Avalanche Tricolor: o acidente e a intenção

Santos 1×1 Grêmio
Brasileiro – Vila Belmiro, Santos/SP

Edenílson fez o gol do Grêmio. Foto: Lucas Uebel/GrêmioFBPA

O que é, afinal, acidental?
No dicionário, acidente é aquilo que acontece por acaso, sem intenção. No futebol, porém, o acaso é muitas vezes interpretado pela ótica da conveniência.

O Grêmio saiu na frente com Edenilson e resistiu até os 44 minutos do segundo tempo a um bombardeio que parecia não ter fim. Gabriel Grando não contou com o acaso: foram mãos firmes, pés atentos, reflexos treinados para enfrentar as intempéries de um jogo assim. Quando não era ele, surgiam a trave, o travessão ou a linha de cal, todos cúmplices da resistência gremista. No fim, a bola entrou — acidental ou não, inevitável.

No primeiro tempo, porém, o “acidental” virou sentença contra nós. Alysson marcou um golaço daqueles que mudam o rumo de uma partida. O árbitro, no entanto, enxergou irregularidade no toque de mão de Edenilson segundos antes. Especialistas em arbitragem foram claros: a bola bateu de forma acidental, sem qualquer intenção de vantagem. A regra é simples — se não houve intenção, não há falta. Mas no futebol, o que está escrito nem sempre vale tanto quanto o que é interpretado.

O empate na Vila deixa a pergunta suspensa no ar: quantas vezes, dentro e fora de campo, transformamos o acidental em culpa, e a intenção em desculpa? Talvez o futebol sirva de metáfora para a vida. Há quem use a palavra “acidente” como fuga, há quem a use como condenação. O Grêmio, mais uma vez, conheceu o peso dessa escolha.

Avalanche Tricolor: vamos comemorar!

Grêmio 1×0 Santos
Brasileiro – Arena do Grêmio, Porto Alegre (RS)

Foto: Lucas Uebel/Grêmio FBPA

Uma vitória. É o que temos a comemorar. Independentemente do futebol apresentado, das dificuldades na articulação, da sofrência no ataque e da desconfiança na defesa — vencemos. Foi com um único gol, contra um adversário também em crise, mas foi uma vitória. E era disso que mais precisávamos nesta retomada do trabalho de Mano Menezes e Felipão.

Posso estar sendo comedido (ou ranzinza?) ao dizer que a vitória é o único grande motivo para comemoração neste domingo na Arena. Mas há, sim, outro: a qualidade técnica de Cristian Olivera. O atacante uruguaio, que fez o caminho inverso ao de Luis Suárez — trocou o futebol norte-americano pelo Grêmio — tem sido, desde sua estreia, a melhor contratação da temporada. Incisivo no ataque, dono de bom drible e velocidade, ele ainda recompõe a marcação, algo essencial diante da fragilidade defensiva que ainda carregamos.

Foi dele o gol da vitória, ao aproveitar a sobra de uma jogada iniciada pela direita e construída por outra boa notícia deste elenco: Alyson – ops, não é que encontrei mais uma razão para comemorar?!? Com apenas 19 anos, o atacante tem sido aproveitado nos segundos tempos e, na maioria das vezes, deixa sua marca com algum bom lance ou finalização. Hoje, roubou a bola do adversário, escapou pela linha de fundo e cruzou para a área, originando o lance decisivo.

Pode parecer pouco para quem ainda nutre pretensões de título em uma das três competições que disputamos (Brasileiro, Copa do Brasil e Sul-Americana). E é mesmo. Mas você, caro — e cada vez mais raro — leitor desta Avalanche, há de concordar comigo: diante da escassez de boas novas, vencer uma partida e sair daquela zona-que-você-sabe-qual-é já são razões mais do que suficientes para comemorar.

O resultado deste domingo dá um respiro ao elenco e à dupla Mano-Felipão, que poderão pensar nos próximos adversários com um pouco mais de tranquilidade — a começar pelo desafio da Sul-Americana no meio da semana. Há muito a ser ajustado: o posicionamento dos defensores na marcação por zona, a movimentação e a troca de passes no meio-campo, a chegada mais precisa no ataque.

