Avalanche Tricolor: cantas por quê?

São Paulo 3×0 Grêmio

Brasileiro – Morumbi, São Paulo/SP

Foto de Lucas Uebel/GrêmioFBPA

A experiência do estádio ainda me surpreende. Os muitos anos de arquibancadas no Olímpico Monumental não foram suficientes para me oferecer todas as sensações que o futebol pode proporcionar — e quantas emoções eu lá vivi! Falo do Olímpico porque, quando a Era Arena se iniciou, já não vivia mais em Porto Alegre, o que me fez diminuir drasticamente a presença, ao vivo, nas partidas. Transformei-me em torcedor de sofá — que isso não seja visto como demérito, apenas como circunstâncias da vida.

Hoje, porém, dei-me o direito de assistir ao Grêmio no Morumbi. É aqui na vizinhança, pouco menos de 2,5 quilômetros de casa e a 10 minutos de carro. Tinha uma razão especial para ver a partida do estádio: Luis Suárez, nosso atacante que se encaminha para o fim da jornada com a camisa tricolor. É um privilégio ser torcedor de um time que tem um dos quatro maiores goleadores do mundo na ativa a lhe representar. Não canso de admirar o esforço deste gigante que faz o que está a seu alcance para tornar o Grêmio um pouco melhor do que é — não bastasse o talento com que toca na bola e chuta a gol, tem uma raça e uma forma de liderar exemplares.

De Suárez vi o que foi possível a medida que o time faz pouco para que ele apresente todo seu potencial em campo. Por mais que corra desesperadamente em busca de uma boa jogada, a companhia não colabora muito com a sequência do lance. O que me fez feliz em uma noite de infelicidade no futebol jogado no campo esteve na arquibancada do Morumbi, no pequeno e desconfortável espaço reservado à torcida adversária. 

No embalo da banda da Geral do Grêmio, os torcedores, mesmo descrentes em relação ao desempenho do time, entoavam cânticos de exaltação pelos feitos do Imortal. Faltava harmonia entre as letras que falavam de vitórias e conquistas e a performance da equipe. Essa dessintonia fazia do som emitido pelos torcedores algo ainda mais impressionante. Sinalizava o quanto eles (nós) têm noção da relevância daquele distintivo que carregamos no peito, do que representamos e alcançamos nessa longa jornada. 

O melhor foi reservado para depois do jogo. Após um jogo que jogamos abaixo da crítica, tão sem méritos quanto sem organização. Enquanto esperávamos a liberação policial para deixamos o estádio, a banda tocava de forma eletrizante. Dentre os torcedores que pulavam no ritmo das músicas, um menino de cabelos longos, nos ombros do pai, com a camisa de Suárez nas mãos, vibrava como se tivéssemos conquistado um título. Uma alegria contaminante! 

Foi na imagem daquele guri que me encontrei em sintonia com a história do Grêmio mais uma vez. A felicidade dele lembrou-me porque sou um apaixonado por este time. Por que cantamos mesmo quando em campo o time não encanta.

Avalanche Tricolor: torcer em família

 

 

 

São Paulo 0x0 Grêmio
Campeonato Brasileiro —- Morumbi, São Paulo/SP

 

 

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A alegria de torcer em família, em foto de Paulo Pinto do Foto Públicas

 

 

De mãos dadas com o pai, o guri chegou vestindo a camisa do Grêmio feliz da vida as arquibancadas reservadas a torcida adversária no Morumbi. O sol forte que ardia na pele, na manhã de sábado, fazia brilhar ainda mais os olhos dele, que se movimentavam com rapidez de um lado para o outro como se quisessem captar todas as imagens que compunham aquele cenário mágico que é o campo de futebol. Mal prestou atenção quando o pai o apresentou a mim como “um gremista nascido em São Paulo”. Por respeito, aceitou tirar uma foto ao meu lado. Mas o que queria mesmo era ver o Grêmio no gramado.

 

 

A satisfação do pai também era enorme aquela altura. Sabemos como é difícil criar essa gurizada em terra distante do nosso time do coração. Lá no Rio Grande do Sul, você já nasce predestinado a seguir o time do pai. Ou torce pelo time dele ou pelo arquirrival — o que exige algum atrevimento e muito desprendimento. Quando os criamos fora do Estado, os riscos de termos um desgarrado é enorme, especialmente em São Paulo, Rio de Janeiro e Minas Gerais em que os grandes clubes estão sempre em destaque no noticiário e disputando títulos. Sem contar a tentação em torcer pelos times milionários do exterior.

 

 

Aqui em casa, com dois paulistanos expostos as múltiplas tentações, me esforcei para impedir dissidências. Já contei ao caro e raro leitor desta Avalanche como a batalha de todos os Aflitos, em 2005, foi determinante para o rumo que os meus dois guris tomariam. Tivemos poucas oportunidades de assistirmos juntos ao Grêmio nos estádios de futebol. Mas sempre fiz questão de tratar esses momentos com cerimônia. Houve partidas marcantes, como a despedida do Olímpico Monumental, o primeiro jogo na Arena ao lado do avô ou as finais do Mundial em 2017.

