Avalanche Tricolor: a culpa é do Grêmio

Flamengo 1×0 Grêmio

Copa do Brasil – Maracanã, RJ/RJ

Suárez em destaque na foto de Lucas Uebel/GrêmioFBPA

O ano era para ser mediano. No Brasileiro, estar no meio da tabela, no máximo na primeira página como costumamos nos referir aos que aparecem entre os dez primeiros classificados, seria suficiente. Na Copa do Brasil, cada etapa vencida seria bem-vinda — no mínimo, um pouco mais de dinheiro para pagar as contas. 

Foi então que o Grêmio decidiu trazer Luis Suárez — o terceiro maior goleador do mundo em atividade. O cara fez três na primeira partida. E a cada jogo revelava uma qualidade técnica para a qual não estávamos preparados — e entre nós muitos dos nossos jogadores. Seguiu marcando gols, dando assistência para os seus companheiros, e proporcionando jogadas de uma inteligência acima do normal. Sua camisa 9 virou orgulho imortal!

Bastaria Suárez para o ano já ser considerado acima da média. Mas teimamos em vencer o Campeonato Gaúcho — o que, convenhamos, “virou goleada”. Novos jogadores se juntaram ao grupo. Os “abominados” foram embora a conta gotas, sem muito trauma. O elenco ganhou qualidade apesar de restrito. Nem mesmo uma sequência de lesões que nos tirou alguns dos melhores, impediu que o time encontrasse soluções para superar seus adversários.

Na Copa do Brasil, vencemos jogos nos minutos finais. Viramos resultados fora de casa. Tiramos da cartola gols que nos permitiram ir para o tira-teima dos pênaltis. E chegamos à semifinal, a despeito dos prognósticos.

Em paralelo, os favoritos marcavam passo e nós, passo a passo, nos aproximamos do G4 do Campeonato Brasileiro. Entramos no seleto grupo da elite do Brasileiro e por lá ficamos. Mesmo com um jogo a menos do que os principais adversários, estamos agora em terceiro e disputando a vice-liderança. 

Nem sempre o jogo foi bonito. Nem sempre jogamos bem. Nem sempre havia espetáculo. Às vezes, uma derrota ou um empate azedo tentavam nos empurrar a crueza da realidade, como se questionando nossa condição no campeonato. Os demais resultados mesmo assim teimavam em nos iludir. Nos fazer acreditar. 

A partida dessa noite de quarta foi a síntese da temporada até aqui. 

A postura do nosso time no lotado Maracanã e contra uma equipe milionária e protegida deu a entender que havia chances de uma virada histórica. Suárez e seus companheiros estavam mais próximos e mais intensos do que no primeiro jogo da semifinal. Chegou-se à frente do gol. Reduziu-se parte dos riscos do ataque adversário. E quando não se tinha sucesso na marcação, Grando foi grande novamente com defesas importantes. 

O Grêmio nos fazia acreditar mais uma vez. Até que a bola bateu na mão de nosso zagueiro e o árbitro entendeu que era pênalti —- apesar de termos tido lances semelhantes a nosso favor, nesta mesma Copa do Brasil, e o VAR e o juiz terem interpretado de forma contrária. Contrária ao Grêmio. 

Era a realidade se impondo. Não bastava jogar acima do esperado, não bastava superar seus próprios limites. Precisava ser maior do que tudo e de todos. Não conseguimos. Sentimo-nos frustrados. E a culpa deste sentimento é, única e exclusivamente, do Grêmio. Porque o Grêmio sempre nos faz acreditar. Sempre tenta ser mais. Sempre está no jogo. 

Independentemente do que a realidade queira escancarar para nós, Grêmio, eu sempre acreditarei!

Avalanche Tricolor: alucinações de um torcedor

Grêmio 0x2 Flamengo

Copa do Brasil – Arena Grêmio, Porto Alegre/RS

Reprodução de ClicRBS, foto de André Avila/Agência RBS

Um a zero no primeiro; dois a zero, no segundo tempo. E Grando resolve na cobrança de pênaltis. O roteiro para mais uma virada histórica do Imortal, no Rio de Janeiro, já está escrito no coração do torcedor gremista — aquele que lotou a Arena e cantou e cantou e cantou mesmo após o apito final de uma partida em que perdemos por dois gols de diferença e tivemos de jogar mais de meia hora com um jogador a menos contra o time mais rico e poderoso do Brasil. 