Mas, só por hoje, vamos comemorar!

Avalanche Tricolor: um recado ao grupo de WhatsApp

Santos 2×1 Grêmio

Brasileiro – Vila Belmiro, Santos/SP

Foto de Lucas Uebal GrêmioFBPA

Quem me conhece bem sabe que quase não abro espaço a grupos de WhastApp em meu celular. É estratégia para preservar a sanidade. Uma forma de silenciar o barulho das redes sociais e ser menos impactado pelo contágio emocional que a vida em bando provoca. Quando uma pessoa expressa uma emoção forte como medo, empolgação ou raiva tende a insuflar esse mesmo estado psicológico em seus pares. Pessoas aparentemente tranquilas podem ter reações extemporâneas e radicais se envolvidas por um coletivo que reforça suas convicções e pensamentos. É em parte o que acontece em um estádio de futebol no instante em que cidadãos pacíficos fazem coro aos torcedores que ofendem o árbitro, o adversário ou o jogador que pisa na bola (ou esquece que ela está em jogo).

Mesmo que não acredite em grupos de WhastApp que eles existem, existem. Poucos, mas estão lá no meu celular e se movimentam ativamente conforme a situação. Hoje, minha tela não parava de piscar com as notificações de um desses grupos — claro, aquele formado por gremistas –, especialmente após os 17 minutos do segundo tempo quando se iniciou a “contra virada” (será que posso chamar assim quando meu time sai na frente e entrega o jogo depois?). Aos 44 do segundo tempo, após a pataquada dos nossos jogadores, o que era pisca-pisca virou luz estroboscópica. A prudência me fez virar o celular com a tela para baixo e me calar diante do que haveria de acontecer ao fim desta primeira rodada do returno do campeonato.

Preferi deixar que a turma do WhatsApp expressasse no silêncio do meu celular sua indignação perante a iminência da derrota que nos afastaria do líder e nos deixaria momentaneamente fora do G4 — grupo que almejamos ocupar para garantir vaga direta na Libertadores e ganhar um respiro no início da próxima temporada com uma preparação mais longa para a competição sul-americana. Não queria ser influenciado pelas opiniões catastróficas e as teorias de conspiração que costumam florescer nesses momentos de forte emoção. A bronca, a opinião exarcebada e a frase sangrada pela raiva se justificam por humanos que somos. Tanto quanto mais apaixonado, mais sensível se torna o nosso coração. Não pense que sou santo — ops, melhor não usar hoje esse adjetivo. Não pense que sou calmo mediante os acontecimentos do futebol. Assim como qualquer torcedor, alterno o vibrar e o esbravejar conforme o lance. Reclamo do árbitro nas marcações contra o meu time — mesmo que tenha de me redimir ao conferir o acerto dele no replay. 

Minha estratégia, porém, é clara. Jamais permitir que o movimento de bando me impulsione a dizer o que a razão não concorda. Da mesma forma que não faço cálculos antecipados que “provam” que seremos campeões após uma vitória incrível sobre um adversário de peso, me nego a ter previsões trágicas por causa de uma derrota impossível de admitir como a deste domingo. Mesmo porque, nesta altura do campeonato, o destino de cada time ainda não está traçado. Alguns até flertam desde o início com o rebaixamento e outros estão se aproximando cada vez mais desta faixa — sem nenhuma provocação, tá!?! Assim como há os que miram o topo da tabela e têm feito por merecer o lugar lá no alto. 

O Grêmio, que voltou a ter revés contra times da parte de baixo da competição, ainda tem muito a fazer para que possamos dizer com certeza qual será nosso lugar neste campeonato. Aquele elenco que nos colocou na vice-liderança foi reforçado para o returno com as novas contratações e a recuperação de lesionados. Acertá-lo e fazê-lo jogar de maneira coordenada mesmo quando há necessidade de substituições ao longo da partida é responsabilidade do comando técnico. Teremos mais tempo para fazer esse arranjo a medida que estamos agora dedicados ao Brasileiro, por força da desclassificação da Copa do Brasil, no meio da semana passada.