 

 

A última vez que assistimos a um jogo juntos e com a presença da mãe ao lado —- ou seja, família completa —- havia sido em 2001. Por coincidência no próprio Morumbi. Valia vaga à semi-final da Copa do Brasil. O Grêmio já havia vencido por 2 a 1 em casa. Por essas inconsequências do calendário, a partida foi marcada para quarta-feira à tarde, em pleno dia útil. Com a possibilidade de termos pouco movimento de torcida, me arrisquei a levar os guris que estavam com apenas dois e cinco anos, e pudemos experimentar um jogo incrível com sete gols, duas viradas de placar, vitória do Grêmio por 4 a 3 e classificação à fase seguinte.

 

 

Para constar: naquele ano, 2001, fomos campeões da Copa do Brasil.

 

 

Nesse sábado, estivemos de volta ao Morumbi. Eu, eles e a mãe a tiracolo. Justiça seja feita, ela já encarou algumas poucas e boas sozinha ao meu lado, como assistir a um jogo do Grêmio em uma noite de sábado e Dia dos Namorados. É muito amor, né?!? Havia muitas outras famílias reunidas, além da minha e a do pai e filho que inspiraram os primeiros parágrafos desta Avalanche. Uma delas se apresentou a mim, também. “Somos primos”, disse o porta-voz dos Jung de Passo Fundo. Sim, encontramos um parentesco em meio a felicidade de estarmos reunidos torcendo pelo Grêmio. Não sei se todos os Jung são gremistas, mas não conheci até hoje nenhum que não fosse.

 

 

Os Jung e as demais famílias gremistas, aproveitávamos as facilidades que uma partida de sábado pela manhã, em São Paulo, proporciona, mesmo com as dificuldades para se obter ingresso, as limitações impostas pela falta de segurança e o desconforto de ficarmos expostos no espaço menos nobre do estádio — já contados neste blog.

 

 

Todos queríamos ver o Grêmio jogar e não nos importávamos de estar diante de uma equipe alternativa, já que o Campeonato Brasileiro não é nossa prioridade. Nos contentávamos em estar em família, comungando nossa paixão com quem amamos. E assim comemoramos as defesas de Júlio César e os desarmes de David Braz, tanto quanto as tentativas de dribles de Luan e Tardelli.

 

 

Agradecemos a Renato que nos permitiu assistir a Everton em campo — o craque que parece vai ficar entre nós por mais algum tempo. Raras são as equipes brasileiras com capacidade de ter no elenco um craque que é reverenciado por todos os demais torcedores brasileiros, fato alcançado por nosso atacante depois do desempenho como titular da seleção brasileira na Copa América.

 

 

Aliás, que privilégio tiveram os mais de 40 mil torcedores que foram ao Morumbi nesse sábado. Se de um lado tínhamos Everton, o craque da final da Copa América, de outro havia Daniel Alves, o craque da Copa América.

 

 

De nosso lado, olhávamos com o merecido respeito toda vez que o agora meio-campista adversário pegava na bola e ensaiava alguma jogada — na maior parte das vezes não correspondida por seus companheiros de equipe. E vibrávamos assim que a bola era passada a Everton. Aplaudíamos a maneira como corria pela lateral do campo, a forma como cortava para dentro em busca do gol e os dribles que acumulava sobre seus marcadores.

 

 

O que foi aquele sequência de dribles em direção a área no segundo tempo? Lembrou o lance que nos levou ao gol da vitória na Libertadores dias atrás. Desta vez só não completou a jogada porque foi derrubado por um zagueiro, que o árbitro jura ter agido dentro da lei. Nós, como bons torcedores, lógico, reclamamos a injustiça cometida.

 

 

Ao contrário daquele jogo de 2001 que assisti com a família no Morumbi, nesse ninguém conseguiu marcar um só gol. Pela reação final das torcidas, a impressão que ficou é que a nossa saiu do estádio mais satisfeita do que a deles. Até porque nós já estávamos suficientemente felizes em compartilharmos aqueles 90 e tantos minutos de futebol em família — a família gremista.

O futebol não quer você no estádio adversário

 

Gremio x Palmeiras

Torcida do Grêmio no Pacaembu, em foto de LUCASUEBEL/GRÊMIOFBPA

 

Em um momento em que o futebol brasileiro tem conseguido mobilizar uma quantidade significativa de torcedores para os estádios —- e os “calculistas” podem me confirmar se a média de público tem aumentado, neste ano —- quero conversar com você, caro e raro leitor deste blog, sobre a dificuldade para se assistir aos jogos no estádio do adversário.

 

(ops: antes de seguir em frente, acabo de receber a confirmação do meu colega Paulo Vinícius Coelho: o público tem aumentado, a média está em 20.700 torcedores, a maior em 36 anos)

 

Nasci e fiz minha infância e adolescência quase dentro de um estádio de futebol. O quintal da casa em que morei, em Porto Alegre, era o Olímpico Monumental. Assistir aos jogos pelo interior do Rio Grande do Sul também não era um problema pois tinha o privilégio de chegar aos estádios na companhia da equipe de esportes da Rádio Guaíba, estivesse ou não com o meu pai. Os portões se abriam e na pior das hipóteses eu arrumava um lugarzinho na cabine da emissora.

