Educação digital e diálogo evitam dependência de videogame e tecnologia

 

 

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Usuário de videogame. Foto: CC0 Creative Commons

 

 

A decisão da OMS – Organização Mundial de Saúde de identificar o vício por videogame como distúrbio mental, tema que tratei em post publicado nessa terça-feira, aqui no Blog,  sinaliza o tamanho do problema que algumas pessoas estão enfrentando dentro de casa. Se até há alguns anos, os pacientes que apresentavam sinais de dependência aos jogos eletrônicos, especialmente online, tinham mais de 18 anos, hoje os consultórios de psicologia já recebem meninos e meninas de 11 e 12 anos. Fiquei surpreso e assustado com a informação da psicóloga  Anna Lucia King, que entrevistei no Jornal da CBN, na manhã desta quarta-feira.

 

 

Ela entende do assunto. É doutora em saúde mental e uma das fundadoras do Instituto Delete que surgiu dentro do Instituo de Psiquiatria da Universidade Federal do Rio de Janeiro, em 2008. Logo que começa a conversar sobre o assunto faz questão de ressaltar: “somos a favor das tecnologias porque são muito importantes, elas desenvolvem o mundo”. Mesmo que defenda um detox digital, não prescreve abstinência no acesso a computadores e celulares ao contrário do que se faz com dependentes de álcool e drogas.

 

 

Chama atenção para a necessidade de se diferenciar os que usam de forma abusiva a tecnologia, por lazer ou trabalho, daqueles usuários abusivos que tenham um transtorno associado. Geralmente são pessoas inseguras, dependentes emocionalmente de outras, têm baixa auto-estima, dificuldade de se relacionar, mantém alguma fobia social e usam o computador como um escudo.

 

 

 

 

Existem exames específicos e profissionais preparados para identificar a dependência de videogames – e este é um dos trabalhos do Instituto Delete. Porém, é possível ligar o sinal de alerta no caso de a pessoa, seja mais jovem ou mais velha, ter privação de sono, baixo rendimento escolar e profissional, prejuízos na  vida pessoal, social e familiar. Geralmente, a identificação desses sinais é feita por alguém da família porque a pessoa mesmo não reconhece o uso abusivo com transtorno associado.

 

 

Para Anna Lucia, educação digital e diálogo são os caminhos a serem percorridos por pais e filhos com o objetivo de evitar o uso abusivo das tecnologias: “o importante é o pai entender que ele é o responsável pelo uso da tecnologia do filho … como transmitir educação digital se ele mesmo dá exemplo errado?”.  Portanto, antes de cobrar do seu filho um comportamento que considere mais apropriado, lembre-se de prestar atenção nos seus hábitos.

 

 

Gostei de ouvir na entrevista uma sugestão que já aplico desde que me conheço por pai – e isso lá se vão 20 e poucos anos.

 

 

Anna Lucia comentou que os pais costumam reclamar dos excessos cometidos pelos filhos, mas fazem questão  de montar o quarto das crianças com sinal de wi-fi e equipamentos de última geração: “aquilo (o videogame) é muito sedutor, com luzes, imagens e personagens que são fortes e bem sucedidos”. A sugestão dela é que  o computador esteja na sala para que as crianças não fiquem isoladas e o acesso seja em um ambiente coletivo.

 

 

Por vivência já compartilhada com você, caro e raro leitor deste Blog, quando todos usam a internet em um mesmo ambiente a troca de experiência é muito maior, o relacionamento se torna saudável e educativo. E educativo para ambos os lados. Aprendi muito assistindo a meus filhos e descobri, por exemplo, que eles não vivem na frente do computador jogando videogame. Eles vivem na frente do computador assistindo a documentários e séries, pesquisando para trabalhos escolares e profissionais, conversando com amigos nos mais diferentes cantos do planeta, lendo artigos e textos disponíveis na internet, trocando todo tipo de arquivo de áudio, video, texto e foto, e, claro, jogando videogame.

 

 

“Os pais precisam ver que não é porque o filho joga o dia inteiro que ele é um doente ou tem um transtorno associado, ele às vezes tem uma falta de orientação de como usar adequadamente a tecnologia; e todo jovem que usa muito tempo não quer dizer que ele é um viciado ou dependente, ele só tem um mau uso que precisa ser corrigido e orientado”, comentou.

 

 

Você está preparado para orientar o seu filho?

