Por Abigail Costa
Voltar para casa é sempre bom. Mas ando enrolando as minhas saídas do trabalho às sextas-feiras. É como se o tempo gasto em conversas no fim do expediente me distanciasse de uma realidade com hora marcada Falo da movimentação de centenas de mulheres e dezenas de homens, carregando malas, pacotes, trouxas de roupa. O ponto de encontro é numa praça vizinha ao terminal rodoviário da Barra Funda, aqui em São Paulo.
Eles de um lado, e muitos, mas muitos ônibus do outro.
O destino: penitenciárias no interior paulista. Em meio a agitação dos camêlos que tentam vender mercadorias de útima hora e dos sanduíches reforçados de pernil, que valem por um jantar (sim, é preciso forrar bem o estômago, muitos viajam até 600 quilômetros.).
O que me faz “enrolar ” para deixar a redação, são imagens que ficam martelando na minha cabeça, cenas que me fazem imaginar histórias, sem muita expectativa de final feliz. Não são apenas homens e mulheres que vão visitar parentes nas celas. São filhos levados pelas mães, muitos ainda de colo, outros pequeninos que já andam, arrastados pelas mãos. Eles também estarão no sábado pela manhã, num ambiente, para eles familiar.
É aí que viajo: Que conversas eles ouvem ? O que passa nessas cabeçinhas ainda sem maturidade ? Eles tem idéia por que estão lá? Seria esse o lazer dessas crianças, o páteo das penitenciárias?
Nada contra filhos visitarem pais, ainda que nesses lugares. É direito assegurado por lei. É justo. Injustiça é o que pode vir pela frente.
Quanto eles terão de lutar para ter uma vida diferente?
Quantos olhares maldosos de julgamentos desnecessários terão de ignorar?
Quantos deles terão o discernimento de pegar um atalho para outros rumos?
Desses que amanhã embarcarão mais um vez para uma longa viagem, sem mesmo ter noção de que rodovia estarão passando, quantos terão uma sorte diferente da que eles conhecem e convivem ?
Quantos?
Abigail Costa é jornalista, daquelas que jamais serão pautadas pela insensibilidade
essas imagens que vc descreveu da espera pelos ônibus são, realmente, pertubadoras. passo por eles toda sexta-feira… vejo as sacolas, as crianças, a roupa nova pra visita e os semblantes cansados e irritados uma vez por semana. passo, olho e não penso.
mas, espero que a vida seja colorida para essas crianças que conhecem a névoa e, de verdade, acreditam que são felizes.
um beijo
Como sempre te digo, você tem uma sensibilidade incrível PARA TUDO!!! Tenho certeza que aqueles motoristas revoltados, que passam buzinando porque essas pessoas estão “atrapalhando” seu caminho de volta para casa, jamais pararam para pensar para onde aquelas crianças e mulheres estão indo. Só pensam em si: “eu vou sair com os amigos agora! Eu vou para minha casa, quentinha e acolhedora! Eu, vou ao cinema!!!”. Realmente, se todos tivessem essa sensibilidade…
Achei muito interessante o assunto, pois jamais soube que existia isso em São Paulo. Deixo esta canção postada ao seu belo artigo:
VIAGEM
ah! se eu dissesse
o que mais quisesse
conhecer Nordeste
Sul, Centro-oeste
Norte e Leste
ainda não conheço
quem nasceu Sudeste
pensou que pudesse
nos seus dezessete
ir onde desse
tudo descobrisse
livre interesse
bem, talvez soubesse
quando a gente cresce
pensa, retrocede
rejuvenesce
nada nos impede
nem tempo, espaço
na noite seguisse
viagem e visse
um extraterrestre
me revelasse
tal o fruto morre
semente renasce
(Valter Moreira)
Nunca soube que isso existia.
Entendo esse direito de visita. Talvez seja pior não ver os pais, mas espero de coração, que esses mesmos pais que dão tanto valor a este convívio dívino, que tenham sabedoria para direcionar seus filhos para um caminho contrário ao que eles seguiram, nunca permitindo que uma penitenciária seja algo normal na vida deles.
beijos,
Silvia