Por Maria Helena Leonel de Queiroz
Ouvinte da CBN
No Conte Sua História de São Paulo, o texto da ouvinte Maria Helena Leonel Gandolfo:
Meu pai havia se casado com a filha de um comerciante português. O tio Carlos, irmão do papai, com a filha de um rico industrial italiano. Em 1936, morávamos em um sobradinho na Lapa. E meu tio num belo palacete na Rua Estados Unidos. No dia 12 de julho um importante acontecimento marcava a estreia da cidade de São Paulo no cenário automobilístico internacional: o I Grande Prêmio de São Paulo.
Pilotos europeus e sulamericanos, que um mês antes haviam participado do IV GP Cidade do Rio de Janeiro, no Circuito da Gávea, inscreveram-se para a prova que iria se realizar nas ruas do Jardim América. O circuito, com cerca de 2.500 metros, tinha sua linha de largada e de chegada na Av. Brasil, em frente ao prédio do Automóvel Clube e formava o quadrilátero com as ruas Colômbia, Estados Unidos e Canadá. Um percurso de 60 voltas, totalizando 150 quilômetros.
Alguns corredores, os mais renomados, eram o italiano Carlo Pintacuda, com sua Alfa Romeo 8C35, o argentino Augusto MacCarthy com um Crysler V-8; e os brasileiros Manuel de Teffé, com sua Alfa Romeo 6C1750 e Chico Landi, com um Fiat. Mas a estrela, sem dúvida, era a francesa Hellé-Nice, que disputava a corrida com seu Alfa Romeo 8C35, pintado de azul — artista de teatro, acrobata e dançarina no Cassino de Paris, Mariette Hélène Delangle, nascida em 15 de dezembro de 1900, havia iniciado sua carreira como piloto nos anos 30.
Meu tio, por morar na Rua Estados Unidos, mandou fazer no jardim um palanque para assistir à corrida com todo o conforto junto com seus amigos. Meus pais, obviamente, figuravam entre os convidados. Nós, as crianças, ora brincando no jardim, ora subindo no palanque, estávamos na maior excitação, ouvindo o barulhão dos carros que passavam.
Até que, lá pela 50ª volta, aconteceu o acidente. Dizem uns que foi quando Helenice tentou ultrapassar Manuel de Teffé e os carros se entrechocaram. Outros, que ela perdeu a direção para não atropelar um policial que atravessou a pista. Outros ainda contam que uma fã de Teffé, para atrapalhar Helenice, empurrou contra seu carro um fardo de feno.
Tenha sido esta ou aquela a causa, a conseqüência foi que, correndo a 160 km/h, o carro capotou duas vezes e investiu contra a multidão que assistia à corrida, matando cinco pessoas e ferindo mais de 30. Helenice, lançada fora do carro, foi hospitalizada, recuperando-se após ter ficado três dias em coma. Traumatizada, ela deixou de participar de corridas de grande prêmio passando a disputar apenas provas de ralis.
A corrida de São Paulo chegou ao fim com a vitória de Pintacuda mas o acidente causou grande agitação. Durante dias e dias não se falava de outra coisa. Por isso é que Helenice e Pintacuda são dois nomes que logo me vêm à cabeça quando se fala em Fórmula 1. Naquela época, quando alguém pisava exageradamente no acelerador era certo ouvir o comentário: “Está pensando que é o Pintacuda?”
Maria Helena Leonel Gandolfo é personagem do Conte Sua História de São Paulo. A sonorização é do Cláudio Antonio. Conte você também mais um capítulo da nossa cidade: escreva para contesuahistoria@cbn.com.br