Avalanche Tricolor: o preço de sonhar menos

Botafogo 3×2 Grêmio
Brasileiro – Nilton Santos, RJ/RJ

Gremio x Botafogo
Foto: Lucas Uebel/GrêmioFBPA

O Grêmio vive de pequenas esperanças e grandes frustrações. Uma vitória acolá levanta o ânimo, um empate segura a respiração e as derrotas — sempre tão recorrentes — lembram que a realidade insiste em puxar o time de volta ao chão. Basta um bom jogo para acreditar que a arrancada começou; basta a rodada seguinte para perceber que continuamos no mesmo lugar.

Há quem descreva essa temporada como uma montanha russa. Não me convence. A figura mais honesta é a de um carrossel infantil: gira, gira, e não sai do eixo. Mesmo depois da vitória no meio da semana, sabíamos que o jogo no Rio não autorizava qualquer ousadia. Diante de um adversário organizado, a queda parece escrita antes do apito inicial — e o time age como se também tivesse lido esse roteiro.

As carências do futebol jogado estão expostas para quem quiser enxergar. Frequentemente, sucumbimos à superioridade rival, como se alcançar um nível mais alto fosse algo fora do alcance. A perda de pontos se torna rotina: às vezes um, muitas vezes três, como aconteceu neste sábado.

O maior perigo não é o sobe e desce, mas o hábito que ele produz. Corre-se o risco de aceitar a mediocridade como paisagem fixa. Ganha-se quando sobra espaço, empata-se por acidente e a derrota passa a ser tratada como destino de quem não se preparou para competir mais alto.

O placar da noite reflete exatamente isso. Pode-se lamentar a chance final desperdiçada — aquela bola que parecia pedir para morrer nas redes e foi chutada para longe pelo próprio artilheiro. Ainda assim, não surpreende: entramos em campo desconfiando de que qualquer vitória seria fruto de generosidade do acaso.

O Grêmio corre poucos riscos no campeonato e alimenta ambições igualmente pequenas. O problema é que o Grêmio, esse que honra sua história, nunca foi time de aceitar o mínimo. O incômodo maior não está no resultado, mas no tamanho dos sonhos que estamos deixando de sonhar.

Avalanche Tricolor: um gol para Walter Kannemann

Grêmio 1×1 Botafogo
Brasileiro – Arena do Grêmio, Porto Alegre RS

Reprodução do canal Premiere

Thiago Volpi que me perdoe — e sei que há de entender —, mas se pudesse dedicar esse gol de empate no minuto final, entregaria a autoria a Walter Kannemann. O capitão do Grêmio fez uma partida colossal dentro da área: ganhou todas as disputas, não deixou sobrar espaço para os atacantes e lutou do jeito que só ele sabe lutar.

Logo no primeiro contra-ataque inimigo, ainda no início, foi Kannemann quem se atirou contra o adversário de forma espalhafatosa e necessária, impedindo a finalização certeira contra o nosso gol. A cena parecia a de um guarda-costas se jogando na frente do protegido para deter a bala fatal. No caso, a bola fatal. Minutos depois, já estava ele do outro lado, na área ofensiva, chutando forte e obrigando o goleiro rival a fazer defesa complicada.

Durante toda a partida, foi Kannemann quem mais bem representou o desejo do torcedor: devolver ao Grêmio o caminho da vitória em casa. Nos últimos três jogos na Arena havíamos perdido dois, empatado um e, pior, não marcado nenhum gol — sequência absurda para quem sempre transformou o estádio em diferencial.

Nada, no entanto, foi tão Kannemann quanto o momento em que ele arrancou do árbitro a marcação do pênalti que nos deu o empate. A bola mal havia saído para escanteio e nosso zagueiro já corria em direção ao juiz, gesticulando, denunciando a infração.

Sim, foi ele quem marcou aquele pênalti. Havia árbitro em campo, auxiliar na beira do gramado e VAR com câmeras de todos os ângulos. Mas, sinceramente, duvido que alguém tivesse visto a irregularidade se não fosse a eloquência do nosso capitão. O gestual teatral, a dança quase grotesca imitando o movimento dos homens da barreira, a braçadeira erguida com orgulho quando o juiz o mandou calar — tudo isso foi decisivo para que ninguém ousasse ignorar o que acontecera.

