De descobertas

Por Maria Lucia Solla

Click to play this Smilebox slideshow: De descobertas 18.04.09
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Ouça e veja as “descobertas” na voz da autora clicando na imagem acima. A música é St. louis Blues – Benny Goodman  

Olá,

Esta semana, dirigindo à noite na Marginal Pinheiros, fiz uma descoberta do tipo dois. Deliciosa.

Conheço e percebo dois tipos de descoberta. A do tipo um que acontece de fora para dentro, e é chamada de aprendizado ou conhecimento, e a do tipo dois que acontece de dentro para fora, e é chamada de percepção, intuição, clarão, loucura ou eureka. Vão em sentido contrário, mas são porções da mesmíssima realidade, e uma contem a outra. A do tipo um é popular e circula por aí, feito celebridade. A do tipo dois já se mostra com cautela; é comentada a boca pequena, como no tempo da fogueira e da forca. Ao pé do ouvido.

No entanto, o modo como somos treinados a viver nos dificulta o contato com a descoberta do tipo dois, e a gente não consegue ver o que mora debaixo de véus, carimbos, dissimulação, e crenças adquiridas. Imagine! Crença adquirida! Adquirimos sim, herdamos, engolimos a seco ou com um trago, recebemos intravenosamente… Compramos a maioria das crenças, e nem chiamos. Que loucura!

Na adolescência, um dos meus amigos tinha mais de um carro, e meu pai não gostava nem um pouco quando ele me trazia da escola para casa num carro diferente. O que os vizinhos iriam pensar?! Claro que ele herdou essa crença. Não podia ser uma escolha dele. Eu era sua filha. Ele me conhecia. Conhecia meus amigos. Percebia quem eu era. Ou não? Enfim, só um exemplo de que corremos o risco de nos transformarmos naquilo que aprendemos. Usamos fragmentos de conhecimento para construir barreiras, dogmas, preconceitos, e para nos protegermos da vida.

Não nos deixamos permear.

Impermeabilizamos as cidades, e é exatamente o que fazemos conosco. Veias, artérias, vísceras; nossas emoções. Nos reprimimos doentiamente, e adoecemos doentiamente. Lutamos contra a própria Terra, através da terra e dos rios. Nós a aprisionamos, nós a sufocamos, nós a violentamos. Boicotamos nossa sociedade criando partidos que abrigam indivíduos que tiram partido deles. Nós os criamos para que se oponham visceralmente. Brigam tanto, medindo forças, que acabam brigando só por si mesmos e estamos conversados.

Mas voltando a elas, a maior parte das vezes, quando fazemos uma descoberta do tipo um, entramos em contato só com uma partícula da realidade. Aquela visível através dos olhos do corpo, inteligível através da mente terrena. Não reconhecemos o outro; não percebemos o outro. Estamos tão acostumados a olhar carcaças e a usá-las como espelho, que acabamos nos contentando com pouco.

Subverter é preciso. Afinal, subverter não quer dizer descobrir? Não quer dizer mudar a vertente? Mudar a direção? Sub não é um prefixo que dá a idéia de por baixo, pela base da estrutura? Então, é por isso que o verbo foi mandado para a masmorra. Subverter ganhou outro significado, outra roupagem. Hoje quer dizer quebrar a ordem vigente. Percebe?

Prefiro chamar a descoberta de dentro para fora de percepção, que está em estreita sintonia com a Vida. Perceber é um verbo que usamos quase sem perceber. É como se ele se escondesse dele, e nele mesmo. Os esotéricos seguramente perceberam que o perceber se escondia  ali e, alguns se prevaleceram dessa percepção para dominar e manipular o  mundo em volta, sem que o mundo percebesse. E a história se repete.

E você, costuma perceber?

Pense nisso, ou não, e até a semana que vem.

Maria Lucia Solla é terapeuta e professora de língua estrangeira. Aos domingos, nos ajuda a olhar as coisas de outro modo, sem modos nem modas.