Quanto a você que por ventura esteja  gritando “Fora Renato” ou “desse jeito nem Libertadores” ou “o campeonato acabou para nós” ou “tem que botar todos estes que aí estão no banco” —- juro que não li meu grupo depois que a bola parou —, tenho certeza que vestirá a camisa tricolor no próximo domingo, vai correr para frente da televisão, ligar o rádio ou ocupar uma cadeira na Arena, e ressuscitará sua esperança logo que a bola começar a rolar, devolvendo ao nosso grupo de WhatsApp aquele clima saudável e de confiança que nos entusiasma a entrar logo cedo e desejar: “Bom dia, gremistada!”

Avalanche Tricolor: Grêmio completa 700 vitórias diante de uma torcida que faz a diferença!

João Pedro comemora o gol da vitória, em foto de Lucas Uebel/GrêmioFBPA

Grêmio 1×0 Santos

Brasileiro – Alfredo Jaconi, Caxias/RS

“Muito feliz com o desempenho da torcida” — disse Nathan, naquela entrevista feita logo após o apito final do árbitro, ainda no calor da partida. Costuma ser a mais difícil de todas e injustamente cobrada de jogadores que nem sempre têm habilidade com as palavras. O batimento cardíaco está em alta, mal deu tempo de respirar fundo para pensar no que acabou de acontecer e o repórter dispara uma pergunta que, convenhamos, tende a ser mais longa do que deveria, considerando que tudo que ele gostaria de saber é “o que você achou do jogo?”.

O recém-chegado meio campista do Grêmio respondeu no microfone da televisão com a mesma sensibilidade e talento que havia apresentado em campo desde que entrou aos 26 do segundo tempo em lugar de Cristaldo.  Foram dele três dos principais e raros lances de ataque na etapa final —dois em que foi o protagonista do chute a gol e um terceiro, já nos acréscimo, quando desarmou o adversário e entregou a bola limpa para Suárez concluir.

Ao exaltar o torcedor, que havia tomado quase todas as dependências do Alfredo Jaconi, em Caxias, e vibrou mesmo diante da pressão maior do adversário, Nathan fez justiça aos gremistas que, já no ano passado, entenderam sua importância para o clube e tomaram para si a responsabilidade de nos levar de volta à Série A. Ascensão  conquistada e o orgulho recuperado, nesta temporada de 2023, os torcedores souberam dar a resposta ao esforço da diretoria que montou um elenco qualificado e, principalmente, contratou um dos maiores goleadores do mundo, Luis Suárez. 

Cada jogo é uma nova festa. Da Recopa Gaúcha a Copa do Brasil, do campeonato Gaúcho ao Brasileiro, tomamos as arquibancadas e aumentamos exponencialmente o número de sócios. Estamos com o Grêmio onde o Grêmio estiver. A despeito de algumas recaídas, com vaias pontuais a determinados jogadores, canta e embala a equipe, faz nosso time se desdobrar em busca da vitória, e a resistir quando necessário. No fim deste domingo, foi fundamental para dar força a equipe que estava tendo dificuldades para dominar a bola, especialmente no segundo tempo. E reconheceu quem se doou em busca do resultado, como fez com Kannemann que teve seu nome gritado enquanto estava caído e extasiado no gramado.

De minha parte, queria chamar atenção para a boa atuação dos três laterais que vestiram nossa camisa. Na direita, João Pedro que fez o gol da vitória, batendo de fora da área com pé trocado e tendo seus últimos desempenhos premiados neste momento importante da vida, às vésperas do primeiro bebê nascer. Thomas Luciano, de apenas 21 anos, que substituiu o autor do gol no intervalo, tomou para si a responsabilidade de combater o principal atacante adversário e cumpriu com precisão seu papel, além de ter sido o responsável por provocar a expulsão dele. E, finalmente, Diogo Barbosa, que se faz melhor nas últimas partidas e hoje foi essencial na movimentação de ataque pelo lado esquerdo.

O futebol jogado pelo Grêmio ficou aquém da expectativa mas havia na partida de hoje algo muito mais importante a se comemorar: a volta à Série A. Volta que se deu com uma vitória histórica porque é a de número 700 desde que as competições nacionais foram unificadas, em 1959 — estatística registrada logo após ao jogo pelo canal História Grêmio, no YouTube.

