O momento certo para começar, não existe

Por Simone Domingues

@simonedominguespsicologa

Foto de Tobi no Pexels

Assim que estiver tudo pronto eu começo!

Essa é uma daquelas frases rotineiras que costumamos dizer quando vamos nos engajar em um novo comportamento, tal como fazer uma dieta, iniciar uma atividade física ou começar um projeto profissional.

E vai começar pelo fim? 

Confesso, faço essa pergunta, curiosa por sua resposta. Afinal, se estiver tudo pronto, não há mais nada ou muito pouco que possa ser feito.

Permita-me a ousadia: gostaria de fazer mais uma pergunta. 

Se você deseja aprender um instrumento musical, se inscreveria em um curso ou para tocar na orquestra da sua cidade?

Por mais óbvio que isso pareça, muitas pessoas criam expectativas para mudanças de hábitos ou alcance de metas como se estes dependessem de fatores externos. Na realidade, iniciar um novo hábito ou desenvolver uma habilidade envolve dedicação e persistência. Leva tempo, causa frustração e desconforto. Envolve processos. Envolve dar um passo por vez. Envolve treinar, errar, recomeçar, falhar, errar de novo, aperfeiçoar. Isso significa progredir.

Numa sociedade imediatista e com baixa tolerância à frustração, ter paciência para progredir soa como falta de foco e de determinação. Sobram ideias de que é preciso ser absolutamente o melhor para poder progredir e, com o endosso promovido pelas redes sociais, ecoam-se expectativas de que todos os feitos devem ser infalíveis.

Padrões que gritam por ser, quando ainda nem estamos

Perdemos tempo em excesso refletindo como seria nossa vida se fossemos de um jeito ou de outro; se tivéssemos isso ou aquilo; a partir de comparações injustas, baseadas em recortes de vidas perfeitas estampadas em posts

Desejamos a perfeição. Não seria isso exatamente o sinônimo de estarmos prontos? Na sua ausência, colocamos lente de aumento em nossos erros ou faltas.  A autocrítica se eleva e procrastinamos, não por preguiça ou dificuldade de resolução, mas como uma estratégia para adiar a tomada de decisão ou o nosso engajamento, aprisionados ao perfeccionismo exagerado que nos enche de temor pelas falhas e possíveis julgamentos alheios; perfeccionismo que nos coloca em labirintos, enviesa o pensamento que surge com pouca lógica. 

Quantas vezes acreditamos que se perdermos peso, seremos mais felizes no amor ou na vida profissional? Quantas vezes adiamos a dieta porque seria melhor começar na segunda-feira e não na próxima refeição?

Não existe momento certo para começar. Não estamos prontos e talvez nunca estejamos, porque mudam-se as necessidades e a vida se encarrega de nos desafiar com novas oportunidades. Como diz Mário Sérgio Cortella: 

“Gente não nasce pronta e vai se gastando; gente nasce não-pronta e vai se fazendo”.

Saiba mais sobre saúde mental e comportamento assistindo ao canal 10porcentomais

Simone Domingues é Psicóloga especialista em Neuropsicologia, tem Pós-Doutorado em Neurociências pela Universidade de Lille/França, é uma das autoras do canal @dezporcentomais no Youtube. Escreveu este artigo a convite do Blog do Mílton Jung

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