 

Nos clássicos que eram disputados no Beira Rio a logística era parecida graças ao carinho com que a diretoria do Grêmio sempre concedeu ao meu pai. Assim, era fácil encontrar um diretor gremista que me acolhia e  me levava junto com o staff para o estádio adversário.

 

As coisas começaram a ficar mais complicadas aqui em São Paulo. Os primeiros jogos em que me arrisquei foi no Canindé, em época na qual a Portuguesa estava sempre disposta a pregar suas peças —- bons tempos aqueles, não é Luisinho! Foi lá, porém, que tive minha primeira decepção. Pois insisti em levar um dos meus filhos. A desorganização na fila do ingresso, a forma agressiva com que os cambistas nos abordavam e a violência de uma das organizadas fez com que ele me pedisse para nunca mais convidá-lo para aquele selvageria.

 

Tivemos algumas experiências, também, no Parque Antártica e no Morumbi —- nada muito convidativo, mesmo que os resultados em campo tenham sido positivos para o meu Grêmio. Aliás, antes mesmo de os meus meninos serem gremistas, fui ao Morumbi com eles para ver o São Paulo em campo e os maus-tratos foram tais que acabamos sentados nas cadeiras reservadas ao time adversário, que estavam completamente vazias.

 

Transformei-me em torcedor de televisão, especialmente depois do surgimento do paga-pra-ver. É mais fácil, mais seguro e mais confortável — mesmo que nada se comparece com o prazer de você pular na arquibancada, gritar até a voz se perder e comemorar abraçado a alguém do seu lado que você jamais viu na vida e jamais verá de novo, mas se identifica com você pela cor da sua camisa.

 

Nesta semana, muitos amigos não acreditaram que eu não assistiria ao Grêmio na Libertadores, no estádio do Pacaembu, em São Paulo.

 

Pense comigo: o trajeto até o estádio tem de ser feito de forma clandestina, porque se um louco qualquer identificá-lo com a camisa contrária, você corre o risco de ser agredido. Estacionar seu carro nas proximidades do estádio é uma façanha (e um achaque). O espaço destinado ao torcedor adversário é sempre o pior possível. Distante e em um canto qualquer, cercado de seguranças por todos os lados, oferecendo a sensação de que você é um terrorista prestes a explodir uma bomba. Ao fim da partida, você se transforma em refém, pois só pode deixar o local quando a polícia entender que está tudo em ordem do lado de fora. Ou seja, para um jogo que começa às nove e meia da noite, como foi o caso desse, você só vai voltar para a casa por volta de uma hora da manhã —- inviável para quem como eu acorda às quatro da matina.

 

Entenda, não estou aqui desmerecendo o sistema de segurança necessário para manter a ordem e os bons costumes em um estádio de futebol. Sei que a estupidez humana exige alguns limites. Mas chamo atenção para a necessidade de o torcedor adversário —- e aqui em São Paulo sempre sou o adversário —- também ser mais bem respeitado nos estádios de futebol.

 

Hoje, pensei em me organizar com a família e assistir ao Grêmio no sábado pela manhã, no Morumbi. O horário é ótimo —- mesmo que ainda me cause uma estranheza —- e o local é próximo de casa. Além de ver meu time, mesmo com os reservas em campo, ainda terei a oportunidade de acompanhar, ao vivo, a atuação de Daniel Alves, um dos maiores nomes do futebol mundial. Sim, eu gosto de ver craques jogando, apesar deles estarem do outro lado.

 

Aí surge a primeira decepção: na busca de ingresso, a informação que descubro é que a torcida visitante pode comprá-lo, mas “somente no dia da partida, na bilheteria 05 do portão 15”. Não fosse o fato de ser um dos mais caros, R$ 80,00, você tem de ficar sentado na arquibancada superior, a mais distante do gramado e sem direito a cobertura — torça para não chover no dia nem ter de enfrentar um sol escaldante.

 

Com todas as possibilidade de os ingressos serem vendidos on-line, difícil entender o motivo de oferecer como único serviço ao torcedor adversário a bilheteria e no dia da partida — o que nos leva a crer que haverá filas enormes e a possibilidade de entrar quando a bola já estiver rolando. Só uma coisa justifica essa atitude: convidar o torcedor adversário a ficar em casa e diante da televisão.

 

 

 

Avalanche Tricolor: o torcedor é tratado como se fosse um mero detalhe

 

Aimoré 1×1 Grêmio
Gaúcho – Cristo Rei/São Leopoldo-RS

 

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Juninho Capixaba comemora o 2º gol dele no Gaúcho, em foto de LUCASUEBEL/GRÊMIOFBPA

 

Os campeonatos estaduais têm perdido prestígio ao longo dos últimos anos, apesar de algumas rivalidades permanecerem muito fortes, como é o caso do Rio Grande do Sul. Mesmo assim, tirar as pessoas de casa para ocupar as arquibancadas é tarefa das mais complicadas.

 

No ano passado, a média de público pagante foi de 4.262 pessoas. O Grêmio, campeão de 2018, também liderou essa estatística: 16.233 pessoas por jogo — nada muito entusiasmante se levarmos em consideração que isso não chega a um terço da ocupação dos estádios em que disputou suas partidas.