16 comentários sobre “De descobertas

  1. Maria Lucia, este é um tema importantissimo.
    Há que ter abertura para novidades,mudanças,diferenças.
    É preciso ter conhecimento para saber que não há conhecimento estabelecido.
    A mudança é permanente e a abertura tem que estar sempre presente, assim como preconceito ausente

    Abraço

    Carlos Magno.

  2. Ola ML
    Se existe algo difícil de ser notado pelo no ser humano é o “seja você mesmo”!
    Tirar os próprios véus!
    Parabéns pelo tema de hoje.
    Bom domingo
    Armando Italo

  3. Armando Ítalo, amigo escrevinhador!

    Gostei muito do seu texto, blogado aqui esta semana, e fiquei lisonjeada por ter uma foto minha ilustrando o seu pensar. Viu que ela está aqui também, no slideshow?

    Isso é que é multimidiaquice, não é?
    Seria multimedia kiss, in English? rsrs

    Milton Jung nos leva longe, diminuindo o próprio passo para que possamos acompanhá-lo, unindo pessoas, idéias, ideais, palavras, sentimentos, esforços, ao longo do caminho, com uma generosidade rara de encontrar, difícil de compreender, e alvo favorito da condenação de quem não percebe.

    Bom domingo pra você também, Armando, cercado de gente que percebe.

    Beijo,
    ml

  4. M.L
    Adorei a sua foto ilustrando “no meu texto”
    Tudo a ver!
    Gosto muito deste gênero de imagens e pelo que pude notar vc e a sua sensibilidade.
    TEnho muitas imagens reais e virtuais arquivadas
    Se vc quiser te mando com muito prazer.
    Obrigado!
    Bom domingo
    Cavok sempre!
    Armando Italo

  5. Maria Lúcia adorei o texto e sua fala também.
    Eu percebo que na realidade estou viciado nesse divã dominical.

    Eu percebo que não consigo mais ficar sem ler os textos de uma certa terapeuta que insiste em nos mostrar certas verdades.

    Certamente fomos “puxados pela orelha” para um exercício de descobertas do tipo 1 e do tipo 2.
    Ainda bem bem que temos você para nos alertar.

    Bom domingo à todos pois agora vou refletir sobre outras descobertas, ainda por serem descobertas.

  6. Ah, flor,

    Estou vivendo o tipo dois, ininterruptamente! Às vezes de maneira doída, brigando com o tipo um; outras, suavemente…
    Tenho me despido de tudo para ver se me descubro.
    E tuas palavras caíram tão bem que já não me sinto tão sozinha!
    Obrigada, sempre, por suas palavras.
    Beijo,
    Suiang

  7. Suely,

    Seja bem-vinda. E se já posso chegar palpitando… Nesta manhã de segunda-feira, ensolarada na medida certa, recheio saboroso de feriadão, preguiçosa, espaçosa, ruim para os cofres públicos, mas bálsamo para o coração, pense, sim, enquanto se mima e se cuida. Sem culpa.

    Beijo,
    ml

  8. Maria Lúcia:
    Veja como a vida tem suas coincidências. Ou não?
    Entrei hoje pela primeira vez no blog de Milton Jung e que eu encontro? Esta maravilha de texto deixada por você. Coisa estranha isso… Nos conhecemos por telefone – por causa de um trabalho – e de repente a vejo declamando algo tão profundo quanto o entender da alma humana.
    Estou perplexa (no bom sentido) com este fato inusitado.
    Muito interessante isso… Deveras interessante.
    Um abração.
    Teresa (XRT)

  9. Olá, Teresa,

    que bom te ouvir.
    Sou fascinada pela alma das pessoas. Pelo que realmente é real (!) nelas. Nem sempre acerto, mas sempre aprendo e me alimento do convívio.
    Obrigada pelo carinho e…
    Não nos abandone mais, combinado?

    Beijo,
    ml

  10. Lu querida,aprecio muito os teus comentarios.Domingo ja é uma rotina abrir o email para ler com muita atenção.
    Todos eles servem para a gente refletir bastante.
    Gostamos muito de ti .
    Vera e Nukas

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