Dalva Rodrigues
Ouvinte da CBN
Minha infância foi na Vila Liviero, divisa com São Bernardo. Nossa casa humilde, o quintal, a rua, seus moradores, comércio, quermesse, o circo e o parquinho de diversão. Da janela da frente de minha casa avistava o terreno que diziam ser da Ford. Mas acho que só uma parte era da montadora, onde havia o pátio de automóveis. O restante era uma enorme área verde. Era o que chamávamos de “Pastão da Ford” — um paraíso para brincar, empinar pipa … onde cavalos e bois pastavam, havia um ou outro casebre, algumas hortas, árvores, cercas de madeira e arame farpado querendo impor limite aos invasores.
Acordava cedinho com o apito das dezenas de fábricas nos arredores. Abria a janela e olhava a névoa que cobria o Pastão se dissipando aos poucos com a chegada da luz matutina, parecia cenário de filme. Quando o capim gordura estava alto, a tela que via da janela era outra: quase tudo se tingia de rosa avermelhado. Quando o capim estava baixo, virava parque de diversão.
Lembro quando com alguns amigos atravessamos a pinguela do córrego, estreita e perigosa. Mais de um quilômetro de caminhada. Fomos fazer um piquenique por lá. Toalha estendida embaixo da árvore mais frondosa, comida, brincadeiras, risadas. A infância se derramava alegremente. Depois o descanso. Deitada no chão observava a vida agitada dos insetos que zanzavam ao redor. Ao longe avistava minha rua, a janela pequenininha de onde olhava o pasto logo cedo. Foi quando o tempo fechou, as nuvens escureceram e raios e trovões anunciaram a tempestade de verão. Sem consciência do perigo ficamos embaixo da árvore gigante até a chuva passar. Fomos protegidos pela nossa inocência. Sorte de criança.
Os apitos das fábricas agora são raros. O nosso Pastão foi tomado por hipermercado, condomínios, muros altos que separam as casas do córrego mal cheiroso. Mesmo assim ainda hoje olho o Pastão de minha janelinha, a partir das memórias que não se apagaram totalmente.
O capim gordura no “meu pastão” é lindo de olhar.
Dalva Rodrigues é personagem do Conte Sua História de São Paulo. A sonorização é do Cláudio Antonio. Escreva suas lembranças e envie para contesuahistoria@cbn.com.br
Uma linda narrativa
Enviado do meu iPhone
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Que alegria estar mais uma vez participando do quadro, ficou linda a narrativa e a sonorização genial do Claudio Antonio!
São Paulo nos dá lembranças que o tempo não apaga! (pelo menos se o Alzheimer não nos pegar rs)
Obrigada!