 

 

Leia mais sobre o assunto:

 

 

O que aprendi com os meninos que não saem da frente do computador

 

 

Um manual para os pais da geração gamer

Avalanche Tricolor: “nos pênaltis, ora bolas!”

 

 

Novo Hamburgo 1×1 Grêmio
Gaúcho – Estádio do Vale/Novo Hamburgo

 

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Barrios marca o gol do Grêmio, reprodução de imagem da SPORTV

 

Porto Alegre foi onde estive nesses últimos dias, após uma rápida estada em Gramado, interior do Rio Grande do Sul. Cheguei de lá na noite deste domingo quando o Grêmio já estava em campo decidindo uma vaga à final do Campeonato Gaúcho.

 

Estar com a família, relembrar histórias das quais fomos protagonistas juntos, entender como cada um de nós chegou até aqui e perceber que fomos feitos de alegrias e tristezas, sendo que ambos sentimentos deixaram suas marcas, tornaram esses dias intensos ao lado de minha irmã e meu irmão, e junto com minha cunhada e sobrinhos.

 

Rever o pai, então, é sempre uma sensação única. Gosto de abraçá-lo fortemente para agradecer pela sua presença entre nós e, em especial, para deixar nele a certeza de que tudo que vivemos até aqui valeu a pena, independentemente do que tenhamos enfrentado no passado.

 

Até porque naquele passado, filhos e pais nem sempre se abraçavam e se beijavam com o desejo que esta relação sempre mereceu. Sei lá, parece que rolava uma timidez, uma vergonha sem explicação de dizer o quanto te amo. Coisa de adolescente, talvez.

 

Verdade que o pai sempre se esforçou para mostrar isso para mim. Eu só não entendia.

 

Quando eu chegava tarde em casa, ele me esperava acordado, fumando um cigarro atrás do outro, sempre imaginando que o pior poderia ter acontecido. Sobrava bronca pra todo mundo. Eu achava desnecessário e desconfortável. Hoje percebo tudo isso com maior nitidez: era apenas amor.

 

Ao lado dos campos de futebol e das quadras de basquete, onde tive o prazer de representar o Grêmio por anos a fio, ele sofria desesperadamente, esbravejava contra o juiz e dizia palavrões desajeitados. Tiveram cenas hilárias, como o dia em que correu atrás do árbitro, cansado de tanto vê-lo apitar contra nós. Que vergonha! Vergonha, nada! Era apenas amor.

 

Naqueles tempos, abraços intensos e desavergonhados só mesmo quando assistíamos aos jogos do Grêmio. Eram momentos em que parecíamos ter a mesma idade. Socávamos as cadeiras azuis do Olímpico a cada lance desperdiçado. Saltávamos efusivamente para comemorar nossos gols. Os títulos mereciam celebração especial que se iniciava no estádio, seguia com a gente pelas escadarias até o vestiário e se estendia pelo caminho de volta a nossa casa, que ficava bem pertinho dali.

 

Diante do revés, ele voltava a ser meu pai. Pois era quem sabia me consolar, usando às vezes a razão outras apenas a ilusão para explicar os motivos de uma derrota. Nem sempre havia coerência na justificativa, mas ele insistia naquela história para não ver seu filho triste. Era mais um sinal de seu amor.

 

Hoje, voltei para São Paulo e, depois de um abraço bem apertado, deixei o pai lá em Porto Alegre antes de a partida se iniciar. Precisávamos vencer para estar na decisão. Nem que fosse nos pênaltis. Repetimos os feitos (ou defeitos) do primeiro jogo da semifinal quando saímos na frente e não foi necessário muito esforço do adversário no ataque para entregarmos o empate. Jogamos fora a possibilidade de classificação em pênaltis mal cobrados.

 

Estivesse aqui ao meu lado, em São Paulo, arrisco dizer que o pai encontraria uma desculpa qualquer para não me ver abatido com a desclassificação. Talvez tentasse me convencer que mais importante é conquistar a Libertadores.

 

Eu sei, pai, mas nós sempre queremos ganhar todos os títulos que disputamos.

 

Quem sabe, me lembraria que somos os atuais campeões da Copa do Brasil, o Rei de Copas, título nacional de muito mais destaque do que um regional.

 

Você tem razão, pai, mas eu ando com saudades de um título gaúcho. E você, também.

 

Ora bolas, mas só perdemos nos pênaltis! – tentaria uma última cartada.

 

É, ele é assim mesmo: para me consolar, o pai não desiste nunca. É amor, eu sei!

