
Os barulhos urbanos podem ser diversos dependendo a região na qual você mora. Aqui perto de casa, tem vizinho barulhento, que ouve rádio mais alto do que necessário. Só não reclamo porque ele ainda ouve rádio. Pior é o outro que educa os filhos aos berros e é correspondido por eles, que respondem até perderem a voz.
O de melhor lembrança é o do grito das crianças na escola que fica logo na esquina de casa. Na hora da saída, uma outra melodia se destaca: a medida que os pais chegam, a funcionária chama o nome dos alunos no alto-falante. E esse som vem até aqui e teimo em ouvi-la chamando o nome dos meus dois meninos, que estudaram lá até o fim do ensino médio.
O som da Igreja no fim da rua também é marcante. Todas às vezes que, ao meio-dia e às seis da tarde, o sino replica, tenho a impressão que vivo em uma pequena cidade. Gosto, também, de ouvir ao fundo o som da Ave Maria cantada pelos fiéis nos horários da missa.
Assustador é o som da sirene do carro fúnebre que insiste em me avisar que a morte está passando. O cemitério, que anda movimentando nos últimos dias, está a algumas quadras daqui e a sirene mais se parece com um lamento interminável.
Na madrugada, além do rapaz que mora perto e estaciona o carro ouvindo suas músicas preferidas em alto e bom som, só me incomoda mesmo a chegada das caçambas. Sei lá que tanta obra e reforma fazem meus vizinhos. Mais difícil de entender é como a tecnologia desenvolvida do jeito que está não inventaram caminhões, caçambas e correntes menos barulhentas. O badalar do ferro em outro ferro tira o sono de qualquer um. A consolar apenas o fato que a maioria das entregas ocorre quando já estou praticamente levantando da cama para trabalhar na madrugada.
Nenhum barulho, porém, é mais desconfortável do que o da serra elétrica. Nem tanto pela frequência com que o som atinge nossos ouvidos, mas pelo que representa. Sexta passada, minha casa foi invadida por este barulho e logo percebi que era obra de uma equipe contratada para “limpar” o que restava de terreno arborizado na minha rua.
Eles chegaram rápido e com a mesma rapidez fizeram as serras soarem nos meus ouvidos. Enquanto isso, levantavam uma placa anunciando que estava em processo uma operação de “manejo de vegetação arbórea” – que, se realizada de verdade, nada mais é do que cortar árvores aqui e plantar outras em sei lá qual lugar.
Será que se eu perguntasse, eles me diriam em que endereço poderei respirar o ar puro das árvores que não farão parte mais da minha vizinhança? Onde será que poderia visitar as falecidas?
A serra elétrica já parou de gritar nos meus ouvidos, mas assim que se calou percebi, no rastro das árvores derrubadas, que levou junto o canto do sabiá. Daquelas dezenas de sabiás que batiam asa na frente de casa e assoviavam ainda de madrugada em busca de uma namorada.
E esse provavelmente será o barulho urbano que me perseguirá para o resto dos tempos na casa em que moro: o silêncio dos sabiás.
Que postagem linda Milton, cheia de sensibilidade…A última frase então…é de calar qualquer barulho ensurdecedor.
Parece que você é meu vizinho. Aqui são os mesmo sons (ou barulhos), tirando a igreja e o cemitério.
Ainda ouço os sabiás e especialmente um que visita minha casa constantemente. Não sei porque.
Chamo de kamikaze porque junto ao jardim 3 gatos o espreitam.
A postagem começou branda e terminou triste, mas parece que é o destino de todos os bairros desta nossa cidade.
Os sabiás que tanto se acostumaram com nós sofrem com nossas transformações.
Gostaria de poder avisá-los para que tenham cuidado:
– O homem vem ai! O home vem ai!
Os sabiás saberão se realocar, saberá lá aonde
Milton, este tema tão antigo quanto contemporâneo a respeito da humanidade, e ao mesmo tempo a respeito do respeito, motiva pegar carona e atrelar mais sons.
É o que me permitirei fazer no post de amanhã.
Até lá, e cumprimentos pelo texto, bonito por fora e por dentro.
Valeu, Carlos! Estamos esperando você por aqui.
Pingback: Tudo é uma questão de respeito | Mílton Jung
Bom dia
Ai que raiva..porque tanta destruicao.
E agora onde irao morar os belos Passaros…
A natureza vai cobrar..tenho certeza.
Fico triste..pelos Passaros..e por Voce.