Avalanche Tricolor: chora, Brenno!

Santos 1×0 Grêmio

Brasileiro – Vila Belmiro, Santos/SP

Imagem reproduzida da SportTV

“Choro quando estou triste,

Lágrimas que queimam, mas que aliviam”

Brenno foi gigante enquanto pode. Defendeu as bolas quase impossíveis.  Uma a meia distância, com força e velocidade —- daquelas que o atacante comemora antes de ver a rede estufar. Outra no ângulo, em cobrança de falta perfeita que se fez imperfeita diante da perfeição de sua defesa. Despachou o perigo toda vez que este rondou nossa goleira. Sofreu no corpo o tranco adversário. Despencou das alturas e sentiu nos braços o choque violento com o gramado. 

Houve ao menos dois momentos em que parecia batido: foi quando sua áurea se estendeu além do corpo para impedir que a bola entrasse na cidadela — a fez desviar no poste ou impulsou seu zagueiro a tirar de cabeça. De tanto se fazer grande, Brenno transferiu aos atacantes o peso da responsabilidade de terem de ser maiores do que eles próprios eram capazes. Os fez pensar duas, três vezes antes de arriscarem o chute.

Apesar de fazer de tudo, Brenno não pode tudo. Por isso foi às lágrimas ao fim de tudo. Lágrimas de tristeza. De frustração. De indignação. Da injustiça de se ver batido na imprevisibilidade de uma bola desviada do seu rumo. 

Foi ao assistir às lágrimas de nosso jovem goleiro, que me veio a mente trecho de poesia que havia lido, nesta semana, quase por acaso, como foi o gol adversário. Por contraditório que seja, estava em busca de autores que definissem o poder das lágrimas provocadas por uma alegria. Encontrei Regiane Folter, outra jovem talentosa em sua arte da escrita, autora paulistana temporariamente erradicada no Uruguai —- ali onde se chega cruzando pelo Rio Grande do Sul. Na poesia de Regiane, agora, encontrei consolo para quem como Brenno — e eu — choramos diante da frustração:

“Choro quando estou frustrada,

Quando as coisas não saem e tudo parece perdido.

Cada gota que escapa leva um pouco de estresse acumulado,

E deixa espaço pro descanso tão necessário antes de recomeçar.”

Chora, Brenno! Amanhã tudo recomeça e vamos precisar de você gigante mais uma vez.

Leia a poesia “Choro para ser” de Regiane Folter

Avalanche Tricolor: vai passar!

Grêmio 2×2 Santos

Brasileiro — Arena Grêmio, Porto Alegre RS

foto de Lucas Uebel/Grêmio FBPA

O gol de calcanhar há 50 anos, já contei.

O título que narrei há 20 anos, contei também.

Quem sabe o dia que assisti a Pelé jogar? 

Não, já falei.

Deixe-me pensar mais um pouquinho … 

Já sei, aquele jogo que chorei pela derrota acachapante.

Melhor não falar em derrota, né! 

É, caro e cada vez mais raro leitor desta Avalanche, está difícil de encontrar boas histórias para contar em lugar de me despedaçar em lamentos pelos maus resultados no Campeonato Brasileiro —- não que tenha sido um  jogo mal jogado, especialmente diante das últimas fracas apresentações, mas, novamente, fomos incapazes de vencer uma partida.

O ponto ganho foi ponto amargo. Só o ‘conquistamos’ porque perdemos os outros dois que a vitória nos oferecia, mas que entregamos em duas oportunidades — uma em uma bola mal dividida no meio de campo e outra em uma bola em que sequer tentou-se dividir. Resultado que nos mantém mais uma rodada naquela-posição-que-você-sabe-qual-é (melhor não citar aqui para não dar mais azar).

Um amigo de redação para me consolar, logo cedo, comentou: calma, Milton, é só o começo do campeonato. É exatamente isso que me preocupa. Ainda temos todo um Brasileiro pela frente.

Mais amargo do que isso só acordar de madrugada para trabalhar e descobrir que a máquina de café estava quebrada. Mas esta é outra história e hoje não estou com disposição de contar histórias nesta Avalanche. 