 

Diante do fiasco de público, é de se esperar que as federações e os demais protagonistas do futebol adotem medidas que motivem os torcedores. De olho no noticiário, porém, percebe-se que essa não é a lógica que impera no futebol brasileiro.

 

Hoje à noite, pouco antes de se iniciar a segunda partida do Grêmio no Gaúcho, leio que a Brigada Militar estava impedindo a entrada de torcedores com a camisa do clube, no estádio Cristo Rei. Resultado de interpretação de punição imposta pelo STJD – Superior Tribunal de Justiça Desportiva à dupla Gre-Nal por briga de torcedores que aconteceu no ano passado durante um dos clássicos.

 

Ou seja, porque grupos de insanos resolveram se engalfinhar ano passado, a solução encontrada pelos tribunais foi impedir a participação do senhor, da senhora, do seu filho, do sobrinho, da dona de casa, do cidadão comum, de bem com a vida, que simplesmente curte ver a bola rolando e quer ter o prazer de vestir a camisa do seu clube de coração — talvez em uma rara oportunidade de assistir ao time jogando na cidade em que mora.

 

Para moralizar o futebol pune-se os que gostam de futebol. Afasta-se a família, tira-se o prazer do guri, corta-se o barato de nos sentirmos integrantes de um grupo, aborta-se o orgulho de usar o mesmo uniforme que nossos ídolos que estão em campo.

 

A medida adotada no Rio Grande do Sul soma-se a outros fatos desses últimos dias, como a ameaça de termos torcida única na final da Copa São Paulo de Futebol Júnior — que só não se concretizou graças a combinação de times que se classificaram para a decisão —- e o ingresso único de R$ 100,00 imposto pela diretora da claudicante Portuguesa, na segunda divisão do Campeonato Paulista.

 

Menos mal que quando a bola começou a rolar no estádio Cristo Rei, em São Leopoldo, nesta quarta-feira, pude perceber pelas imagens da televisão que havia nas arquibancadas torcedores gremistas com suas camisetas tricolores ou azuis. Não sei como entraram. Se os policias fizeram vistas grossas ou simplesmente eles esconderam suas camisetas até a partida se iniciar.

 

Independentemente do “drible” que deram na punição imposta pela Justiça, tanto no Rio Grande do Sul quanto em São Paulo, o que vemos é uma série de ações que dá a entender que o torcedor é um mero detalhe no futebol.

Sou explosivamente Grêmio!

 

 

Por Cao Hering

 

 

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Acompanhe outras imagens do Grêmio no site http://www.ducker.com.br

 

 

Já me perguntaram se eu sou gaúcho. Não, não sou. Está na cara, repare no meu jeito “catarina”. Sou gremista por osmose, ou sei lá como se chamam essas coisas do futebol. Amor gratuito à primeira vista? Pode ser. Saí de Blumenau torcendo pelo Grêmio Esportivo Olímpico, quem sabe esteja aí o elo. Torcer por um time é uma caixinha de surpresas, diz a filosofia. Torcer por um time é se apegar simplesmente a um escudo, pois todo o resto é volátil. Jogadores, técnico, ídolos, estilo de jogo, o corte da gola e das mangas, o estádio, até as cores, tudo em algum momento pode se desfazer, e você fica com seu escudo providencialmente no lado esquerdo do peito.

 

 

Pus os pés em Porto Alegre quando Falcão, Batista, Figueroa e outros tantos imbatíveis colorados botaram o tricolor da Azenha na roda por longos anos. Sem TV, na companhia do radinho de pilha, no silêncio das tardes de domingo meu quarto era preenchido pela narração vibrante, quase visível, de Armindo Antônio Ranzolin, os comentários de Lauro Quadros e Ruy Carlos Ostermann. O longo grito de goooooooooool era quase sempre para o Inter.

 

 

Nas discussões, puxávamos antigas derrotas do rival que em nada adiantavam para aplacar a frustração e as gozações nos almoços e aulas da faculdade nas segundas-feiras. Mas é aí mesmo que a gente se apega ao time do peito. Virei gremista de raiz, sem me meter em loucuras, fanatismo ou descer pela avalanche no estádio. Em Blumenau, sou torcedor à distância, não pego ônibus ou avião pra ver o Grêmio jogar na Cochinchina ou no Alegrete. Não me perguntes onde fica, não sei explicar direito.

 

 

Tivemos nossas redenções no Campeonato Brasileiro, Copa do Brasil, Libertadores da América e um mundial no Japão. Há uma longa lista de feitos em ambos os lados, administrada atabalhoadamente pelos deuses do futebol. Não cabem aqui. Nos últimos anos, no entanto, é nossa vez. E na quarta-feira passada o apaixonado planeta azul pôde explodir novamente, agora em hostil território argentino. E também dentro de sua própria arena frente aos telões. “Soy loco por tri, America!”, dizia a faixa na arquibancada. É orgástico, é ver de novo e de novo e de novo Cícero, Fernandinho e Luan metendo a bola na rede do Lanús. Olha o gol! Olha o gol! Olha o gol! Ah, e os milagres do Grohe! É o mundial mais uma vez na porta. E seja lá o que os deuses do futebol programarem daqui pra frente, já tá tudo de bom tamanho.