Avalanche Tricolor: espírito Olímpico volta no Dia dos Pais

 

Grêmio 3×0 Corinthians
Brasileiro – Arena Grêmio

 

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Sou gremista porque meu pai decidiu assim. Nasci sem cor nem clube, como nascem todos os bebês. E no momento em que meu destino teria que começar a ser traçado foi ele quem me ensinou, nos moldes da época, o caminho a seguir.

 

Foi meu pai quem me levou pela mão ao estádio Olímpico que ficava logo ali, quase na esquina de casa. A primeira vez, pelo que me lembro, foi para ver Pelé em campo. E daquela lembrança tenho a caminhada pelo “beco”, como chamamos as ruas de terra e cercadas por casas pobres, para cortar caminho.

 

Pode ter me levado antes ao estádio, mas a memória me trai. Sei, porém, que depois daquele jogo, levou-me duas, três, quatro, um centena de vezes, até que eu soubesse percorrer aquele caminho sozinho.

 

Meu pai me forjou gremista, sentindo o frio das cadeiras cativas no arco de cima do estádio Olímpico e visitando os corredores internos daquele monumento construído para abrigar nosso time de coração. Tive o privilégio de ver jogos ao lado dele na cabine de transmissão da rádio Guaíba. As arquibancadas lotadas causavam arrepios e minha emoção muitas vezes se transformou em lágrimas, tanto pela vitória quanto pela derrota.

 

Hoje, ao ver a Arena do Grêmio tomada por mais de 50mil torcedores, em um domingo especial no qual se comemora o Dia dos Pais, percebi que o espírito do Estádio Olímpico estava de volta. A torcida cantou e vaiou. Atreveu-se a pedir olé quando o placar estava decidido. O caldeirão esquentou.

 

Mesmo distante, tinha a impressão de que estava lá, sentado em um das cadeiras ao lado do pai, no velho Estádio Olímpico – que ganhou este nome por abrigar a Universíada – os Jogos Olímpicos Universitários, em 1963.

 

O número de torcedores presentes jamais havia sido registrado em partidas disputadas na Arena. E se estavam lá é porque sabiam que o time poderia responder a altura. Torciam para que isso acontecesse. E aconteceu.

 

Um time que começou a partida com postura diferente das últimas, semelhante a que nos deu vitórias importantes neste campeonato. Que não se importou com as ausência de dois de seus maiores talentos, Luan e Wallace, que ajudam o Brasil a ser melhor nos Jogos Olímpicos.

 

O resultado foi que nossos atacantes, Pedro Rocha, Everton e Miller, fizeram o que esperamos deles: gols. Nossos defensores, com destaque para Geromel, o Incrível, e Marcelo Grohe, cumpriram com méritos suas funções. E, mesmo com uma partida a menos, estamos de novo na disputa da liderança.

 

No Dia dos Pais, o espírito do Estádio Olímpico esteve de volta. E eu pude lembrar mais um vez como o pai foi importante na minha formação.

Avalanche Tricolor: Pai, obrigado!

 

Grêmio 5×0 Inter
Brasileiro – Arena Grêmio

 

Time comemora a goleada no Gre-Nal (Foto álbum oficial do Grêmio no Flickr)

Time comemora a goleada no Gre-Nal (Foto álbum oficial do Grêmio no Flickr)

 

Fui cedo à igreja como sempre faço aos domingos. E na igreja que vou o padre é gremista. Não todos, mas o que reza as missas nas manhãs de domingo, José Bertolini, de quem já bem falei nesta Avalanche, o é. Para que não haja dúvida, ratifico, também, o que já escrevi por aqui: não vou a igreja porque ele é gremista nem por causa do futebol. No campo em que a bola rola, nossos deuses são profanos e nossas atitudes nem sempre são santas. De qualquer forma, é bom encontrá-lo por lá, pois fico sempre a espera de um cumprimento na porta da capela. Assim que cheguei, acenou com a mão aberta e os cinco dedos à mostra para em seguida balbuciar: e hoje, heim?! Que façamos por merecer, respondi de bate-pronto.

 

Lá dentro, na dinâmica que emprega, Bertolini aproveitou a data especial (e me refiro ao Dia dos Pais) para convidar os fiéis a falarem sobre seus pais. Antecipei-me na jogada, tomei o microfone e com duas palavras defini o meu, que você, caro e raro leitor desta Avalanche, já conhece muito bem, como incentivador e inspirador. Motivos não me faltam para descrevê-lo desta maneira e poderia, talvez, exemplificar com a escolha profissional que fiz, seguindo seus passos na carreira. Ou, ainda, lembrar as centenas de vezes em que esteve ao meu lado, sofrendo em cada jogada que me envolvia nas partidas de basquete e de futebol, esportes que pratiquei por muitos anos.

