Atropelando o bom senso e a língua portuguesa

 

Por Milton Ferretti Jung

 

Invejo os colunistas de jornais diários que necessitam encontrar a cada dia assuntos capazes de satisfazer aos seus leitores e sempre descobrem um tema. Houve uma época na qual eu escrevia aos domingos sobre futebol,dividindo com Ibsen Pinheiro meia página do Correio do Povo. Ele tratava do Internacional e eu,do Grêmio. Quem não está a par da rivalidade que reina absoluta no futebol do Rio Grande do Sul talvez desconheça que os meios de comunicação gaúchos devem cuidar para não fazer diferença entre os dois times. Hoje,o meu compromisso com o blog do Mílton me permite escrever sobre assuntos variados,inclusive futebol. Nem por isso,entretanto,fico menos agoniado quando chega a terça-feira,dia em que entrego o meu trabalhinho para o âncora deste blog.E não há nada a me inspirar. Não é,felizmente,o caso de hoje.

 

Chamou-me a atenção matéria publicada pela Zero Hora dessa segunda-feira. Trata de trânsito,assunto com o qual preenchi muitos dos meus textos de quinta. O jornal começa assustando quem tem de enfrentar,especialmente,as rodovias deste país,ao lembrar que,”em uma década,meio milhão de pessoas tiveram as vidas interrompidas em ruas e estradas do Brasil,enquanto outros 2 milhões ficaram feridos”.Os dados foram compilados pela UFRJ – Universidade Federal do Rio de Janeiro. Na proporção para cada 100 mil habitantes,o Brasil ganha – acho melhor dizer que perde – de goleada para os Estados Unidos,Finlândia,China e Reino Unido. As estatísticas não tratam de quantos desses acidentes fatais tiveram caminhões como participantes. É incompreensível que,em uma terra como a nossa as ferrovias sejam as filhas desprezadas. Por quê? Seria interessante que essa pergunta fosse feita para a candidata à reeleição,Dona Dilma,em cujo governo nada foi feito em prol do transporte ferroviário,muito menos poluente e pouco sujeito a acidentes. Pelo menos,não se encontra,entre os maquinistas,bêbados e drogados.

 

Os números que acabei de repetir,retirados da reportagem sobre acidentes de trânsito,deveriam preocupar,por exemplo,os nossos senadores. Mas não é o que ocorre. Pelo jeito,resolveram imitar os linguistas e assemelhados,eis que estão estudando modificar,novamente,as regras ortográficas que,segundo imagino,não é assunto para curiosos. Ou eles são doutos em ortografia? O último acordo ortográfico,droga contestada por professores de português,que retirou o hífen de várias palavras,ainda nem foi assimilado pelos viventes de todas as idades,e já querem nos impor mudanças ainda mais estúpidas do que a última. Os portugueses,simplesmente,não ligaram para a reforma,eis que ainda chamam meninos de putinhos e insistem em meter um “c” em facto,além de outras idiossincrasias que vão impedir por “saecula seaculorum” que falemos todos a mesma língua,sem tirar nem por.

 

Imaginem que o “H” desapareça,o “G”fique com som de “GUE”,o “CH” seja substituído por “X”e outras asneiras que as alterações trarão no seu bojo. A vontade que eu tenho é de “EZECUTAR”os nossos senadores e todo e qualquer defensor de nova reforma ortográfica. Como cantaria Roberto Carlos,”quero que vá tudo pro inferno”!!!

 


Milton Ferretti Jung é jornalista, radialista e meu pai. Às quintas-feiras, escreve no Blog do Mílton Jung (o filho dele).

5 comentários sobre “Atropelando o bom senso e a língua portuguesa

  1. Caro Milton Pai, seus textos são ricos e nos preenchem de conhecimento, sempre.
    Se algum dia houve um momento de falta de inspiração, com certeza, não chegou a ser notada.
    Com relação ao trânsito, ainda ontem, no Bom Dia São Paulo, programa apresentado pelas manhãs na Globo, foi divulgado o número 406 de mortes nas ruas de São Paulo, em apenas 4 meses. O que impressiona é que muitas delas ocorreram em ruas pouco movimentadas.
    Acredito que nós brasileiros temos uma necessidade preeminente de nos apresentar nivelados aos grandes centros mundiais e descuidamos do nosso nível humano.
    Há um limite para tudo.
    As ferrovias nunca foram prioridades num pais que tem a cultura de mobilidade sobre rodas.
    Crise energética e recursos que vão para finalidades eleitoreiras são os obstáculos que prevalecem.
    Nem a candidata a reeleição, nem o principal opositor se preocuparam. Se olharmos para Minas Gerais os números de acidentes são, proporcionalmente, também de números alarmantes. E nem por isso nos últimos anos tivemos melhorias nesta situação.
    Quanto a língua pátria, tem gente que se enriquece fazendo estas alterações e editoras ganham com edição de novos dicionários e livros sobre novas orientações da língua portuguesa. É assustador!

  2. Sr. Milton Pai: Quando tive acesso ao noticiário há poucos dias, e vi a manchete que nos informava sobre a votação dos senadores em relação a mudança de grafia da nossa tão sofrida língua portuguesa, tive a mesma impressão do sr. Quantas leis existem a serem aprovadas em relação á saúde, educação e segurança de nossa população, prioritárias a meu ver, a depender de que circuntância para o serem?Cabe agora a reflexão de nós, eleitores, que temos o poder de eleger nossos representantes em várias instâncias nesse ano, para exercer o poder do voto. Grande abraço.

  3. Com tantos outros temas relegados a segundo plano Milton, é preocupante mais esse empenho estapafúrdio dos nossos congressistas. Mas falando em ferrovias, faz algum tempo elas saíram do papel, e ao menos dois projetos importantes já estão com trechos iniciais prontos. Um deles prevê a ligação Norte-Sul, com 4.576 mil quilômetros de trilhos cortando nove estados, do Maranhão a São Paulo, dos quais 855km foram entregues em Maio passado. Segundo reportagem do G1, mais 680 km estão sendo finalizados e o restante será entregue até 2015. Outra ferrovia importante, a Transnordestina, teve as obras retomadas em fevereiro deste ano e prevê cerca de 1500Km de trilhos.

  4. Milton pai,
    Na minha observação quem desviou a rota das ferrovias sem dúvida nenhuma foi o JK.
    Quando fiz o mestrado na década de 80, uma das colegas, filha de ex-ferroviário apresentou uma das mais emotivas dissertações. O tema foi a irresponsabilidade de abandonarmos num país continental as ferrovias.
    Os 40 anos em 4 foram um desastre sobre vários aspectos.

  5. Caro Mílton Pai,
    é sempre um prazer e um respiro ouvir teus (ooops – ler) textos.

    Vinha pela estrada com meu filho e dizia a mesma coisa. E as estradas de ferro? Por que tanto incentivo às montadoras de carros? Discurso e realidade, sempre a velha dicotomia politiquesca..

    Quanto à nossa Língua Portuguesa, foi perdendo os anéis, como nós. Primeiro foi isto, depois aquilo. Meu filho e eu usamos essa expressão também para dizer o que as cachorras vão fazer, quando levamos as duas ‘lá em baixo’. Já ouvi dizer, mas ainda não tive coragem de ir ver. Mas continuo com coragem de viver.

    Parabéns e ótima semana,

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