Vai passar!

Avalanche Tricolor: entre saudades e injustiças, mais um empate

Grêmio 3×3 Santos

Brasileiro —-Arena Grêmio

Pepê volta a marcar, em foto de Lucas Uebel/GrêmioFBPA

Diego Souza marcou seu gol. O Grêmio tomou os seus. Tantos quantos eram suficientes para alcançar o décimo-sétimo empate no Campeonato Brasileiro e a sétima partida sem vitória. De tantos jogos empatados, podemos até separá-los por categorias: o merecido, o conquistado, o enjoado , o irritante …. o de hoje está na categoria do injustiçado.

Pela primeira vez neste ano vi a bola ser tocada de pé em pé desde o primeiro minuto de jogo. Bola que era passada na mesma velocidade com que nossos jogadores se deslocavam para recebê-la.

Foi assim no primeiro minuto de partida quando desperdiçamos o primeiro lance de gol. Foi assim especialmente no início do segundo tempo quando ampliamos o placar com mais dois gols de videogame. É como a gurizada se refere a esses lances em que a precisão do passe e do movimento é tal que só pode ter sido projetada em computador. Ledo engano. Lances assim são frutos da genialidade, só possível se protagonizados por seres humanos, craques humanos.

Que saudade que eu estava de assistir ao Grêmio jogando bonito. De Jean Pyerre passando no espaço infinito. De Pepê aproveitando-se da velocidade para surpreender o adversário. De Diego Souza concluindo a gol —- ops, sejamos justos com nosso goleador, ele tem entregue o que prometeu e chegou hoje a marca de 12 gols no Brasileiro e 27 na temporada. É a mais grata surpresa de 2020, um ano que ainda não acabou.

Fazia tempo que o Grêmio não jogava bem. E, por isso, o empate desta quarta-feira à tarde já mereceria seu registro na categoria dos injustos. Infelizmente, outros elementos surgiram para que essa sensação se expressasse em indignação. A marcação de dois pênaltis —- um em que Matheus Henrique foi forçado por trás e o outro em que a regra do pênalti foi esquecida pelo árbitro e seus amigos do VAR (copio a seguir o texto para quem tiver dúvidas) — e a falta de avaliação no lance do primeiro gol do adversário foram revoltantes, no factual e no contexto.

Sim, no jogo determinaram o resultado e no campeonato se somaram a uma série de decisões sem critério que tiveram seu ápice naquela partida que perdemos para você-sabe-quem, após um pênalti não sinalizado contra nós e outro, polêmico, marcado para eles. Uma sequência de erros e incoerências que não será suficiente para encobrir a queda de rendimento de um time acostumado a lutar pela vitória e pelos primeiros lugares em todas as competições das quais participa. Digo isso para você — caro e raro leitor —- não pensar que sou incapaz de observar nossas fraquezas nesta temporada. 

Tenho saudades daquele tempo —- não muito distante —- em que éramos suficientes para driblar o adversário e a incompetência da arbitragem, e conquistarmos os títulos almejados. Hoje, sequer conseguimos superar nossos próprios problemas. Que essa saudade se desfaça quando março e a decisão da Copa do Brasil chegarem.

Avalanche Tricolor: uma carta ao Greg

Santos 4×1 Grêmio

Libertadores — Vila Belmiro, Santos/SP

Thaciano comemora o único gol do Grêmio, em foto de Lucas Uebel/Grêmio FBPA

 

Greg,

Há três anos, nesta mesma data, estávamos juntos a caminho do Zayed Sports City, em Abu Dhabi. Em algumas horas, disputaríamos a final do Mundial de Clubes contra o Real Madrid. Em um momento daquela caminhada, diminuí o passo e você e o Lô seguiram firme em direção ao estádio. Ver os dois vestindo a camisa tricolor com o nome do vovô às costas, em uma homenagem àquele que nos colocou nesta jornada mas que já não tinha mais condições de estar ao nosso lado naquela aventura, foi uma das mais belas imagens que o Grêmio me proporcionou em todos esses anos em que sou um fanático torcedor.