 

Hoje, porém, permita-me falar sobre apenas um dos aspectos que o tornaram tão especial para mim: a crença de que eu deveria ser gremista. Foi meu pai quem me guiou pela mão em direção ao Estádio Olímpico quando eu tinha seis anos de vida. E o fez usando sua autoridade de pai, pois percebeu que um primo de segundo grau tentava seduzir-me e levar-me a torcer para o time que, naquele ano, inaugurava seu novo estádio e quebrava sete temporadas seguidas de hegemonia regional do Grêmio. Fosse nos dias de hoje talvez sua atitude tivesse sido condenada, mas ao me ver com a bandeira do adversário na mão, tirou-a de mim e me passou um corretivo. Nada como um pai convicto de suas decisões e disposto a tudo para colocar o filho no caminho correto.

 

Neste domingo, foram intensas as lembranças provocadas graças a atitude de meu pai.

 

Lembrei de meu pai e a atitude dele ao ver nosso time trocar passes – olha eu aqui mais uma vez enaltecendo o passe – com precisão, rapidez e criatividade.

 

Lembrei de meu pai e a atitude dele ao ver nossos jogadores marcando com a força e a prudência necessárias para impedir que o adversário jogasse.

 

Lembrei de meu pai e atitude dele ao ver Marcelo Grohe comemorando com os punhos cerrados um das poucas vezes em que foi exigido.

 

Lembrei de meu pai e a atitude dele no golaço com o pé esquerdo de Giuliano, no segundo e no terceiro gols com o pé direito de Luan, no quarto marcado após o drible em velocidade de Fernandinho e no quinto em que o adversário capitulou jogando contra sua própria rede.

 

Lembrei dele até no pênalti desperdiçado (sim, a goleada poderia até ser maior), pois me ensinou que nada está perdido enquanto se tem dignidade para lutar. E que força o Grêmio demonstrou na partida desta noite!

 

Foram tantas as lembranças e alegrias nesta goleada dominical, proporcionadas pelo caminho oferecido por meu pai, lá em 1969, que só posso encerrar esta Avalanche com um agradecimento:

 

Pai, obrigado por eu ser gremista!

Dia dos pais: “obrigado por suas palavras”

 

Desnecessário tecer aqui a importância de um pai na vida de seus filhos, menos ainda o papel que o meu teve, já que, entre tantas coisas, somos parceiros de blog e, muitas vezes, ele ou eu já escrevemos sobre nossa relação. Toda semana, ou quase toda, ele nos dá o privilégio de escrever suas crônicas por aqui. Nesta, preferiu mandar-me e-mail para agradecer a dedicatória que escrevi no exemplar do livro ‘Comunicar para liderar’ que reservei com carinho para lhe entregar em mãos no último fim de semana, em Porto Alegre. Confesso que, fosse um editor qualquer de blog, talvez não abrisse espaço para publicar apenas uma nota de agradecimento pelo que realizamos, mas esta não é uma nota qualquer nem eu sou apenas o editor deste blog: a nota foi escrita pelo meu pai e, convenhamos, como negar tal pedido às vésperas do Dia dos Pais.

 

Então, vamos lá! Atendendo a pedidos de meu pai, eis o post da semana escrito por ele:

 

“Obrigado por suas palavras”

 

Oi,este texto eu gostaria de ver postado no teu blog desta sexta-feira. O meu texto começa como o teu:

"Sua correção me guiou,
 Sua carreira me inspirou;
 E aqui você encontra um pouco daquilo
 Que aprendi na estrada da comunicação
 Que foi aberta por você.”

Neste obrigado que se lê acima, o Mílton escreveu para mim a sua dedicatória no dia em que ele e sua parceira, Leny Kyrillos, lançaram o livro “Comunicar Para Liderar”. Demorei um pouco – ou,quem sabe,muito – para postar este texto e agradecer a você o elogio feito ao seu “Velho”. Não fiz mais do que minha obrigação de pai,orgulhoso pelo sucesso do seu filho,radialista de escola e também escritor.

Avalanche Tricolor: o Grêmio está na disputa, sim senhor!