Para quem ainda precisa de mais uma pitada de alucinação, pouco antes de o jogo se iniciar, leio no ex-Twitter de Edu Cesar, titular e editor do @PapodeBola, uma frase clássica de Armindo Antonio Ranzolin, um dos maiores narradores esportivos que o rádio gaúcho já teve: eu disse que acreditassem, eu pedi que acreditassem, eu nunca deixei de acreditar” — o grito do locutor foi proferido ao fim do título da Libertadores da América, em 1983, e virou estrofe de música dos Engenheiros do Hawaii.

Quem me convence de que deparar com essa lembrança em um tuíte (ou agora se chama “xiste”?) sem pretensão, escrito sei lá por qual motivo, não seja um sinal dos céus para apaziguar o coração angustiado deste torcedor que lhe escreve, caro e cada vez mais raro leitor desta Avalanche. 

Acabo de ver meu time ser derrotado em casa,  sair atrás na decisão da vaga à final da Copa do Brasil e perder seu principal zagueiro e capitão, Kannemann, por “duplo” cartão amarelo — aplicado por um árbitro que foi pouco criterioso na distribuição das punições —, no início do segundo tempo, o que lhe tira da próxima partida, no Maracanã. Tudo isso acontecendo em uma noite na qual o futebol gremista pouco apareceu, com exceção dos 20 primeiros minutos de jogo quando Suarez tentou mais uma vez aquele gol antológico à longa distância e Villasanti desperdiçou um gol frente a frente do goleiro quando o placar ainda estava zerado. 

A persistirem os sintomas de alucinação desta Avalanche, pode começar a levantar uma estátua para Gabriel Grando, porque iremos agradecer muito a ele por ter defendido um pênalti ainda no primeiro tempo do jogo de hoje. Será graças aquela defesa que nos habilitaremos a cometer mais um desvario no futebol brasileiro, nos classificando à final contra todos os prognósticos e crenças.

Avalanche Tricolor: o dia em que a bola fez um trato com o Diabo!

Flamengo 3×0 Grêmio

Brasileiro – Maracanã, RJ/RJ

Suárez em mais uma tentativa de ataque, em foto de Lucas Uebel/GrêmioFBPA

Tem dia que não entra. E o dia foi hoje. Foram 25 chutes em direção ao gol — quase o dobro do adversário. Foram oito chutes no gol — o dobro do adversário. Luis Suárez fez de tudo um pouco. Driblou, serviu, lutou e atacou. No segundo tempo, quando já mancava de um das pernas, mesmo sob forte marcação, chutou de primeira de fora da área e a bola bateu no poste de um lado, correu sobre a linha e bateu no poste do outro lado. Na sequência, mais um lance do nosso time, e a bola se chocou no travessão. Já havíamos testado por baixo, por cima, de fora e de dentro da área. Quando não era um poste, havia um zagueiro. Quando não tinha zagueiro no meio de caminho, era o goleiro a impedir nosso gol – convenhamos, é para isso que estão lá.

Tem dia que não entra. E o dia foi hoje. Ao contrário do adversário que o que fez, fez bem. Nós fizemos muito. No primeiro tempo, menos. No segundo, mais. Nem assim fomos capazes de abrir o placar a nosso favor. Sair do Maracanã com um empate já teria sido lucro, considerando a pressão do estádio, o embalo do time da casa e o gramado mal acabado. Seria suficiente para nos manter entre os quatro primeiros antes da parada de 10 dias da competição. Não conseguimos. Perder estava na conta, também. Ninguém imaginava que seria fácil. Não precisava ter sido com esse placar elástico.

Assim como tem dia que não entra, tem árbitro que não ajuda. Pior, atrapalha! É caseiro. Passa pano para os de casa, pune com rigor o forasteiro. Eu não daria o pênalti reclamado, em que a bola bate na mão do zagueiro. Mas várias vezes, fomos vítimas dessa interpretação. Erraram contra nós nas vezes anteriores. Não erram a nosso favor ou contra eles. Faz parte do jogo e a gente sabe que o jogo tem de ser jogado assim. 

