Por Carlos Magno Gibrail
A Cia. City, como o paulistano bem informado sabe, foi a pioneira do planejamento urbano bem sucedido. De São Paulo e do mundo.
Fundada em 1911, chegou a São Paulo em 1912, quando introduziu em Londres e aqui, a ideia de um bairro com ruas sinuosas que inibissem o tráfego intenso, propiciando uma qualidade de vida invejável aos moradores, que teriam extensas áreas verdes através de praças e recantos com árvores e flores.
Jardim América e depois Pacaembu foram as primeiras áreas implantadas. Cidade Jardim, Morumbi, City Pinheiros, City Lapa, Jardim Morumbi, Jardim Leonor, Vila Sonia, Jardim Caxingui, Vila Paulista, Planalto Paulista e muitos outros bairros copiaram o conceito.
Hoje, há uma ameaça geral ao então invejado estilo londrino e paulistano através do automóvel e seus derivados, pois o tráfego intenso acaba com a qualidade de vida dos moradores, alterando as condições do meio ambiente. Acidentes, poluição, ambulantes, flanelinhas, assaltantes desencadeiam um real processo de degradação, danificando e destruindo as condições originais sociais e ambientais.
As ruas criadas como vias de transporte local passam a vias de conexão de bairros, onde a mudança de função leva ao desordenamento, onde os moradores locais pagam um alto preço ao perder a qualidade de vida, cedendo à pressão do trânsito de veículos, e os demais moradores da cidade recebem a degeneração de mais um pulmão verde de São Paulo.
A CET retomando a EMURB, que na década de 90 atendendo a solicitações de entidades de moradores criou bolsões residenciais, atualizou e melhorou o conceito ao criar o “Traffic Calming”. Ao invés de isolar as áreas residenciais como na proposta da EMURB, objetiva devolver o tráfego inadequado ao sistema viário principal.
A inovação iniciada em 2005 na City Boaçava em Alto de Pinheiros enfrentou resistência do Ministério Público. O promotor José Carlos Freitas alega que bairros vizinhos poderão receber o fluxo indevido, além do elitismo ao exigir que os moradores paguem as despesas do sistema de bloqueio ou desvio do tráfego, o que penaliza aquelas regiões que não possuem recursos financeiros, e sinaliza que o processo ainda está aberto.
Independentemente disso, a CET, finalmente cumprindo com a função precípua a que está incumbida, que é a coordenação da engenharia de tráfego da cidade, o que implica necessariamente na gestão técnica e social, além de considerar o trânsito não apenas um fim em si, mas também um meio de administrar as variáveis da locomoção e vida urbanas abre a possibilidade para os moradores assumirem o papel de cidadão, e através da tramitação legal apresentar propostas que beneficiem suas comunidades.
Vila Paulista, Jardim Caxingui, Jardim Morumbi, Vila das Flores, Jardim Marajoara, Vitória Régia já se apresentaram ao CET. Tudo indica que sairão vitoriosos, pois as condições exigidas são coerentes e as características destes bairros estão dentro dos parâmetros.
Diz a CET:
A moderação de tráfego busca atender bairros predominantemente residenciais que tenham, em suas vias locais, um grande fluxo de veículos fugindo do sistema viário principal, com
velocidades incompatíveis com a malha viária e a dinâmica localAs medidas só são autorizadas após análise e comprovação de que não causarão prejuízos ao sistema viário principal.
É necessária a aprovação por no mínimo 70% dos moradores
Ao Ministério Público cabe refletir sobre seus argumentos. Quanto à questão da vizinhança, de acordo com o critério da CET não haverá aprovação se ocorrer prejuízo ao sistema viário principal. Fica bem clara a intenção da CET de corrigir a anomalia de usar vias locais para conexões entre bairros, repondo a necessária hierarquia urbana.
Cabe também analisar o alegado elitismo, pois é só transferir para o estado as despesas para mudanças em áreas de moradores sem recursos ao invés de impedir aqueles com recursos, de financiar o estado. Qual o problema de também beneficiar os moradores em áreas residenciais nos bairros periféricos? Por que não utilizar um conhecido, mas pouco utilizado sistema de transferência de renda? Os mais fortes contribuindo para os demais?
Carlos Magno Gibrial é doutor em marketing de moda e escreve às quartas no Blog do Mílton Jung