 

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Grêmio 2 x 1 Atlético PR
Brasileiro – Arena Grêmio

A Arena era destaque na Porto Alegre que via lá da janela do avião, assim que partimos da cidade. Até pouco antes, enquanto aguardava a decolagem, assistia ao jogo na tela do meu celular, que se parecia minúscula diante do futebol que jogávamos contra o líder do campeonato.

 

Marcação na saída de bola, pressão no meio de campo e defesa firme se uniam a velocidade na troca de passe e deslocamentos pelos lados com a entrada em diagonal na área. Chegávamos à linha de fundo e de lá disparávamos cruzamento ou passes para quem viesse de trás, conforme a conveniência.

 

Foi em uma dessas investidas, com bola aberta pela direita, boa condução até a proximidade da área e cruzamento forte e rasteiro para o meio que saiu o primeiro gol, de Giuliano, e único que consegui assistir dos três marcados na partida desse domingo à tarde.

 

Por força dos compromissos, e algo que o destino insiste em fazer comigo, afastar-me da Arena em dias de jogos, precisei deixar a capital gaúcha em meio a partida. Havia aproveitado muito bem os dias anteriores – cheguei à cidade no fim da tarde da sexta-feira – com a família. Matei a saudade dos irmãos e sobrinhos, colocamos os assuntos em dia, relembramos os bons momentos em que crescemos unidos e sentamos entorno do pai para aproveitar o carinho que ele transpira por todos nós, mesmo quando os filhos defendem restrições para que ele preserve sua saúde.

 

As curtas caminhadas em volta da casa de infância, o cumprimentar dos vizinhos que resistiram às investidas imobiliárias e a visão do estádio Olímpico, que fica logo ali ao lado, sendo colocado à baixo, tijolo por tijolo, ofereceram um ar de nostalgia à visita. Porto Alegre sempre me faz bem, especialmente quando para comemorar conquistas como o aniversário da minha sobrinha Vitória.

 

Quando o avião partiu, fui obrigado a desligar o celular e fiquei com a imagem da Arena na janela. Dali pra frente, tudo ficaria por conta do Grêmio e sua capacidade de suportar a pressão adversária que, inevitavelmente, ocorreria. Somente conseguiria manter contato com o time e saber de seu desempenho quando tudo estivesse decidido. Sem nenhuma condição de secar as investidas contra nossa defesa e menos ainda de torcer por um placar mais tranquilo. Naquela altura, em meio as nuvens, meu desejo é que nada mais acontecesse em campo e de lá saíssemos com os três pontos.

 

O avião acabara de taxiar na chegada a São Paulo quando voltei a ligar o celular e descobri que muitas coisas aconteceram depois daquele gol. E, felizmente, a nosso favor. Mesmo com o empate na cobrança de falta, conseguimos retomar a vitória com uma bola lançada dentro da área e o desvio de cabeça de Rhodolfo. Mais do que isso, se é que fosse necessário, enfrentamos um jogo disputadíssimo e de alto nível. E fomos fortes o suficiente para vencer.

 

O resultado desse domingo contrastou com o do fim de semana anterior. E nos aproximou do que havíamos feito duas rodadas antes. Os altos e baixos na competição se explicam pelo rejuvenescimento do elenco e o amadurecimento do time sob nova direção. Ao contrário do que disseram e li, o Grêmio está sim, na disputa!

 

A foto que ilustra este post é reprodução feita da tela do meu celular

Conte Sua História de SP: o passeio de mãos dadas com o meu pai até o Cambuci

 


Por Roberto Furtner Caldeira

 

 

A brisa suave anunciava a chegada do outono na cidade, varrendo ladeira abaixo as folhas das árvores prestes a adormecer. O toc-toc dos sapatos apressados atravessando a rua de paralelepípedos era o prenúncio de mais um entardecer.

 

Seria mais um final de dia normal naquela cidade que via seu sonho de virar metrópole se aproximar a passos largos. Mas não para mim. Então aos 6 anos de idade, as terças feiras eram especiais. O dia da semana em que voltava a pé com meu pai do centro da cidade até nossa casa no bairro do Cambuci.

 

Como fazia toda semana, ao final do expediente meu pai me apanhava na escola. Ele gostava de caminhar, hábito adquirido nos tempos em que tudo em São Paulo ficava à distância de uma caminhada, se muito uma viagem de bonde.
Segurando firme sua mão, olhando o mundo de baixo para cima, eu sentia um misto de temor e excitação. Aquela caminhada de quarenta minutos era repleta de estímulos, de aventuras.