Além disso, precisamos aceitar que neste campeonato também ganhamos partidas sem ter o mesmo volume de jogo do adversário.Portanto, ganhar ou perder é da vida. O importante é entender o que pode ser aproveitado daquilo que fizemos no Maracanã, investir mais para consertar os erros de marcação, aprimorar o acabamento das jogadas e torcer para que tenha sido hoje — e apenas hoje — o dia em que a bola fez um trato com o Diabo.

Avalanche Tricolor: forjados pelas batalhas e aflições, não desistiremos jamais

Grêmio 2×2 Flamengo

Brasileiro – Arena Grêmio, Porto Alegre/RS

Ferreirinha em foto de Lucas Uebel/Grêmio FBPA

Se é de batalhas e aflições que queremos escrever essa jornada de 2021, o capítulo desta noite foi escrito a contento. Diante do mais caro time do futebol brasileiro, de uma crise técnica poucas vezes vista e de um silêncio retumbante na nossa Arena – pela punição imposta à torcida que assistiu a alguns alucinados invadirem o campo rodadas atrás -, sofremos dois gols já no segundo tempo e vimos o rigor do árbitro punir com expulsão um dos nossos atacantes. A derrota seria inevitável e desistir de lutar a única opção, não estivéssemos falando de um clube que já nos propiciou alguns dos mais impossíveis resultados da história do futebol.

Como se algo estranho ao campo da bola transcendesse a razão, o passe que foi inseguro durante quase todo jogo chegou preciso ao pé de Ferreirinha – que já havia recebido todo tipo de bola, mas sem conseguir finalizar de forma correta. Nosso ponteiro esquerdo, que em toda a partida arriscava dribles sem sucesso, livrou-se de três marcadores e deu o presente que Borja, recém-entrado no time, mais esperava. Nosso centroavante com um carrinho empurrou a linha do VAR para longe e a bola para as redes. 

As possibilidades de levar ao menos um ponto deste jogo ainda eram pouco consideradas pelos críticos quando mais uma vez o sobrenatural protagonizou. Ferreirinha, incansável. Ferreirinha, insistente. Ferreirinha, que há algumas partidas vem tentando sem sucesso marcar gols após desconsertar seus adversários, desta vez cortou uma, duas vezes e colocou a bola fora do alcance do goleiro, estufando as redes e empatando a partida.

Os matemáticos e pragmáticos seguem céticos às nossas chances de escaparmos da Inominável a quatro rodadas do fim do campeonato. Passarão os dias falando de percentuais, projeções e possibilidade de queda. Da impossível tarefa de construir no fechamento da temporada o que não fomos competentes de fazer ao longo de todo ano. Tomados pela lógica, se esquecerão que fomos forjados nas batalhas e nas aflições. E delas nos alimentaremos para persistirmos até o fim lutando pela presença na elite do futebol brasileiro. 

Avalanche Tricolor: carta ao meu amor!

Flamengo 0x1 Grêmio

Brasileiro – Maracanã, RJ/RJ

Borja em foto de Lucas Uebel/Grêmio FBPA

Amor,

Há momentos na nossa vida que são muito especiais. Fazem cicatrizes em nosso coração. Não como aquelas provocadas por feridas de tropeços, erros e pecados. São marcas que ficam para nos lembrar a todo instante o quão feliz fomos naquelas experiências. Para não nos deixar desanimar diante de percalços e questionamentos que irão acontecer —- e como têm acontecido, na maioria das vezes por minha culpa, minha tão grande culpa, como dito no ato penitencial que faço em todas as missas dominicais.

Esses mesmos momentos que cicatrizam o coração, todas as vezes que os enxergamos no retrovisor de nossas vivências, induzem nossa memória afetiva e nos fazem reviver as emoções, acelerar o batimento no peito, arrepiar os pelos da pele, lacrimejar os olhos e sorrir de forma incontida. Ah, como você foi gigante ao me proporcionar cada uma dessas sensações, amor! 