Kannemann brigou como um soldado disposto a morrer pela batalha, até a confirmação da penalidade. Depois, restou a Thiago Volpi a execução perfeita: frio, sereno, certeiro na cobrança, como já havia feito no Maracanã em situação semelhante.

Volpi tem nossos aplausos, claro, pelo que tem feito e decidido a nosso favor. Mas Kannemann, ah, esse merece uma homenagem especial. Foi ele quem transformou o empate em conquista, num jogo em que o resultado teve gosto de alívio diante da fase recente na competição. Ainda não ganhamos em casa, como desejávamos, mas como não vibrar ao assistir à bravura de Kannemann nos permitindo seguir em frente no Campeonato Brasileiro.

Avalanche Tricolor: do Grand Slam à grande sofrência

Grêmio 1×0 Sportivo Luqueño
Sul-Americana — Arena do Grêmio, Porto Alegre (RS)

Riquelme comemora em foto de Lucas Uebel/GrêmioFBPA

Sentei à noite diante da televisão ainda sob o impacto da vitória de João Fonseca em Roland Garros, no meio do dia. O jovem brasileiro eliminou o francês Pierre-Hugues Herbert por três sets a zero, com autoridade e talento que saltavam aos olhos. Desde sua estreia no Grand Slam de Paris, tenho dividido com amigos e ouvintes o prazer de torcer por alguém que vence com brilho próprio — sem precisar de pênalti forçado ou gol chorado.

Minutos depois, a realidade me trouxe de volta à Arena. Bastaram alguns toques na bola para que o sofrimento habitual se escancarasse. Nem mesmo um adversário fragilizado foi capaz de facilitar a missão. O Grêmio não conseguiu apresentar um futebol minimamente agradável. Sequer o árbitro, figura tantas vezes questionada, servia de bode expiatório. Foi preciso, correto ao marcar o pênalti e justo nas expulsões dos paraguaios.

Mesmo com um a mais em campo durante boa parte da partida — e dois nos minutos finais — desperdiçamos a penalidade e mal conseguimos aproveitar a vantagem numérica. Dizer que estávamos com um time alternativo, poupando titulares para o Campeonato Brasileiro, pouco aliviava a frustração. Pelo contrário: aumentava a preocupação ao ver Mano Menezes recorrer a nomes que já deveriam ter sido deixados para trás há algum tempo.

Para tornar a noite ainda mais amarga, o empate entre Godoy Cruz e Atlético Grau, na Argentina, teve gosto de oportunidade perdida. Os argentinos chegaram a estar perdendo, mas reagiram, e com o empate em 2 a 2 mantiveram a liderança do grupo. Bastariam mais dois gols do Grêmio — contra um adversário com dois a menos — para que conquistássemos a vaga direta à próxima fase. Dois gols. Não parecia pedir demais.

O que consola este torcedor é a aparição de Riquelme. Saído do banco no segundo tempo, foi ele quem marcou o único gol da noite. Aos 18 anos, mesma idade de João Fonseca, decidiu a partida e salvou o Grêmio de um vexame maior.

Será que ao menos isso… pode me dar alguma ilusão?

Avalanche Tricolor: só faltam seis jogos

Fluminense 2×2 Grêmio
Brasileiro – Maracanã, Rio de Janeiro/RJ

Time comemora gol de Braithwaite. Foto: Lucas Uebel/GrêmioFBPA

Minhas redes sociais têm reproduzido nestes últimos dias uma série de momentos memoráveis do Grêmio. Revi o gol de Luan contra o Lanús, na Libertadores de 2017. Rolando a tela do Instagram, encontrei lances da batalha contra o Peñarol, em 1983. Por uma dessas circunstâncias que só o destino é capaz de explicar, até a vitória contra a Portuguesa, em 1996, quando conquistamos pela segunda vez o Brasileiro, apareceu na tela do meu celular. Todas são cenas que mexem com minha memória afetiva e me fazem pensar quantas glórias tivemos o privilégio de assistir nessas mais de seis décadas de vida.

Aqueles tempos estão distantes do futebol que assistimos recentemente. Libertadores e Copa do Brasil vemos apenas pelo retrovisor. O Campeonato Brasileiro, que no ano passado ainda conseguimos chegar em segundo lugar, tem sido um martírio atrás do outro. Cada partida é um drama. Nunca se tem certeza do que seremos capazes. Conquistamos um ponto aqui e outro acolá. Quando fazemos três, torcemos para os demais concorrentes empacarem no lugar.