 

De um lado o ronco dos carros nacionais em meio aos antigos e bojudos carros americanos que ainda circulavam, brilhantes, imponentes. De outro lado o bonde alaranjado, com aposentadoria já anunciada, apinhado de pessoas em busca de um lugar em seus assentos de madeira gasta. Suas rodas emitindo um guincho estridente em função do atrito contra os trilhos de metal.

 

A medida em que nos afastávamos da praça da Sé em direção à Baixada do Glicério, os prédios mais altos ficavam para trás e surgiam restaurantes, bares e luminosos de neon. Uma profusão de cheiros, sons, vozes e risadas.
Me divertia especialmente na frente dos bares que naquela época jogavam as tampinhas de garrafa na calçada. Tampinhas de refrigerante, de cerveja e de pinga. Até ensaiei uma coleção, consumida meses depois pela corrosão do metal das tampinhas.

 

Como sempre, em meio a nossa animada conversa, parávamos no meio do caminho para comer pastel. O meu sempre de queijo, o de meu pai sempre de carne.

 

Após o lanche retomávamos nossa caminhada, cruzando pela baixada do Glicério, até chegarmos à outrora famosa rua do Lava Pés, conhecida pelo riacho e por ser a última parada dos viajantes para beber água e se refrescar antes de subir para o centro da cidade, nos tempos do império.

 

A caminhada então alcançava sua reta final ao cruzarmos o largo do Cambuci, já próximos de casa. Nasci e cresci no Cambuci. Embora nunca tivesse visto de perto uma árvore da espécie, cedo soube que o nome do bairro era homenagem a uma fruta outrora abundante na região.

 

Já no último quarteirão passávamos pelo açougue do seu Jairo, padaria do seu Milton, sapataria do seu Manuel e barbearia do Antônio. Naquela pequena comunidade todos nos conheciam pelo nome e acenavam ao nos verem passar.
Antes de entrarmos em casa meu pai refazia o ritual diário: colocar uma garrafa de vidro destinada ao leite, dentro da caixa de metal ao lado do portão, para que o padeiro pudesse trocar por uma garrafa cheia quando trouxesse o pão na madrugada seguinte. Leite que seria devidamente fervido para o café da manhã.

 

Ouvíamos o som dos cascos do cavalo trotando rua abaixo, puxando a carroça do catador de sucata. A brisa continuava, de tempos em tempos. O céu, mais escuro naquela época, mostrava um negrume salpicado de estrelas por todos os lados. Pedia para meu pai me apontar o cruzeiro do sul antes de entrarmos em casa onde minha mãe nos aguardava.

 

Como um herói que voltava da guerra cheio de estórias para contar, eu entrava em casa de peito estufado, dono do mundo, contando as novidades. Minha mãe ouvia tudo com atenção e o devido ar de surpresa. O único ponto de discórdia: ela achava que pastel não era um bom jantar para uma criança.

 

O tempo passou, eu me tornei adulto, a cidade se multiplicou.

 

Hoje já não consigo chegar aos lugares com uma caminhada apenas. O bonde se foi há tempos. Não mais consigo ver as estrelas com a mesma clareza, quanto mais apontar o cruzeiro do sul para meus filhos. Só quando viajamos para fora da cidade.

 

Tampinhas de garrafa de metal quase não existem mais. Não sabemos mais o nome dos vizinhos direito. Leite entregue em casa é coisa do passado. Açougue virou seção de supermercado.

 

Aquela cidade de indivíduos cedeu lugar a uma cidade de instituições. Para o bem, e para o mal.

 

Porém ainda caminho com meu pai, pela rua arborizada que ele escolheu para viver sua aposentadoria. Já aos 80 anos, hoje é a sua mão que busca apoio em meu braço. Aquela mesma mão que me guiou pela São Paulo de outros tempos.

 

Conversamos sobre causos da vida, enquanto a brisa suave anuncia a chegada de outro outono na cidade, varrendo ladeira abaixo as folhas das árvores prestes a adormecer.

 

De aniversário de casamento

 

Por Maria Lucia Solla

 

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Hoje, 25 de janeiro de 2015, meus pais, Oswaldo Rocco Solla e Clélia Calò Solla, comemoram setenta anos de casamento, onde quer que estejam, já que se foram deste planeta sem comunicar seus destinos.

 

Como todos os que se vão daqui, imagino que nasçam em novo lugar, para nova vida, em dimensão e vibração muito diferentes das nossas. Mas quem é que sabe…

 

A gente não sabe o porquê nem para que veio, e vive na ignorância do que virá. Mas vive. O propósito é esse, e pronto. Dia a dia, dor a dor, riso a riso.