 

 

É só futebol, mas é o Grêmio. Não sou gaúcho, assim como os flamenguistas da minha turma não são cariocas e muitos corintianos nem saberiam chegar a Itaquera. Não me acostumei à carne mal passada e o chimarrão é amargo demais. Música gauchesca, nem pensar. Não digo “tchê” e nem usaria uniforme gremista na rua. Mas sou explosivamente Grêmio! Grêmio, o Imortal!

 

O Cao Hering, que autorizou a publicação deste texto no Blog, é gremista, publicitário e colunista do Jornal de Santa Catarina.

 

Avalanche Tricolor: o dia em que redescobri aquele guri do Olímpico

Grêmio 0 (3) x (1) 1 Barcelona Guayaquil
Libertadores – Arena Grêmio

Escrevo de dentro do avião que me leva de volta a São Paulo. Da janela vejo do lado direito a imponência da arquitetura que dá desenho à Arena do Grêmio. Exuberante, pulsante. Imagem que dá ponto final (ou quase) a incrível experiência vivida por mim nestas últimas 24 horas.

Ainda sinto no corpo e na alma (na voz, também) as emoções as quais fui submetido desde que cheguei neste mesmo aeroporto, na tarde de quarta-feira. Do Salgado Filho, fui, acompanhado de meu irmão, até a Arena. Melhor. Nas cercanias da Arena. Fui recepcionado por uma quantidade enorme de torcedores que já se reuniam à frente da casa batizada “Largo dos Campeões”, nome do coletivo de gremistas que aluga e mantém o espaço a uma quadra do estádio.

Lá dentro, em uma pequena sala, a decoração é carregada de adereços, relíquias e memórias do Grêmio. O espaço recebe também alguns barris de chopp, devidamente gelados, e um DJ que no comando de sua picape toca rock and roll pra animar a festa.

Lá fora, embaixo de um toldo com as cores do Grêmio, do lado e ao longo da praça, um amontoado de torcedores a espera da costela que assa em fogo de chão, no mais típico dos churrascos gaúchos. A fumaça toma conta do local quando o vento bate para refrescar a turma – trago o cheiro entranhado na mala de viagem. O som alto da música se mistura a uma série de sotaques do Brasil: Mato Grosso, Santa Catarina, Ceará, Distrito Federal e São Paulo estão representados. O gauchês prevalece. Nem poderia ser diferente.

Foi no “Largo dos Campeões” – nome que relembra o espaço onde estavam os arcos dos portões de entrada do saudoso estádio Olímpico -, que participei do esquenta para a partida que garantiria a presença do Grêmio na sua quinta final de Libertadores. Fui a convite de um amigo de infância: Marcelo Quadros. Somos filhos de jornalistas, que foram colegas de rádio, e desde muito pequeno assistíamos às partidas do Grêmio no Olímpico ou por onde o Grêmio estivesse, no interior do Rio Grande do Sul.

Fazia mais de 30 anos que não nos víamos, apesar da troca constante de mensagens no último ano, desde que ele se mudou de Buenos Aires para São Paulo. Finalmente nos encontramos e o momento não poderia ser mais especial.

Cercado de gremistas. De entusiasmados gremistas. Cada um contava um pouco de sua história, todos relembravam momentos vividos, jogos inesquecíveis, jogadores memoráveis. Muitos faziam reverência ao meu pai, Milton Gol-Gol-Gol Jung, que narrava futebol com precisão e emoção e jamais escondeu sua torcida pelo Grêmio. E ao Lauro, pai do Marcelo.

Somos de uma época em que as conquistas regionais eram o ápice de nossa satisfação. Somente mais tarde passamos a nos acostumar com as vitórias nacionais. Foi, também, quando o sonho da Libertadores se iniciou. Já eram os anos de 1980.

Tanto tempo depois de nosso último encontro, lá estávamos nós de volta.

Camisa do Grêmio vestida, bandeira nas costas, sorriso no rosto, confiança exagerada. Um quase deslumbramento. Semelhante aos dos tempos em que éramos guris e, das cadeiras de ferro azuis do Olímpico, transmitíamos nossa certeza na vitória – nem sempre atendida com o desempenho em campo, o que, inevitavelmente, me levava às lágrimas. Chorei muito quando era criança, no Olímpico.

As lágrimas voltaram a correr quando entramos na Arena. Éramos, Marcelo, eu e mais 51 mil gremistas alucinados com a possibilidade de estarmos mais uma vez em uma final de Libertadores, esta competição pela qual aprendemos a jogar e nos apaixonar. O choro viria a se revelar novamente no fim da partida quando a classificação estava garantida e a torcida cantava alto seu orgulho de ser gremista.

Ao longo do jogo, sofri com o gol adversário, aplaudi o carrinho bem dado, a roubada de bola inesperada, o drible encantador e os ataques frustrados. Xinguei o juiz. Xinguei quando ele não tinha razão e muitas vezes quando ele tinha, também. Desculpe-me, seu juiz, mas estava vivendo um momento muito especial da minha vida: voltava a ser aquele guri gremista do estádio Olímpico.