Hoje, nos restou festejar um resultado alcançado na bacia das almas. Após sairmos na frente em um contra-ataque com boa participação de Aravena e conclusão de Braithwaite, não suportamos a pressão do adversário e tomamos a virada. O gol de empate, já nos acréscimos, veio de uma jogada fortuita de ataque em que Nathan Fernandes, que andava esquecido no elenco, conseguiu alcançar a bola com calcanhar e a fez, inadvertidamente, encontrar Arezo dentro da área. Reinaldo, em uma excelente cobrança de pênalti, igualou o placar.

Sei que já fui bem mais feliz ao comemorar Libertadores, Brasileiros e Copas do Brasil. Já sofri com viradas históricas, assim como vibrei em partidas heróicas. Mas, atualmente, na escassez de resultados e conquistas, o que me resta é valorizar cada ponto conquistado, ainda que na bacia das almas, e lembrar que, por mais que o Grêmio esteja distante das glórias de outros tempos, a paixão tricolor permanece intacta. Porque torcer é isso: é saber festejar o mínimo, é não desistir diante das dificuldades e é manter viva a esperança de que um dia o ciclo das vitórias voltará a girar ao nosso favor. Diante das atuais circunstâncias, não tem como exigir muito mais do que um empate no Maracanã. Só faltam seis jogos!

Avalanche Tricolor: empate para se comemorar!

Botafogo 0x0 Grêmio

Brasileiro – Mané Garrincha, Brasília/DF

Aravena ensaia um ataque em foto de Lucas Uebel/GrêmioFBPA

O Grêmio estava irreconhecível na noite deste sábado. 

A marcação precisa, quase infalível, surpreendeu tanto o torcedor gremista quanto o líder do campeonato. Essa foi apenas a décima vez em 27 jogos disputados na competição que o time não tomou gols. O feito se torna ainda maior se considerarmos que o adversário tem o melhor ataque da competição, ao lado do Palmeiras. 

A mudança no meio de campo, especialmente no posicionamento e na atitude dos jogadores, e a maneira com que o time escolheu ficar mais tempo com a bola no pé, diminuiu a pressão sobre a defesa. Corremos riscos, lógico. E chegamos a levar um gol. Mas até isso esteve a nosso favor, em Brasília. O VAR identificou posição irregular do atacante e anulou o que seria uma injustiça para com a equipe que soube ser resiliente e já causou sofrimento suficiente a nós torcedores.

Especialmente no primeiro tempo e em alguns poucos momentos no segundo, chegamos a impor perigo ao adversário. Estivemos prestes a assistir a um gol que entraria para a história, no minuto final do jogo, quando Walter Kannemann fez o desarme lá atrás e disparou com a bola para o ataque, atropelando os marcadores e concluindo para fora. Seria pedir muito!

O time foi guerreiro para impedir as investidas na sua área e aparentou tranquilidade para trocar passes. Villasanti e Pepê souberam tocar a bola colocando Cristaldo em jogo. Edmilson apareceu bem lá atrás, fechando o meio de campo, e na frente, entrando na área e arriscando a gol. O time, de uma maneira geral, superou a expectativa de um torcedor que tem bons motivos (ou seriam maus?) para estar desconfiado. 

Por mais que a posição na tabela de classificação exigisse três pontos, principalmente depois da derrota em casa no meio da semana, ter saído  de Brasília com um 0 a 0 é  motivo de comemoração. Ou, ao menos, de alívio. 

Avalanche Tricolor: de desalojados, desequilibrados e injustiçados

Grêmio 1×2 Botafogo

Brasileiro – estádio Kleber Andrade, Cariacica/ES

Du Queiroz arrisca de longe em foto de Lucas Uebel/GrêmioFBPA

Pelo calendário oficial, ao Grêmio caberia o mando de campo na partida deste início de noite. Como é sabido por todos, estamos impedidos de jogar na Arena desde as enchentes de maio. E o retorno à casa não se dará antes de agosto. Até lá, seremos apenas um time de itinerantes, desalojados. 