 

Me afasto do assunto.

 

Meus avós paternos, Pedro Rojo Sola, espanhol, e Deolinda D’ Assumpção Marcello, portuguesa, criaram a metade homem, muitíssimo bem assessorados pela Bisa Maria da Luz; e meus avós maternos, Vito Calò e Grazia Giannuzzi Calò, ambos italianos, a metade mulher.

 

Oswaldo – e dois irmãos – nasceu e cresceu pobre, numa família ‘esquentada’. Estudou pouco na formalidade das escolas, mas atingiu o doutorado na vida. Trabalhou quase sessenta anos na mesma empresa, desde os quatorze anos. Começou cedo, e atesto que isso não fez mal a ele. Ao contrário, ajudou a forjar sua auto-estima e o seu caráter. Recebeu muitos prêmios, construiu sua casa, comprou seus carros e, principalmente, assegurou-se de que seus filhos não cresceriam sem o melhor estudo e o melhor código de honra que ele pudesse oferecer. Agora, o que fez de melhor foi proteger a Clélia. Contra tudo e contra todos, fazia tudo por ela. Ela era a Rainha do Lar – dirigida pelo Rei, é óbvio! Bibelô… mas tudo tem seu preço.

 

Clélia – e dez irmãos – vivia bem nesta nova e promissora terra brasileira, até completar nove anos. Nove! Foi então que o vovô Vito resolveu nascer, ele também, para uma nova vida, deixando a família que protegia, alimentava e acarinhava – todos dizem que ele era carinho puro -, nas mãos de D’eus.

 

Imagina a situação da vovó Grazia? Vivia as vinte e quatro horas do dia cuidando da casa e da família e de repente se viu sozinha e responsável pelo sustento da casa. Doze bocas para alimentar, doze de tudo! Nem quero nem pensar.

 

Pois ela pensou, e bem rapidamente: foi trabalhar numa fábrica de charutos e deu conta do recado, muito bem.
Por que eu conto tudo isso? Porque que me orgulho da minha família. Me orgulho de ser um pedacinho dela. Fruto dela. Dos seus erros e dos seus acertos, das suas brigas e da sua paz. O seu não-estar estando para sempre.

 

Obrigada, mamãe, obrigada papai, pela minha vida.

 

Maria Lucia Solla é professora de idiomas, terapeuta, e realiza oficinas de Desenvolvimento do Pensamento Criativo e de Arte e Criação. É colaboradora do Blog do Mílton Jung

Conte Sua História de SP: a bicicleta do meu pai

 

No Conte Sua História de São Paulo, o texto de ouvinte-internauta Ademir Silva:

 

 

Nestes tempos em que se fala em mobilidade quero contribuir com a história (verídica) que vivi. No ano de 1958, nos mudamos do Tatuapé para a Vila Carrão, porém eu continuava estuando no Educandário Espírito Santo – colégio de freiras no Tatuapé, zona leste. Meu pai, Antonio Pinheiro da Silva, me levava ao colégio de bicicleta e depois seguia para o trabalho, pois ele era mestre de obra.

 

Lembro-me que durante mais ou menos oito meses, ele seguia do Tatuapé até o largo de Pinheiros de bicicleta, pois para custear meus estudos e sustento isso se fazia necessário. Ele sempre comentava que a maior dificuldade era a subida da rua da Consolação.

 

Nunca escutei qualquer reclamação por parte dele, e olhe que não existiam as grandes avenidas tais como Radial Leste e 23 de Maio. Nem mesmo as tais ciclovias.

 


Ademir Silva é personagem do Conte Sua História de São Paulo. A sonorização é do Cláudio Antonio. Participe com as suas histórias da cidade de São Paulo enviando seu texto para milton@cbn.com.br ou agende entrevista no Museu da Pessoa pelo e-mail contesuahistoria@museudapessoa.net.

Conte Sua História de SP: os valores de meu pai

 


Por Luciano Ribeiro
Ouvinte-internauta da Rádio CBN

 

 

Em 1986, éramos sócios do Clube Juventus, no Bairro da Mooca, zona leste, mas morávamos no Cangaíba, distrito da Penha, bem longe dali. Eu, no auge dos meus 14 anos, me sentia muito orgulhoso em poder ir desde a minha casa até ao clube sozinho. Pegava um ônibus na Avenida Cangaíba, descia na Penha, embarcava no Vila Limoeiro, próximo ao Cemitério. Ali seguia em uma longa viagem de quase hora e meia até descer na portaria do clube, e aproveitar o dia quente de férias nas piscinas.