Assistí à partida no círculo mais alto da Arena, nas cadeiras sobre a Geral, atrás do gol defendido por Marcelo Grohe no segundo tempo, aquele em que a bola deles tocou o poste – e eu tenho certeza que ajudei a desviá-la para fora. Ouvi torcedor reclamando de Cícero, lamentando que Cortez não chegou à linha de fundo, que o drible de Fernandinho não deu certo, que Luan poderia ter entrado mais duro, batido mais forte, feito o gol de empate, da virada, o da goleada … pô, Luan! Grande, Luan! Vi esses mesmos torcedores aplaudindo a todos eles.

A gente quando torce é assim mesmo. Distorce as coisas. Não relativiza.

Em campo, o Grêmio foi “copero” como só os grandes times sul-americanos sabem ser. Mesmo diante da pressão de um adversário precisando descontar os gols tomados no Equador, soube cadenciar, catimbar, chutar a bola para fora e segurar a bola do lado de fora quando necessário. Valorizava a trombada recebida, esticava o tempo de recuperação caído no gramado e chegava forte sempre que exigido. Deu-se o direito de fazer o jogo da desconstrução já que havia construído o resultado na casa do adversário, uma semana antes. Porque assim é a Libertadores. E poucos no Brasil sabem jogá-la tão bem quanto nós.

Retorno a São Paulo e vou ter de me recompor. Voltar a ser o adulto que deixe para trás quando desembarquei na cidade. O cara responsável que a profissão exige e a família precisa. Chego com a garganta arranhada, com dores nas costas e pernas cansadas. Essas coisas que amanhã ou depois estarão recuperadas e esquecidas. O que nunca mais sairá do meu corpo e da minha memória é a experiência vivida nessas 24 horas, em Porto Alegre.

Valeu, Marcelo! Valeu, Grêmio! Até a final!

Avalanche Tricolor: somos todos gremistas!

 

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Torcida tricolor destaque em foto de LUCAS UEBEL/GRÊMIO FBPA

 

Não sei quem é Ticiano Osório. Menos ainda quem é Alexandre Elmi. Que isso não diminua a importância deles nem pareça arrogância deste que lhe escreve. Meu tempo distante do Rio Grande me fez perder referências, por mais que insista em acompanhar o noticiário aqui e acolá, especialmente quando se trata do Grêmio. Portanto, não saber quem são, revela antes de mais nada minha ignorância e peço desculpas a ambos.

 

Soube deles nestes dias que antecedem a decisão da vaga à final da Copa do Brasil, muito mais próxima do que imaginávamos há alguns meses. Usaram do talento que têm com as letras para demonstrar o amor que sentem pelo Grêmio. Amor e apreensão. Ceticismo e deslumbramento. Cada um a seu modo.

 

A você, caro e raro leitor deste blog, além de reproduzir o link para acessar o que dizem, explico, desde já, que ambos publicaram textos na coluna “De Fora da Área”, que pode ser lida na página virtual da ZH Esportes.

 

O primeiro, Ticiano, com o chamativo título “o Grêmio não vai ser campeão” , seguido por artigo no qual descreve a série de frustrações vividas nos últimos 15 anos, desde a disputa de pênaltis contra o Olímpia, as finais contra o Boca, na Libertadores, e a entrega do Campeonato Brasileiro depois de estar 12 pontos à frente de seu adversário direto. Relembra todos esses reveses como se buscasse um consolo para caso nada dê certo mais uma vez. Cria assim uma blindagem em seus sentimentos, ao mesmo tempo que torce alucinadamente para que a história o surpreenda.

 

O segundo, Alexandre, é afirmativo ao intitular seu artigo com “o Grêmio vai sair campeão”. Lembrou do nosso delírio ao acreditarmos que seríamos capazes de golear o Boca, no Olímpico, após perdermos por 3 a 0 o primeiro jogo da final – e eu estava lá delirando ao lado do meu pai. Lembrou, também, da esperança que tivemos de nos recuperarmos no Brasileiro após termos conquistado uma vantagem que jamais algum outro clube foi capaz de obter (e desperdiçar). Mesmo assim, encontrou na nossa história inspiração para crer que agora tudo será diferente e, depois de passarmos pelo Cruzeiro, logo mais à noite, a Copa do Brasil estará logo ali nos esperando.

 

Os dois autores têm razão por mais contraditórios que sejam seus sentimentos. Cada um dos torcedores que forem à Arena nesta noite, e os milhares de nós que estaremos diante da televisão, carregaremos conosco um pouco de cada versão. Amor e apreensão. Ceticismo e deslumbramento. Dr. Jekill e Mr. Hyde. Deus e o Diabo. Ticiano e Alexandre.

 

Vamos nos dividir entre a crença a cada “pifada”  de Douglas e o desespero no avanço do adversário sobre Marcelo Oliveira. Os olhos vão brilhar com o drible de Luan e o coração vai apertar a cada lançamento para dentro de nossa área. Vamos cerrar os punhos para comemorar as bolas despachadas por Geromel e Kannemann e voltaremos a cerrá-los de raiva nas bolas perdidas por Pedro Rocha e Ramiro.

 

Seremos um pouco de cada um a cada lance.

 

Seremos, acima de tudo, gremistas! Imortais!