Você e o mano, lado a lado, felizes pela oportunidade que nos foi proporcionada de disputar uma final de Mundial —- mesmo admitindo a superioridade do rico futebol europeu —-, foram o meu troféu. Qualquer que fosse o resultado daquele partida, eu já me sentia vitorioso e recompensado por todos os tempos de sofrimento que enfrentei na minha infância e adolescência. Imagine que só soube o que era ser campeão, quando já estava com 14 anos, e o título que conquistei naqueles tempos era um Estadual — igual a esse que ganhamos em 2020. A primeira taça nacional só venho quando estava com 18 anos. E as duas primeiras internacionais, aos 20 anos.

Nesta noite de quarta-feira, em que desperdiçamos a oportunidade de estar em outra semifinal da Libertadores, mais do que para o jogo, perdido nos primeiro segundos, olhei para você ao meu lado, no sofá e diante da televisão. Pode parecer estranho o que vou dizer. Ver sua reação, seu incômodo frente a malemolência da nossa marcação, esbravejando pela bola perdida, maldizendo o jogador que errou o passe, o chute, o escanteio, o cabeceio, o bote … tudo isso me fez sentir uma ponta de alegria. Orgulho. Não pelo time. Por você.

Hoje, você, Greg, me fez reviver o Miltinho das arquibancadas de cimento que seguia para o Olímpico de mãos dadas com o pai — o vovô. Que mesmo ciente do tamanho e da impossibilidade de vencer o desafio que se avizinhava, caminhava com convicção para o campo. Que vibrava a cada lance, apesar dos pesares. Que ficava a espera do milagre, mesmo sabendo que o que precisava era de um futebol mais bem jogado. Que suava a camisa de nervoso. Que molhava a camisa de tanto chorar. Que era consolado por amigos, pelo pai —- o vovô —-, pelo técnico e até por jogadores no vestiário. Em seu benefício e antes que seus amigos leiam esta Avalanche, registro que você não chegou a chorar como eu, mas sofreu tanto quanto.

Posso lhe garantir: aqueles eram tempos bem mais difíceis. Hoje, o Grêmio só se dá o direito de perder como perdeu —- diante de um grande time de futebol —-, porque se credenciou e se acostumou a disputar finais das principais competições nacionais e internacionais. Foi assim ano passado na semi; foi assim agora nas quartas da Libertadores. E muitas outras vezes sofreremos juntos pelo revés alcançado, porque não nos contentamos com posições intermediárias. Queremos sempre estar no topo. Com os vencedores. Entre os maiores do Brasil, da América e do Mundo.

E se queremos sempre mais e mais, saiba que é preciso apanhar, sofrer, errar, encarar a derrota … chorar se preciso —- eu choro agora enquanto escrevo. E amanhã acordar, juntar os trapos, ser resiliente à corneta do inimigo e dos amigos, aguentar firme, forte e crente de que somos capazes de dar a volta por cima. Porque somos gremistas e Imortais, graças a Deus — e ao vovô.

Avalanche Tricolor: faz assim, não, que eu apaixono

Grêmio 1×1 Santos

Libertadores — Arena Grêmio

Diego Souza marca nos acréscimos, foto de Lucas Uebel/Grêmio FBPA

 

Não me faz sofrer, não! Joga, Grêmio, como tu sabes jogar. Respeita o adversário, sem desrespeitar o jeito bonito que gostamos de ti ver jogando. Segura a bola o quanto puder, vai na boa, não arrisca, mas não me faz sofrer, não Troca passe lá atrás, leva para frente, se movimenta no ataque. E chuta uma, duas, três, quantas vezes precisar para me fazer comemorar o teu gol.

Faz quanto tempo que sofremos juntos? Desde que me conheço por gente, com certeza. Então, pra que estender este sentimento por 180 minutos se tudo pode ser resolvido nos primeiros 90? Mas tu parece que gostas de me ver sofrer, não é?!? Precisa tomar um gol ainda no primeiro tempo, bobear na defesa, errar passe no meio mais do que o normal, ameaçar uma expulsão no ataque e levar um, dois, três sustos na sequência. 