Nestes dias, vivenciei essa montanha russa ao seu lado, mesmo que você sequer tenha percebido, afinal estava inebriada — merecidamente inebriada —- pela peculiaridade da semana que se encerrou.  Uma semana especial na sua vida, porque sabemos o quanto você preza pelo dia de seu aniversário. E assim deveria ser para todos e sempre. Para cada um de nós. Se a humanidade tivesse noção de como é importante brindarmos pelos instantes de alegria que temos, não ergueria um copo de vinho sequer sem agradecer a Deus pelo que Ele nos proporciona.

Aprendi com você que essas vitórias precisam ser celebradas, a despeito de ainda potencializar tanto a dor das derrotas. Sou um péssimo aprendiz, confesso. Tivesse absorvido as lições que você me ensinou nesse tempo todo em que estamos juntos, provavelmente seria um humano melhor. Seria alguém mais grato a tudo que a vida me ofereceu, a começar por estar ao seu lado.

Não, não sou merecedor sequer de parcela dessa dedicação que você me prestou ao longo deste tempo. Seja como for, estou aqui a agradecer por tudo que você me propiciou. Pelo amor que você compartilhou. Pelas alegrias e frutos que me deixou experimentar. 

Esteja onde eu estiver — nunca se sabe que lugar da arquibancada o destino me reservará —, saiba que sempre estarei aplaudindo suas vitórias, consolando suas derrotas e admirando seu jeito de ser.

Obrigado por existir, meu Amor!

(esta carta, claro, escrevo para minha mulher que comemorou mais um ano de vida, no dia 15 de setembro; mas, pensando bem, tem destino perfeito para o time do meu coração que aniversariou no 16 de setembro e voltou a me proporcionar a alegria da vitória, neste domingo)

Avalanche Tricolor: porque foi assim que aprendi a ti gostar

Flamengo 2×0 Grêmio

Copa do Brasil – Maracanã, RJ/RJ

Kannemann em foto de Lucas Uebel/GrêmioFBPA

Sou gremista, não por agora. Sou gremista de nascença. Quem já conversou comigo, leu minhas palavras ou ouviu minhas conversas sabe muito sobre isso. E se começo a Avalanche reforçando essa ideia é porque muitos devem imaginar que momentos como esse que estamos enfrentando são suficientes para nos afastar daquilo que aprendemos a gostar. Quem viveu o que vivemos, não esmorece. Não se micha como dizem lá pelas nossas bandas. 

Na noite de ontem, mesmo diante do desastre da primeira partida, do time alternativo levado a campo, das carências de qualidade e talento, do poder financeiro e político do adversário —- que teve o privilégio de levar torcedores para o estádio e esfregar na nossa cara, sem máscara, o desrespeito aos quase 590 mil mortos por Covid-19  — , lá estava eu na torcida mais uma vez. Porque é assim que nos tornamos gremistas. Acreditando sempre, mesmo que não haja por que acreditar.

Posso lhe garantir, já foi pior. Muito pior. E se você, caro e cada vez mais raro leitor desta Avalanche, for gremista como eu, sabe do que estou falando. Hoje, sofremos mais porque ficamos mal acostumados com a performance, resultados e títulos dos últimos anos. Tivemos um time de excelência e de futebol exuberante poucas temporadas atrás. E quando olhamos em campo, ainda vemos alguns resquícios desse passado recente: alguns cambaleando e outros apenas como um desenho mal esboçado do que foram. Tem até mesmo talentos em potencial, que não conseguem se expressar.

Nada disso … nem a bola mal tratada, nem a gestão mal acabada, nem as derrotas acumuladas, … nada disso me demove do desejo de torcer pelo meu Grêmio. De acreditar no meu Grêmio. De sofrer desta paixão. Por isso, a despeito do que esteja acontecendo, do que aconteceu na noite desta quarta e do que acontecerá em seguida, cá estou a ratificar este amor e a desejar-lhe um feliz aniversário, Grêmio!

Avalanche Tricolor: minha cadeira azul

Grêmio 0x4 Flamengo

Copa do Brasil — Arena Grêmio

Minha cadeira azul fica ali ao lado da tela da televisão, onde assisto a todos os jogos de meu time. É o lugar que encontrei para jamais esquecer o Grêmio que já fomos. O metal frio do assento ondulado e do encosto curvado teve sua cor recuperada; o número que a identificava no anel superior do Olímpico Monumental, também: J-104 aparece na cor branca sobre o fundo preto. Quando a recebi de presente —- generosidade de meu irmão, Christian —- logo pensei nos milhares de torcedores que a usaram ao longo de sua vida útil no saudoso estádio. Quem sabe até eu tenha sentado nela em um domingo qualquer de futebol. 