O preço que pagamos é alto e jamais será coberto pelo milhão depositado na conta do Grêmio com a venda do mando de campo, que nos levou ao Espírito Santo, neste domingo. Além do acúmulo de jogos, devido a parada por cerca de 30 dias, e a disputa de partidas decisivas pela Libertadores, viagens incessantes têm causado desgaste extraordinário no elenco.

As dificuldades se somam a carência de substitutos, especialmente no comando do ataque. Mas não somente nesta posição. Verdade que esse é um problema que teríamos a despeito das ocorrências relacionadas à tragédia no Rio Grande do Sul. Enfrentar três competições, por si só, seria um desafio enorme e exigiria muita criatividade do comando técnico, diante do grupo de jogadores disponíveis. Com as atuais condições, os riscos se potencializaram. 

Estamos participando de um campeonato, e aqui me refiro ao Brasileiro, dos mais disputados do mundo. E somos obrigados a jogá-lo nas condições precárias que o destino nos proporcionou. Em um escancarado desequilíbrio técnico que até aqui prejudicou apenas a nós. Cabe ao Grêmio se resignar e reagir em campo recuperando-se com uma sequência de vitórias.

O que provavelmente os demais clubes não perceberam é que alguns deles também serão vítimas desse desequilíbrio. Porque haverá times que terão vantagem sobre os outros ao disputarem seis pontos contra o Grêmio sem precisar passar pela Arena — é o caso do Botafogo que com a vitória de hoje assumiu a liderança da competição. Considere nessa análise o fato de que, na temporada passada, foram especialmente os resultados obtidos em Porto Alegre que nos levaram ao vice-campeonato brasileiro. Nem todos os adversários, porém, serão submetidos ao fenômeno transformador que a Arena proporciona. E isso torna a disputa injusta.

Avalanche Tricolor: Meu Deus Suárez!

Botafogo 3×4 Grêmio
Brasileiro — São Januário, Rio de Janeiro/RJ

Suárez comemora o terceiro gol em foto de Alexandre Durão / Grêmio FBPA

Foi pura magia. Do desencanto ao encantamento. Do revés à reação. Do time que sabe onde pode chegar a um craque que joga uma bola descomunal. Cada nuance da partida desta noite, em São Januário, foi parte de um roteiro forjado pelo sofrimento e êxtase, na típica narrativa da jornada do herói, desde a passagem pelo tempo comum até a ressurreição, da travessia do primeiro limiar ao elixir da conquista.

E se havia um personagem a ser o herói, claro, só poderia ter sido Luis Suárez, o atacante que aceitou a missão de recuperar a história do Grêmio nos gramados brasileiros e nos devolver a Libertadores. Mais do que isso: resgatou o orgulho de um torcedor ferido nos percalços das duas últimas temporadas. Um torcedor que tem levado seu grito a todos os estádios onde o Grêmio joga. Que canta satisfeito por seu próprio valor.

Luis Suárez foi gigante no gramado de São Januário. E no instante em que o Grêmio mais precisava dele, quando estávamos perdendo por 3 a 1. Em que parecíamos vencidos pelas circunstâncias, resignados por aquilo que o destino havia nos reservado, sermos coadjuvantes nesta competição. O maior atacante que já vestiu nossa camisa nos devolveu o direito de sonhar. De acreditar que não é impossível. Ele foi o responsável pela virada de um placar que parecia definitivo, dadas as condições do jogo e a pressão da torcida adversária.

Heróis como Luizito não se entregam jamais. Acreditou e lutou enquanto pôde. Foi auxiliado por um endiabrado Ferreirinha, que entrou no segundo tempo e infernizou quem se atreveu a marcá-lo. Em um dos primeiros lances, cruzou e, com o desvio do zagueiro, fez a bola chegar aos pés de Suárez, que diminuiu o placar. Na segunda, o cruzamento foi na medida certa e nosso atacante não perdoou, fazendo o gol de empate. A virada foi obra dele novamente, que buscou a bola na intermediária, tabelou e recebeu em condições de passar no meio dos zagueiros e estufar a rede.

Diante da obra construída por Suárez, só restava agradecer àquele que me deu a oportunidade de vivenciar esse momento. Levantei as mãos aos céus e agradeci: obrigado, Meu Deus Suárez!

Avalanche Tricolor: no limite!