Avalanche Tricolor: vaga na Copa do Brasil ainda está em jogo, apesar de gol mal anulado

 

Grêmio 0x1 Criciúma
Copa do Brasil – Arena Grêmio

 

Time precisa agora de todo o apoio do torcedor (foto do Grêmio Oficial no Flickr)

Time precisa agora de todo o apoio do torcedor (foto do Grêmio Oficial no Flickr)

 

É impressão minha ou todo mundo achou que o erro do árbitro ao anular o gol de Pedro Rocha foi normal? Que não influenciou na partida? Que pouca diferença faria no desempenho das duas equipes? Ouvi alguns comentaristas durante a transmissão e pouco se citou o fato, para mim crucial no jogo. Houve até quem, a princípio, validasse a decisão do juiz.

 

Eram 22 minutos quando Rocha, em meio aos zagueiros e em velocidade, tabelou com Luan e, na entrada da área, recebeu passe preciso, em jogada que tem marcado o futebol gremista nesses tempos de Roger, para com apenas um toque deslocar o goleiro e por a bola dentro do gol.

 

Vamos ser sincero: era desnecessária a linha digital que as emissoras de televisão usam nas transmissões – aliás, demoraram para usar nesta terça-feira – para perceber que o atacante estava em posição legal. O auxiliar, que está lá só para ver esse lance e trabalha recomendado pela Fifa a, na dúvida, dar sequência à jogada, não entendeu dessa maneira e levou o árbitro ao erro.

 

Como agora é proibido reclamar do juiz, mesmo diante de erros crassos, aos jogadores cabe apenas indignar-se em silêncio, enquanto os algozes seguem sua vida sem qualquer punição. Um erro que pode custar a desclassificação desta Copa, pois exigirá vitória em Criciúma na partida de volta – o que, convenhamos, não é difícil, desde que as finalizações voltem a ser mais certeiras.

 

Um gol naquela altura mudaria o cenário da partida, pois obrigaria o adversário a abandonar sua postura defensiva, desmontaria a retranca montada para surpreender o Grêmio e abriria espaço para jogar. Sem o gol, o Grêmio teve dificuldade para trocar bola com mais objetividade e foi punido com um erro na saída de bola da sua defesa.

 

O Grêmio não perdeu a partida somente por causa do árbitro, mas também por causa dele, e precisa acertar sua forma de jogar contra equipes retrancadas, pois com sua ascensão na temporada tende a ser essa a postura dos próximos adversários. Porém, analisar o resultado do jogo e nosso destino na competição sem levar em consideração a anulação do gol no primeiro tempo é injusto. Assim como o foi a vaia de alguns torcedores ao fim da partida. Pois, mesmo com a derrota, o que o time precisa agora é de todo o apoio para se recuperar na próxima partida e, novamente, revelar-se Imortal.

Avalanche Tricolor: ganhamos deles de goleada!

 

Inter 0 x 0 Grêmio
Campeonato Gaúcho – Beira Rio/POA-RS

 

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Tenho orgulho de ser gremista. Talvez fosse até dispensável dizer isso, afinal quem lê esta Avalanche ou, minimamente, acompanha minha carreira no rádio sabe bem de quanto torço para o Grêmio. Cresci próximo do estádio, aprendi a jogar futebol no campo de terra nos fundos do Olímpico e, por mais de dez anos, vesti a camisa 13 do time de basquete, treinando no ginásio sem teto que ficava ao lado. Nas arquibancadas do Monumental chorei por títulos conquistados e perdidos. Costumava chorar muito até porque sempre fui passional e me emocionava com facilidade. Ao começar minha vida como jornalista, em 1984, fui repórter de esportes da Rádio Guaíba e, como tal, fui escalado várias vezes para trabalhar como setorista do Internacional. Lembro de uma vez ter chegado ao velho Beira-Rio e uma foto minha com a camisa de basquete tricolor estar estampada no quadro de avisos da sala de imprensa. Havia sido recortada de reportagem que registrava meus dez anos de basquete, publicada no jornal editado pelo departamento de imprensa do Grêmio. Era brincadeira de colegas, no Inter. Talvez pelo meu profissionalismo, espero que seja isso, sempre fui muito respeitado, apesar de todos saberem da minha paixão.

 

Meu fanatismo pelo Grêmio nunca influenciou a relação com meu círculo de amigos, também. Um dos poucos que mantenho até hoje, desde os tempos de infância, é o Paulinho, que, aliás, jogou ao meu lado no time de basquete. Ele era colorado. Perdão! Ele é colorado, muito colorado! Filho do seu Valdemar e da dona Terezinha e irmão da Verinha, tudo gente muito boa e de um carinho contagiante. Preservamos a amizade mesmo eu tendo vindo para São Paulo, em 1991, e ele permanecido em Porto Alegre. Nas vezes em que visita à capital paulista a trabalho costumamos dividir uma garrafa de vinho para lembrar alguns momentos que vivenciamos em parceria no Sul. O futebol, apesar de nossas diferenças evidentes, sempre nos uniu, pois era motivo de gozação mútua. Se não me falha a memória, neste tempo todo, tirei mais sarro da cara dele do que ele da minha. Ou teria sido ao contrário? Coisa ruim a gente não lembra!