Foi em cadeiras azuis como essa que forjei minha paixão pelo Grêmio. E você, caro e raro leitor desta Avalanche, não tem ideia de como ela  moldou minha personalidade e meu caráter. De quantas vezes saltei sobre ela com os dois pés para comemorar o gol impossível e a virada improvável. De quantas vezes, me ajoelhei diante dela para não ver o desastre que se avizinhava. De quantas vezes, escondi minha cabeça sobre o assento para que meus colegas não me vissem chorando a derrota sofrida.

Foi em uma dessas cadeiras azuis e de ferro frio que suportei anos a fio sem um título estadual. Foi nela que, ao lado de meu pai, vibrei como nunca com o gol de André Catimba, naquele Gre-Nal histórico de 1977. Dela presenciei a conquista da América na batalha final contra o Peñarol. Foram elas, as centenas e centenas de cadeiras que ornavam de azul o setor das cativas do velho estádio, que me uniram a amigos, serviram de assento para conversas animadas e aninharam alguns amores platônicos que minha timidez impedia de revelar àquelas torcedoras que vestiam a camisa tricolor. 

Hoje, foi para a cadeira azul, ao lado da televisão, que olhei, ao fim da partida. Em silêncio, enquanto absorvia o que acabara de acontecer no gramado de Humaitá, perguntava a ela onde está o meu Grêmio, aquele que não temia qualquer adversário por mais forte que fosse; que mesmo quando o futebol não se expressava pela qualidade, se superava na força e na coragem? O que aconteceu com a nossa Imortalidade, que um dia nos permitiu ascender de divisão com apenas sete jogadores em campo? Que já nos fez virar placares de forma inimagináveis? Que me fez ter orgulho de meu time mesmo em momentos de derrota?

Com a frieza típica do ferro, que se tornava mais penetrante ainda quando exposto ao inverno do Rio Grande do Sul, a cadeira azul nada me disse. Porque nada há para dizer em um momento como esse. E o melhor que ela pode fazer é ficar ali, parada, servindo-me como uma memória do que fomos, lembrando-me que, a despeito de já termos passado por momentos dramáticos, encontramos forças para nos recuperar. E soubemos reescrever a história.

Avalanche Tricolor: não vai deixar saudades

Bragantino 1×0 Grêmio

Brasileiro — Nabizão, Bragança Paulista/SP

Foto de Lucas Uebel/Grêmio FBPA

Cuspida e escarrada! A última rodada foi a cara do Campeonato Brasileiro, que, ao longo da temporada, desdenhou a gravidade da pandemia, teve jogos suspensos devido a “contaminação em rebanho” em alguns times, jogadores expostos a risco e traduzindo essa apreensão no campo com performance abaixo da esperada, estádios com arquibancadas vazias e com aglomeração de torcedor do lado de fora.

O Covidão-2020, apelido que meu amigo Juca Kfouri deu ao campeonato, terminou sem direito a gol do título. O campeão perdeu na partida final, marcando uma campanha claudicante o suficiente para superar em pontos ganhos todos os demais adversários. Quem poderia ser campeão em lugar do campeão, não foi capaz de vencer mesmo jogando em casa e contra um time que nada mais tinha a ganhar. Quase ganhou, mas o VAR impediu que a injustiça fosse concretizada, primeiro em um pênalti sinalizado pelo árbitro, que voltou atrás ao ser chamado para rever na televisão, ao lado do campo, e depois em dois gols marcados em posição de impedimento, que foram anulados com o certificado do VAR.

Quem diria, depois de uma competição em que faltou verificação do VAR, houve erros com o apoio do VAR e descobrimos que o VAR só funciona se estiver bem calibrado, foi o VAR quem salvou a lisura do resultado nos acréscimos do Campeonato. Nesse caso, justiça seja feita, o auxiliar sinalizou a irregularidade do gol e se não foi agredido — como ameaçaram alguns jogadores — deve agradecer ao VAR que ele, aos gritos, anunciava que seria consultado.