Grêmio 0x2 Botafogo

Brasileiro – Arena Grêmio, Porto Alegre RS

Suárez em destaque na foto de Lucas Uebel/Grêmio FBPA

O Grêmio joga no limite. Com o seu limite. 

Luis Suárez é quem melhor representa essa verdade, ao não conseguir esconder mais a expressão de dor no rosto, a passada marcada pelo arrastar da perna direita e o segurar de joelhos com as mãos sempre que a bola para. Sofre em campo e não desiste. Não se entrega. Tira do limite do corpo o melhor que seu talento consegue oferecer. Tabela com os companheiros, antevê a jogada, se posiciona para receber e não desperdiça uma oportunidade de chutar a gol. Hoje, por duas vezes, esteve próximo de ser antológico. Na primeira, a bola desviou no travessão; na segunda, o goleiro adversário impediu o gol. Entre uma e outra jogada, chutou como poucas vezes se viu nesses últimos jogos. Desta vez, sem sucesso. 

Considerando o limite do seu grupo de jogadores — que não é apenas físico, como no caso de Suárez —, o Grêmio surpreende até aqui ao permanecer entre os primeiros colocados do Brasileiro, especialmente se pensarmos que chegou na temporada alvo de desconfiança. Dentre os descrentes muitos dos nossos torcedores — alguns, é verdade, apenas oportunistas a espera de um revés para exalar suas discordâncias. Mesmo diante de todas as restrições, o Grêmio vem acumulando bons resultados, alguns construídos na última hora, como os da Copa do Brasil. 

Temos indícios de bom futebol, também. Na partida de hoje, assistimos nossos jogadores se aproximando e tabelando apesar do pouco espaço diante da marcação forte do adversário. Toques curtos e de primeira permitiram que avançássemos em direção a área. Houve boas viradas de jogo, passes qualificados e entrega na marcação que permitia a roubada da bola para iniciar o ataque. As chances se acumularam no primeiro tempo. Infelizmente, foram desperdiçadas.

Desta vez, pagamos caro por não transformar nosso esforço em gol. Contra um adversário que também surpreende a lógica do futebol ao disparar na liderança do campeonato após entrar desacreditado na competição, fomos incapazes de conter a precisão de seus ataques e amargamos uma rara derrota em casa. Foram dez meses e 24 jogos de invencibilidade na Arena,  o que, convenhamos, também desafiava nossos limites. 

O resultado não nos tira do topo da tabela. Seguimos entre os três primeiros classificados no Brasileiro. Na Copa do Brasil, vamos para mais uma decisão, na quinta, outra vez diante da nossa torcida. A medida que a temporada avança novos limites surgirão e caberá ao Grêmio reconhecê-los e superá-los como sempre fizemos ao longo da nossa história. 

Avalanche Tricolor: xô, zica!

Botafogo 2×5 Grêmio

Brasileiro – Nilton Santos, RJ/RJ

Matheus comemora o 5º gol, em foto de Lucas Uebel/Grêmio FBPA

Fizemos 5 gols. Tomamos 2. Fizemos de bola tocada, de bola colocada e de falta cobrada. Teve gol de Churín. Gol de pênalti. Gol de Jean Pyerre. De falta. Teve o primeiro do Alisson. E os dois últimos do Matheus Henrique. Do último, tiro inspiração para esta crônica. 

Já com a braçadeira de capitão —- legado de Maicon que havia saído mais cedo —-, nosso camisa 7 marcou o quarto gol gremista depois de uma assistência de Isaque, aos 27 do segundo tempo. Da entrada da área e com a defesa no meio do caminho, encontrou um espaço para colocar a bola com classe na rede adversária. Foi um gol importante porque pouco antes havíamos levado o primeiro e, apesar de ainda estar 3 a 1, a saga de empates que marcou nossa jornada na temporada voltava a fazer sombra.

Se no primeiro que fez a comemoração foi tímida, no segundo, Matheus revelou o peso que estava sobre os seus ombros —— o mesmo que pesa nos ombros de toda a equipe. Aos 32, após mais uma assistência de Isaque, desta vez de calcanhar, Matheus entrou na área conduzindo a bola até encontrar o gol. Na festa, fez aquele movimento com as mãos sobre o próprio corpo que, em bom português, significa: “xô, zica!”