Deixa pra resolver tudo depois. Nos acréscimos. Na partida de volta. Como foi ano passado nas quartas-de-final. Como tantas outras vezes nessa nossa longa convivência. Nem posso reclamar muito, porque hoje ainda te saístes bem com o gol de pênalti, além da hora. Ah, isso, também. Já que era para empatar tinha que ser desse jeito, né?!? Sofre-se porque o árbitro não enxergou a irregularidade. Sofre-se porque o VAR demora para convencê-lo da penalidade. Sofre-se porque é pênalti, e, neste ano, convenhamos, não tem sido o melhor caminho para chegarmos ao gol. 

Parece até que tu sabes que por mais que eu te peça “não me faças sofrer”, foi assim que fui forjado na tua torcida. Foi padecendo na arquibancada de cimento e nas cadeiras de ferro frio do Olímpico. Foi ao lado do radinho de pilha, lá na Saldanha. Foi diante da TV —-  como nesta noite de quarta-feira. Foi na sofrência de cada lance mal lançado, de cada bola desperdiçada e de resultados impossíveis alcançados. No gol marcado no minuto final, que me faz acreditar mais uma vez na volta por cima. Parece até que tu saber que foi assim que me apaixonei por ti. 

Avalanche Tricolor: neste Capitão, eu confio!

Santos 2×1 Grêmio

Brasileiro —- Vila Belmiro, Santos-SP

Maicon sabe o que faz com a bola nos pés Foto LUCASUEBEL/GREMIOFBPA

 

Foi mais uma jornada bem abaixo do esperado, se é que os desfalques na defesa, as ausências no meio de campo e a falta de um camisa 10 pudessem nos oferecer alguma expectativa mais promissora. O gol de empate, em uma única jogada que nos fez lembrar os tempos de um Grêmio em que a bola era tratada com respeito, trocada de pé em pé e com precisão, me parecia o suficiente para a tarde deste domingo. Até Diego Souza desencantou aparecendo no momento certo para concluir a gol. No entanto, havia algo ou alguém conspirando contra nós na Vila Belmiro e a derrota voltou a se apresentar com dois gols de pênalti (o que foi e quem foi ficam por conta da sua imaginação).

Chama atenção como a presença de um ou dois jogadores seriam suficientes para elevar o nível do futebol jogado pelo nosso time. Haja vista, a qualidade que Maicon acrescenta na saída de bola, na distribuição de jogo e na orientação de seus companheiros sempre que consegue ser escalado, como ocorreu hoje no segundo tempo —- não por acaso o gol veio após a entrada dele . Pena não ter condição física para se manter em campo por mais tempo. Faz falta e dificilmente encontraremos, com a brevidade necessária, um jogador com a sua qualidade técnica —- nem nós nem qualquer outro time brasileiro, registre-se.

Mesmo que não possa jogar em sua plenitude, o Capitão, que levantou todas as taças nas últimas décadas, tem papel fundamental. Ele é um líder importante no grupo e com capacidade de mobilizar a equipe para a reação que se faz necessária no Campeonato Brasileiro. É preciso subir na tabela, entrar na ZL e impor o futebol que o Brasil aprendeu a respeitar, que nos faz líder do Grupo E da Libertadores e nos põe como favorito nas oitavas-de-final da Copa do Brasil. E Maicon deixou isso claro nas palavras ao fim da partida:

“A gente sabe que não estamos bem no campeonato, nós cobramos bastante no dia a dia, porque a qualidade da nosssa equipe, não podemos estar onde estamos. Muitas vezes é complicado falar algumas coisas, porque as pessoas interpretam de maneira diferente, mas eu sempre cobro. O que eu falo aqui eu falo lá dentro. Aqui dentro (do campo) temos que ter atitude, coragem, estamos vestindo uma camisa de um time que tem chegado sempre, sendo campeão, e nosso torcedor cobra sempre isso, e a gente sabe que estamos abaixo. As pessoas olham a gente lá embaixo, mas tenham certeza que a gente se cobra e que vamos melhorar. É hora de começar a mudar e subir na tabela porque nessas condições ficamos distantes do que a gente almeja, que é ser campeão”

Como neste Capitão, eu confio, renovo minhas esperanças mesmo que tenhamos terminado o domingo com mais um revés.