Sem gol do título, sem torcida, sem futebol qualificado e com Covid-19, o Campeonato Brasileiro terminou com o mesmo campeão da temporada anterior. Ou seja, enfrentamos toda essa maratona para entregar o título ao mesmo time. Pode isso, Juca?

E se estou aqui a falar de dois jogos que não tinham a presença do Grêmio, protagonista de sempre nesta Avalanche, é porque nada tenho a registrar do desempenho do meu time na rodada final da competição.

O Campeonato Brasileiro de 2020, que já vai tarde, não me deixará saudades.

Avalanche Tricolor: de afazeres e entregas

Grêmio 2×4 Flamengo

Brasileiro – Arena Grêmio

Diego Souza, atacante do Grêmio, cabeceia a bola em direção ao gol e dois zagueiros do Flamengo assistem ao lance que se transformou no primeiro gol da partida
Diego Souza faz de cabeça em foto de LUCAS UEBEL/GRÊMIOFBPA

 

Se é que existe alguém que passe neste blog com alguma frequência —- aqueles que costumo chamar de meus caros e raros leitores —-, deve ter percebido que o movimentei pouco nesta semana. De domingo até agora não mais de três postagens e uma delas graças a sempre pertinente participação da Simone Domingues, que nos ajuda a entender o que se passa na nossa mente e como tudo que está em  volta influencia nosso comportamento. 

Justifico-me: a semana está intensa e, não bastasse comandar quatro horas de Jornal da CBN com o volume de notícia gerada no mundo, assumi compromissos neste início de ano que têm me tomado boa parte do dia com estudos, planejamento, reuniões e aulas. São dois projetos distintos. Um voltado ao desenvolvimento de habilidades profissionais, com a imersão no conhecimento do marketing digital, e outro ligado a um desejo pessoal e fraterno que há muito alimentava, que é o de dominar a língua italiana — se não dominá-la, ao menos ter segurança para levar em frente outros projetos de vida relacionado ao país de meus ancestrais. 

Foi na Itália que meu bisavô por parte de pai nasceu. Consta que o primeiro Ferretti —- da minha linhagem —- a desembarcar lá pelo sul do país, tenha sido o biso Vitaliano, nascido em Ferrara, na região da Emília-Romanha. Dele veio um casamento com um sem-número de filhos. E dos filhos, um era minha avó Ione, mãe do meu pai. Boa parte da minha infância foi próxima dos Ferretti, especialmente de Caxias do Sul, na serra gaúcha. Isso não foi suficiente para que eu absorvesse o conhecimento da língua, o que teria sido uma tarefa bem mais simples pois sabemos que o cérebro da criança é muito mais poroso do que o de adulto, já endurecido por sabotadores internos, viéses inconscientes e excesso de preconceitos consigo mesmo. 

Divago entre uma agenda mais intensa do que se imagina para um início de ano, a desaceleração no ritmo de publicações e as relações familiares das quais tenho orgulho, porque foram esses motivos de minha falta de atenção com você que, por pouco e raro que é, merece minha dedicação e respeito. Nem sempre conseguirei entregar o que prometo, com a frequência que gostaria e qualidade que o leitor busca. Desatenção, cansaço, frustrações, escolhas nem sempre as mais certas, energia sendo sugada em outras frentes —- e você não tem ideia de que como esta pandemia também tem impactado esse meu comportamento — às vezes podem ser fatais no resultado que se busca. 

Dito isso, assumo aqui o compromisso que a despeito de a escassez de tempo e de energia para dar conta de todas às frentes de trabalho, vou continuar insistindo em dar o que tenho de melhor e oferecer, aos que confiam alguns minutos do seu dia a me ler neste espaço, o pouco do conhecimento que tive o privilegio de adquirir em vida e me permite escrever e pensar com alguma lógica e razão. 

Assumo esse compromisso com o desejo de ser retribuído com a sua confiança e leitura, assim como espero que o Grêmio de Portaluppi —- ops, olha aí outro de origem italiana que me apetece —- também esteja compromissado em entregar o que tiver de melhor nesta reta final de temporada. E o melhor que temos é a Copa do Brasil.

