
Aeroportos são feitos para funcionar, tanto quanto os aviões. Problemas técnicos ou falhas no gerenciamento de crise costumam provocar grandes prejuízos (até mortes, no caso dos aviões): negócios deixam de ser realizados, reuniões não ocorrem, agendas sofrem transtornos e sonhos não se realizam. Especialmente no período de férias, expectativas de famílias inteiras são frustradas, pessoas que se reencontrariam têm de estender a saudade, e planos, às vezes construídos por um ano inteiro, outros por toda uma vida, são adiados. Fora os momentos que nunca mais serão vividos (ou sentidos) pelos passantes.
Há situações, porém, inevitáveis, para as quais aeroportos e aviões têm de estar preparados. Nos Estados Unidos, onde estou nessas férias, turistas vivem um cenário de intranquilidade, para dizer o mínimo. Todo dia, milhares de voos são cancelados devido as nevascas que atingem parte do país, que enfrenta um dos seus mais rigorosos invernos. Algumas temperaturas beiram o absurdo, termômetros marcaram -40ºC, em Minnesota, e a sensação térmica pode chegar a -51ºC, em Chicago. Onde estou, mais ao leste, a neve foi intensa e curtimos um inverno de aproximadamente -20ºC, aulas não foram reiniciadas depois dos feriados de Natal e Ano Novo e muitos trabalhadores ficaram em casa. A possibilidade é que o frio permaneça intenso por mais alguns dias.
Domingo passado, a caminho do aeroporto La Guardia, em Nova Iorque, cruzamos por painéis eletrônicos anunciando o fechamento do aeroporto JFK, que fica um pouco mais à frente. Logo me solidarizei com as centenas de brasileiros sem condições de retornar para o Brasil, conforme havia lido em reportagens horas antes na imprensa local. Soube depois que um avião da Delta derrapou na pista sem causar danos, mas espalhou neve e medo na tripulação e nos passageiros. A mesma empresa domina os terminas C e D do La Guardia, aeroporto que tem voos mais curtos do que o JFK, e de onde pretendíamos seguir para Burlington, cidade que está a meia hora de uma estação de esqui, Stowe, no Estado de Vermont. Depois do check in feito, malas despachadas, bilhetes na mão e todos assentados na sala de embarque fomos informados que o voo estava cancelado. Mais informações no guichê à direita, orientou o funcionário da Delta. Não demorou muito para percebermos que a diversão ficaria adiada para as próximas férias. Não havia lugar nos voos para os dias seguintes e menos ainda a garantia de que estes conseguiriam decolar em direção à Vermont.
E agora você começará a entender porque iniciei este texto reforçando a ideia de que os aeroportos foram feitos para funcionar. Os daqui dos Estados Unidos costumam andar muito bem levando em consideração o número de passageiros e voos diários, além da complexidade de se atender um pais com essas dimensões e o trauma de atentados. É o que se espera de qualquer aeroporto do mundo: atendimento rápido, serviço de qualidade, conforto para o embarque, organização e segurança. O problema é que existem fatores que fogem do controle de seus administradores como as intempéries: vento forte, nevoeiro, chuva ou neve intensas. E para essas tem de se ter um plano de contingenciamento que ofereça o mínimo de respeito aos passageiros, vítimas de todo este processo e, afinal de contas, quem financia o negócio.
A experiência que encarei no La Guardia não me dá garantias de que os administradores estejam prontos para essas dificuldades. O valor da passagem, disseram os funcionários, será restituído, bastando fazer contato com a empresa por telefone. Tudo muito simples (e em 20 dias úteis, me parece). Tanto quanto seria para resgatar minhas duas malas que, soube depois, deveriam ser devolvidas em até uma hora e meia. A primeira apareceu uma hora depois em uma esteira rolante de outro voo no terminal em que eu pretendia embarcar. A segunda foi protagonista de uma aventura que me levou a visitar mais três terminais por mais de uma oportunidade, entrar na fila de reclamações quatro vezes – algumas enormes (as filas) – e perceber como é vulnerável o sistema de segurança. Vários passageiros a espera das malas assim como várias malas a espera de passageiros formavam um cenário caótico. A argentina soube que suas malas tinham seguido para Vermont, o polonês teve a garantia de que as suas estavam por ali, em algum lugar qualquer, provavelmente acompanhadas pela minha mala que a atendente, bastante simpática, tinha certeza de que permanecia no aeroporto, apenas não sabia onde. Foram cinco horas de espera até ser informado de que algumas malas teriam sido entregues em terminal próximo dali e, se eu tivesse a sorte, a minha estaria por lá. Dei sorte.
Aeroportos foram feitos para funcionar, mas quando não funcionam, têm de estar prontos para gerenciar crises e oferecer o mínimo de transtorno possível ao passageiro que, convenhamos, já teve frustração suficiente ao não alcançar seu destino.
PS: com as malas de volta e roteiro modificado, minhas férias vão muito bem, obrigado. E os patrícios estão mais tranquilos por saberem que não me arriscarei em uma pista de esqui, novamente. Ao menos, por enquanto.