Zica tem diversos significados aqui no Brasil.

É nome do vírus que nos assustou anos antes da Covid-19. É como, em alguns estados, descrevemos jovens descolados, com estilo próprio, que têm a capacidade de fazer coisas que fogem do nosso comum. Matheusinho —- é assim que locutores de futebol gostam de chamá-lo para revelarem uma intimidade inexistente —- pode ser considerado um moleque zica ou um guri zica, apesar de a gíria não ser própria do Rio Grande. Naquele momento do gol, do seu segundo gol, a zica que Matheus queria afastar nem era uma nem era outra. Era a zica que vem acompanhada pelo azar, pelos lances de infortúnios, pelo tanto de coisa ruim que se acumula em um determinado momento de nossa vida.

O quinto gol gremista definiu o placar e encerrou uma interminável trajetória sem vitórias neste ano de 2021. Já passava de um mês desde a última conquista, em 6 de janeiro. De lá para cá, além de resultados doloridos e pênaltis esquisitos, tivemos um amontoado de empates que nos fizeram patinar na subida ao topo da tabela do Brasileiro, momentos depois de uma arrancada que chegou a nos dar alguma esperança.

A despeito da capacidade do adversário,  tão abatido quanto rebaixado, que os gols de Alisson, de Jean Pyerre, de Churín, de Matheus Henrique, de pênalti, de falta, de bola passada e bola colocada, nesta noite de segunda-feira, sejam os gols que nos livraram da zika que carregamos nesta ano e marquem a virada de expectativas para as três rodadas finais do Brasileiro —- que ainda podem nos devolver, pela porta da frente, a Libertadores —- e nas duas partidas finais da Copa do Brasil.

Xô, Zica!

Avalanche Tricolor: o talento ainda veste a camisa do Grêmio

Grêmio 3×1 Botafogo

Brasileiro —- Arena Grêmio, Porto Alegre/RS

Comemoração do segundo gol de Pepê em foto de LUCAS UEBEL/GRÊMIO FBPA

 

Houve quem tenha lido a Avalanche anterior e saído dela com a impressão de que usei de estratégia escapista ao enaltecer o capitão de todos os títulos, Maicon, após termos registrado mais um revés em campo. Aos que desconfiaram das minhas intenções, a melhor resposta veio na partida desta noite, em Porto Alegre.

Os gols foram de Diego Souza e Pepê, eu sei, Mas a presença de Maicon no meio de campo fez toda a diferença. Ao sair do gramado, quando a missão já era de apenas nos defendermos diante de um time que tinha superioridade numérica —- devido a expulsão de nosso centroavante logo no início do segundo tempo —-, Maicon era o líder no número de passes: 75, se não me engano. O mais incrível: havia errado apenas um. É muito talento para uma camisa só.

Isso não bastou para o capitão. Ele comandou o time, organizou seus companheiros em campo, chamou atenção da marcação, cobrou empenho e não descansou mesmo depois da vitória garantida. Sua dedicação e liderança se expressaram em uma dessas cenas que passam batido pela televisão e pela observação dos comentaristas. Após mais um cruzamento desperdiçado pelo adversário, Maicon não poupou de uma bronca Pepê, que já havia marcado dois gols, porque nosso atacante não acompanhou o adversário até a linha de fundo. Ele sabe que, neste momento, o time precisa de esforço redobrado e de cada gota de suor que ainda tiver para ser produzida. Por isso reclamou. E Pepê entendeu.

O Menino Maluquinho do Grêmio, aliás, foi outro jogador com atuação incrível  nesta noite. Fez o gol do desempate com um chute certeiro, após receber bola de presente de Diego Souza. E fez o gol que fechou o placar após uma daquelas jogadas de dar orgulho de ser torcedor deste time. O locutor da TV disse que foi gol de videogame. Cheguei a definir como um gol de futvôlei. Um comentarista de futebol amigo meu, resumiu com uma só palavra enviada pelo WhatsApp: genial!

O Grêmio renasce com seu futebol a medida que começa a colocar em campo alguns dos seus principais jogadores. Ainda tem gente para se recuperar e muito caminho pela frente no Brasileiro, na Copa do Brasil e na Libertadores. O mais importante, porém, foi o aceno que fez ao seu torcedor demonstrando que o talento ainda veste a camisa do Imortal.