Por Antonio Carlos Aguiar

“Sinto-me – como Silvana Dualibe ao escrever
seu ‘De repente sessenta’, citando Cora Coralina –,
‘com mais estrada no coração do que medo na cabeça.’” [1]
Nesse começo de ano alcanço a idade de sessenta anos!
Todos vocês já sabem como vou começar, mas, me desculpem, não há como ser diferente, senão iniciando pelo bordão: passa rápido demais…
E pior: não fosse o bendito do espelho, eu sequer me veria com sessenta anos.
Mas, chegou. E devo dizer: que ótimo, uma vez que a outra opção não é melhor, uma vez que desconheço literalmente se há “um depois”, e como ele é ou seria.
Bora, então, olhar o lado bom e místico desse novo número etário.
Nesse sentido, os olhares espiritual, mítico e da numerologia se apresentam como um belo elixir para amainar o peso dos sessenta, afinal de contas, segundo a Bíblia:
“Sessenta é o número que representa misticamente todos os perfeitos. Por isso se diz no Cântico dos Cânticos (3:7): ‘É a liteira de Salomão – isto é, a Igreja de Cristo – escoltada por sessenta guerreiros, sessenta valentes de Israel’. Também sessenta é o fruto dado pelas viúvas e continentes. Daí que se leia no Evangelho (Mt 13:23): ‘E produzirão fruto: cem por um, sessenta por um, trinta por um’”; [2]
No espiritismo, observo o número 60 pode ser associado a diferentes conceitos, como evolução espiritual, aprendizado, equilíbrio e transformação;
Nos enigmáticos, numerologia, horóscopo e signos, o número 60 pode ter diferentes interpretações e significados. Pode representar uma energia específica, uma influência astrológica ou até mesmo um arcano do tarot;
No Candomblé e umbanda, o número 60 pode estar relacionado a diferentes entidades, orixás ou energias espirituais. Cada um desses sistemas possui suas próprias interpretações e significados específicos”.
Na vida prática o neófito sexagenário deve, portanto, para que “todos os perfeitos” se manifestem; para exteriorizar e materializar o “aprendizado, o equilíbrio e a transformação”; fruir “energias positivas, próprias de um arcano”; e dar “interpretações e significados” apropriados a esse estágio de vida, fazer mais, diferente e novo, de novo.
Não pode ter melindres. Deve ser humilde e atento com todos os vetores de mudanças. Tem de desaprender e reaprender. Se reinventar a todo instante, a cada segundo; a cada 60 segundos; a cada minuto; a cada 60 minutos; a cada hora; a cada ciclo de cinco anos ou 60 meses; e assim sucessivamente até por muito mais de 60 anos …
Deve viver numa espécie de looping-cognitivo-alquimista capaz de transformar experiência em desempenho superior (e digital). O tempo, mesmo para o sessentão, não para.
Há um começo em cada esquina. Há sempre mais um novo; e de novo ponto a ser ligado no mosaico nexialista dessa recente casa etária.
O sessentão não pode apenas contar com o conteúdo-linear da sua bagagem de aprendizado acumulado. Ela, com certeza, é insuficiente, e, por vezes até errática culturalmente, uma vez que se permeia pela limitação da fonte que a carregou, frente às infindas oportunidades tutoriais e disruptivas agora disponibilizadas, de modo fácil e com disponível acesso a todos.
Ele tem de olhar para frente.
Ter clareza e certeza de que o para-brisa do saber é muito maior que o retrovisor das informações lineares recebidas ao longo da sua vida.
Tem de enxergar e fazer mais, mais e diferenciado. Não existe limitação de estação, saber e/ou especialidades.
Exemplos não faltam: “Identificando a chamada double helix apesar de ser biólogo, James Watson ganhou prêmio Nobel de Física (junto com Francis Crick). Três psicólogos já ganharam o Nobel de Economia. Era advogado Peter Drucker, o celebrado guru da administração. Carlos Drumond de Andrade, nosso grande poeta era farmacêutico. Juscelino era urologista.”