 

Certo dia, ao sair do Clube, deparei-me com a seguinte situação: tinha uma nota de Cz$ 5.000,00 (na época a moeda era o cruzado) e o valor da passagem era de Cz$ 120,00. No ônibus havia uma placa que dizia: troco máximo Cz$ 1.000,00 (posso estar equivocado com os valores exatos). Bem, fui até uma Padaria na redondeza e comprei um “Freshen up”, um chiclete que tinha um recheio líquido refrescante. Cz$ 180,00. Ao fazer o troco, a mocinha do caixa cometeu um equívoco, em vez do troco de Cr$ 4.820,00, ela me entregou Cz$ 5.320,00, e pior, a minha nota de Cz$ 5.000,00 veio junto embaixo de todas. Mais que depressa dobrei aquela pequena fortuna, a coloquei no bolso e segui para minha casa.

 

No ônibus, fazia planos … estava praticamente rico, quantas fichas de fliperama eu iria comprar. Ah! Aquele tênis que eu pedi para a minha mãe, se eu quiser comprar vou poder também! Nossa! Eu estava extasiado. O fim de semana estava garantido: shopping, cinema, sanduíche naquela famosa lanchonete do M amarelo… Uau!! Ao chegar em casa, cometi o “pior erro da minha vida” (ao menos eu enxerguei assim por alguns bons anos). Coloquei a mão no bolso, saquei aquele monte de dinheiro e mostrei, orgulhosamente, ao meu pai: – “Pai, olha o que eu consegui. Estou rico!”. Meu pai, com o semblante sempre sereno fechou a cara, e um pesar imenso tomou conta do rosto dele. O tom grave da voz dizia tudo: – “Onde você conseguiu este dinheiro?”. Expliquei, já não tão orgulho assim, a minha epopeia. Meu braço franzino sentiu a enorme pressão das mãos dele me levando até o carro. Já começava a anoitecer, deviam ser próximo das 7 da noite, estava calor, e nosso carro não tinha ar condicionado. Levamos cerca de uma hora e meia até chegar a padaria. Meu Pai fazia o costumeiro sermão (ele costumava gastar horas em uma conversa, que era pior que vinte surras). Durante todo o caminho, eu o ouvi dizer sobre o que era pegar uma coisa que não era minha, que ele nunca tinha me ensinado que isto era motivo de glória, que… ahhh… Porque eu não fiquei quieto??? Por que tive que mostrar a ele? Como fui burro…

 

Ao chegar a padaria encontramos um Sr. Grande, de cabelos brancos (ele era bem maior que meu pai). O homem apontava e falava alto para a moça, com olhos vermelhos de tanto chorar… Ela tinha uma barriga enorme, estava grávida… Meu pai interrompeu a conversa e ainda com aquela pressão no meu braço, disse que eu tinha algo para dizer… Entreguei a nota de Cz$ 5.000,00, e a de Cz$ 500,00. Com a voz embargada, pedi desculpas, e meu Pai emendou: – “O pior, é que ele percebeu o engano, pegou o dinheiro, e foi embora. Eu não ensinei isto a ele. Por isso está aqui, devolvendo.” A moça não agradeceu, não olhou na minha cara. O homem grande, agradeceu ao meu Pai, e lhe apertou a mão, que então lhe pediu que não punisse a funcionário pelo engano.

 

Demorou algum tempo para eu compreender perfeitamente aquilo tudo, e hoje devo meu caráter à forma como fui criado e educado por minha família. Com uma filha de sete anos, entendo de forma tão clara qual o legado desta, e de várias outras situações, em que meu pai me passou ao longo da minha infância e adolescência.

 

Valores… Não cabem nos bolsos.

 

Luciano Ribeiro (e o pai dele) foram personagens do Conte Sua História de São Paulo. A sonorização é do Cláudio Antonio. Você pode contar outros capítulos da nossa cidade aqui na CBN: envie seu texto para milton@cbn.com.br. Ou agende entrevista no Museu da Pessoa pelo e-mail contesuahistoria@museudapessoa.net. Você vai lá, grava o depoimento e ainda ganha um DVD com suas memórias registradas. Se quiser outras histórias de São Paulo visite o meu blog, o Blog do Mílton Jung