 

Cheguei a ver com o Paulinho algumas partidas de futebol juntos lá no Olímpico. Jamais um Gre-Nal. Nunca tivemos oportunidade de dividir arquibancada em um clássico por motivos mais do que óbvios. Gostaria de ter estado ao lado dele hoje à tarde no Beira-Rio e participado deste fato que chamou atenção de todos, em um momento de reação à estupidez que domina os estádios brasileiros. Tomara que esteja em Porto Alegre no próximo Gre-Nal e tenha a chance de convidá-lo a ver o jogo comigo na Arena. Ver gremistas e colorados lado a lado vibrando a cada chute a gol, sofrendo a cada risco de gol e xingando o juiz que impediu o gol foi, sem dúvida, marcante. Apesar do comportamento violento de uma minoria que se traveste de torcedor para revelar suas frustrações, fiquei feliz em saber que existem pessoas capazes de compartilhar suas paixões clubísticas sem enxergar nisso uma ofensa ao adversário. E mais feliz ainda em ver que este exemplo surgiu na minha terra natal. Espero que a ideia avance e vença a intolerância. Que não seja ato isolado, mas o início de uma transformação nos estádios.

 

O empate em 0 a 0 talvez tenha sido providencial, pois nada em campo poderia ser mais importante do que a vitória da civilidade. Desta vez, ganhamos deles de goleada, Paulinho!

Fora da Área: para quem vou torcer?

 

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Foi cansativo driblar os textos que me ofereceram para ler, nesta semana, sobre a final da Copa do Mundo, mas consegui eliminar de todos eles a expressão “hermanos” que, insistentemente, acompanhava as notícias relacionadas a Argentina. Não porque cultive qualquer incomodo com os argentinos, muito antes pelo contrário. Como sabe bem o caro e raro leitor deste blog, sou gaúcho, gentílico de todos os nascidos no Rio Grande do Sul, mas que também identifica o povo ligado à pecuária em especial os da região dos pampas, da Argentina e do Uruguai. Portanto, a proximidade vai além da geografia, se faz pelos hábitos, expressões e atitudes. Não gosto de chamá-los de “hermanos” simplesmente porque se transformou em lugar comum e uma de nossas tarefas no jornalismo tem de ser a pureza da língua e a limpeza do discurso. Portanto, lembrando brincadeira do colunista Ancelmo Gois, de O Globo, sempre que depara com o exagerado uso de expressões estrangeiras: “hermanos” é o c…..

 

Não gosto de “hermanos”, mas não tenho nada contra eles. Por isso, apesar de muitas vezes compartilhar das brincadeiras que os brasileiros costumam fazer todas as vezes que se referem aos argentinos, os admiro pela bravura, pela elegância no vestir (mesmo diante da crise econômica) e pela carne saborosíssima. Sendo assim, não haveria qualquer motivo para torcer contra a seleção comandada pelo técnico Alejandro Sabella nesse domingo na final contra a Alemanha, no Maracaña. Mesmo porque eles tem Messi, jogador que potencializou à sua genialidade síndrome apontada como uma forma branda de autismo, a de Asperger. Joga com rara qualidade e a cada partida nesta Copa parece melhorar a capacidade de extrapolar com seu sorriso sem jeito os limites emocionais que o transtorno o impõe. Vê-lo jogando é um privilégio. A Argentina, claro, tem Messi, mas também tem Mascherano, tem Zabaleta, tem Di Maria e tem uma torcida de causar inveja. Isso não quer dizer que torcerei para os argentinos.

 

Nascido de família meio italiana e meio alemã, lá no Rio Grande do Sul, escolhi o Jung como sobrenome para me acompanhar na vida profissional. Nem me pergunte porque abri mão do Ferretti que se parece muito mais com a minha personalidade. Mas sendo Jung teria motivos que chega para torcer pela Alemanha. Parentes, que devem viver nas colônias germânicas formadas no meu estado natal, certamente ficarão bastante satisfeitos com a vitória da equipe comandada por Joachim Löw. Se me faltassem motivos para torcer, a seleção ainda tem como maior destaque Thomas Müller, atacante que carrega o sobrenome da minha mãe, não bastasse jogar bola como poucos. Independentemente dessa familiaridade, o tetracampeonato da Alemanha teria um fator pedagógico para o futebol mundial devido a estrutura construída pelo país para chegar ao nível atual, desde a derrota para o Brasil, na Copa de 2002. Sim, na semifinal fomos vítimas de uma criatura que se reconstruiu a partir da lição que aprendeu ao perder para nós por dois a zero no Mundial do Japão e da Coreia. O governo alemão ajudou a reestruturar os times de futebol do país e os obrigou a adotar escolas na região em que atuam, nas quais professores foram capacitados a partir de conhecimento desenvolvido em cursos da Uefa, novos talentos foram identificados e submetidos a uma série de conhecimento técnico e tático e preparados física e psicologicamente. Para se ter ideia, Özil tinha 14, Müller 13, e Kross 12 anos, quando isso começou. O que vemos em campo não é resultado do acaso ou do improviso, como costume aqui no Brasil. O título alemão seria um incentivo a quem acredita em planejamento, trabalho, competência e, claro, muito talento. Isso não quer dizer que torcerei para os alemães.

 

Entre Argentina e Alemanha, no domingo, ainda escolho o Brasil, pois, como já escrevi neste blog, sou torcedor contumaz da nossa seleção.