Claudio de Moura Castro destaca mais em um de seus artigos recentes:
“É certo, a educação aumenta nossa capacidade de aprender. Ou seja, o que serve não é o que aprendemos, mas aprender aumenta nosso poder de aprender outras coisas”.
Envelhecer não é um problema. É um fato. E em outro texto atual que li, a matéria jornalística alertava: “Vamos envelhecer em 19 anos o que a França envelheceu em 145”.
“A população brasileira está envelhecendo cada vez mais rapidamente, em um dos ritmos mais rápidos do mundo. Nova etapa dos resultados do Censo 2022 revelou que o porcentual de pessoas com 65 anos ou mais no País chegou a 10,9% da população – uma alta recorde de 57,4% frente aos números de 201 quando os idosos representavam 7,4% do total”.[3]
Temos de refletir (e muito) sobre isso. E essa é uma reflexão não somente aos sexagenários (novos e mais antigos). Serve para toda a população brasileira. Afinal, todos nós somos seres humanos. Todos envelhecem.
Mesmo com o culto à beleza e à juventude, próprios de uma sociedade hedonista como a nossa, a implacável verdade é que todos envelhecem.
Todos precisam de trabalho, inclusão, saúde, previdência. Precisamos superar e acabar com o idadismo – preconceito a pessoas mais velhas.
Tudo isso faz parte de uma pauta extensa, que precisa ser foco da sociedade.
Em esclarecedor artigo, Celso Ming destaca que tudo isso:
“não é apenas estatística fria. Traz importantes consequências para a economia e para a política. Os economistas olham para essas informações e fazem severa advertência: o Brasil está perdendo o bônus demográfico, que é a capacidade de produção de uma população predominantemente ativa. Quanto mais velho o agrupamento de pessoas, maior dificuldade terá para garantir a produtividade do trabalho. Pessoas idosas estão mais para desfrutar de aposentadoria e para irradiar a sabedoria esperada com a experiência adquirida, do que para enfrentar o batente com força física e mental.
O próprio conceito de idoso, que já vem mudando, pode mudar ainda mais – e rapidamente. Há alguns anos, com 40 anos as pessoas já eram tidas como coroas e passavam para a categoria dos ‘enta’. Hoje, sobre quem morre aos 79 já se começa a ouvir: ‘Como morreu jovem!’”[4]
Pois bem, o aqui coroa e sessentão destaca a inconteste necessidade que temos (todos nós, inclusive os mais jovens) de aprender e desaprender nesse mundo novo, que concentra encontros, como o de gerações; propósitos; missões; e visões diferentes, porém complementares.
Encontros que nos levam a ter obrigatoriamente meta-habilidades como chave para abertura das portas de convívio e manutenção ativa, num mundo que muda o tempo todo.
Não à toa, acima foi destacada a humildade.
Tradução de sapiência com a resiliência do saber limitativo de quem se achava experiente.
Ciência de que a prática é essencial, mas, também envelhece e, muitas vezes, se torna obsoleta, e nos move para o desenvolvimento de novas habilidades. Ciência de que há de se trilhar o caminho da preparação.
Preparação que advêm por diversas formas, modelos lugares, como os atuais tutoriais das redes sociais, e por meio de visões lúdicas e criativas. Preparação que tem a clareza de que o aprendizado tem a ver com errar e ajustar.
Eu sei: para o sessentão o verbo errar é de difícil deglutição.
Criatividade, inteligência social e adaptabilidade fazem parte da tríade de inserção neste mundo em constante transformação.
A conexão entre pessoas, antes da comunicação face to face perpassa pelo autoconhecimento.
Autoconhecimento que exige, uma vez mais, humildade de conhecer e tratar saberes e culturas, como ultrapassadas, que não se amoldam mais à relevância e necessidade dos dias atuais.
O sessentão precisa vibrar. Vibrar com ritmo e equilíbrio.