P.S: a coisa está tão intensa que este post foi salvo para ser publicado ontem à noite; descubro agora que por algum motivo ficou parado por aí. Nunca é tarde.

Avalanche Tricolor: histórias do futebol às vésperas de mais uma final

Caxias 0x2 Grêmio

Gaúcho — Centenário, Caxias/RS

 

Everton comemora seu primeiro gol, em foto de LUCASUEBEL/GRÊMIOFBPA

 

O caro e raro leitor deste Blog talvez estranhe a história que vou contar por aqui. Nem tanto pela história, mas por ter sido protagonizada por clubes e jogadores sobre os quais não costumo falar em uma Avalanche dedicada — e merecidamente — ao Grêmio. E por história do passado que é, considere que posso cometer falhas de memória — sou muito ruim de guardar nomes e épocas.

 

Foi em um dia qualquer das minhas andanças pelos estádios de futebol do Rio Grande do Sul, quando trabalhava como repórter setorista, e um dos técnicos de plantão falava do sucesso de Paulo César Carpegiani, no Flamengo, clube que não estava com essa bola toda quando o contratou, em 1977. O jogador havia saído de um Internacional, que ganhava quase tudo naquela época — sim, isso foi muito antigamente — e onde havia formado um dos melhores meios de campos do Brasil, o que lhe rendeu convocação à seleção brasileira. Diziam em Porto Alegre que Carpegiani estava com problemas físicos, algum tempo antes havia feito cirurgia no joelho.

 

No Rio, os astros se alinharam em favor dele e do Flamengo: estava surgindo um menino chamado Zico, e Carpegiani teve ainda como companheiros Adílio, Tita e Nunes. Ele se tornou um dos lideres das campanhas vitoriosas daquele time. Sobre a suspeita de Carpegiani não dar mais conta do recado, o técnico, contador da história, disse que o pessoal do Flamengo costumava brincar : “sempre que tiver um aleijadinho como esse pode mandar pra cá”.

 

Lembrei da história quando pensava como iniciar esta Avalanche, escrita um dia depois da vitória que colocou o Grêmio em vantagem e mais próximo de outro título gaúcho. Nestes tempos modernos, você sabe: é o Grêmio quem ganha tudo (ou quase tudo). O um a zero saiu cedo, com o jeito de o Grêmio jogar e com um jogador que leva muito jeito: Pepê. Não me surpreendeu. Nosso atacante está pronto para assumir a vaga de Everton — o que saiu.

 

O dois a zero, sim. Esse demorou mais e me chamou muito a atenção. Porque foi resultado de uma bola de rebote na entrada da área, que estufou a rede após um chute tão difícil quanto fulminante de Everton — o que chegou. Trocado por Luciano, o meia-atacante deixou São Paulo sob a descrença de seu clube e chegou a Porto Alegre sob a desconfiança de alguns torcedores.

 

“Só eu sei o momento que estava passando antes de começar aqui. Acharam que estava desacreditado, mas o pessoal aqui acreditou em mim”

Everton, camisa 11

 

Everton — o que chegou — tende a ser mais um desses casos de jogadores que entram no elenco gremista tendo de ouvir críticas à boca pequena. Precisando provar a todo o instante a sua qualidade. E preparado para se transformar em destaque, ao passar pelas mãos mágicas de Renato. O mais recente deles foi Diego Souza: barrigudo, sem força, ultrapassado — foram alguns dos adjetivos que o acompanharam até se apresentar ao time do qual hoje é o goleador.

 

Para não me estender muito nos casos, termino esta Avalanche lembrando Maicon, que trocou o São Paulo pelo Grêmio, em 2015. O que mais ouvi por aqui quando a transferência ocorreu, é que estávamos levando um jogador lento, cansado e que não tinha jeito. Nosso capitão é, sem clubismo, dos jogadores que mais sabem tratar bem a bola, distribuir o jogo e comandar um time em campo, no Brasil. Ver o que é capaz de fazer com a bola nos pés é como estar diante de um globetrotter do futebol.

 

Que estes relegados estejam todos de volta ao campo, ao lado de nossos jovens e promissores talentos, no próximo domingo para comemorar mais um título na história gremista — esta, sim, uma história que eu adoro contar nesta Avalanche.