito ao definir a política de segurança pública que colocaria em vigor no Estado. De lá até agora, o que assistimos foram muitos jovens inocentes sendo mortos com esses tiros a esmo disparados em confrontos entre policiais e bandidos nas comunidades mais pobres do Rio.

 

Após os diversos relatos ouvidos ao longo do dia, nos deparamos com o gesto do pai de uma das reféns em solidariedade a mãe do sequestrador morto. Paulo César Leal, de 54 anos, ainda tinha o coração dolorido pelo drama que enfrentou durante as quase quatro horas em que temeu pela vida da filha, Raiane, de 24. Todos os dias ele a deixava no ponto de ônibus para embarcar na linha Alcântara x Estácio e não demorou muito para saber que a jovem estava entre os 39 reféns. Nada disso foi tão forte que o impedisse de dar um abraço na mulher que havia acabado de ver seu filho ser morto por ter protagonizado aquelas cenas de ameaça e violência.

 

“Como ser humano, fui ajudar, porque naquele momento a dor é dos dois lados. Eu não tenho poder de julgar nem falar qualquer coisa que seja boa. Só falei para ela ter calma e confiar. O que eu vou dizer para ela, de conforto? Não tem o que dizer”, declarou aos jornalistas que se aproximaram dele. 

 

Obrigado, Seu Paulo. Seu gesto não apenas apaziguou o coração daquela mãe como nos serviu de lição de que ainda é possível acreditar na generosidade do ser humano. Que nossas autoridades, perturbadas pelo populismo, um dia aprendam com o senhor.

Conte Sua História de SP: a solidariedade que marcou minha chegada de Santa Fé

 

Osvaldo Seguel

 

 

 

1975, Brasil,fim do governo Geisel, em São Paulo ainda funcionava a rodoviária da Luz, onde afluíam e do seu interior saiam a grande maioria dos ônibus vindos e indo para o interior do Estado e do Brasil todo. Foi nessa rodoviária, febril e estreita, pois de teto baixo (onde ônibus quase riscavam no topo),e,por isso,permanentemente poluída pela fumaça dos escapamentos … que desembarquei em São Paulo, numa manha de março, há quase quarenta anos..e .doente !

 

Vindo da cidade de Santa Fé, num dos ônibus da empresa argentina General Urquizar, onde e após 72 horas de viagem contrai intoxicação alimentar …. chegando a São Paulo com vômitos convulsivos e quase não parando em pé. E aqui tive que descer pois era fim de linha.

 

A generosa solidariedade dos dois motoristas e da rodomoça foi inesquecível. A cada momento desse mau-passar, estavam acompanhando-me nas idas e vidas do banheiro do ônibus, enquanto o mesmo escalava a serra do cafezal, próximo à cidade de Registro, já no Estado de São Paulo. Relembro agora a elegância dos mesmos no trajar e até terem me fornecido cruzeiros que devia exibir, se indagado na alfândega, da fronteira argentino-brasileira, de Foz do Iguaçu.

 

Também devo assinalar aqui a solidariedade de alguns passageiros, dentre eles destaco uma casal de irmãos da minha idade (17 anos), brasileiros, porém que falavam o espanhol e me deram as primeiras aulas de português, ensinando como “cambiar diñero” “pedir una bebida” “preguntar por una calle”…eram filhos de um dono de uma agêcia de viagens e apesar de muito jovens viajavam sozinhos…veio-me agora seus rostos de traços europeus, alegres e solidários…

 

Porém, não guardo o rosto solidário e oportuno do passageiro chileno: era um jovem mais velho do que eu e que já morava no Brasil há vários anos, foi ele quem me ajudou a descer do ônibus nesse estado febril, com as minhas malas. Com elas permaneceu na rodoviária enquanto eu saía a procura de uma farmácia para tratar da minha intoxicação. A única coisa que encontrava chamavam de drogarias.
Um jovem de aspecto indígena dentro de seu avental branco me atendeu, após ser chamado pelas outras funcionárias da tal drogaria. Devem ter-lhe dito, que havia um jovem doente que não falava português mas aparentava estar passando mal.

 

Que fue lo que comistes ?…y há cuanto tiempo ?….

 

Contei que comecei a passar mal nessa madrugada após ter comido um pedaço de bolo com café com leite, numa das paradas daquela noite… e aí veio o milagre …o jovem farmacêutico preparou um coquetel líquido e após ter-me injetado esse misterioso elixir químico, como por passo e mágica, melhorei….e mui agradecido, fui pagando … ele afinal alertou-me de que iria sentir muito sono… ele não soube mas eu já não dormia praticamente desde que saíra do Chile…há quatro dias!

 

Voltei à rodoviária a procura de minhas coisas que ficaram com aquele passageiro desconhecido. Lá estava ele e minhas coisas .. graças a Deus! E sentindo-me agora melhor nesse país de nomes tão estranhos, e, certamente, enorme, populoso, febril e barulhento, onde as vulcanizadoras na estrada chamam-se borracharias que, em espanhol significam bêbados e as fármacias são drogarias, onde lá na Argentina é onde se vende drogas.

 

Coisas desta nova linguagem tropical..!

 

Osvaldo Seguel é personagem do Conte Sua História de São Paulo. A sonorização é do Cláudio Antonio. Você pode contar mais um capítulo da nossa cidade. Escreva para milton@cbn.com.br.

Paulistano quer cidade solidária, diz Irbem

 

bannerIRBEMRespeito ao outro, mais consciência coletiva e melhor relação com a cidade são alguns dos valores que aparecem na primeira etapa da construção dos Indicadores de Referência de Bem-Estar, que serão apresentados nesta terça-feira, em São Paulo. Para o coordenador executivo do Movimento Nossa São Paulo Maurício Broinizi a busca por uma cidade solidária surpreende a medida que o senso comum é de que nos grandes centros urbanos as relações são impessoais.

Crianças e adolescentes vão influenciar na construção dos indicadores pois dos cerca de 36 mil questionários respondidos pelo menos 23 mil são jovens incentivados a participar pelas escolas das redes pública e privada. O resultado parcial mostra ainda que pais e filhos tem olhar parecido sobre a cidade, pois os estudantes revelam a mesma percepção que os adultos sobre as necessidades para se alcançar o bem-estar.

Ouça a entrevista de Mauricio Broinizi, no CBN SP

Os resultados da consulta pública do IRBEM (Indicadores de Referência de Bem-Estar no Município) – serão apresentados em evento no Sesc Vila Mariana, no próximo dia 17 de novembro, das 10h30 às 12h30. Após a divulgação dos resultados, haverá um debate com jornalistas e especialistas que acompanham as questões da cidade.

Leia mais sobre o tema no site do Nossa São Paulo