De acordo com o “Princípio do Ritmo” (muito parecido com a terceira Lei de Newton) aquele que descreve que “Tudo tem fluxo e refluxo; tudo tem suas marés; tudo sobe e desce; tudo se manifesta por oscilações compensadas; a medida do movimento à direita é a medida do movimento à esquerda; o ritmo é a compensação”.
Conhece o ditado que diz: “Dia de muito riso, véspera de muito siso”. Sabe bem que os desvios tendem a compensar com igual intensidade, mas em sentido contrário.
Por isso, deve exercer a sua sabedoria etária. Demonstrar, trabalhar e conviver por meio de um comportamento sóbrio e sereno, uma vez que “serenidade possui um gradiente bem pequeno do desvio do centro”. (…) o fiel da balança (…) algo de estabilidade e durabilidade (…) parecido com o presépio que se monta no Natal: de um lado, o burrinho, que representa a inércia; do outro, o boi ou o touro, que representa o impulso descontrolado. E, lá em cima, na manjedoura, na ponta do triângulo, O Cristo, que representa o equilíbrio, a serenidade.”[5]
Vibrar de acordo com o nome interno das coisas.
Heráclito, entre os pré-socráticos, discursava: Nada está parado, tudo se move, tudo vibra.
“Existe um conceito oriental que pode ser traduzido como ‘nome interno’. Imagine que um grande mestre do passado fosse capaz de viajar até nós e disparasse a mais complexa de todas as perguntas: ‘Quem é você?’. Que tipo de resposta ele esperaria de nós? Nome, profissão, endereço, código postal? Se mudarmos de casa e de profissão, deixaremos de ser nós mesmos? Será que esses pequemos pedaços de papel que trazemos na carteira, com foto e monte de números, responderiam bem à pergunta desse mestre? Talvez ele esperasse simplesmente que soubéssemos o que faz nossa consciência vibrar, o que nos toca, qual é o nosso nível vibratório: isso é o que somos, por agora, e crescer é sutilizar ainda mais essa vibração. Esse é o nosso nome interno.
(…) o nome interno das coisas tem a ver com o parâmetro vibratório que elas possuem em determinado momento. Para a tradução egípcia, segundo O Caibalion, as coisas funcionam mais ou menos assim: se você acelera a matéria, vai ter energia; se acelera a energia, vai ter luz; se acelera a luz, vai ter espírito; se acelera o Espírito, chega até Deus”[6].
Chegando, pois, aos sessenta, quero desaprender, reaprender, ser nexialista, estar aberto às mudanças, fazer mais, mais e diferente. Mas, acima de tudo, acelerar e poder, via parâmetro vibratório correto, poder externar qual o meu nome interno, para chegar e encontrar o melhor!
Antonio Carlos Aguiar, doutor em Direito do Trabalho, sócio da área trabalhista do Peixoto & Cury Advogados há 35 anos, completa sessenta anos em 17 de janeiro. Membro das Academias Paulista e Brasileira de Direito do Trabalho, pesquisador no grupo do Núcleo de Estudos do Futuro da PUC-SP e do Grupo de Estudos Trabalhistas da USP. Foi docente por mais de 30 anos.
[1] Dualibe, Silvana. Disponível em: https://obemviver.blog.br/2017/11/14/de-repente-sessenta-uma-cronica-primorosa/. Acessado em 02/01/2024.
[2] Disponível em: https://glomers.wordpress.com/2012/08/25/o-significado-dos-numeros-na-biblia/. Acessado em 02/1/2024.
[3] Jornal O Estado de S. Paulo, sábado 28 de outubro de 2023, Caderno A22.
[4] MING, Celso. O Brasil, país dos coroas. Jornal O Estado de S. Paulo. Domingo, 29 de outubro de 2023. Caderno Economia & Negócios B2.
[5] GALVÂO, Lúcia Helena. Para entender o caibalion: a vivência da filosofia hermética e sua prática nos dias de hoje. 1ª ed. – São Paulo: Editora Pensamento, 2021, pag. 125.
[6] Ob. Cit., pag. 103.
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